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POSSE DE ARMA DE FOGO COM REGISTRO VENCIDO NÃO CONFIGURA CRIME

POSSE DE ARMA DE FOGO COM REGISTRO VENCIDO NÃO CONFIGURA CRIME

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O ARTIGO FAZ ABORDAGEM COM RELAÇÃO A DECISÃO RECENTE DO STJ NA MATÉRIA.

POSSE DE ARMA DE FOGO COM REGISTRO VENCIDO NÃO CONFIGURA CRIME

ROGÉRIO TADEU ROMANO

Procurador Regional da República aposentado

Em recente julgamento, nos autos do HC 294.078/SP, em modificação de entendimento anterior, o Superior Tribunal de Justiça entendeu, em caso de posse de arma de fogo de uso permitido com o registro vencido, que há atipicidade material da conduta.

Era caso de não aplicação do artigo 12 da Lei 10.826/03, envolvendo crime de posse de arma.

Tem-se da leitura da norma: “Possuir ou manter sob sua guarda arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, em desacordo com determinação legal ou regulamentar, no interior de sua residência ou dependência desta, ou, ainda no seu local de trabalho, desde que seja o titular ou o responsável legal do estabelecimento ou empresa” estará incidindo no crime de posse irregular de arma de fogo de uso permitido.

O caso envolvia a posse de um revólver Taurus, calibre 38, número QK 591720, além de dezoito cartuchos de munição do mesmo calibre.


Assim entendeu-se:

“Todavia, no caso, a questão não pode extrapolar a esfera administrativa, uma vez que ausente a imprescindível tipicidade material, pois, constatado que o paciente detinha o devido registro da arma de fogo de uso permitido encontrada em sua residência – de forma que o Poder Público tinha completo conhecimento da posse do artefato em questão, podendo rastreá-lo se necessário –, inexiste ofensividade na conduta. A mera inobservância da exigência de recadastramento periódico não pode conduzir à estigmatizadora e automática incriminação penal. Cabe ao Estado apreender a arma e aplicar a punição administrativa pertinente, não estando em consonância com o Direito Penal moderno deflagrar uma ação penal para a imposição de pena tão somente porque o indivíduo – devidamente autorizado a possuir a arma pelo Poder Público, diga-se de passagem – deixou de ir de tempos em tempos efetuar o recadastramento do artefato. Portanto, até mesmo por questões de política criminal, não há como submeter o paciente às agruras de uma condenação penal por uma conduta que não apresentou nenhuma lesividade relevante aos bens jurídicos tutelados pela Lei n. 10.826/2003, não incrementou o risco e pode ser resolvida na via administrativa.”

O art. 3º Estatuto  determina  à obrigatoriedade do registro de arma de fogo no órgão competente – Sistema Nacional de Armas (SINARM – Polícia Federal). Já o artigo seguinte (Art. 4º), apresenta um rol de requisitos para aquisição de arma de fogo de calibre permitido, sendo eles: declaração de efetiva necessidade; idade superior a 25 anos; ocupação lícita; residência certa; comprovação de capacidade técnica e psicológica e comprovação de idoneidade, com a apresentação de diversas certidões negativas.

Por sua vez, com base nos artigos 5º, §3º, e artigo 30 da Lei 10.826/03, foi dada a possibilidade aos possuidores de arma de fogo, promover seu recadastramento ou registro inicial junto à Polícia Federal. Uma vez preenchidos os requisitos os possuidores e proprietários de armas de fogo ficam autorizados a possuí-las e mantê-las sob seus cuidados.

Ainda o referido Estatuto remete à obrigatoriedade do registro de arma de fogo no órgão competente até 31 de dezembro de 2008, com a prorrogação estabelecida no artigo 20 da Lei 11.922/09, estendendo o prazo até 31 de dezembro de 2009.

Mas encerrado o prazo, todas as armas passaram a exigir a renovação de seus registros a cada 3 anos(artigo 5º, § 2º, da Lei 10.826/03) adquirindo o tipo penal eficácia jurídica.

O registro pode ser renovado, sucessivas vezes, desde que o proprietário e possuidor da arma de fogo comprove  novamente os requisitos já mencionados.

O novo entendimento do Superior Tribunal de Jusitça, contudo, estabeleceu nítida distinção entre a posse intencionalmente irregular e aquela decorrente da mera inobservância de um procedimento burocrático. Conforme entenderam os ministros do STJ, se uma arma foi originalmente registrada, a ausência de renovação do respectivo registro “não pode extrapolar a esfera administrativa”, não se prestando, portanto, à configuração de crime, uma vez que, para o Direito Penal, a mera falta daquela renovação não apresenta relevância capaz de automaticamente transformar o proprietário da arma em criminoso. Com isso, a ele podem ser aplicadas, tão somente, sanções de âmbito administrativo, mas não penais.

O Ministro Relator Marco Aurélio Belizze, compreendeu que por mais que a arma de fogo esteja irregular, em razão do vencimento do seu registro, não caberia qualquer sanção criminal, por ser materialmente atípica a conduta do agente, sendo passível apenas de sanção administrativa. Acrescentou, ainda, que “a mera inobservância da exigência de recadastramento periódico não pode conduzir à estigmatizadora e automática incriminação penal”.


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