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Revalidação de títulos de pós-graduação obtidos em universidades estrangeiras

Revalidação de títulos de pós-graduação obtidos em universidades estrangeiras

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Agora, quando muitos professores e diversos outros profissionais concluíram cursos de pós-graduação em universidades estrangeiras, sobrevém a necessidade de conhecer que processo devem adotar para a regularização dos seus títulos e, assim, poderem usufruir integralmente, no Brasil, das prerrogativas por eles conferidas.

INTRODUÇÃO

A Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 [1], nos arts. 52, I e 87, § 2º, determina que as universidades deveriam ter pelo menos um terço do seu corpo docente com titulação acadêmica de mestrado ou doutorado em até oito anos desde a edição dessa lei. Esse prazo expirou em 23 de dezembro de 2004, considerando-se que a publicação da referida lei deu-se no Diário Oficial de 23 de dezembro de 1996. A mencionada exigência legal rendeu ensejo a uma grande demanda por cursos de pós-graduação stricto sensu, para a qual, entretanto, o Brasil não estava preparado, considerando-se o reduzido número de professores com titulação de mestre ou doutor e, conseqüentemente, os poucos cursos de mestrado e doutorado disponíveis.

Aos problemas da reduzida quantidade de cursos e da grande concorrência pelas poucas vagas disponíveis, somou-se o fato de que, em geral, os cursos existentes seguiam padrões metodológicos conservadores, não admitindo a adoção de calendário escolar nem de horários de aulas adaptados para atender as possibilidades dos interessados, já que, no Brasil, são raros os profissionais que têm condições financeiras de suspender suas atividades laborais para se dedicar com exclusividade aos estudos, sendo também raras e de ínfimos valores as bolsas de estudos disponibilizadas. Só recentemente sobrevieram cursos diferenciados, adaptados aos padrões da demanda nacional, tais como aqueles que possibilitam o "pagamento" de módulos de disciplinas mediante a assistência de aulas em períodos concentrados, como também os cursos interinstitucionais, em que os professores da universidade que oferece o curso ministram as aulas na própria sede da instituição que demanda pelo curso. Ainda assim, os cursos são insuficientes para atender à crescente demanda existente.

Em países de educação mais avançada, entretanto, além de muitos cursos, as universidades também já dispunham, há muito, de possibilidades de proporcionar calendários e aulas em condições semelhantes às dos nossos atuais cursos modulares e interinstitucionais. Com isso, muitos profissionais brasileiros passaram a optar por cursarem mestrado e doutorado em universidades estrangeiras, principalmente universidades dos Estados Unidos, da Espanha, de Portugal, da Argentina e do Chile. Ao mesmo tempo, várias universidades do Brasil firmaram, com universidades estrangeiras, convênios voltados para oferecer cursos adaptados ao perfil dos profissionais brasileiros.

Agora, quando muitos professores e diversos outros profissionais concluíram ou estão concluindo cursos de pós-graduação em universidades estrangeiras, sobrevém a necessidade de conhecer que processo devem adotar para a regularização dos seus títulos e, assim, poderem usufruir integralmente, no Brasil, das prerrogativas por eles conferidas. Neste artigo, além da formulação de algumas críticas, pretende-se, principalmente, fornecer subsídios informativos para auxiliar aqueles que desejam regularizar títulos estrangeiros de pós-graduação.


ÓRGÃOS E INSTITUIÇÕES QUE DISCIPLINAM OU OPINAM SOBRE A EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL

Para que se tenha alguma segurança ao se discutir temas inerentes à matéria da educação superior no Brasil, é importante, primeiramente, saber quais são os órgãos ou instituições que têm o poder de editar normas sobre essa matéria ou de influenciar na sua elaboração, através do fornecimento de dados ou mediante a emissão de pareceres, bem assim, compreender os limites das atribuições de cada um.

A atual LDB respeita a autonomia administrativa dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios para organizarem os respectivos sistemas de ensino, mas, reserva para a União a coordenação da política nacional de educação, através da função normativa, redistributiva e supletiva em relação às demais instâncias educacionais (art. 8º, § 1º).

Entre as funções normativas da União se insere a de "baixar as normas gerais sobre cursos de graduação e pós-graduação" (art. 9º, VII, da vigente LDB). Para esse mister, esta lei, no § 1º do seu art. 8º, prevê a existência, no âmbito do Ministério da Educação, de um Conselho Nacional de Educação - CNE, "(...) com funções normativas e de supervisão e atividade permanente, criado por lei". Esse Conselho já havia sido instituído pelo § 1º do art. 6º, de LDB anterior, ou seja, a Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961 [2]. De acordo com o art. 7º desta última lei, o CNE é composto pelas Câmaras de Educação Básica - CEB e de Educação Superior - CES e tem atribuições normativas, deliberativas e de assessoramento ao Ministro de Estado da Educação, de forma a assegurar a participação da sociedade no aperfeiçoamento da educação nacional. Conforme o art. 9º da mesma lei, as Câmaras emitirão pareceres e decidirão, privativa e autonomamente, os assuntos a elas pertinentes, cabendo, quando for o caso, recurso ao Conselho Pleno.

Segundo o § 1º do art. 7º, ainda da Lei nº 4.024/1961, compete ao CNE, além de outras atribuições que lhe forem conferidas por lei: a) subsidiar a elaboração e acompanhar a execução do Plano Nacional de Educação; b) manifestar-se sobre questões que abranjam mais de um nível ou modalidade de ensino; c) assessorar o Ministério da Educação e do Desporto no diagnóstico dos problemas e deliberar sobre medidas para aperfeiçoar os sistemas de ensino, especialmente no que diz respeito à integração dos seus diferentes níveis e modalidades; d) emitir parecer sobre assuntos da área educacional, por iniciativa de seus conselheiros ou quando solicitado pelo Ministro de Estado da Educação e do Desporto; e) manter intercâmbio com os sistemas de ensino dos Estados e do Distrito Federal; f) analisar e emitir parecer sobre questões relativas à aplicação da legislação educacional, no que diz respeito à integração entre os diferentes níveis e modalidades de ensino; g) elaborar o seu regimento, a ser aprovado pelo Ministro de Estado da Educação e do Desporto.

Por fim, o § 2º do art. 9º, da mesma Lei nº 4.024/1961, estabelece que são atribuições da CES: a) analisar e emitir parecer sobre os resultados dos processos de avaliação da educação superior; b) oferecer sugestões para a elaboração do Plano Nacional de Educação e acompanhar sua execução, no âmbito de sua atuação; c) deliberar sobre as diretrizes curriculares propostas pelo Ministério da Educação e do Desporto, para os cursos de graduação; d) deliberar sobre os relatórios encaminhados pelo Ministério da Educação e do Desporto sobre o reconhecimento de cursos e habilitações oferecidos por instituições de ensino superior, assim como sobre autorização prévia daqueles oferecidos por instituições não universitárias; e) deliberar sobre a autorização, o credenciamento e o recredenciamento periódico de instituições de educação superior, inclusive de universidades, com base em relatórios e avaliações apresentados pelo Ministério da Educação; f) deliberar sobre os estatutos das universidades e o regimento das demais instituições de educação superior que fazem parte do sistema federal de ensino; g) deliberar sobre os relatórios para reconhecimento periódico de cursos de mestrado e doutorado, elaborados pelo Ministério da Educação e do Desporto, com base na avaliação dos cursos; h) analisar questões relativas à aplicação da legislação referente à educação superior; e i) assessorar o Ministro de Estado da Educação nos assuntos relativos à educação superior.

Além do CNE, também já funcionava, antes mesmo da edição da atual LDB, a Fundação Coordenação Nacional de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES, a qual tem, basicamente, a função de velar pela qualidade do ensino superior, em especial no nível de pós-graduação. Conquanto não tenha função normativa própria, a CAPES é quem dita praticamente todas as medidas a serem adotadas pelo CNE na área da educação superior, sendo que o CNE as adota através de pareceres aprovados pelo Ministro da Educação ou por meio de resoluções que têm como base pareceres aprovados pela referida autoridade. Vinculada ao Ministério da Educação e com sede e foro em Brasília-DF, essa Fundação Pública teve sua criação autorizada pela Lei nº 8.405, de 9 de janeiro de 1992, e foi instituída através do art. 1º do Decreto nº 524, de 19 de maio de 1992, tendo prazo de duração indeterminado e sendo regida por estatuto próprio, que trata da sua estrutura, funcionamento e atribuições, entre outros assuntos.

O vigente estatuto da CAPES foi veiculado como anexo I ao Decreto nº 4.631, de 21 de março de 2003, o qual, no art. 2º, reza que "a CAPES tem por finalidade subsidiar o Ministério da Educação na formulação de políticas para a área de pós-graduação, coordenar e avaliar os cursos desse nível no País e estimular, mediante bolsas de estudo, auxílios e outros mecanismos, a formação de recursos humanos altamente qualificados para a docência de grau superior, a pesquisa e o atendimento da demanda dos setores público e privado e, especialmente: I - subsidiar a elaboração do Plano Nacional de Educação e elaborar a proposta do Plano Nacional de Pós-Graduação, em articulação com as unidades da Federação, instituições universitárias e entidades envolvidas; II -coordenar e acompanhar a execução do Plano Nacional de Pós-Graduação; III - elaborar programas de atuação setoriais ou regionais; IV - promover estudos e avaliações necessários ao desenvolvimento e melhoria do ensino de pós-graduação e ao desempenho de suas atividades; V - fomentar estudos e atividades que direta ou indiretamente contribuam para o desenvolvimento e consolidação das instituições de ensino superior; VI - apoiar o processo de desenvolvimento científico e tecnológico nacional; e VII -manter intercâmbio com outros órgãos da Administração Pública do País, com organismos internacionais e com entidades privadas nacionais ou estrangeiras, visando promover a cooperação para o desenvolvimento do ensino de pós-graduação, mediante a celebração de convênios, acordos, contratos e ajustes que forem necessários à consecução de seus objetivos".

Com vistas aos fins mencionados, segundo o art. 3º do seu estatuto, a CAPES "(...) utilizar-se-á de pareceres de consultores científicos, com a finalidade de: I - proceder ao acompanhamento e à avaliação dos programas de pós-graduação; e II - apreciar o mérito das solicitações de bolsas ou auxílios". Reza o Parágrafo único, do citado dispositivo, que a CAPES, no exercício das citadas atribuições, "(...) será assessorada por representantes das diversas áreas do conhecimento, escolhidos dentre profissionais de reconhecida competência, atuantes no ensino de pós-graduação e na pesquisa".

Há na estrutura federal, ainda, o INEP, que hoje significa "Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais" e que, quando da sua criação, pela Lei nº 378, de 13 de janeiro de 1937, era denominado "Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos" [3]. Tinha esse órgão como principal função a pesquisa destinada a orientar a formulação de políticas públicas e atuar na seleção e treinamento do funcionalismo público da União. Em seguida, passou a ser o principal órgão de assessoramento do Ministério da Educação e Saúde. Paralelamente a esta última função, o INEP passou a promover atividades de apoio técnico a órgãos ligados à educação, mantendo cursos de especialização de professores e o intercâmbio com instituições estrangeiras para a troca de experiências na área da educação. Na década de 1950, teve o INEP entre as suas principais tarefas a realização de levantamentos sobre as condições de ensino nas unidades da Federação. Em 1972, o INEP foi transformado em órgão autônomo, passando a ter a atual denominação, acima mencionada, e o objetivo de realizar um levantamento da situação educacional do país, com vistas a subsidiar a reforma do ensino, que viria por meio de uma Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e que se consubstanciaria na Lei nº 5.692, de 1972; bem assim, ajudar na implantação de cursos de pós-graduação. Na década de 80 do século passado, o órgão sofreu reestruturação, tendo sido fortalecida sua capacidade técnica e seus recursos humanos. Nesta fase, suas prioridades foram o fomento a projetos de pesquisa, o suporte às Secretarias do Ministério da Educação - MEC na avaliação da realidade educacional do país e a colaboração na ampliação do processo de disseminação das informações produzidas. Em 1985, o INEP passou por um novo desenho institucional e retirou-se do fomento à pesquisa, para retomar sua função básica de suporte e assessoramento aos centros decisórios do MEC.

O INEP quase chegou a ser extinto no governo do Ex-Presidente Fernando Collor de Mello, mas, superada essa fase, sofreu outro processo de reestruturação e redefinição de sua missão, que passou a ser centrada em dois objetivos: a reorientação das políticas de apoio a pesquisas educacionais e reforço do processo de disseminação de informações educacionais. Foram também atribuídas ao INEP, nessa fase, as responsabilidades técnicas e operacionais para a implantação de um sistema nacional de avaliação da educação básica (SAEB), até então a cargo da Secretaria Nacional de Educação Básica.

Através da Lei nº 9.448, de 14 de março de 1997, art. 1º, o INEP ganhou personalidade jurídica própria, sob a forma jurídica de autarquia federal, bem assim, as seguintes atribuições: I - organizar e manter o sistema de informações e estatísticas educacionais; II - planejar, orientar e coordenar o desenvolvimento de sistemas e projetos de avaliação educacional, visando o estabelecimento de indicadores de desempenho das atividades de ensino no País; III - apoiar os Estados, o Distrito Federal e os Municípios no desenvolvimento de sistemas e projetos de avaliação educacional; IV - desenvolver e implementar, na área educacional, sistemas de informação e documentação que abranjam estatísticas, avaliações educacionais, práticas pedagógicas e de gestão das políticas educacionais; V - subsidiar a formulação de políticas na área de educação, mediante a elaboração de diagnósticos e recomendações decorrentes da avaliação da educação básica e superior; VI - coordenar o processo de avaliação dos cursos de graduação, em conformidade com a legislação vigente; VII - definir e propor parâmetros, critérios e mecanismos para a realização de exames de acesso ao ensino superior; VIII - promover a disseminação de informações sobre avaliação da educação básica e superior; IX - articular-se, em sua área de atuação, com instituições nacionais, estrangeiras e internacionais, mediante ações de cooperação institucional, técnica e financeira bilateral e multilateral.

Todos esses órgãos ou entes autônomos da União mencionados neste artigo, eventualmente, emitem normas ou pelo menos fornecem subsídios de que se vale a União, através do CNE do MEC, para a editar normas gerais a respeito da educação superior. A interferência de um ou de outro ente dependerá da matéria e da circunstância de que se cuide.

Porém, mesmo a despeito da existência desses vários órgãos no âmbito federal, ainda há que se registrar que as próprias universidades, mercê de sua autonomia administrativa e, sobretudo, didático-científica - prevista no art. 207 da Constituição Federal e no art. 54, § 1º, da vigente LDB -, podem editar normas destinadas a complementar, internamente, as normas gerais ditadas pela União, no tema da educação superior.


CRÍTICA ÀS NORMAS VIGENTES SOBRE REVALIDAÇÃO DE TÍTULOS DE PÓS-GRADUAÇÃO LOGRADOS EM UNIVERSIDADES ESTRANGEIRAS

A LDB, no seu art. 48 e respectivos parágrafos, contém regra geral sobre a regularização, para efeito de terem validade no Brasil, dos certificados de graduação e de pós-graduação expedidos por universidades estrangeiras. Cabe assinalar, preambularmente, que no citado artigo da LDB, especificamente no seu §º 2º, ao se reportar ao diploma de curso superior de graduação obtido em universidade estrangeira, o legislador emprega a palavra "revalidados"; e, por sua vez, no § 3º, onde se reporta aos diplomas de cursos superiores de mestrado e doutorado, utiliza a palavra "reconhecidos". Certo, porém, é que apesar do uso dessas duas palavras diferentes, tudo está a indicar que o legislador as empregou como sinônimas entre si, haja vista que a revalidação e o reconhecimento são, em comum, um mesmo processo, ou seja, aquele processo necessário para que se possa obter a validação, no Brasil, de um diploma de nível superior expedido por universidade estrangeira, seja esse diploma de graduação, especialização, mestrado ou doutorado, o qual se consuma, sempre, com o registro do título que haja sido "revalidado" ou "reconhecido". Reforça essa conclusão o fato de que o próprio Conselho Nacional de Educação (do MEC), como também a CAPES e as universidades, ao tratarem dessa matéria nos documentos de sua autoria, e até em normas complementares, têm empregado as palavras "revalidação" e "reconhecimento" como sinônimas [4].

Pois bem, a LDB disciplina, no seu art. 48, o reconhecimento (ou revalidação), no Brasil, dos títulos de graduação e de pós-graduação conferidos por universidades estrangeiras [5]. Segundo o § 3º do art. 48, da vigente LDB, "os diplomas de Mestrado e de Doutorado expedidos por universidades estrangeiras só poderão ser reconhecidos por universidades que possuam cursos de pós-graduação reconhecidos e avaliados, na mesma área de conhecimento e em nível equivalente ou superior".

Pela sua inegável importância entre as estratégias de melhoramento da educação superior no Brasil, o reconhecimento (ou revalidação) de títulos de pós-graduação expedidos por universidades estrangeiras deve ser um processo pautado em critérios claros e objetivos. Porém, lastimavelmente, o legislador da LDB não fixou um único critério que deva ser minimamente respeitado pelas universidades quando do exame dos pedidos de reconhecimento de certificados de pós-graduação estrangeiros. Com essa omissão, o Poder Legislativo deixou uma larga porta aberta para a arbitrariedade e para a interferência de relações pessoais [6] nos processos de reconhecimento de títulos expedidos por universidades estrangeiras.

Tinha-se esperança de que o Poder Executivo, por meio do MEC/CNE/CES, sanasse a citada omissão do Poder Legislativo [7], porém, tal expectativa restou frustrada na resolução CNE/CES nº 1, de 3 de abril de 2001, a qual trata da matéria ora discutida, dentre outros assuntos. Esta resolução, porém, nada acrescentou, pois, praticamente, repete a LDB, estabelecendo, no seu art. 4º, que "os diplomas de conclusão de curso de pós-graduação stricto sensu obtidos em instituições de ensino superior estrangeiras, para terem validade nacional, devem ser reconhecidos e registrados por universidades brasileiras que possuam cursos de pós-graduação reconhecidos e avaliados na mesma área de conhecimento e em nível equivalente ou superior ou em área afim".

As únicas novidades da resolução CNE/CES 01/2001, em relação à LDBO, são as normas constantes dos §§ 1º e 3º do citado art. 4º. O § 1º reza que "a universidade deve pronunciar-se sobre o pedido de reconhecimento no prazo de 6 (seis) meses da data de recepção do mesmo, fazendo o devido registro ou devolvendo a solicitação ao interessado, com a justificativa cabível"; e o § 3º institui a CES do CNE como instância recursal, rezando que, "esgotadas as possibilidades de acolhimento do pedido de reconhecimento pelas universidades, cabe recurso à Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação".

Ante a falha do Legislativo e a inércia do Executivo, através do MEC/CNE/CES, restava a remota possibilidade de que pelo menos as universidades, nas normas que viessem a adotar para detalhar o procedimento do pedido de revalidação de títulos estrangeiros nos seus âmbitos internos, fixassem critérios objetivos e impessoais para o exame dos pedidos de reconhecimento de títulos de pós-graduação. Com efeito, cada universidade que tenha cursos de pós-graduação lato sensu e/ou stricto sensu, reconhecidos pelo Ministério da Educação e avaliados pela CAPES (com nota igual ou superior a 3), torna-se potencial destinatária de pedidos de reconhecimento de títulos estrangeiros referentes a cursos que sejam da mesma área de conhecimento ou de área de conhecimento afim à daqueles que elas ministram. Não obstante, quando se analisa no âmbito das universidades, o que se constata é que estas também parecem não ter interesse nenhum em estabelecer critérios para o exame dos pedidos de reconhecimento de títulos estrangeiros; muito ao contrário, parecem preferir que a matéria fique "em aberto", pois isso lhe proporciona enorme margem de discricionariedade para revalidar somente aqueles certificados que são do seu próprio interesse.

Com isso, os abusos são freqüentes. Veja-se dois exemplos, para demonstrar o que pode acontecer e, efetivamente, tem acontecido: 1) uma universidade, apta para revalidar certificados estrangeiros, revalida o certificado de um professor do seu quadro e vem a recusar revalidação de certificado idêntico de outra pessoa, estranha ao seu quadro de pessoal; 2) dois professores concluem curso de doutorado numa mesma universidade da Espanha e depois requereram o reconhecimento dos seus certificados em diferentes universidades do Brasil, sendo que um deles obtém o deferimento do seu pedido, mas o outro, não.

À parte o problema descrito, as universidades, com pequenas variações de uma para outra, para efeito de analisar o pedido de revalidação, costumam exigir o comprovante de pagamento de taxa, cópia do diploma de pós-graduação, cópia ou exemplar da tese ou dissertação, cópia do histórico escolar, documentos referentes à duração e ao currículo do curso, cópia de diploma anterior de graduação e/ou pós-graduação e cópias de documentos do requerente. No caso de requerente estrangeiro, costuma-se exigir cópia da cédula de estrangeiro permanente ou o passaporte e declaração de residência no Brasil. Exige-se, ainda, comprovante de bolsa de estudo recebida, quando for o caso. Para os cursos realizados por instituições estrangeiras em convênio com instituição brasileira, deve-se fornecer cópia da autorização do Poder Público para a realização do convênio. Os documentos oriundos da instituição de ensino estrangeira devem ser autenticados pela autoridade consular brasileira no país que os expediu e as firmas dos signatários desses documentos devem estar reconhecidas. Caso não esteja redigida em inglês, francês, espanhol, italiano ou alemão [8], a documentação deverá ser, também, traduzida oficialmente.

Dada sua autonomia didático-científica, não se descarta a possibilidade de que, eventualmente, a universidade venha a condicionar a revalidação à realização de estudos complementares, exames e provas específicas, ou até mesmo uma defesa da tese perante Banca Examinadora da própria universidade. Porém, este autor reputa que não é possível o indeferimento, puro e simples, do pedido de revalidação, sem que se franqueie ao interessado a possibilidade de adequar seus estudos e o correspondente título às exigências da instituição requerida [9]. O indeferimento nessas condições é notoriamente abusivo e, certamente, não tem condições de resistir ao recurso para o CNE/CES, ou, se for o caso, à impugnação na via judicial. Aliás, em todos os casos nos quais uma universidade indeferir pedido de revalidação sem observar critérios claros e objetivos existentes em norma pré-existente, caberá ação judicial para pleitear que a universidade seja condenada a revalidar e registrar o certificado.

Cabe aqui comentar sobre o problema dos cursos ministrados no Brasil, por instituições estrangeiras isoladamente ou mediante convênio com instituições brasileiras.

A abertura do Brasil para o processo de globalização, como em todo lugar, trouxe benefícios e malefícios. Nos campos da educação e da cultura, os benefícios são evidentes. No entanto, nesses setores também há que se tomar o devido cuidado para se "separar o joio do trigo". Pois bem, a partir da segunda metade da década de 90, do século recém-passado, principalmente logo após a promulgação da LDB, muitos cursos de universidades estrangeiras, notadamente de universidades dos Estados Unidos, de Portugal, da Espanha e de países da América do Sul começaram a ser oferecidos aqui no Brasil, normalmente através de convênio com instituições brasileiras, universitárias ou não. Entre esses cursos, muitos eram sérios, mas boa parte também constituiu verdadeiro estelionato [10].

Esse fato levou o CNE a editar uma resolução (atualmente, já revogada), pela qual proibia as universidades de procederem ao reconhecimento e registro de certificados de universidades estrangeiras relativos a cursos de pós-graduação ministrados no território brasileiro sem prévia autorização do MEC. Em seguida, pela resolução CNE/CES nº 02, de 3/4/2001 [11], foi determinado que os cursos de pós-graduação stricto sensu oferecidos no Brasil por instituições estrangeiras, diretamente ou mediante convênio com instituições nacionais, deveriam imediatamente cessar o processo de admissão de novos alunos. As instituições que se enquadrassem na hipótese deveriam encaminhar à CAPES, no prazo de 90 dias (até 9/7/2001), a relação dos diplomados nesses cursos, bem como dos alunos matriculados, com a previsão de conclusão. Por sua vez, os estudantes que se achassem nas condições ali previstas, deveriam encaminhar à CAPES a documentação necessária ao processo de reconhecimento dos seus certificados. A CAPES, por sua vez, iria eleger as universidades aptas a procederem às revalidações, enviando-lhes os certificados para tanto.

Para esse fim, segundo informação que a CAPES havia inserido em seu site na internet, o interessado deveria apresentar requerimento dirigido a ela, com seu nome, o nome do curso, período e local em que foi realizado, instituição promotora, nível do diploma, título da tese, dissertação ou trabalho equivalente, dados básicos do solicitante (identidade, CPF, endereço completo, telefone, fax e e-mail). Era preciso anexar ao requerimento a cópia do diploma a ser validado (frente e verso), autenticado pela autoridade consular brasileira (no caso de a emitente ser instituição francesa, esta última exigência é dispensada); cópia do histórico escolar ou documento equivalente (frente e verso), autenticado pela autoridade consular brasileira (autenticação consular é dispensada para cursos na França); os programa das disciplinas cursadas, com indicação do nome, titulação e vínculo institucional dos professores responsáveis; cópia autenticada do documento de identidade; cópia do diploma de graduação; curriculum vitae atualizado, simplificado; e exemplar da dissertação ou tese. As solicitações, instruídas com os documentos exigidos, deveriam ser encaminhadas à CAPES - Coordenação de Acompanhamento e Avaliação/CAA , aos cuidados da Coordenadora Rosana Arcoverde - Ministério da Educação, Anexo II, 2º andar, 70359-970, com o título "Reconhecimento de diploma de IES estrangeiras" ou poderiam ser entregues diretamente no Serviço de Protocolo da citada entidade, em Brasília, contra a obtenção do devido comprovante, ou postadas no Correio, através de modalidade de serviço que assegure comprovante de remessa. Outrossim, a instituição de ensino superior responsável pela avaliação de cada pedido poderia solicitar diretamente ao interessado a apresentação de informações e documentos complementares considerados necessários - inclusive os referentes ao pagamento de taxas eventualmente previstas. Informava a CAPES, ainda, que a decisão final da instituição de ensino sobre o pedido de revalidação do diploma, fosse a mesma favorável ou não ao pleito, deveria ser informada à CAPES, cabendo à Universidade efetuar a devida comunicação ao interessado. No caso de decisão denegatória do pedido de revalidação caberia recurso administrativo à CES do CNE.

Importa registrar que esse procedimento transitório, criado para atender os alunos de cursos estrangeiros no Brasil, gerou congestionamento nas universidades e estas passaram a indeferir pedidos de revalidação "em blocos", o que significa dizer, em outras palavras, sem examinar o mérito dos cursos.

Em abril de 2005, sob a pressão de alguns grupos mais organizados, realizaram-se audiências públicas na Câmara dos Deputados. Na ocasião, presentes parlamentares, representantes de portadores de certificados estrangeiros e também representantes da CAPES e do CNE, houve uma cobrança de providências por parte destes órgãos, com vistas a dar uma solução para a revalidação dos certificados estrangeiros. Isso, ao que tudo indica, foi o que levou o CNE/CES a editar a resolução CNE/CES nº 02, de 9/6/2005, pela qual criou novamente um procedimento dirigido especialmente àqueles estudantes que se matricularam ou já haviam concluído, até 02/4/2001, cursos ministrados em território brasileiro, por instituições estrangeiras isoladamente ou em convênio com instituições locais.

Por essa nova resolução, os portadores dos certificados de pós-graduação stricto sensu referentes a cursos de instituições estrangeiras ministrados aqui no Brasil passam a ter o direito de requerer o reconhecimento de seus certificados diretamente em universidades públicas ou privadas que ofereçam cursos avaliados pela CAPES e reconhecidos pelo MEC, na mesma área de conhecimento ou área afim e em nível equivalente ou superior.

O procedimento, como se percebe, em princípio, é igual àquele aplicável para quem fez seu curso na sede da universidade estrangeira, ou seja, fora do território brasileiro. Mas, é diferente nos três pontos seguintes, sendo que os dois últimos representariam um avanço, se tivessem como destinatários todos os portadores de certificados estrangeiros de pós-graduação: 1) foi fixado o prazo (decadencial) [12] de apenas um ano para que todos os destinatários interessados formulem seus requerimentos; 2) foi estabelecido um mínimo de critérios; 3) obriga a universidade a formar banca para o portador do título fazer defesa da tese ou dissertação.

A conclusão a que se chega a despeito da nova resolução do CNE (resolução CNE/CES nº 2/2005) é que mais uma vez esse órgão conseguiu ser injusto, pois contemplou na sua nova resolução apenas o grupo de portadores de certificados estrangeiros referentes a cursos feitos no território brasileiro. Ou seja, ficaram à míngua de uma norma clara e objetiva exatamente aquelas pessoas que mais a mereciam, ou seja, aqueles que fizeram seus cursos fora do Brasil, sem ferir qualquer orientação do MEC/CNE e que estão submetidos à resolução CNE/CES nº 1/2001, a qual, ao contrário da resolução CNE/CES nº 2/2005, não obriga a universidade a formar banca examinadora nem fixa critério algum para exame do pedido. É a famosa "lei de Gerson", mais uma vez se confirmando neste país (...).


CURSOS REALIZADOS EM PAÍSES COM OS QUAIS O BRASIL MANTÉM ACORDOS INTERNACIONAIS PARA ACEITAÇÃO RECÍPROCA DE TÍTULOS

Cabe agora discorrer um pouco sobre o caso dos títulos obtidos em universidades de países com os quais o Brasil celebrou e ratificou tratados internacionais para a aceitação mútua sem a exigência de revalidação, ou para a facilitação da aprovação dos pedidos de revalidação, de títulos universitários estrangeiros.

No primeiro caso – o de tratados em que o Brasil se compromete a aceitar o certificado sem prévia revalidação -, o tratado, estando vigente segundo as exigências do seu texto e as de nosso direito interno, deverá possibilitar ao portador do certificado estrangeiro a utilização do certificado em todo o território de todo os países co-pactuantes do tratado, e, se no território brasileiro houver resistência de alguma universidade, ou mesmo da CAPES, em acatar o certificado, o interessado pode pleitear a tutela do Poder Judiciário, através de mandado de segurança ou ação ordinária. O ideal seria que esse certificado fosse passível de registro, à semelhança do registro dos títulos expedidos pelas universidades brasileiras e que se dá também com os títulos de universidades estrangeira ao serem revalidados. Mas, como nem a LDB nem o CNE disciplinaram um procedimento destinado ao simples registro de certificado estrangeiro abrangido por tratado internacional que dispensa a revalidação, não cabe ao portador do certificado preocupar-se com isto, sendo melhor enfrentar esse problema somente no caso de lhe ser indevidamente exigido tal registro, ou no caso de não obtê-lo em o solicitando a uma universidade apta a concedê-lo.

No segundo caso - ou seja, no caso de tratados nos quais o Brasil se compromete apenas a facilitar a revalidação -, estando vigente o tratado segundo as exigências do seu texto e as de nosso direito interno, os interessados deverão requerer a revalidação numa universidade brasileira, invocando no requerimento as disposições constantes do tratado que lhe são favoráveis. No caso de indeferimento arbitrário, caberá ao interessado ajuizar mandado de segurança ou ação ordinária para reverter a decisão negativa.

Por exemplo, com Portugal, o Brasil firmou o "Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta", aprovado em Portugal pela Resolução da Assembléia da República n.º 83, de 14 de Dezembro de 2000 [13]. Esse tratado, do qual convém destacar os seus artigos "41º", "42º" e "43º", embora não assegure a utilização automática do certificado estrangeiro sem necessidade de sua prévia revalidação, assegura ao portador do certificado garantia de que ele será revalidado por uma universidade à qual for requerida a revalidação, desde que atendidas as prescrições nele contidas.

Através do "art. 41º" do Tratado de Amizade, os países signatários estabelecem que o reconhecimento de títulos será sempre concedido, a menos que se demonstre, fundamentalmente, que há diferença substancial entre os conhecimentos e as aptidões atestados pelo grau ou título em questão, relativamente ao grau ou título correspondente no país em que o reconhecimento é requerido ("art. 41º"). Por meio do "art. 42º", admite-se que as universidades do Brasil e instituições de ensino superior de Portugal celebrem convênios para assegurar o reconhecimento automático dos graus e títulos acadêmicos por elas emitidos em favor dos nacionais de uma e outra parte. E pelo "art. 43.º", fica facultado aos nacionais das partes acordantes o acesso a cursos de pós-graduação em universidades e demais instituições de ensino superior, em condições idênticas às exigidas aos nacionais do país da instituição em causa.

O referido Tratado é lei interna do Brasil, pois se encontra aprovado pelo Congresso Nacional, através do Decreto Legislativo nº 165, de 30 de maio de 2001 e promulgado por Decreto nº 3.927, de 19 de setembro de 2001, do Presidente da República. Desse modo, aos brasileiros alcançados pelas cláusulas do Tratado de Amizade e que vierem a sofrer recusa injustificada por parte de universidade brasileira no processo de revalidação dos títulos obtidos em universidades portuguesas, é recomendável recorrer à via judicial, no âmbito interno, sem prejuízo da possibilidade paralela de formular reclamação com base no próprio Tratado, perante os setores diplomáticos do país desacreditado.

Merecem destaque, também, os acordos internacionais firmados pelo Brasil com os demais países do Mercosul, em aditamento ao Tratado de Assunção. Todavia, pela sua importância e peculiaridade, este tema será objeto de item específico, a seguir.


CURSOS ABRANGIDOS POR ACORDOS FIRMADOS PELO BRASIL NO ÂMBITO DO MERCOSUL

O Brasil firmou alguns acordos com os países do Mercosul, para efeito da admissão recíproca de títulos de diferentes níveis de educação. No mesmo sentido foram firmados também acordos pelos países integrantes do Mercosul com outros países da América do Sul não-integrantes desse Bloco.

Dentre os referidos acordos, merecem ser destacados o "Protocolo de Integração Educacional para Prosseguimento de Estudos de Pós-Graduação nas Universidades dos Países Membros do Mercosul", concluído em Fortaleza, em 16 de dezembro de 1996; e o "Acordo de Admissão de Títulos e Graus Universitários para o Exercício de Atividades Acadêmicas nos Estados-Partes do Mercosul", cuja versão original foi firmada em Assunção, Paraguai, em 11 de Junho de 1997 [14].

O "Protocolo de Integração Educacional para Prosseguimento de Estudos de Pós-Graduação nas Universidades dos Países Membros do Mercosul" encontra-se convertido em lei interna do Brasil, eis que aprovado pelo Decreto Legislativo nº 33, de 7 de Junho de 1999 e promulgado pelo Decreto nº 3.196, de 5 de Outubro de 1999, do Presidente da República, tendo sido publicado no Diário Oficial da União - DOU do dia 6 de outubro de 1999. De acordo com o "artigo 1" desse Protocolo, "os Estados Partes, por meio de seus organismos competentes, reconhecerão, unicamente para a realização de estudos de pós-graduação acadêmica, os títulos universitários expedidos pelas Instituições de ensino Superior reconhecidas"; e pelo "artigo 4", "os títulos de graduação e de pós-graduação, regidos pelo presente Protocolo, serão reconhecidos, unicamente para fins acadêmicos, pelos organismos competentes de cada Estado Parte. Tais diplomas de per si não habilitam ao exercício da profissão" [15].

Ainda pelo "artigo 1" do citado Protocolo, desde que atendidos os requisitos mínimos do curso, fixados no próprio Protocolo, os países signatários obrigam-se mutuamente a aceitar os "títulos universitários" (graduação, pós-graduação lato sensu, mestrado ou doutorado) [16] obtidos em qualquer Estado-Parte, para efeito de ingresso em cursos de Pós-Graduação. Coerentemente com a referida disposição, o "artigo 4" estabelece que os Estados-Partes - embora apenas "para fins acadêmicos" - reconhecerão os títulos de graduação e de pós-graduação regidos pelo Protocolo em apreço. Fins "acadêmicos", naturalmente, são aqueles relativos à "academia". Por sua vez, o termo "academia", proveniente do nome da Escola criada por Platão e situada nos jardins consagrados ao herói ateniense Academus, passou a ser empregado como equivalente ao estabelecimento onde se ensinam determinadas práticas; também costuma ser utilizado para referir ao próprio conjunto dos membros de uma escola ou "academia"; ou, ainda, como o local onde se reúnem os acadêmicos. Academia compreende, pois, as escolas universitárias, tendo por isso, também, o sentido de "estabelecimento de ensino superior de ciência ou arte; faculdade, escola" [17]. Assim, os "fins acadêmicos", quando referentes às escolas universitárias, não podem ser outros senão os de discência, docência e pesquisa.

Destarte, o Protocolo ora examinado assegura aos portadores de títulos de graduação ou de pós-graduação obtidos em países integrantes do Mercosul o direito ao reconhecimento desses títulos, para fins de discência, docência e pesquisa universitária, sem necessidade de submissão a processo de revalidação [18].

Mais específico ainda é o "Acordo de Admissão de Títulos e Graus Universitários para o Exercício de Atividades Acadêmicas nos Estados-Partes do Mercosul", cuja versão original data de 11 de Junho de 1997, e que, após sofrer pequenas alterações em sua redação original, foi referendado pela Câmara dos Deputados no dia 14 de Agosto de 2003 e pelo Senado Federal em 22 de Outubro de 2003, com a redação constante da sua quarta versão, levada a efeito através da Decisão 04, de 14 de Junho de 1999, do Grupo Mercado Comum - GMC do Mercosul [19]. A citada norma aprovadora, agora vigente, restou promulgada, pelo Presidente do Senado Federal em exercício, Senador Paulo Paim, no dia 23 de Outubro de 2003, vindo a ser publicada no Diário Oficial da União de 24 de Outubro deste mesmo ano (DOU-E nº 207, pág. 04) como Decreto Legislativo nº 800, de 22 de Outubro de 2003.

Conforme o "Artigo Primeiro" deste último documento, "os Estados Partes, por meio de seus organismos competentes, admitirão, unicamente para o exercício de atividades de docência e pesquisa nas instituições de ensino superior do Brasil, nas universidades e institutos superiores do Paraguai, nas instituições universitárias na Argentina e no Uruguai, os títulos de graduação e de pós-graduação reconhecidos e credenciados nos Estados Partes, segundo procedimentos e critérios a serem estabelecidos para a implementação deste Acordo" [20]. O "Artigo Terceiro" reza que os títulos de graduação e pós-graduação referidos no Acordo deverão estar devidamente validados pela legislação vigente nos Estados Partes; o "Artigo Quinto" diz que "a admissão outorgada em virtude do estabelecido no Artigo Primeiro deste Acordo somente conferirá direito ao exercício das atividades de docência e pesquisa nas instituições nele referidas, devendo o reconhecimento de títulos para qualquer outro efeito que não o ali estabelecido, reger-se pelas normas específicas dos Estados Partes"; e, ainda, reza o "Artigo Décimo Segundo" que "a reunião de Ministros de Educação emitirá recomendações gerais para a implementação deste Acordo".

A CAPES admite - e de outro modo não poderia ser - que o Acordo de Admissão de Títulos e Graus Universitários para o Exercício de Atividades Acadêmicas nos Estados-Partes do Mercosul, assegura ao portador de certificado de mestrado ou doutorado logrado em universidade dos Estados-partes o direito de usufruir, sem necessidade de prévia revalidação/reconhecimento, e para fins de docência e pesquisa, das prerrogativas do título referente ao certificado. Com efeito, a CAPES inseriu no seu portal, na Internet, no caminho www.capes.gov.br/Serviços/Legislacao/FAQ.htm , no ícone referente às "questões mais freqüentes sobre a Legislação da Pós-Graduação", a seguinte explicação:

"2. Validade nacional de diploma obtido no exterior.

Para gozar de validade no Brasil, o diploma conferido por estudos realizados no exterior deverá se submeter à reconhecimento por universidade brasileira que possua curso de pós-graduação avaliado e reconhecido. Assim, qualquer informação sobre critérios e procedimentos do reconhecimento (revalidação) deverá ser obtida junto à própria universidade, que os define, no exercício de sua autonomia técnico-científica e administrativa, observando as normas pertinentes.

Mesmo os diplomas de Mestre e Doutor, provenientes de países que integram o MERCOSUL estão sujeitos ao reconhecimento. O acordo de admissão de títulos acadêmicos, aprovado pelo Decreto legislativo nº 800, de 23.10.2003, não dispensa da revalidação/reconhecimento (Art. 48, § 3º, da LDB) os títulos de pós-graduação conferidos em razão de estudos feitos nos demais países membros do Mercosul, embora permita, exclusivamente para o exercício de atividades de docência e pesquisa, que os diplomas com tal procedência, comprovadamente válidos consoante a legislação da origem e de nível correspondente quando diversas as denominações, ensejem as prerrogativas decorrentes, SEM O RECONHECIMENTO." (Os destaques são dados pelo requerente).

Ainda com relação a esse mesmo tratado (o segundo) no âmbito do Mercosul, é preciso esclarecer que ele foi referendado pela Câmara dos Deputados no dia 14 de Agosto de 2003 e pelo Senado Federal em 22 de Outubro de 2003, com a redação constante da sua quarta versão, levada a efeito através da Decisão 04, de 14 de Junho de 1999, do Grupo Mercado Comum - GMC do Mercosul. A citada norma aprovadora restou promulgada, pelo Presidente do Senado Federal em exercício, Senador Paulo Paim, no dia 23 de Outubro de 2003, vindo a ser publicada no Diário Oficial da União de 24 de Outubro desse mesmo ano (DOU-E nº 207, pág. 04) como Decreto Legislativo nº 800, de 22 de Outubro de 2003.

Porém, por razões que se pode facilmente deduzir [21], não foi expedido decreto presidencial de promulgação do decreto legislativo que aprovou o tratado em apreço, mas isso não o torna não-vigente, eis que, conforme se depreende da leitura de J.F. Rezek (in Direito Internacional Público, 7ª ed., São Paulo: Saraiva, 1998, p. 84) e Carlos Roberto Husek (in Curso de Direito Internacional Público, 5ª ed., São Paulo, LTR, 2004, p. 80), a promulgação do decreto legislativo que ratifica tratado, além de não constituir uma exigência constitucional, não tem nem mesmo a essência de um decreto, servindo mais precisamente mais como mecanismo destinado a dar publicidade ao ato, já que o decreto legislativo que aprova tratado não comporta sanção ou veto.

E sendo assim, o decreto presidencial, com essa mera função de dar publicidade ao tratado (a qual, inclusive, já existiu, quando da promulgação do próprio decreto legislativo que o aprovou), pode até constituir um requisito necessário para dar uma publicidade ainda maior ao ato com relação aos cidadãos, mas é totalmente desnecessário com relação aos administradores, notadamente os inseridos no Poder Executivo, haja vista que foi um plenipotenciário designado por esse mesmo Poder quem discutiu as cláusulas do tratado e o assinou, e foi o próprio Chefe de Estado (Presidente da República) quem enviou o tratado para o Congresso Nacional, a fim de que fosse discutido e aprovado nas duas Casas Legislativas.

Enfim, o tratado em comentário acha-se vigente, pois o Brasil foi o segundo país signatário a aprová-lo e a fazer a ratificação no plano externo, mediante o envio, pelo Presidente da República, da carta de ratificação com destino ao país depositário do tratado (Paraguai), o qual, por sua vez, confirmou o depósito do instrumento da ratificação interna (ou seja, o decreto legislativo 800/2003) na cidade de Assunção. Tal depósito aconteceu no mês de maio de 2004, de sorte que o tratado passou a vigorar para o Brasil (segundo país a ratificá-lo) e para a Argentina (primeiro a ratificá-lo) em junho de 2005, obedecido que foi o prazo de vacatio legis de 3O dias a partir do depósito do instrumento de ratificação pelo segundo Estado a ratificá-lo, conforme previsto no "artigo décimo" de seu próprio texto.

Conclui-se, portanto, que esta segunda avença internacional permite ao titular de título de graduação ou de pós-graduação obtido em instituição do Estado Parte do Mercosul, utilizá-lo em qualquer dos Estados-Partes, para exercer atividades de docência e pesquisa, bem como, eventualmente, na atividade de discência (participação em outra pós-graduação, por exemplo). Assim, o direito à aceitação automática de títulos obtidos em instituições do Mercosul, para fins acadêmicos, que já se encontrava plenamente contemplada no "Protocolo de Integração Educacional para Prosseguimento de Estudos de Pós-Graduação nas Universidades dos Países Membros do Mercosul", aprovado pelo Decreto Legislativo nº 33, de 7 de Junho de 1999 e promulgado pelo Decreto nº 3.196, de 5 de Outubro de 1999, agora encontra-se respaldado, também, no Acordo de Admissão de Títulos e Graus Universitários para o Exercício de Atividades Acadêmicas nos Estados-Partes do Mercosul, aprovado na Câmara e no Senado e Promulgado através do Decreto Legislativo nº 800, de 23 de Outubro de 2003, do Senado Federal.

Conclusivamente, do ponto de vista do Direito Positivo vigente no Brasil, deve-se considerar que o título logrado em instituição do Mercosul vale em todo o território nacional, para efeito da prática de atividades discentes, docentes e de pesquisa, sem necessidade, portanto, de ser submetido ao procedimento de revalidação. Seria bom que se obtivesse pelo menos o mero registro, perante uma universidade que atenda às mesmas exigências para julgar o pedido de revalidação, mas, conforme já assinalado antes, nem a LDB nem o CNE disciplinaram o processo para esse registro, sendo, por isso, preferível tentar demonstrar sua inexigibilidade administrativamente ou judicialmente, ou então buscar obtê-lo, pelas mesmas vias conforme a necessidade, se houver resistência intransponível na sua utilização sem que esteja registrado [22]. Esse direito é assegurado por lei vigente e, ademais, trata-se de um direito social fundamental, nos termos do art. 6º da Constituição do Brasil (inserido nos direitos sociais à educação e ao trabalho), o qual tem aplicação imediata, ante o que rezam os §§ 1º e 2º do art. 5º, da referida Lei Fundamental [23].

No próximo tópico, aponta-se os possíveis caminhos a serem seguidos pelas pessoas cujos títulos de graduação ou pós-graduação, obtidos em universidades de outros Países-Membros do Mercosul, não estejam sendo reconhecidos em instituições de ensino superior do Brasil.


SOLUÇÕES POSSÍVEIS PARA AQUELES QUE ENCONTRAREM BARREIRAS NA ACEITAÇÃO DE TÍTULOS CUJO RECONHECIMENTO É REGIDO POR ACORDOS INTERNACIONAIS CELEBRADOS PELO BRASIL

Em se tratando de título abrangido por avença internacional de que o Brasil é signatário e que já se acha vigente para o Brasil, o interessado poderá impetrar Mandado de Segurança contra o ato da autoridade da instituição de ensino superior que recusar o reconhecimento do título, requerendo medida liminar e sua confirmação definitiva, para ordenar o reconhecimento.

Outra ação adequada seria a Ação Ordinária, onde se postulasse a antecipação da tutela de mérito, para o mesmo fim da liminar acima mencionada, bem assim, sua confirmação na sentença definitiva [24]. A Ação Ordinária também traz a vantagem de possibilitar a cumulação do pedido de condenação na obrigação de fazer (reconhecer o título) com a obrigação de pagar, que, no caso, seriam os danos materiais e morais que forem suportados pelo lesado.

Com efeito, como a negativa ilegal e arbitrária à aceitação do título traz graves constrangimentos para o seu portador, quer no meio acadêmico, onde ganha a sua vida, quer seja entre os amigos, e, ainda, no seio familiar, surge o direito do lesado à reparação dos danos morais sofridos, que são gravíssimos, mormente para quem vive da atividade acadêmica, já que muito perde em sua reputação, quando deveria ganhar. Além disso, como a não-aceitação do título impede o seu portador de usufruir os direitos financeiros que ele lhe proporcionaria, caberá, ainda, a cumulação do pedido de indenização dos danos morais com a indenização dos danos materiais. Estes últimos correspondem ao que o portador do título deixaria de ganhar se estivesse com o título devidamente aceito (lucros cessantes), como também tudo o quanto gastou na realização do curso cujo título está sendo recusado (danos emergentes).

Paralelamente, sem prejuízo do ajuizamento da ação, cabe a reclamação contra o País, no âmbito internacional, seguindo-se os procedimentos previstos nos acordos internacionais que abranjam a hipótese do portador do título e, subsidiariamente, os demais mecanismos previstos pelo Direito Internacional Público [25]. A propósito disso, o "artigo 8" do "Protocolo de Integração Educacional para Prosseguimento de Estudos de Pós-Graduação nas Universidades dos Países membros do MERCOSUL" estabelece que: "1. As controvérsias que surjam, entre os Estados Partes, em decorrência da aplicação, interpretação ou do não cumprimento das disposições contidas no presente Protocolo serão resolvidas mediante negociações diplomáticas diretas. 2. Se, mediante tais negociações, não se alcançar um acordo ou se a controvérsia for solucionada apenas em parte, serão aplicados os procedimentos previstos no Sistema de Solução de Controvérsias vigente entre os Estados Partes do Tratado de Assunção". No "Acordo de Admissão de Títulos e Graus Universitários para o Exercício de Atividades Acadêmicas nos Estados-Partes do Mercosul", aprovado pelo Decreto Legislativo nº 800/2003, não consta disposição semelhante, todavia, como faz parte do Tratado de Assunção, a ele se aplica a mesma sistemática descrita, de solução de controvérsias.

Uma explicação bastante objetiva e sintética do funcionamento do referido Sistema de Solução de Controvérsias encontra-se disponibilizado na Internet [26], dela sendo pertinente destacar o seguinte trecho:

"No que diz respeito a reclamações de particulares, o procedimento está previsto no Capítulo V do Protocolo de Brasília, o qual reconhece que o objetivo visado pelo Tratado de Assunção não se alcança somente com a participação dos Estados, mas presssupõe a participação dos operadores econômicos, dos nacionais dos Estados membros.

Pelo disposto nesse capítulo, as pessoas físicas ou jurídicas que se sentirem afetadas por uma sanção ou aplicação, por qualquer dos Estados Partes, de medidas legais ou administrativas de efeito restritivo, discriminatórias ou de concorrência desleal, iniciarão o procedimento formalizando suas reclamações ante a Seção Nacional do GMC do Estado Parte onde tenham residência habitual ou sede de negócios.

De acordo com o art. 27 do Protocolo de Brasília, se a Seção Nacional decidir patrocinar a reclamação do particular, optará entre a negociação direta com a Seção Nacional do GMC do Estado Parte ao qual se atribui a violação ou levará o caso, sem mais consultas, diretamente ao GMC; este poderá denegar a reclamação, se carecer dos requisitos necessários, ou receber a reclamação, convocando a seguir grupo de especialsitas para emitir parecer sobre sua procedência. Comprovada a procedência, qualquer outro Estado Parte poderá requerer a adoção de medidas corretivas ou a anulação das medidas questionadas. Caso o requerimento não prospere, o Estado Parte poderá recorrer ao procedimento arbitral previsto no Capítulo IV do Protocolo de Brasília.

O Anexo do Protocolo de Ouro Preto, por sua vez, estabelece um iter alternativo, no qual as reclamações de Estados Partes ou de particulares são apresentadas pelas Seções Nacionais da Comissão de Comércio do Mercosul e são a seguir apreciadas pela própria CCM, por um Comitê Técnico, outra vez pela CCM, pelo GMC e, caso não resolvida até esse momento, possibilita-se o acionamento do Capítulo IV do Protocolo de Brasília (fase arbitral)".

Com relação aos portadores de títulos obtidos em universidades de países com os quais o Brasil não tenha celebrado nenhum tratado sobre a matéria em apreço, impõe-se ao interessado a submissão ao procedimento de que trata a resolução CNE/CES nº 01/2002, ou seja, deve formular pedido de revalidação perante uma universidade brasileira que ofereça curso da mesma área ou de área afim, avaliado pela CAPES e com nota não inferior a três. No caso de negativa arbitrária ou abusiva do pedido de revalidação - e se não desejar esgotar as instâncias administrativas mediante interposição de recurso para a CES do CNE - poder-se-á buscar amparo do Judiciário, através de Ação Ordinária, onde se demonstre, com elementos objetivos, que o título deve ser reconhecido, e, assim, se requeira medidas de antecipação de tutela e definitiva, para obrigar a universidade requerida (e também a União, caso o seu Ministério da Educação, através da CES do CNE, tenha negado provimento ao recurso administrativo) a proceder à revalidação do título.

Tendo-se em consideração que o problema da revalidação atinge direitos sociais fundamentais (educação e trabalho) [27] de uma parcela bastante ampla da comunidade docente do Brasil [28], cabe perfeitamente a elaboração de denúncia individual ou por meio do sindicato ou outra associação de classe, perante o Ministério Público Federal - de preferência à Procuradoria da República em Brasília, de onde poderia ser obtida uma solução que alcançasse todas as universidades do Brasil [29]. Com efeito, é dever dessa instituição a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, conforme art. 127 da Constituição Federal; e, mais precisamente, zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na Constituição, promovendo as medidas necessárias à sua garantia (art. 129, II).

Às vezes, uma simples notificação recomendatória do Ministério Público é suficiente para que seja interrompida uma conduta irregular. Fora esse mecanismo, o Ministério Público Federal tem ao seu dispor a possibilidade de obter dos infratores a assinatura de Termo de Ajustamento de Conduta, com força de Título Executivo Extrajudicial, onde se obriguem a respeitar os direitos constitucionais e legais dos lesados; ou, no caso de não lograr assinatura de tal documento, tem a possibilidade de propor Ação Civil Pública, visando a obter medida liminar e subseqüente sentença judicial que produzam os mesmos efeitos.

Por fim, deve-se ressaltar que, em qualquer uma das situações em que se enquadre o solicitante da revalidação, ele tem o direito a uma decisão da universidade requerida no prazo máximo de seis meses, de forma que a falta de decisão nesse prazo constitui mais uma agravante a ser levada em consideração por quem for apreciar eventual pedido de solução, seja ele o Judiciário do Brasil, os órgãos judicantes designados pelos sistemas internacionais de solução de controvérsias ou o Ministério Público Federal.


CONCLUSÃO

Não resta dúvida de que, desde o advento da LDB, tem-se ampliado consideravelmente a oferta de cursos de pós-graduação lato sensu, bem assim de cursos de mestrado e de doutorado, em comparação com o período que antecedeu ao da vigência da citada lei. Em 23 de dezembro de 2004, consumou-se, sem êxito, o prazo de oito anos, fixado pela LDB, para que as universidades brasileiras tenham pelo menos um terço dos seus professores com títulos de mestrado ou doutorado, sendo cinqüenta por cento efetivos. Trata-se de uma meta mínima, de modo que o ideal seria que muito mais de um terço dos professores já tivessem logrado seus títulos antes mesmo do prazo fixado. Todavia, a maioria das universidades brasileiras não cumpriu a citada meta mínima, uma vez que a rede de cursos de pós-graduação strico sensu do Brasil não atende à sua enorme demanda hoje existente.

Assim é que, em paralelo com as medidas voltadas para a integração econômica com outros países e, especialmente, com Portugal e seus co-irmãos da América do Sul, notadamente os demais países que formam o Mercosul, o Brasil vem direcionando esforços também no sentido da integração em matéria de educação e cultura. Com efeito, a despeito do intercâmbio de informações e de cultura, a integração em tema de educação superior traz para o Brasil, praticamente sem ônus, a vantagem de ampliar a rede de cursos de graduação e pós-graduação disponíveis para seus graduados e docentes, e, assim, reduzir seu déficit de professores qualificados. Ao mesmo tempo, a demanda recíproca dos docentes estrangeiros pelos cursos oferecidos pelas universidades brasileiras provoca a criação de um mercado de trabalho praticamente inexplorado pelo Brasil em nível internacional.

A propósito desse tema, a adesão do Brasil a acordos internacionais para a aceitação mútua de títulos universitários de graduação e pós-graduação obtidos em universidades dos Estados-Partes foi interpretada, pelos brasileiros atuantes na área da educação superior e por técnicos interessados em ampliar seus conhecimentos, como um veemente incentivo do Governo Federal para que pudessem ingressar em cursos ofertados por universidades estrangeiras, notadamente de Portugal e dos países integrantes do Mercosul. Esse incentivo conduziu centenas de docentes e outros profissionais do Brasil a realizarem cursos de pós-graduação em universidades estrangeiras. Muitos optaram por cursos totalmente presenciais em universidades do exterior e outros o fizeram em universidades de Portugal (país integrante do denominado "Primeiro Mundo") ou de países do Mercosul (especialmente a Argentina, que tem elevado padrão na área de Educação, como se faz sentir pelo seu elevado número de ganhadores do Prêmio Nobel). Também houve casos de cursos feitos em universidades de outros países, mediante convênios com instituições brasileiras, sendo parte das atividades realizadas no Brasil e parte na sede da universidade estrangeira.

Porém, mesmo a despeito da necessidade do país pela implementação de seu quadro de docentes pós-graduados, o que se verifica é que os professores que optaram por fazer cursos de pós-graduação em universidades estrangeiras têm sido, com freqüência, mercê da demora nos pedidos de revalidação e de infundados indeferimentos desses pedidos, desprezados pelo próprio Poder Público, que os incentivou a ingressar nessa empreitada. E esta empreitada, deve-se ressaltar, é muitas vezes mais árdua, devido à divergência de idiomas e, eventualmente, dos métodos de avaliação; e mais onerosa para o estudante, uma vez que, na maioria dos casos de que se tem conhecimento, dão-se às suas próprias expensas - daí dizer-se que praticamente não existem ônus para o País.

Por outro lado, a enorme demanda reprimida por cursos de pós-graduação no Brasil representa um próspero mercado de trabalho, confirmando previsões de especialistas divulgadas há dez anos ou mais. E esse crescente mercado de trabalho, ora referido, não se resume à atividade docente propriamente dita, compreendendo, ainda, outras atividades como a coordenação de cursos de graduação e pós-graduação, a orientação de pós-graduandos, a gerência e direção de universidades privadas, a assessoria ad-hoc às instituições públicas ligadas à educação superior, como a CAPES e o INEP; e, principalmente, a cobiçada atividade de assessoria, prestada eminentemente por professores com grau de doutorado, para a instalação de novas universidades ou para a criação de novos cursos de graduação e pós-graduação.

Pelo fato de o Brasil não dispor de suficiente número de professores com graus de doutorado e mestrado, os poucos que estão em atividade passaram a compartilhar, privilegiadamente, o rico nicho de mercado de trabalho que se formou. Na área de Direito, por exemplo, professores de universidades públicas que antes só tinham como renda os módicos vencimentos inerentes aos seus cargos, logo passaram a lograr generosos honorários, em paralelo com os vencimentos. Isto, porque logo surgiram instituições interessadas em celebrar convênios com universidades públicas para, servindo-se do renome, monopólio de registro e revalidação de títulos, bem como da autorização governamental de que elas dispõem, ofertarem cursos particulares de pós-graduação regados a elevadas mensalidades. Nesse tipo de empreitada, de um lado lucram as instituições intermediadoras e os professores-doutores vinculados aos cursos que são oferecidos através dos convênios por elas firmados; de outro lado, perde o país, pois está subsidiando com suas próprias instituições e servidores um nítido monopólio privado da pós-graduação, e perdem ainda aqueles professores que lograram títulos no exterior e que se acham privados de usufruir os direitos inerentes a esses títulos, já que dependem de revalidação por uma universidade nacional [30].

Nesse contexto, acredita-se que há forças atuando no seio dos centros decisórios do tema da pós-graduação das Universidades e até mesmo fazendo lobby tanto na CAPES e no CNE do MEC, como também perante as Casas Legislativas, no sentido de ver barradas quaisquer espécies de providências - especialmente aquelas que visem à desburocratização do processo para a revalidação dos títulos estrangeiros - que possam possibilitar a ampliação do quadro de professores com mestrado e, sobretudo, doutorado, no País. Com efeito, o aumento de doutores (sobretudo) e de mestres implicará na divisão do lucrativo mercado de trabalho hoje dominado por uma minoria.

A despeito de exercer sua autonomia prevista constitucionalmente, o que se verifica ordinariamente é que as universidades brasileiras ora protelam indefinidamente a decisão sobre os pedidos de revalidação de títulos de mestrado e doutorado obtidos em universidades estrangeiras, ou instituem exigências impossíveis de serem atendidas, devido à natural divergência dos sistemas jurídicos dos Estados envolvidos; e ora negam-se sistematicamente a revalidar esses títulos.

De um lado, esse fato é surpreendente, pois se trata de uma postura totalmente incoerente com a de um país que carece de mestres e doutores para aprimorar sua educação superior e que estabeleceu a qualificação do seu corpo docente como uma das metas prioritárias da educação. Por outro lado, a explicação para essa postura parece muito evidente. Com efeito, muitos dos que se encontram no comando das principais pós-graduações das universidades brasileiras são exatamente professores que estão entre aqueles que hoje lucram no já retratado mercado de pós-graduação. Obviamente, estando munidos de poder para tanto, por mais honestos que sejam, esses professores podem tornar-se naturalmente tendenciosos a laborar em causa própria, seja protelando por vários anos suas manifestações nos pedidos de revalidação, seja exarando decisões negativas, contrárias à revalidação de títulos de mestrado e doutorado, de molde a reservarem para si o mercado de trabalho.

A propósito das decisões negativas que têm sido exaradas por Universidades brasileiras em pedidos de revalidação de títulos de mestre e doutor obtidos no exterior, suas motivações, nos raros casos em que elas são dadas, têm sido, em geral, a alegação de que a universidade não tem tradição acadêmica, que não há prova de que o curso foi alvo de avaliação pelo Ministério da Educação do país de origem, que não existem critérios estabelecidos no Brasil para fins de comparar o curso feito no exterior com o curso feito no Brasil ou, ainda, que não existe reciprocidade de tratamento por parte do país de onde provém o título [31].

Ocorre que ser tradicional ou famosa não constitui o único indicativo da qualidade de uma universidade, de forma que o que se deve perquirir é tão-somente se o curso feito atendeu a determinados critérios válidos mundialmente para o mestrado ou doutorado. Ademais, tem-se notícia de decisões contrárias mesmo em casos nos quais os pedidos de revalidação já estavam instruídos com comprovação de que o curso feito no estrangeiro foi devidamente avaliado e aprovado pelo Ministério da Educação do país de origem, o que evidencia o propósito determinado de não revalidar os certificados estrangeiros.

Por outro lado, é igualmente inaceitável o argumento de que faltam de critérios para a comparação dos títulos, já que a fixação de critérios para esse fim constitui incumbência do Governo Federal - quer seja através de tratativas com os outros países, através do seu setor diplomático ou, no caso do Mercosul, pelos órgãos que o representam nesse Bloco; pelo Conselho Nacional de Educação, inserido na estrutura do seu Ministério da Educação, que é o órgão normativo do Sistema de Educação Nacional ou, ainda, por meio da CAPES, que tem a atribuição de velar pelo aperfeiçoamento do ensino superior em nível de pós-graduação -. Com efeito, em nenhum ordenamento jurídico do mundo é admitido que a própria parte que deu causa a uma suposta nulidade a invoque em prejuízo da outra. De modo que não é justo nem lícito que o Poder Público impeça o cidadão de exercer direitos - no caso, as prerrogativas que o título de pós-graduação lhe conferem - ante a alegação do não-atendimento de um requisito que não incumbe ele, cidadão, mas ao próprio Poder Público.

Por último, também não faz sentido o argumento da falta de reciprocidade, pois, no campo do Direito Internacional Público, a reciprocidade de tratamento é uma exigência que só se faz para beneficiar os nacionais do país, nunca para prejudicá-los. No caso de que ora se trata, a maioria dos pedidos de revalidação tem sido formulada por brasileiros, não tendo cabimento a exigência de reciprocidade.

Aos estrangeiros, aliás, no meio acadêmico, o Brasil tem dispensado tratamento bem melhor do que aos seus nacionais, pois há inúmeros casos de professores oriundos de países da Europa e da América do Norte que chegam ao Brasil e logram o registro de seus títulos de forma automática, sem que a instituição aceitante faça a mínima investigação ou questionamento sobre as circunstâncias e o curso de onde provém o título, numa patente demonstração de falta de auto-estima, já que isso implica admitir tacitamente que as pessoas e os cursos da Europa e da América do Norte são sempre melhores do que os seus congêneres no Brasil e no restante da América do Sul, o que não é verdade.

Assim, conclui-se este trabalho com uma sugestão aos senhores parlamentares da União, no sentido de que proponham uma alteração na vigente LDB, capaz de evitar eventuais arbitrariedades em matéria de revalidação de títulos de pós-graduação logrados por brasileiros em universidades estrangeiras, especificamente no que pertine à falta de sanção para o caso de não observância do prazo para decidir os pedidos de revalidação. Para tanto, seria bastante salutar e oportuno que os Senhores Deputados e Senadores da República tomassem a iniciativa de aprovar projeto de lei com a redação a seguir, ou outra melhor, desde que com o mesmo objetivo:

"Projeto de Lei nº___________

Insere o § 4º no art. 48 da Lei nº 9.394, de 20/12/1996.

Art. 1º. O art. 48, da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a ter a seguinte redação:

‘Art. 48.

§ 1º ...

§ 2º ...

§3º ..

§ 4º. O pedido de revalidação de título de graduação ou de pós-graduação expedido por universidade estrangeira é um processo de adequação do certificado, cabendo à universidade requerida fazer exame do certificado com base unicamente em critérios objetivos que deverão ser estabelecidos pelo Conselho Nacional de Educação, tais como carga horária, disciplinas cursadas e defesa de tese perante banca examinadora;

§ 4º A universidade brasileira, à qual for solicitada a revalidação de título de mestrado ou de doutorado expedido por universidade estrangeira, terá o prazo de três meses para decidir, considerando-se revalidado o título pela universidade requerida, se esta não proferir sua decisão dentro do prazo fixado. No caso de decisão denegatória da universidade requerida, é facultada ao interessado a interposição, no prazo de dez dias, de recurso para o Conselho Nacional de Educação, o qual deverá proferir decisão no prazo de três meses, sob pena de se considerar tacitamente provido o recurso’ ".


NOTAS

  1. Esta lei é amplamente conhecida como Lei de Diretrizes e Bases da Educação ou, simplesmente, pelas letras iniciais "LDB".
  2. Esta lei foi preservada, na parte que trata "da administração do ensino" (arts. 6º a 9º), com as alterações promovidas pela Lei nº 9.131, de 24 de novembro de 1995.
  3. As informações ora transmitidas, a respeito do INEP, foram colhidas no seu site, no caminho www.inep.gov.br/institucional/historia.htm (acesso em 1º de setembro de 2003), bem assim, na Lei nº 9.448, de 14 de março de 1997.
  4. Quanto ao uso das palavras revalidação e reconhecimento como sinônimas pela CAPES, veja-se seu portal, na Internet, no caminho www.capes.gov.br/Serviços/Legislacao/FAQ.htm , no ícone referente às "questões mais freqüentes sobre a Legislação da Pós-Graduação", especificamente na questão "2" (Validade nacional de diploma obtido no exterior). Aí, essa Fundação, numa passagem, emprega a palavra "reconhecimento" e, em seguida, entre parênteses, emprega "(revalidação)"; e, noutra passagem, escreve assim: "revalidação/reconhecimento". O MEC o faz, igualmente, no seu portal na Internet, no caminho http://portal.mec.gov.br/cne/index.php?option=content&task=view&id=1882&FlagNot... , nas partes em que formula e responde às questões "como se dá a revalidação de diploma de graduação expedido por universidade estrangeira (?)" e "como revalidar estudos de nível superior (graduação e pós-graduação) realizados no exterior(?)". As universidades que têm regras disciplinando no seu âmbito interno o procedimento da revalidação de certificados estrangeiros, também adotam, via de regra, nas referidas normas, as palavras revalidação e reconhecimento, indistintamente, como sinônimas.
  5. Poder-se-ia dizer também que esse dispositivo disciplina a "nacionalização" de certificados de graduação e de pós-graduação expedidos por universidades estrangeiras.
  6. As relações pessoais, ou de amizade, constituem uma das inúmeras formas de manifestação da corrupção, à semelhança do "jeitinho brasileiro" e outras tantas. A expressão "relações pessoais" se contrapõe à impessoalidade, que é o atributo que deveria prevalecer na aplicação da lei.
  7. Recorde-se que o art. 9º da LDB, ao fixar as tarefas a cargo da União no que diz respeito à organização da educação nacional, lhe impõe, entre outras, a incumbência de "baixar normas gerais sobre cursos de graduação e pós-graduação" (inciso VII). O órgão da União responsável pela edição das referidas "normas gerais" é o CNE, o qual, por sua vez, as edita por meio da sua Câmara de Educação Superior - CES, haja vista o rol de suas atribuições, constante do § 2º do art. 9º da Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961, conforme se vê linhas atrás.
  8. Como essas universidades exigem dos candidatos a mestrado e doutorado a aprovação em prova de alguma dessas línguas, pressupõe-se que elas estão aptas para examinar o trabalho escrito em qualquer um dentre esses idiomas, sendo dispensado, assim, o fornecimento de cópia do trabalho traduzida para português.
  9. A propósito do assunto, na área do Direito, onze Programas de Pós-graduação do Brasil que possuem níveis de mestrado e doutorado em Direito referendados pela CAPES (UFMG, UFPR, UFPE, UFRGS, UFSC, USP, UERJ, UGF, PUC-SP, PUC-RJ e UNISINOS) celebraram, entre si, na cidade de Curitiba-PR, em 27 de março de 2002, uma espécie de pacto de honra, no qual fixaram algumas "Diretivas", de força moral entre os pactuantes, a serem aplicadas uniformemente nos processos de revalidação de títulos. Nesse documento, os cursos signatários pactuaram que não revalidarão nenhum título que não atenda, simultaneamente, várias exigências nele relacionadas, as quais são, praticamente, impossíveis de ser atendidas na sua totalidade, haja vista a natural diversidade nos ordenamentos jurídicos dos diversos países entre si. Tudo leva a crer que o citado documento não tem outra finalidade, senão a de inviabilizar, por via indireta, a revalidação de título estrangeiro no Brasil, o que implica em afronta a dois direitos sociais fundamentais do homem - o direito à educação e o direito ao trabalho, previstos no art. 6º, da CF, uma vez que permanecer com o título sem revalidação implica não ter acesso ao nível educacional que esse título deve proporcionar ao seu titular; e sem o título revalidado, seu titular não pode assumir cargos ou empregos para cujo ingresso tal título é considerado pré-requisito indispensável -; mas implica, também, burla à própria LDB, já que esta não contempla, seja de forma implícita ou explicita, a possibilidade de a universidade deixar de revalidar um título estrangeiro.
  10. Este professor, por exemplo, foi contratado por um empresário português para ministrar uma disciplina num suposto curso de acesso a doutoramento em educação, curso esse cujas disciplinas deveriam ser cursadas pelos doutorandos, parte no Brasil e parte numa universidade da Suíça. Desconfiando de tal curso, este autor aceitou a proposta, ministrou as aulas e perquiriu do que se tratava. Como não conseguiu saber da verdade aqui no Brasil, este autor escreveu carta para a universidade suíça que estaria sendo representada pelo mencionado empresário português e, afinal, descobriu que a referida universidade não tinha nenhuma ligação com esse empresário, ou seja, tratava-se de um estelionato. Os estudantes ficaram "a ver navios". Não se duvida que o referido "empresário" continue aplicando o mesmo golpe pelo Brasil afora.
  11. Esta resolução, de certo modo, complementa, nesse ponto, a resolução CNE/CES nº 01, de 03/4/2001, pois a resolução CNE/CES nº 01/2001, no seu art. 2º, já rezava (e ainda reza) que os cursos de pós-graduação stricto sensu oferecidos mediante formas de associação entre instituições brasileiras ou entre estas e instituições estrangeiras obedecem às mesmas exigências de autorização, reconhecimento e renovação de reconhecimento estabelecidas na resolução em referência.
  12. Este autor reputa que foi intenção do MEC/CNE dar uma última chance aos portadores de certificados de pós-graduação referentes a cursos ministrados no território brasileiro através de convênios com instituições locais. Sendo assim, pelo menos no que diz respeito à intenção de quem editou a norma, tudo está a indicar que não deseja que a questão possa ser novamente reativada por outra via, de forma que o interessado deve requerer a revalidação dentro de um ano, sob pena de não mais poder fazê-lo nem mesmo pela via judicial, já que o CNE tem poder normativo complementar à LDB. Se esse prazo será considerado decadencial pelo Poder Judiciário numa eventual lide, trata-se de algo que não se pode assegurar, todavia, para que se possa resguardar com segurança a possibilidade de discutir judicialmente um eventual resultado negativo, o mais recomendável é que os portadores de títulos abrangidos pela resolução CNE/CES nº 02/2005 passem primeiro pelo procedimento administrativo nesta previsto.
  13. O inteiro teor desse Tratado encontra-se disponibilizado na Internet, no caminho http://homepage.esoterica.pt/~nx8zwr/tratado.htm .
  14. Os dois acordos ora mencionados, assim como vários acordos firmados pelos países do Mercosul com outros países da América do Sul, encontram-se disponíveis no site do MEC, na Internet, no caminho http://sicmercosul.mec.gov.br/asp/Acordos/acordos.asp .
  15. Ao asseverar que "tais diplomas de per si não habilitam ao exercício da profissão", o Acordo apenas está deixando claro que, para o exercício de determinada profissão, muitas vezes, se requer o atendimento de outros requisitos. Assim, por exemplo, se um advogado argentino conclui um doutorado no Brasil, ele não estará, por força do título de doutor obtido no Brasil, habilitado a aqui exercer a Advocacia. Para tanto, ele teria que revalidar no Brasil o seu diploma de graduação em Direito, se submeter ao Exame da Ordem dos Advogados do Brasil e depois obter desta uma inscrição como advogado. O título de doutor obtido no Brasil apenas lhe habilitaria a exercer aqui no país, sem necessidade de qualquer outra providência, as atividades consideradas acadêmicas, ou seja, a discência em outros cursos nacionais de que eventualmente deseje participar, a docência e a pesquisa, conforme será explicitado mais adiante, no corpo deste artigo.
  16. Como o protocolo emprega a expressão generalizadora "títulos universitários", deve-se entendê-la como tal, literalmente, ou seja, como abrangente dos títulos de graduação e da pós-graduação. Um título de graduação obtido em um Estado-Parte permitiria, assim, ao seu titular, ingressar numa pós-graduação de outro Estado-Parte; do mesmo modo, um título de pós-graduação obtido em um Estado-Parte permitiria ao seu titular ingressar numa nova pós-graduação que exigisse esse título como pré-requisito (por exemplo, tendo um título de mestrado obtido no Uruguai, o candidato o utiliza para ingressar num curso de doutorado no Brasil).
  17. Cf. Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira S.A., verbete "academia", p. 19.
  18. A CAPES, durante algum tempo, parece que teve a intenção de não respeitar essa lei, pois manteve durante longo período, veiculada no seu portal, na Internet, a seguinte nota "(...) Mesmo os diplomas de Mestre e Doutor, provenientes dos países que integram o MERCOSUL estão sujeitos ao reconhecimento, pois apesar da edição do Decreto n.º 3.196/99, ainda não foram definidos critérios mínimos a serem observados nas avaliações de qualidade dos países membros, tampouco estabelecido sistema de informação dos cursos reconhecidos na origem, não sendo elemento seguro a simples menção feita no corpo do documento" (esse aviso constava página inicial do site da CAPES, no item "Legislação", subitem "questões mais freqüentes sobre a Legislação da pós-graduação, questão número "2", no caminho www.capes.gov.br).
  19. Na Câmara dos Deputados, o projeto de Decreto Legislativo correspondente tramitou sob o nº PDC 1.093/2001 e, tendo tramitado no Senado Federal sob o nº PDS 523/2003, foi finalmente aprovado nessa Casa Legislativa no dia 22 de Outubro de 2003, como Decreto Legislativo nº 800/2003.
  20. Soa muito incoerente a referência à necessidade "(...) procedimentos e critérios a serem estabelecidos (...)" para a implementação deste acordo, constante do seu Artigo Primeiro, in fine. Pior ainda, segundo se depreende do Artigo Doze do mesmo Acordo, esses procedimentos serão fruto de recomendações gerais a serem expedidas pela Reunião de Ministros da Educação no Mercosul. Ora, se há necessidade de novas diretrizes mesmo já tendo sido aprovado o Acordo, cujo texto encontra-se claríssimo no seu Artigo Primeiro, qual seria, então, a utilidade de se ter aprovado uma lei (Decreto Legislativo) para esse fim? Qual seria a justificativa para se terem movimentado as máquinas do Executivo e do Legislativo dos Estados-Partes do Mercosul, se isso não iria alterarar em nada a situação anterior à aprovação do acordo internacional em referência? Logo, por se afigurar teratológico conceber a inutilidade da movimentação das máquinas do Executivo e do Legislativo, assim como da lei que resultou dessa movimentação, este autor entende que o mais correto é a interpretação segundo a qual não há necessidade de o interessado esperar indefinidamente a edição de qualquer outra nova norma complementar, seja a cargo da Reunião de Ministros ou a cargo do CNE/CES, pois a vontade do legislador, ao aprovar o Acordo, foi exatamente a de eliminar a burocracia referente ao reconhecimento dos títulos de graduação e pós-graduação no Mercosul, não a de aumentá-la, mormente para afetar diretamente a camada da sociedade à qual se destinaria a norma aprovada.
  21. O trâmite desse tratado se dá a partir da pasta do Ministério da Educação, cujas manifestações se dão quase sempre com base em pareceres prévios dos seus órgãos internos, ou da CAPES, sendo que estes, por sua vez, baseiam-se fortemente na opinião de professores-consultores (muitos deles consultores "ad-hoc"). Tais professores-concultores, atualmente, estão tendo, como nunca tiveram antes, ótimas oportunidades de trabalhos e ganhos, bastando citar os cursos de fins de semana (lato sensu, a maioria, tais como os MBA) nos quais se cobram altas mensalidades e que são ministrados com o artifício dos convênios de instituições privadas com universidades públicas (as quais são usadas para certificar os cursos), a assessoria para empresas interessadas em abrir universidades privadas, a coordenação de cursos em universidades privadas etc. Dito isto, pode-se facilmente deduzir o motivo pelo qual algum burocrata despreocupado com os destinos da educação nacional sentou-se sobre o tratado em apreço e até agora não se encaminhou o Decreto Legislativo 800/2003, que o aprovou, para ser promulgado pelo Presidente da República (...).
  22. O simples registro é um ato útil não só para os títulos estrangeiros, mas também para todos os títulos expedidos pelas universidades brasileiras, seja de graduação ou pós-graduação. Com efeito, por meio do registro, o título obtém a devida publicidade, que funciona como um aval do Poder Público, para que o seu reconhecimento seja oponível contra todos, no território brasileiro.
  23. Ao ser negada a revalidação de um título, seu portador sofre constrangimento de dois direitos constitucionais pertencentes ao grau de direitos fundamentais: o direito à educação, já que ter o título sem o devido reconhecimento equivale a não ter; e o direito ao trabalho, pois, sem o título não se poderá ocupar posto de trabalho que exija a qualificação nele inserida. De acordo com o § 1º, em referência, "as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata"; e pelo § 2º, "os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte".
  24. Nesse sentido, já há precedente, embora ainda em primeira instância, nos autos do Processo nº 2001.014426-6, da 15ª Vara da Justiça Federal em Belo Horizonte - MG, cuja posição em primeira instância pode ser vista pela Internet, no seguinte caminho: www.mg.trf1.gov.br (deve-se clicar o ícone de "consulta processual", onde basta indicar o número do processo, sem pontos nem hifem, da seguinte forma: 200138000144266). A UFMG interpôs Agravo de Instrumento contra a medida de antecipação de tutela e Apelação Cível contra a sentença que confirmou a antecipação de tutela e ordenou o reconhecimento do título de doutorado do autor da referida ação. No Tribunal Regional Federal da 1ª Região, o referido Agravo de Instrumento tramita sob com a abreviatura "AG" e sob o número 20020100004557-7; e a citada Apelação Cível, sob a abreviatura "AC" e número 20013800014426-6. O andamento dos referidos recursos pode ser acompanhado pelo site do TRT-1ª Região, no caminho www.trf1.gov.br , através da ferramenta de busca nele existente. Para consultas, basta indicar a espécie e o número do processo, que são os acima mencionados.
  25. Por exemplo, com relação ao "Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil", o procedimento é o previsto no "art. 75º", o qual reza que "as dificuldades ou divergências surgidas na interpretação ou aplicação do Tratado serão resolvidas através de consultas, por negociação directa ou por qualquer outro meio diplomático acordado por ambas as Partes". Assim, o lesado deve provocar o Ministério das Relações Exteriores do seu país, com sua queixa, a fim de que o Estado lesado busque solucionar a divergência diretamente com o outro, pela via diplomática. E quanto ao Protocolo e ao Acordo aqui também citados, firmados pelos países do Mercosul como partes integrantes do Tratado de Assunção, o procedimento para as reclamações é disciplinado no Sistema de Solução de Controvérsias no Mercosul, estabelecido pelo Protocolo de Brasília de 1991 e no Anexo do Protocolo de Ouro Preto de 1994. Essa via é, porém, bem menos interessante para o caso de títulos abrangidos por acordos já aprovados internamente no Brasil do que para aqueles cujos títulos estão alcançados por acordos internacionais que ainda dependem de conversão em lei interna, já que na primeira hipótese se tem a proteção do direito interno e maior garantia de obtenção de sentença favorável.
  26. No caminho www.mercosul.gov.br/html/textos/file_101.doc .
  27. Se a pessoa possui certificado sem a necessária revalidação, não poderá prosseguir estudos que exijam como pré-requisito o referido certificado. Igualmente, se o certificado estrangeiro não for revalidado, seu portador não poderá trabalhar nas atividades de docência em cursos de pós-graduação, ou seja, ficará privado também do direito ao trabalho.
  28. O próprio CNE divulgou em seu site que há milhares de pessoas aguardando a regularização do certificado estrangeiro, tanto assim que, considerando apenas os que participaram de cursos oferecidos por instituições estrangeiras aqui no território brasileiro, esse número é de cerca de nove mil pessoas.
  29. A propósito disso, convém registrar que, para decidir sobre pedidos de revalidação de títulos obtidos em instituições estrangeiras, as universidades brasileiras, habilitadas para tanto, observam lentos procedimentos internos. Ademais, normalmente, a tarefa de decidir sobre essa matéria é atribuída a órgãos colegiados que se reúnem pouquíssimas vezes durante o período do calendário Universitário, fato esse que protela suas decisões ao longo de anos.
  30. Sobre esse assunto, o autor deste texto ficou muito feliz com a notícia sobre esse exato assunto, constante da Folha de São Paulo de quarta-feira, 22/6/2005, intitulada "USP É ACUSADA DE COBRAR MENSALIDADE". Segundo a notícia, o Promotor de Justiça da Cidadania da São Paulo intentou contra a USP uma ação civil pública perante o juízo da 6ª Vara Cível da cidade de São Paulo, na qual pede que a Justiça determine que citada universidade pare de emprestar seu nome para a emissão de certificados referentes a cursos oferecidos por entidades privadas que cobrem mensalidades (a universidade recebe apenas de 5% a 10% da receita). A notícia foi acessada via Internet, no caminho www.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff2206200501.htm .
  31. Este é o argumento da CAPES para não respeitar o Tratado de Amizade, conforme a seguinte advertência, que consta na Internet, no caminho www.capes.gov.br (página inicial do site, no item "Legislação", subitem "questões mais freqüentes sobre a Legislação da pós-graduação, questão número "2"): "O Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta celebrado entre as Repúblicas Brasileira e Portuguesa, por ocasião do 500º aniversário do Descobrimento não é suficiente para legitimar a atuação de Instituições de Ensino Superior lusitanas em solo brasileiro, sem o reconhecimento pelo nosso Ministério da Educação, e vice-versa". Ver, também, a nota de rodapé nº 13, supra.

Autor

  • Marco Aurélio Lustosa Caminha

    Marco Aurélio Lustosa Caminha

    Desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 22ª Região. Ex-Procurador Regional do Trabalho. Professor Associado de Direito na Universidade Federal do Piauí. Mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco. Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino (Buenos Aires, Argentina). Doutor em Políticas Públicas pela Universidade Federal do Maranhão.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CAMINHA, Marco Aurélio Lustosa. Revalidação de títulos de pós-graduação obtidos em universidades estrangeiras. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 75, 16 set. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4372. Acesso em: 16 abr. 2024.