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Competência para julgamento de conflitos decorrentes do exercício do direito de greve de servidores públicos

Competência para julgamento de conflitos decorrentes do exercício do direito de greve de servidores públicos

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A quem compete julgar conflitos decorrentes do exercício do direito de greve de servidores públicos?

No julgamento da Reclamação (RCL) 21842 (19/10/2015), o Supremo Tribunal Federal - STF reafirmou a competência originária de Tribunal de Justiça para processar e julgar conflitos decorrentes do exercício do direito de greve de servidores públicos municipais. A questão da competência para julgamento de conflitos relacionados ao direito de greve de servidores públicos já havia sido devidamente apreciada pelo Supremo nos Mandados de Injunção (MIs) 670 e 708 (2007). Na oportunidade, foram atribuídos excepcionais efeitos erma omnes para determinar a aplicação aos servidores públicos da Lei nº7.783/89, que versa sobre o exercício do direito de greve no âmbito privado.

Até que seja editada legislação específica pertinente, nos termos do art.37, VII, da Constituição Federal, o STF estabeleceu parâmetros de competência constitucional para a apreciação do exercício do direito de greve de servidores públicos. A depender da abrangência da paralisação dos servidores grevistas, a competência poderá ser do Superior Tribunal de Justiça - STJ, de Tribunais Regionais Federais ou de Tribunais de Justiça.

A competência será do STJ se a paralisação for de âmbito nacional, ou abranger mais de uma região da justiça federal ou, ainda, se compreender mais de uma unidade da federação. Nesse caso, o STF tomou por base a aplicação analógica do art. 2º, I, 'a', da Lei nº 7.701/1988.

Será dos Tribunais Regionais Federais nos casos em que a demanda dos servidores grevistas, de âmbito federal, estiver adstrita a uma única região da justiça federal, em aplicação analógica do art. 6º da Lei nº7.701/1988. Também por aplicação analógica do artigo em destaque, se a controvérsia estiver inserida no âmbito estadual ou municipal, a competência para julgamento será do respectivo Tribunal de Justiça.

Por fim, ainda de acordo com o entendimento do STF, as greves dos servidores públicos de âmbito local ou municipal serão dirimidas pelo Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal com jurisdição sobre o local da paralisação, conforme se trate de greve de servidores municipais, estaduais ou federais.

Fonte: STF

Rcl 21842 / RS - RIO GRANDE DO SUL
RECLAMAÇÃO
Relator(a):  Min. ROBERTO BARROSO
Julgamento: 19/10/2015

DECISÃO: Ementa: DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECLAMAÇÃO. DIREITO DE GREVE. SERVIDORES PÚBLICOS. DISSÍDIO COLETIVO. COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1. Ofende a autoridade do julgado do STF nos MIs 670 e 708, decisão que afasta a competência originária de Tribunal de Justiça para apreciar ação declaratória de ilegalidade de greve de servidores públicos municipais. 2. Reclamação que se julga procedente. 1. Trata-se de reclamação, com pedido de medida liminar, contra decisão do Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Gravataí e acórdão do TJ/RS, os quais apreciaram liminarmente a legalidade de movimento grevista de servidores públicos, determinando providências. Transcrevo ementa do pronunciamento de segundo grau: “AGRAVOS DE INSTRUMENTO. SERVIDOR PÚBLICO. MUNICÍPIO DE GRAVATAÍ. DIREITO DE GREVE. 1. Sendo a greve una, não pode ser cindida para que as mesmas questões sejam analisadas tanto na Justiça Comum (para os servidores estatutários) como na Justiça do Trabalho (para os servidores celetistas). Tal como pontificado na ADIN nº 3.395, cabe à Justiça Estadual processamento de ações como a debatida. 2. Competência da Primeira Instância para processamento da lide, haja vista a inviabilidade de ampliar, regimentalmente, privilégios processuais. 3. A petição inicial da ação declaratória é clara quanto ao pedido e causa de pedir, inexistindo inépcia a ser declarada. 4. O art. 46 do CPC possibilita que duas ou mais pessoas litiguem no mesmo processo, em conjunto, ativa ou passivamente quando os direitos ou as obrigações derivarem do mesmo fundamento de fato ou de direito, caso dos autos. 5. O direito de greve é garantido constitucionalmente, devendo a lei definir os serviços considerados essenciais, conforme se verifica nos artigos 9º e 37, VII. Aplicação das regras previstas na Lei nº 7.783/89, conforme julgamento do Mandado de Injunção nº 670/ES pelo Tribunal Pleno do STF. 6. Durante a greve devem ser mantidos os serviços ou atividades essenciais a fim de evitar prejuízos irreparáveis a bens, à retomada das atividades e à comunidade. Caso concreto em que há prova que o movimento paredista em discussão nem sempre é pacífico, bem como está prejudicando o atendimento mínimo em postos de saúde e em escolas municipais, em evidente prejuízo aos munícipes. 7. Embora os servidores públicos sejam titulares do direito de greve, não se apresenta razoável que este direito se sobreponha ao interesse público, em especial o direito da sociedade ao acesso à assistência médica. 8. Determinação no sentido de que pelo menos 50% dos servidores públicos permaneçam em serviço, garantindo-se um mínimo razoável de prestação dos serviços públicos, o que não só garante o direito de reivindicação como também garante o acesso da comunidade ao serviço público. Precedente. 9. Inexistência de lei lei vedando a suspensão de pagamento de vencimentos dos servidores públicos municipais grevistas em virtude da não prestação de serviço. DERAM PARCIAL PROVIMENTO AOS AGRAVOS DE INSTRUMENTO” (destaques acrescentados). 2. A parte reclamante alega afronta aos julgados nos MIs 670 e 708, em que o STF teria definido “a competência originária dos Tribunais Estaduais para processar e julgar originariamente os conflitos decorrentes do exercício do direito de greve”. Nessa linha, pede que seja determinada a remessa dos autos da ação declaratória de ilegalidade da greve ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, para apreciação originária. 3. É o relatório. Decido. 4. Estando o feito suficientemente instruído, dispenso as informações, bem como o parecer ministerial, em razão do caráter reiterado da matéria (RI/STF, art. 52, parágrafo único). 5. No julgamento dos MIs 670 e 708, aos quais foram atribuídos excepcionais efeitos erga omnes, o Plenário do STF determinou a aplicação aos servidores públicos da Lei nº 7.783/1989, que versa sobre o exercício do direito de greve no âmbito privado, visando a sanar omissão legislativa em regulamentar o art. 37, VII, da CRFB/1988. Na oportunidade, em paralelo à atribuição dos Tribunais trabalhistas para julgar dissídio coletivo de greve de empregados celetistas (Lei nº 7.701/1988), foi fixada a competência dos Tribunais de Justiça, dos Tribunais Regionais Federais e do Superior Tribunal de Justiça para decidir sobre greves de servidores públicos. Veja-se a ementa do MI 670: “(...) 6. DEFINIÇÃO DOS PARÂMETROS DE COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL PARA APRECIAÇÃO DO TEMA NO ÂMBITO DA JUSTIÇA FEDERAL E DA JUSTIÇA ESTADUAL ATÉ A EDIÇÃO DA LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA PERTINENTE, NOS TERMOS DO ART. 37, VII, DA CF. FIXAÇÃO DO PRAZO DE 60 (SESSENTA) DIAS PARA QUE O CONGRESSO NACIONAL LEGISLE SOBRE A MATÉRIA. MANDADO DE INJUNÇÃO DEFERIDO PARA DETERMINAR A APLICAÇÃO DAS LEIS Nº 7.701/1988 E 7.783/1989. 6.1. Aplicabilidade aos servidores públicos civis da Lei nº 7.783/1989, sem prejuízo de que, diante do caso concreto e mediante solicitação de entidade ou órgão legítimo, seja facultado ao juízo competente a fixação de regime de greve mais severo, em razão de tratarem de 'serviços ou atividades essenciais' (Lei nº 7.783/1989, arts. 9º a 11). 6.2. Nessa extensão do deferimento do mandado de injunção, aplicação da Lei nº 7.701/1988, no que tange à competência para apreciar e julgar eventuais conflitos judiciais referentes à greve de servidores públicos que sejam suscitados até o momento de colmatação legislativa específica da lacuna ora declarada, nos termos do inciso VII do art. 37 da CF. 6.3. Até a devida disciplina legislativa, devem-se definir as situações provisórias de competência constitucional para a apreciação desses dissídios no contexto nacional, regional, estadual e municipal. Assim, nas condições acima especificadas, se a paralisação for de âmbito nacional, ou abranger mais de uma região da justiça federal, ou ainda, compreender mais de uma unidade da federação, a competência para o dissídio de greve será do Superior Tribunal de Justiça (por aplicação analógica do art. 2º, I, 'a', da Lei no 7.701/1988). Ainda no âmbito federal, se a controvérsia estiver adstrita a uma única região da justiça federal, a competência será dos Tribunais Regionais Federais (aplicação analógica do art. 6º da Lei nº 7.701/1988). Para o caso da jurisdição no contexto estadual ou municipal, se a controvérsia estiver adstrita a uma unidade da federação, a competência será do respectivo Tribunal de Justiça (também por aplicação analógica do art. 6º da Lei nº 7.701/1988). As greves de âmbito local ou municipal serão dirimidas pelo Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal com jurisdição sobre o local da paralisação, conforme se trate de greve de servidores municipais, estaduais ou federais. 6.4. Considerados os parâmetros acima delineados, a par da competência para o dissídio de greve em si, no qual se discuta a abusividade, ou não, da greve, os referidos tribunais, nos âmbitos de sua jurisdição, serão competentes para decidir acerca do mérito do pagamento, ou não, dos dias de paralisação em consonância com a excepcionalidade de que esse juízo se reveste. Nesse contexto, nos termos do art. 7º da Lei nº 7.783/1989, a deflagração da greve, em princípio, corresponde à suspensão do contrato de trabalho. Como regra geral, portanto, os salários dos dias de paralisação não deverão ser pagos, salvo no caso em que a greve tenha sido provocada justamente por atraso no pagamento aos servidores públicos civis, ou por outras situações excepcionais que justifiquem o afastamento da premissa da suspensão do contrato de trabalho (art. 7º da Lei no 7.783/1989, in fine). 6.5. Os tribunais mencionados também serão competentes para apreciar e julgar medidas cautelares eventualmente incidentes relacionadas ao exercício do direito de greve dos servidores públicos civis, tais como: i) aquelas nas quais se postule a preservação do objeto da querela judicial, qual seja, o percentual mínimo de servidores públicos que deve continuar trabalhando durante o movimento paredista, ou mesmo a proibição de qualquer tipo de paralisação; ii) os interditos possessórios para a desocupação de dependências dos órgãos públicos eventualmente tomados por grevistas; e iii) as demais medidas cautelares que apresentem conexão direta com o dissídio coletivo de greve. 6.6. Em razão da evolução jurisprudencial sobre o tema da interpretação da omissão legislativa do direito de greve dos servidores públicos civis e em respeito aos ditames de segurança jurídica, fixa-se o prazo de 60 (sessenta) dias para que o Congresso Nacional legisle sobre a matéria. 6.7. Mandado de injunção conhecido e, no mérito, deferido para, nos termos acima especificados, determinar a aplicação das Leis nos 7.701/1988 e 7.783/1989 aos conflitos e às ações judiciais que envolvam a interpretação do direito de greve dos servidores públicos civis” (destaques acrescentados). 7. No presente caso, a 3ª Câmara Cível do TJ/RS, apreciando agravo de instrumento contra decisão liminar do Juiz de Direito de Gravataí, deixou de acolher a alegação de competência originária do Tribunal local para julgamento do dissídio de greve, sob o fundamento de inexistência de previsão regimental: “Para respaldar a propositura da demanda perante este Tribunal de Justiça, consoante item nº 2 da exordial (fl. 3), o autor argumentou que, nos termos dos julgamentos exarados nos mandados de injunção nº 670/ES e 708/DF, oriundos do Supremo Tribunal Federal, a fim de suprir a lacuna legislativa decorrente da ausência de regulamentação do art. 37, inciso VII, da Constituição Federal, a competência para processamento e julgamento atinentes a paralisações e/ou direito de greve no serviço público - no âmbito estadual e municipal - incumbe ao Tribunal de Justiça do Estado. Efetivamente, consta, modo expresso, nos aludidos mandados de injunção determinação no sentido acima referido. No ponto, válido incorporar a transcrição do excerto em referência: Destarte, na linha da determinação constante do precedente supra, os Tribunais de Justiça Estaduais devem, por analogia, aplicar o preconizado no art. 6º da Lei nº 7.701/88, o qual possui o seguinte teor: Os Tribunais Regionais do Trabalho que funcionarem divididos em Grupos de Turmas promoverão a especialização de um deles com a competência exclusiva para a conciliação e julgamento de dissídios coletivos, na forma prevista no 'caput' do Art. 1º desta Lei. Parágrafo único. O Regimento Interno disporá sobre a constituição e funcionamento do Grupo Normativo, bem como dos demais Grupos de Turmas de Tribunal Regional do Trabalho. Entretanto, tal como consignado na decisão da ilustre Desembargadora suscitante, efetivamente, inexiste no nosso Regimento Interno previsão de Grupo ou Câmara separada especializada com competência exclusiva para a conciliação e julgamento de ações como a presente. Tal conclusão decorre da análise da questão realizada a partir dos enfoques a seguir especificados. A uma, a Constituição Federal de 1988 em seu art. 96, a respeito da competência privativa dos tribunais, alínea 'a' em seu inciso I preconiza: 'eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos;' A duas, nossa Constituição Estadual não traz previsão sobre competência originária para o processamento e julgamento de modalidade de ações como a ora examinada no âmbito deste Tribunal de Justiça. Nesse sentido, veja-se o texto de seu artigo 93: ( ) A conclusão extraída da transcrição acima é de que se está diante de relação taxativa, sem previsão de espaço de estabelecimento de competência originária para processar e julgar demandas que versem sobre a legalidade do exercício do direito de greve do qual tomem parte os servidores públicos estaduais ou municipais, modalidades de serventuários englobados nos precedentes do Supremo Tribunal Federal que fixaram a competência dos Tribunais de Justiça dos Estados para equacionar os dissídios de greve dos servidores municipais e estaduais. Por fim, o exame do Regimento Interno de nosso Tribunal corrobora estreme de dúvidas, a ausência de moldura própria para enquadramento de situação como a vertida nesses autos. É que em todo o vasto elenco de matérias previstas no atinente a todas as seções deste Tribunal, a saber: o Órgão Especial, Grupos ou Câmaras Separadas, verifica-se rol exaustivo de competências para cada um dos setores especificados. 8. Tal entendimento não se coaduna com o determinado pelo STF nos MIs 670 e 708. Nessa linha, confiram-se: Rcl 18.370, Rel. Min. Gilmar Mendes; Rcl 18.203, Rel. Min. Luiz Fux, Rcl 18.122, Rel. Min. Ricardo Lewandowski; Rcl 13.218, Rel. Min. Cármen Lúcia; Rcl 21.153, Rel. Min. Rosa Weber; Rcl 16.423 MC, sob a minha relatoria. 9. Diante do exposto, com base no art. 161, parágrafo único, do RI/STF, julgo procedente a reclamação, para cassar as decisões reclamadas e assentar a competência originária do TJ/RS para apreciar a ação declaratória nº 0015876-03.2014.8.21.0015. Publique-se. Intimem-se. Comunique-se. Brasília, 19 de outubro de 2015 Ministro LUÍS ROBERTO BARROSO Relator

(STF - Rcl: 21842 RS - RIO GRANDE DO SUL 0006085-88.2015.1.00.0000, Relator: Min. ROBERTO BARROSO, Data de Julgamento: 19/10/2015, Data de Publicação: DJe-210 21/10/2015)


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