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Responsabilidade civil objetiva do empregador pelos danos decorrentes da relação de trabalho

Responsabilidade civil objetiva do empregador pelos danos decorrentes da relação de trabalho

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O presente trabalho versa sobre o estudo da responsabilidade do empregador frente ao empregado, sujeito hipossuficiente da relação, pelos danos decorrentes da atividade laboral desenvolvida.

SUMÁRIO

  1. RESUMO__________________________________________________________1
  2. INTRODUÇÃO ____________________________________________________1
  3. DESENVOLVIMENTO______________________________________________2

3.1-ASPECTOS DA RELAÇÃO DE TRABALHO_____________________________2

3.2-EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR___3

3.3-TEORIA DO RISCO_________________________________________________ 5

3.4-POSSIBILIDADE DE AÇÃO REGRESSIVA CONTRA O EMPREGADO______7

3.5-POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE SEGURO PREVIDENCIÁRIO OBRIGATÓRIO E INDENIZAÇÃO CIVIL OBJETIVA________________________8

3.6-EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA____________10

3.7-CONFLITO DE NORMAS____________________________________________11

3.8- COMPETÊNCIA___________________________________________________ 11

  1. CONCLUSÃO_____________________________________________________12
  2. REFERÊNCIAS____________________________________________________14

RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO EMPREGADOR PELOS DANOS DECORRENTES DA RELAÇÃO DE TRABALHO

            Carlos Ivan Ferreira de Araujo Junior *

1. RESUMO: O presente trabalho versa sobre o estudo da responsabilidade do empregador frente ao empregado, sujeito hipossuficiente da relação, pelos danos decorrentes da atividade laboral desenvolvida. De inicio busca-se explicar os fundamentos que caracterizam uma relação trabalhista, desde a definição de seus sujeitos até circunstancias que são indispensáveis para que tal relação se materialize, como, por exemplo, o caráter oneroso da relação. Logo após verifica-se a evolução histórica da responsabilidade civil do empregador, que primeiramente era subjetiva, deixando todo o ônus da prova a cargo do empregado, diferentemente do que se percebe hoje, onde o “ônus probandi” é de competência do empregador, surgindo ai a teoria do risco que concretiza a responsabilidade objetiva, fundamentando a sua existência nos riscos que são característicos de determinadas atividades pelo simples fato de estarem sendo exercidas. Posteriormente, busca-se explicar que, embora na maioria das vezes o empregado seja a parte lesada da relação, há casos onde o empregador é que se ver onerado quando seu subordinado age, por exemplo, dolosamente, tendo assim o direito de pleitear ação regressiva contra este. Busca-se demonstrar também a possibilidade de cumulação entre o seguro obrigatório que é encargo do órgão securitário e a indenização civil que é de responsabilidade do empregador, sem esquecer de resolver determinados conflitos normativos que decorrem da interpretação e aplicabilidade da responsabilidade civil, concluindo com a definição da justiça competente para dirimir tal conflito.

Palavras chave: Responsabilidade civil objetiva. Relação trabalhista. Ônus probandi. Teoria do risco.

*Acadêmico de Direito no Instituto Camillo Filho, estagiário do Tribunal de Justiça-PI.

2. INTRODUÇÃO

A responsabilidade civil e o Direito do Trabalho apresentam uma intima relação, sendo que a primeira surgiu no ceio do direito trabalhista, buscando resolver conflitos onde o empregado, parte hipossuficiente da relação, era incumbido do ônus de provar a culpa do empregador para só assim ter seu direito satisfeito.

Com a responsabilidade civil objetiva, passou-se a exigir apenas a comprovação do dano e o nexo de causalidade para que pudesse pleitear a indenização perante o empregador, o que acabou por favorecer e facilitar demasiadamente a vida do empregado.

Foi então que surgiu a Teoria do Risco, para dar fundamento à responsabilidade objetiva do empregador, teoria esta fundada no potencial lesivo que determinada atividade pode oferecer a outrem, devendo aquele que dela aufere lucre ou qualquer outro beneficio arcar também com os ônus que dela surgirem, o que acabou por ramificar as concepções que fundamentam a teoria do risco, como o risco-proveito, risco criado, risco profissional e o risco integral, todas com o mesmo objetivo que era o de facilitar a satisfação do direito da parte lesada.

Embora na maioria das vezes o empregado seja a parte lesada na relação, em outras ocasiões o empregador também figura neste pólo, como, por exemplo, quando o empregado age com dolo ou culpa, tendo o empregador o direito de reaver o eventual ônus que percebeu frente ao empregado causador do dano, tendo para tanto o direito de pleitear ação regressiva.

Da preocupação em buscar resolução para os conflitos existentes na relação trabalhista, buscou-se analisar como será definida a responsabilidade frente aos agentes protagonistas dessa relação, partindo do ponto de vista de que há uma desigualdade fática existente entre ambos, onde uma das partes aplica sua atividade pessoal na consecução de um fim desejado pelo outro, caracterizando um estado de sujeição, que está incrustado no conteúdo do contrato, buscando explicar desde os fundamentos que caracterizam a relação até os legitimados para processar e julgar tal demanda.

3. DESENVOLVIMENTO

3.1- ASPECTOS DA RELAÇÃO DE TRABALHO

Segundo Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino o Direito do Trabalho pode ser conceituado como:

O ramo do Direito que tem por objeto as normas, as instituições jurídicas e os princípios, que disciplinam as relações de trabalho subordinado, determinam os seus sujeitos e as organizações destinadas à proteção desse trabalho em sua estrutura e atividade (VICENTE PAULO. 2010).

Ramodo Direito que se dedica à proteção da harmonia na relação empregatícia, protegendo não apenas o trabalhador, que aplica sua atividade pessoal na consecução de um fim desejado pelo outro, caracterizando um estado de sujeição, que está incrustado no conteúdo do contrato, como também o empregador, que mesmo estando no pólo mais favorável da relação, acaba muitas vezes por ser penalizado ou prejudicado por práticas lesivas advindas de seus empregados.

Nesse sentido, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) em seusarts. 2º e 3º trazem os conceitos de empregador e empregado, in verbis:

Art. 2º. Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.

Art. 3º. Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.

Além das características dos sujeitos da relação citados acima, para que uma relação seja assim classificada faz-se necessário a presença de alguns elementos, imprescindíveis para caracterizar uma relação de trabalho. São Eles:

  • : O contrato de trabalho é constituído intuito personae, havendo a sua descaracterização quando se percebe a possibilidade de um trabalhador se fazer substituir por outro, independentemente da manifestação da outra parte.
  • : O contrato de trabalho subordinado, com certeza não é gratuito, fazendo-se necessária uma contraprestação pelo trabalho desenvolvido.

Permanência ou Não-eventualidade: Faz-se necessário uma periodicidade quanto ao exercício da atividade laboral, para que se caracterize o vinculo trabalhista.

  • Trata-se do estado como o empregado se coloca frente ao seu empregador, que por força do contrato individual, põe sua energia à disposição da empresa, para a execução dos serviços necessários aos seus fins.

3.2EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR.

Primeiramente, faz-se necessário salientar que a adoção da responsabilidade civil objetiva não se deu de forma instantânea e imediata, sendo resultado de uma lenta evolução.Segundo Sérgio Cavalieri Filho:

Não foi rápida, nem fácil, entretanto, essa passagem da responsabilidade subjetiva para a objetiva. Primeiramente, os tribunais começaram a ad­mitir uma maior facilidade na prova da culpa, extraindo-a, por vezes, das próprias circunstâncias em que se dava o acidente e dos antecedentes pessoais dos participantes. Evoluiu-se, depois, para a admissão da culpa presumida, na qual, como já visto, há a inversão do ônus da prova. Sem se abandonar a teoria da culpa, consegue-se, por meio de uma presunção, um efeito próximo ao da teoria objetiva, onde o causador do dano, até prova em contrário, presume-se culpado, cabendo-lhe elidir essa presunção, isto é, provar que não tem culpa, o que, sem dúvidas, favorece sobremaneira a posição da vítima. Passou-se, ainda, pela fase em que se ampliou o número de casos de responsabilidade contratual, até que, finalmente, chegou-se à admissão da responsabilidade sem culpa em determinados casos. Provados o dano e o nexo causal, bem como o ônus da vítima, insurgi o dever de reparar, independentemente de culpa. Só se eximindo o causador do dano, se provar qualquer das causas de exclusão do nexo causal, não cabendo qualquer discussão em torno da culpa (CAVALIERI FILHO. 2009).

Nos primórdios observava-se uma verdadeira “irresponsabilidade patronal” substituída posteriormente pela responsabilidade apenas quando restasse configurado o dolo, que mais tarde foi substituído pela culpa grave e após o advento da Constituição de 1988, o empregador passou a ser responsabilizado por qualquer grau de culpa.

Atualmente, nas indenizações por acidente do trabalho, faz-se necessário analisar a aplicabilidade do art. 927 do Código Civil. O parágrafo único do dispositivo em estudo é taxativo ao mencionar a obrigação de reparação do dano, independentemente de culpa, nos casos fixados em lei, ou mesmo quando a atividade desenvolvida pelo autor do dano implicar por natureza, pela própria peculiaridade da atividade, risco para os direitos de outrem.

Art. 927, §único do Código Civil de 2002: Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, riscos para os direitos de outrem.

 Podem ser citados ainda os artigos 186 e 187 do mesmo instituto normativo, que trazem respectivamente a definição de Ato Ilícito e a determinação da ilicitude do ato cometido pelo titular de um direito.

Art. 186: Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 187: Também Comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Partindo da análise de tais institutos, percebe-se que o interesse jurídico desloca-se no sentido da responsabilidade objetiva de forma a ter maior abrangência no campo social, mantendo seu foco maior na vítima, deixando de se ater aos danos propriamente ditos, redirecionando sua visão para os danos sofridos.

Tais dispositivos exerceram uma importante reação nos doutrinadores brasileiros, que a partir daí passaram a buscar novas Teorias que pudessem esclarecer como se dava a responsabilização do Trabalhador frente aos danos sofridos por seus empregados, destinando uma maior proteção à parte hipossuficiente da relação, materializando o que enuncia o princípio da isonomia, tratando desigualmente os desiguais, surgindo assim a Teoria do Risco.

3.3TEORIA DO RISCO

Para se entender a chamada Teoria do Risco, primeiro Faz-se necessário definir o que vem a ser uma “atividade de risco”, sendo aquelas atividades que a lei assim considerar, bem como aquelas que revelem periculosidade intrínseca ou relativa aos meios e trabalho empregados.

Para melhor entendimento, analisemos o que diz o enunciado 38 da Primeira Jornada de Direito Civil:

A responsabilidade fundada no risco da atividade, como prevista na segunda parte do parágrafo único do art. 927 do novo Código Civil, configura-se quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano causar a pessoa determinada um ônus maior do que aos demais membros da coletividade (Enunciado aprovado na I Jornada de Direito Civil, promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal).

Portanto, se a exposição do empregado ocorrer em condições acima do risco médio permitido à coletividade, em geral é cabível a indenização com base na responsabilidade fundada no risco da atividade, independentemente de culpa.

Segundo Eugênio Facchini Neto (p.177), “A teoria do risco surge frente ao impasse condenar uma pessoa não culpada a reparar os danos cau­sados por sua atividade ou deixar-se a vítima, ela também sem culpa, sem indenização”, tendo como fundamento a responsabilidade decorrente da atividade que, por sua natureza, gera um risco a outrem, entendimento esse que já vem se consolidando na jurisprudência nacional, segundo o qual, aquele que aufere um bônus também deve ser responsabilizado pelos ônus decorrentes de tal atividade.

RECURSO ORDINÁRIO. ACIDENTE DERABALHO. TEORIA DO RISCOCRIADO. ATIVIDADE DESEMPENHADA QUE GERA RISCO. INDENIZAÇÃO DEVIDA. Não é somente a quebra do dever de vigilância (conduta pessoal, subjetiva) que autoriza a condenação reparadora, mas o simples exercício continuado deatividade que, em si mesma, é potencialmente prejudicial ou perigosa é capaz de ensejar a obrigação de indenizar (teoria do risco criado). Sendo comprovado que a lesão sofrida se articula com o risco da atividade desempenhada pelo empregado, devida a indenização decorrente de acidente do trabalho. TRT-1 - Recurso Ordinário RO 00016695720105010205 RJ (TRT-1)Data de publicação: 02/02/2015.

                                  

A partir de tal teoria, surgiram várias “ramificações”, que buscaram descentralizar e ao mesmo tempo expandir o campo de estudo e aplicação sobre o risco que algumas atividades vêm a desempenhar, das quais se destacam o risco-proveito, risco criado, risco profissional e o risco integral.

Segundo Sérgio Cavalieri filho:

Aidéia de risco-proveito, que surgiu na França, concebeu a teoria do risco tendo em vista a especial situação da responsabilização do empregador, em casos de acidentes de trabalho envolvendo seus empregados.Nesse sentido, responsável é aquele que tira proveito da atividade danosa. Contudo, a grande dificuldade estava em provar a obtenção de tal proveito, por isso tal teoria mostrou-se insuficiente (CAVALIEIRI FILHO.2010)

Surgiu então, a teoria do risco criado, a qual estende a aplicação do risco-proveito aos demais ramos do Direito. Aparece como uma“evolução” da teoria do risco proveito. Enquanto esta última responsabiliza o autor do fato que o desencadeia com o objetivo de obter um proveito econômico, a primeira torna desnecessária a prova de que o autor obtenha de fato vantagens econômicas da atividade geradora do dano, uma vez que o risco incidirá em todas as atividades desenvolvidas pelo agente, tenha proveito econômico ou não.

Como preceitua Eugênio Facchini Neto:

 A responsabilidade não é mais a contrapartida de um proveito ou lucro particular, mas sim a conseqüênciainafastável da atividade em geral. A idéia do risco perde seu aspecto econômico, profissional. Sua aplicação não mais supõe uma atividade empresarial, a exploração de uma indús­tria ou de um comércio, ligando-se, pelo contrário, a qualquer ato do homem que seja potencialmente danoso à esfera jurídica dos seus semelhantes. Concretizando-se tal potencialidade, surgiria a obrigação de indenizar( FACCHINI NETO).

Complementa o magistrado José Acir Lessa Giordani ao discorrer sobre a respectiva norma civilista

O dispositivo em apreço dispõe que a responsabilidade será objetiva quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitosde outrem. Verificamos, como já foi dito, que o preceito consagra a teoria do risco criado. Assim, toda atividade desenvolvida que, por sua natureza, produza um risco para terceiros ensejará o dever de reparar os danos causados sem que haja necessidade de comprovação de culpa do autor do fato. Esta atividade pode ser de cunho profissional, recreativa, de mero lazer, não havendo, assim, necessidade de que resulte em lucro ou vantagem econômica para o agente para que haja caracterização de sua responsabilidade objetiva. Não se trata, desta forma, do risco proveito, mas sim do risco criado (GIORDANI.p.90)

A teoria do risco profissional, em seu turno, dispõe que o dever de indenizar existe quando o dano é decorrente da atividade profissional do lesado. De acordo com Dallegrave Neto (2010), “é mais ampla que a teoria do risco criado, pois se estende aos empregadores de todas as atividades laborais, e não apenas aos de atividades perigosas”.

Cabe destacar, que o fundamento de tal teoria é o dano ocasionado no desempenho de alguma atividade laborativa ou profissão, concebida para abranger os casos de acidentes de trabalho onde o empregador não agiu culposamente.

Sérgio Cavalieri afirma que

A desigualdade econômica, a força de pressão do empregador, a dificuldade do empregador de produzir provas, sem se falar nos casos em que o acidente decorria das próprias condições físicas do trabalhador, quer pela sua exaustão, quer pela monotonia da atividade, tudo isso acabava por dar lugar a um grande número de acidentes não indenizados, de sorte que a teoria do risco profissional veio para agastar esses inconvenientes (CAVALIERI. 2010. p.143).

Por fim, como preceitua Monique Bertotti (ano 3), “a teoria do risco-integral prega a indenização mesmo nos casos de inexistência do nexo causal, quais sejam, culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro e caso fortuito ou força maior”.

Tal teoria, não admite excludentes de responsabilidade, pois apenas requer a ocorrência de resultado prejudicial ao homem e ao ambiente advinda de uma ação ou omissão do responsável para ser caracterizada.

Como exemplo da incidência de tal teoria cita-se a responsabilidade civil por danos ambientais, que de acordo com o STJ:

Seja por lesão ao meio ambiente propriamente dito (dano ambiental público), seja por ofensa a direitos individuais (dano ambiental privado), é objetiva a responsabilidade, fundada na teoria do risco integral, em face do disposto no art. 14, § 1º, da Lei 6.938/1981. (Política Nacional do Meio Ambiente).

O que legitima o Ministério Público da União e dos Estados a propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.

3.4 POSSIBILIDADE DE AÇÃO REGRESSIVA CONTRA O EMPREGADO.

Muito já se falou sobre a responsabilidade do empregador enquanto beneficiado da atividade laboral exercida e, portanto, responsável por eventuais danos e prejuízos dela decorrente, mas faz-se necessário tratar da possibilidade de que tem o empregador de reaver o que lhe foi onerado, frente ao real causador do dano.

O chamado Direito de Regresso, previsto no Código Civil em seu art.934, diz que “aquele que ressarcir o dano causado por outrem pode reaver o que houver pago daquele por quem pagou (...)”.

O direito de regresso pode ser exercido de duas formas pelo empregador. Primeiramente por meio da denunciação à lide, que nada mais é do que uma ação independente no curso da ação principal, mas que será julgada na mesma sentença.

Muito embora tal possibilidade possa trazer benefícios, também existem alguns empecilhos, como preceitua Vânia Aleixo Pereira:

O único problema, apesar de a sentença já poder de antemão condenar o verdadeiro culpado, é que tal instituto raramente é aceito na seara trabalhista. Ou porque prejudica a celeridade do processo judicial, ou porque não seria possível que o empregado ofensor figurasse no processo como co-responsável, no pólo passivo, pois a competência da Justiça do Trabalho, segundo o artigo 114, I, da Constituição Federal, é para apreciar litígios envolvendo relação de trabalho, o que não existiria entre o ofensor e o ofendido (Disponível em: http://www.conjur.com.br/2006-nov-28/empregador_cobrar_empregado_ato_ilicito. Acesso em 17/05/15)

                                                                                                                                                                                

Segunda possibilidade totalmente cabível é a Ação regressiva, instituto esse que diferente da denunciação à lide, deve aguardar a resolução da primeira demanda, para que o empregador então tente reaver o que lhe foi onerado, frente o Poder Judiciário Trabalhista contra o empregado causador do dano.

Ainda segundo Vânia Aleixo Pereira “tal alternativa (Ação Regressiva), ainda é pouco usada pelas empresas privadas, mesmo existindo no âmbito do poder público há algum tempo.” (Disponível em: http://www.conjur.com.br/2006-nov-28/empregador_cobrar_empregado_ato_ilicito. Acesso em 17/05/15).

Segundo o parágrafo 2º, do artigo 122, da Lei 8.112/90, o servidor público está sujeito à responsabilização civil por ato omissivo ou comissivo, doloso ou culposo, praticado no exercício do cargo/funções, de que resulte dano à Fazenda Pública ou a terceiros, por meio de Ação Regressiva.

3.5 POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE SEGURO PREVIDENCIARIO OBRIGATÓRIO E A INDENIZAÇÃO CIVIL.

Anteriormente, a indenização acidentaria em decorrência de contrato de trabalho ficava a cargo do empregador, devendo mantê-la segura como garantia em caso de algum infortúnio.

Atualmente, segundo Carlos Roberto Gonçalves:

Com a integração do seguro acidentário na Previdência Social, alteraram-se as formas de indenização, não havendo mais o pagamento de uma indenização fixa, mas a adoção de novos critérios para a compensação previdenciária específica do trabalhador pelo dano sofrido em razão do infortúnio. A ação, agora, é ajuizada contra o órgão previdenciário que detém o monopólio do seguro de acidentes (GONÇALVES.2013).

A indenização decorrente de acidente do trabalho tem seu fulcro na responsabilidade civil de natureza subjetiva, ou seja, depende da comprovação de dolo ou culpa do empregador, sendo assim independe dos benefícios concedidos pela legislação do seguro de acidente do trabalho, que não tem natureza jurídica nem conteúdo de seguro propriamente dito.

Para obter os direitos acidentários cobertos pelo seguro da Previdência Social, basta que se comprove o nexo causal do acidente com o trabalho do segurado, no entanto, para conseguir a reparação do direito comum (responsabilidade civil) é imprescindível que se comprove, além do nexo causal, a culpa ou dolo do empregador.

A atual legislação securitária garante ao lesado apenas o mínimo para sua subsistência, disponibilizando prestações periódicas, que nem de longe tem o propósito de assegurar a reparação dos danos sofridos, o que possibilita o pleito cumulativo da indenização civil.

Os tribunais já vêm se posicionando a esse respeito, senão vejamos:

ACIDENTE DO TRABALHO. INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE. CONFIGURAÇÃO. MATÉRIA FÁTICA. PENSÃO MENSAL VITALÍCIA.CUMULAÇÃO COM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.1.É insuscetível de revisão, em sede extraordinária, a decisão proferida pelo Tribunal Regional à luz da prova carreada aos autos. Somente com o revolvimento do substrato fático-probatório dos autos seria possível afastar a premissa sobre a qual se erigiu a conclusão consagrada pela Corte de origem, no sentido de que resultou comprovada, por meio de perícia, a incapacidade definitiva e total do obreiro para o trabalho. Incidência da Súmula n.º 126 do Tribunal Superior do Trabalho 2. Não há óbice para que o empregado receba concomitantemente a pensão mensal e o benefício previdenciário, em virtude de tais prestações não possuírem a mesma natureza jurídica e derivarem de relações jurídicas distintas. Precedentes. 3. Recurso de revista de que não se conhece. DANOS MORAIS. FIXAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. JURISPRUDÊNCIA INSERVÍVEL. Não se prestam à demonstração de dissenso jurisprudencial arestos inespecíficos, consoante disposto na Súmula n.º 296, I, do Tribunal Superior do Trabalho. Recurso de revista não conhecido. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. JUROS DA MORA. SÚMULA N.º 439 DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. A jurisprudência deste Tribunal Superior do Trabalho firmou o entendimento no sentido de que o termo inicial para a incidência dos juros da mora ocorre na data do ajuizamento da reclamação trabalhista, nos termos do artigo 883 da Consolidação das Leis do Trabalho . Súmula n.º 439 deste Tribunal Superior. Recurso de revista não conhecido. TST - RECURSO DE REVISTA : RR 1014004820075030052, Data de publicação: 12/12/2014.  TST- 1ª Turma.

Trata-se, portanto, de indenizações de origens absolutamente distintas, o que possibilita a sua aplicação cumulativa, uma vez que a natureza do seguro de acidente do trabalho é diferente daquelas inerentes aos seguros em geral. Logo, não há que se falar em bis in idem uma vez que os benefícios acidentários são pagos em razão dos riscos normais da atividade laboral desenvolvida, enquanto que a indenização prevista no art. 7º, XXVIII, da CF/88, decorre de um dano em que o trabalhador tenha participado com dolo ou culpa.

3.6 EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA

Na teoria do risco, as causas de exclusão da responsabilidade civil objetiva devem ser apreciadas em função do nexo de causalidade, não podendo, assim, ensejar qualquer responsabilidade o dano emergente de conduta da própria vítima (fato da vítima). Não por se tratar de “culpa exclusiva da vítima”, já que a incidência da responsabilidade civil objetiva independe da idéia de culpabilidade, mas pelo fato de não existir qualquer nexo de causalidade entre o risco criado pela atividade desenvolvida e o dano ocorrido.

Damesma forma, o causador do dano deverá ser responsabilizado ainda que tenha decorrido de caso fortuito (fortuito interno), ou seja, daquele relacionado aos riscos da atividade, cabendo a exclusão apenas nas hipóteses de força maior (fortuito externo), isto é, quando o fato advier de acontecimento estranho à atividade desempenhada.

Portanto, em caso de adoçãoda teoria da responsabilidade objetiva pelo risco criado, nos casos de danos decorrentes de acidentes de trabalho, as excludentes de responsabilidade limitar-se-ão às seguintes hipóteses: quando da ocorrência do chamado “fato da vítima” (onde inexiste nexo de causalidade entre o risco criado e o dano, posto que este ocorreu em decorrência da conduta da própria vítima), ou no caso de “fortuito externo” (quando o dano ocorreu em razão de acontecimento totalmente alheio à atividade desempenhada pelo empregador).

Como preceitua Carlos Roberto Gonçalves:

Somente a ausência total de culpa do patrão (em hipóteses de caso fortuito e força maior, ou de culpa exclusiva da vítima ou de terceiro) é que o isentará da responsabilidade civil concomitante à reparação previdenciária (GONÇALVES.2013.p.314).

Tornando cada vez mais difícil as hipóteses em que o empregador se escusará do dever de indenizar o empregado, o que resulta em uma maior proteção ao indivíduo lesado.

3.7CONFLITO DE NORMAS

Em meio a estudos quanto à responsabilidade civil, percebeu-se um potencial conflito entre dispositivos distintos da legislação pátria, qual seja a CF/88 e o CC/ 2002.

A CF/88, em seu art. 7º XXVIII, qualifica como um direito do empregador o seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quanto incorrer em dolo ou culpa.

Já o Código Civil, em seu art. 927 § único, diz que a obrigação de reparar o dano independe de culpa, nos casos especificados em lei, bem como quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco aos direitos de outrem.

Entendemos ser o dispositivo civil o mais adequado para disciplinar a relação trabalhista, pois não se pode esquecer que o principio da proteção, principio este norteador do Direito Trabalhista, traz como sub-princípio a aplicação da norma mais favorável ao trabalhador, ainda que hierarquicamente inferior, como é o caso.

E é nesse sentido o entendimento a que chegou a Primeira Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho, que no enunciado 37 diz que:

37. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA NO ACIDENTE DE TRABALHO. ATIVIDADE DE RISCO. Aplica-se o art. 927, parágrafo único, do Código Civil nos acidentes do trabalho. O art. 7º, XXVIII, da Constituição da República, não constitui óbice à aplicação desse dispositivo legal, visto que seu caput garante a inclusão de outros direitos que visem à melhoria da condição social dos trabalhadores.

3.8COMPETÊNCIA.

A responsabilidade civil sempre instigou a doutrina em vários de seus aspectos, ganhando relevância na seara trabalhista a partir da mudança de posicionamento da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no tocante à competência para julgamento das demandas que vislumbram pretensão de pagamento de indenização por danos decorrentes de acidente de trabalho.

A Suprema Corte, através da Súmula nº 736, fincava seu posicionamento pela competência da Justiça do Trabalho para julgar tais ações que tenham como causa de pedir o descumprimento de normas trabalhistas relativas à segurança, higiene e saúde dos trabalhadores.

No entanto, o Supremo Tribunal Federal, numa primeira interpretação do inciso I do artigo 109 do Texto Constitucional, vinha entendendo que as ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente de trabalho, ainda que movidas pelo empregado em face de seus ex-empregadores, seriam da competência da Justiça Comum Estadual.

Atualmente, embora controvérsias marquem o debate,o entendimentodo Supremo Tribunal Federal, é no sentido de que a Justiça do Trabalho é a competente para apreciar e julgar as ações que envolvam o pedido de pagamento de indenização por danos morais e materiais em decorrência de acidente de trabalho, como bem preceitua de forma clara e precisa a Constituição Federal de 1988, em seu art. 114, VICompete à Justiça do Trabalho processar e julgar: VI. As ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho”.

4. CONCLUSÃO

O estudo da responsabilidade civil mostra-se extremamente necessário a fim de dirimir conflitos e responsabilizar aquele que apresenta melhores condições para arcar com eventuais danos decorrentes do exercício de determinada atividade laboral.

A responsabilização objetiva do empregador frente ao seu empregado, parte hipossuficiente da relação, apresenta-se como um pilar de segurança e igualdade, materializando tal principio ao tratar desigualmente os desiguais, dando ao mais fraco a oportunidade de estar em paridade de direitos com o que domina a relação.

A área trabalhista é ampla em casos em que se aplica a responsabilidade objetiva, tais como os acidentes de trabalho, os abusos do poder diretivo e os atos de empregados, serviçais ou prepostos. No que tange aos acidentes de trabalho, muito já se evoluiu, ao se adotar a teoria do risco-criado, segundo a qual quem cria o risco deve arcar com suas conseqüências. Porém, não há que se falar em acomodação, na medida em que o ideal seria o empregador responder sempre que não se caracterizasse nenhuma das excludentes de ilicitude, a saber, culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro, caso fortuito ou força maior.

A teoria do risco, que torna objetiva a responsabilidade do empregador, passou a ser aplicada pelo fato de a prova da culpa a cargo do empregado tornar extremamente desigual a relação, fazendo com que muitas vezes o mesmo viesse a sucumbir frente aos interesses do empregador, tornando necessária uma melhor interpretação e aplicação dos diplomas legais, surgindo assim novos dispositivos que de forma expressa inverteram o dever de prova, tornando empregadores responsáveis independente de se questionar culpa.

Ressalta-se, no entanto, que deve haver muito cuidado ao se estudar a responsabilidade objetiva do empregador, pois seguindo tal entendimento o empregado se escusa apenas de comprovar o dolo ou a culpa do empregador, não se eximindo, no entanto, de comprovar a existência do dano, bem como o nexo de causalidade existente, sendo o seu objetivo apenas facilitar a prova daquele que apresenta maior fragilidade na relação.

  1. REFERÊNCIAS

BERTOTTI, Monique. A responsabilidade civil objetiva no âmbito trabalhista. Revista Fórum Trabalhista – RFT, Belo Horizonte, ano 3, n. 11, p. 109-124, mar./abr. 2014.

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 8. ed. 3. reimpr. São Paulo: Atlas, 2009.

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 9. Ed. São Paulo: Atlas, 2010.

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Disponível em http://www.conjur.com.br/2006-nov-28/empregador_cobrar_empregado_ato_ilicito.  Acesso em 17/05/15.

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Enunciado aprovado na I Jornada de Direito Civil, promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, no período de 11 a 13 de setembro de 2002.

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