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Governo ostentação: a utilização de veículos de luxo no serviço público e o princípio da eficiência

Governo ostentação: a utilização de veículos de luxo no serviço público e o princípio da eficiência

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Existe uma prática corriqueira na Administração Pública brasileira de usar recursos públicos, não para atender as necessidades da população, mas para bancar extravagâncias para determinados agentes públicos, a exemplo da contratação de veículos de luxo.

I - INTRODUÇÃO

O presente ensaio decorre de uma inquietação com uma situação corriqueira no Brasil, qual seja, a aquisição e, mais recentemente, a locação de veículos de luxo para a utilização no serviço público, quando se confronta tal expediente com o princípio da eficiência, considerando o preço gasto com a aquisição e/ou locação desses veículos e o preço gasto com a manutenção desses veículos.

Na verdade, não é novidade a aquisição de veículos de luxo para serem utilizados no serviço público por parte dos órgãos públicos e entidades administrativas federal, distrital, estaduais e municipais, no entanto, nos últimos tempos vem se noticiando a utilização de veículos de luxo no serviço público decorrentes de apreensões pela prática de infrações penais, normalmente, com base em decisões judiciais que autorizam os órgãos públicos de repreensão ao crime a utilizarem provisoriamente esses veículos.

Para além dessas situações, outra opção que vem sendo utilizada com frequência é a locação de veículos, cuja especificação constante do edital de licitação não deixa dúvidas quanto a caracterização de veículo de luxo.

A pergunta norteadora do trabalho é saber se os gastos com aquisição, locação e manutenção de veículos de luxo para utilização no serviço público observam o princípio da eficiência, o qual, inicialmente implícito, passou a constar do rol contido no art. 37 da Constituição Federal com a promulgação da Emenda Constitucional nº 19/98, denominada de reforma administrativa, e como todo princípio, serve de parâmetro para a elaboração, interpretação, integração e aplicação das normas jurídicas, observando que a doutrina e a jurisprudência vêm, ao longo dos anos, desenvolvendo o seu conteúdo.

Para o desenvolvimento do tema, inicialmente iremos delinear a existência ou não de um conceito legal ou jurídico de veículos de luxo, após explanar a concepção do princípio da eficiência para, ao final, relacionar os gastos de aquisição, locação e manutenção de veículos de luxo para utilização no serviço público com a observância do princípio da eficiência.

A metodologia adotada é bibliográfica realizada a partir de artigos jurídicos e doutrina, além da análise pontual da legislação e da jurisprudência nacional relacionada à temática.


II DEFINIÇÃO DE VEÍCULO DE LUXO

Já adianta que até pouco tempo não existia um conceito legal para caracterizar veículo de luxo ou carro de luxo, tratando-se de um parâmetro utilizado pelo setor automotivo para comparar os diversos modelos das diversas marcas existentes no mercado, considerando, por vezes, a tradição da marca, o acabamento do veículo e itens tecnológicos agregados, de forma que um veículo da BMW ou da MERCEDES, pela tradição e fama dessas marcas, mesmo o modelo de entrada, é considerado veículo de luxo no Brasil.

Ainda, o mercado automotivo brasileiro para fins, inclusive, de tributação estabelecia um padrão que seria a dos carros populares, de forma que um mesmo veículo tinha modelos diferentes, seja de motorização, seja de itens, objetivando atingir categorias diferentes de consumidores e, mais recentemente, uma nova categorização foi lançada, qual seja, a de veículos premium, de forma que as categorizações e características dos modelos existentes decorre do próprio mercado e dos consumidores, o que vai influenciar, por exemplo, o sucesso de lançamento de um novo modelo, a sua manutenção ou a sua retirada do mercado.

Para além da política empresarial utilizada pela montadora para lançar, manter ou retirar um determinado modelo de veículo do mercado, por vezes, o pós-venda, tais como preço de peças e de seguro, gasto com manutenção, depreciação do valor do veículo, influenciam o consumidor na hora de escolher qual o veículo irá adquirir, representando a face da autonomia da vontade, que é uma característica própria das relações travadas no âmbito do direito privado, de forma que compete tão somente ao consumidor a liberdade de escolher, dentro das suas condições financeiras, qual o veículo que irá adquirir, novo ou usado, popular ou luxuoso, enfim, a lógica seria o dinheiro é meu e eu compro o carro que eu quiser.

Essa autonomia de vontade não serve de baliza no âmbito das relações de direito público, nas quais um dos participantes é o Estado, que atua através de seus diversos órgãos públicos e entidades administrativas, em função justamente dos princípios que limitam a atuação do gestor público, entre os quais, o da eficiência, que será delineado em tópico apartado.

Para além dos princípios, existem as regras, os quais são espécies de normas jurídicas dentro de uma visão pós-positivista, atualmente consagrada em nosso ordenamento jurídico, havendo divergência sobre a diferença entre essas espécies, princípios e regras, no entanto, há consenso em reconhecer a força normativa dos princípios.

O princípio da eficiência, como dito, inicialmente implícito, passou a ser expresso com a EC nº 19/98, no entanto, nosso ordenamento já continha regra expressa sobre a aquisição de veículo de luxo, tratando-se da Lei nº 1.081 de 13/04/1950, que dispõe sobre o uso de carros oficiais, merecendo transcrição o seu art. 6º:

Art. 6º Os automóveis destinados ao serviço público federal, observadas as condições estabelecias nesta Lei, serão dos tipos mais econômicos e não se permitirá a aquisição de carros de luxo, salvo na hipótese dos carros destinados à Presidência e Vice-Presidência da República, Presidência do Senado Federal, Presidência da Câmara da Deputados, Presidência do Supremo Tribunal Federal e Ministro de Estado. GRIFO NOSSO

Como a lei não estabeleceu um parâmetro para caracterização de carro de luxo ou veículo de luxo, a sua delimitação deve ser buscada a partir do significado contido em dicionários, encontrando, entre outras, as seguintes definições para a palavra luxo:

Modo de vida que inclui um conjunto de coisas ou atividades supérfluas e aparatosas. Grande quantidade. Bem ou atividade que não é considerado necessário, mas gera conforto ou prazer.[1]

Ostentação da riqueza; magnificência; gala; fausto; suntuosidade; pompa; qualquer bem ou objeto de custo elevado e que não é indispensável.[2]

Importa dizer que o ponto comum no significado é que o luxo é aquilo que não é indispensável ou não é necessário, a significar a existência de opção menos custosa para atender a situação, observando que no âmbito federal, a aquisição de veículo de luxo é excepcional e tão somente para o uso de determinadas autoridades no exercício de suas funções.

Naturalmente que, desde a edição da regra legal acima referenciada, houve melhor densificação normativa, a exemplo, da regulamentação contida no Decreto nº 99.188/90 e na Instrução Normativa nº 01/2007 do MPOG - Ministério de Planejamento, Orçamento e Gestão e, em que pese, voltados para a Administração Pública Federal, servem de norte para a atuação dos Estados, Distrito Federal e Municípios.

Ocorre que a Lei nº 1.081/50 era e é simplesmente ignorada por diversos órgãos públicos e entidades administrativas que compõem a estrutura federativa brasileira, considerando que é recorrente a aquisição e, ultimamente, a locação de veículos de luxo para uso no serviço público, bastando pesquisar decisões dos Tribunais de Contas, vide:

Aquisição de veículo de luxo, em afronta aos princípios da economicidade e da legalidade no âmbito da prestação de contas do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural Administração Regional no Estado do Mato Grosso (Senar/MT), referente ao exercício de 2004, foram suscitadas irregularidades referentes à aquisição do veículo Pajero Sport/HPE 4x4, ano 2004, modelo 2005. No que concerne à aquisição de modelo demasiadamente sofisticado, sem justificativa de necessidade e adequação às características exigidas, infringindo os princípios constitucionais da proporcionalidade e da economicidade, o relator ressaltou que o veículo custou aos cofres do Senar/MT R$ 146.500,00, quando havia outros modelos no mercado que poderiam atender, pela metade do preço, aos requisitos de conforto e segurança exigidos. Além disso, a Lei n.º 1.081/1950 proíbe a aquisição de veículos de luxo, exceto em relação aos destinados aos Presidentes da República, do Senado, da Câmara e do Supremo Tribunal Federal, e a Ministros de Estado. Quanto ao direcionamento da licitação e à inobservância do número mínimo de licitantes convidados, o relator concordou com a unidade técnica, para a qual a descrição das características mínimas do veículo a ser adquirido continha exigências praticamente idênticas às especificações constantes da resposta da Tauro Motors à cotação de preços realizada pelo Senar/MT. Dessa forma, não poderia prosperar a justificativa de que não havia, no mercado, mais de três empresas que pudessem fornecer o veículo nas características desejadas, porquanto tal restrição foi criada, irregularmente, pela própria entidade. Ao final, o relator propôs e a Primeira Câmara decidiu pela aplicação de multa aos responsáveis. Precedente citado: Acórdão n.º 2.501/2007-1a Câmara.[3]

De igual forma, é relativamente fácil encontrar editais de licitação, nos quais a especificação técnica indica expressamente que se pretende adquirir veículo de luxo, a exemplo, do pregão nº 14/2020, realizado pelo Ministério Público do Mato Grosso do Sul, vide especificação:

Veículo sedan, marca Toyota, modelo Corolla 2.0 16V (ou superior), dotado de blindagem nível III-A, bicombustível (gasolina e etanol), zero km, ano/modelo 2020/2020 ou superior, capacidade para 5 pessoas, 4 portas, na cor preta, transmissão automática de no mínimo 5 velocidades, direção eletroassistida (EPS) ou superior, rodas de liga leve, aro 16 (polegadas) no mínimo, freios a disco ventilado com ABS e EBD, ar condicionado, retrovisores externos mecânicos ou elétricos, travas e vidros elétricos nas 4 portas, sensor de estacionamento, limpador de para-brisa com temporizador, para-choques na cor do veículo, air bag frontal e lateral, sistema de som original de fábrica, bancos em couro, com jogo de tapetes, incluindo todos os equipamentos exigidos pelo Código de Trânsito Brasileiro e demais itens de série do veículo. Garantia contra defeitos de fabricação de no mínimo 5 (cinco) anos ou no mínimo 100.000 (cem mil) quilômetros (o que ocorrer primeiro).[4]

Sem entrar na discussão sobre a (ir)regularidade da indicação da marca/modelo no edital, acima mencionado, a questão é que o veículo em questão, na especificação estabelecida, não se trata nem mesmo do modelo de entrada da marca, se enquadrando como veículo de luxo no mercado automotivo brasileiro, de forma que a análise da economicidade da contratação, certamente demonstraria a existência de outros modelos no mercado com melhor custo/benefício que atenderia da mesma forma, a locomoção dos membros e servidores desse órgão público.

Outro exemplo de licitação é o processo nº 9/2019-037PMVX[5], pregão presencial para registro de preços realizado pelo Município de Vitória do Xingó, Estado do Pará, no qual a especificação técnica contida no edital indica expressamente que se pretende adquirir veículo de luxo, vide:

4.1.2 DO VEÍCULO: 4.1.2.1 Veículo Tipo SUV, (Cabine Fechada) 0 km; 4.1.2.2 Ano/modelo 2019 ou posterior a data do pedido de fornecimento; 4.1.2.3 Cor Prata Metálica ou a critério da CONTRANTE; 4.1.2.4 04 portas laterais; 4.1.2.5 Capacidade de 07(sete) passageiros incluindo o motorista; 4.1.2.6 Motor Diesel 3.0 ou superior com potência de 171 CV ou superior; 4.1.2.7 Sistema de injeção direta e eletrônica de combustível (tipo common rail); 4.1.2.8 Câmbio automático de 05 velocidades; 4.1.2.9 Tração 4x4 permanente com reduzida e diferencial central tipo Torsen com bloqueio; 4.1.2.10 Controle eletrônico de estabilidade e de Tração; 4.1.2.11 Direção hidráulica; 4.1.2.12 Ar condicionado automático com display digital; 4.1.2.13 Sistema imobilizador por código eletrônico na chave; 4.1.2.14 Acendimento automático dos faróis; 4.1.2.15 Banco do motorista com ajuste elétrico (distância, inclinação e altura); 4.1.2.16 Revestimento interno em couro (Bancos, Volante, Manopla do câmbio e Laterais das portas); Coluna de direção com regulagem em altura; 4.1.2.17 Freios a disco nas rodas dianteiras e a tambor nas rodas traseiras, com sistema antibloqueio das rodas ABS e EBD (sistema de assistência em frenagem de emergência); 4.1.2.18 Air Bag duplo frontal (2), lateral (2) e de cortina (4); 4.1.2.19 Volante com comandos integrados de telefone, áudio e computador de bordo; 4.1.2.20 Travas, Vidros e Retrovisores externos eletrorretráteis com regulagem elétrica; 4.1.2.21 Faróis de neblina; Aviso sonoro de faróis ligados e chave na ignição; 4.1.2.22 Estribo laterais; 4.1.2.23 Pneus 265/65 R17 e Rodas de liga leve; 4.1.2.24 Cintos de segurança dianteiros e traseiros retráteis de três pontos; 4.1.2.25 Capacidade mínima do tanque de combustível de 80 litros ou superior; 4.1.2.26 Capacidade mínima de carga de 620 kg; Vão livre mínimo do solo de 222 mm; 4.1.2.27 Sistema de navegação (GPS), conexão USB e Aux in; 4.1.2.28 Câmera de ré; 4.1.2.29 Tapetes de borracha e demais acessórios e equipamentos não especificados mas exigidos por Lei;

Só faltou gritar a marca TOYOTA e o modelo SW4, veículo este que vem a ser a preferência nacional nesses tipos de contratações, a exemplo, do processo nº 2373/2020-PM, pregão presencial para registro de preços nº 97/2020, do Município de Coari, no estado do Amazonas[6], cujo despacho de homologação da licitação previa, pasmem, a locação de 08 (veículos), marca Toyota, modelo SW4, sendo que 04 desses veículos teriam que ser blindados, conforme uma das especificações, vide:

Descrição: Locação de Veículos Tipo SUV. Blindado. Características: 1. Ano de fabricação 2019/2019 ou superior, zero quilometro. 2. Blindagem Nível III-A 3. Motor a Diesel 4. Tanque mínimo de 76 Lt 5. Potencia mínima de 170 VC 6. Direção hidráulica e/ou elétrica 7. Transmissão automática 8. 4 portas laterais, com travamento elétrico; 9. Distância mínima entre eixos de 2.700 mm, comprimento mínimo de 4.680 mm largura mínima de 1.880 mm de altura máxima de 1.800 mm; 10. Sistema de freio com disco ventilador nas rodas dianteiras com ABS e EBD; 11. Air bag frontal e lateral para motorista e passageiro, e air bag para joelhos; 12. Controle de tração 13. Ar condicionado com Dual Zone 14. Terceira Luz de freio 15. Alarma e travas elétricas 16. Vidros dianteiros e traseiros com acionamento elétrico 17. Retrovisores externos eletroretrateis; 18. Áudio cd player, mp3 19. Luzes estroboscopicas de Led nas lanternas dianteiras e traseiras 20. Sirene 21. Giroflex Interno (Ventosa) 22. Cor (Preta) 23. Seguro Total e Km Livre.

Outro caso é o processo nº 201800047000445, pregão eletrônico nº 017/2018, instaurado pelo Tribunal de Contas do Estado de Goiás[7], no qual um dos objetos seria a locação de 09 (nove) Veículos Executivos luxo, constando no detalhamento da especificação, entre outros itens: Retrovisores rebatíveis eletricamente; Ajuste elétrico dos retrovisores; ar condicionado com controle eletrônico de temperatura; Sistema multimídia com rádio, navegador GPS, entrada USB, TV digital e interface bluetooth); bancos de couro.

Os exemplos, acima indicados, é um retrato de uma prática muito comum em todas as esferas de governo de nossa estrutura federativa, inclusive, nos próprios órgãos de controle que deveriam obstar essas contratações a partir do princípio da eficiência ou da regra da economicidade, considerando que os recursos públicos formados, principalmente, através de uma carga tributária absurda custeada pela sociedade não podem ser utilizados para bancar a ostentação, a suntuosidade, a pompa dos agentes públicos que deveriam atuar em prol, justamente, da economia dos recursos públicos.

Não se trata, simplesmente, de analisar a compra ou aquisição de veículos de luxo, indo além, porque além da depreciação do valor desses veículos no caso de aquisição, há necessidade de manutenção dos mesmos exigindo gastos consideráveis com combustível, revisões, troca de peças, seguros e diversos outros, indicando, como exemplo, que um único pneu do veículo SW4 da fabricante Toyota, custa mais de R$ 1.200,00 (Mil e duzentos reais) no mercado.

No mesmo contexto, há de se refletir quanto à utilização de veículos de luxo, apreendidos em operações policiais, pelos órgãos de segurança pública, a exemplo, do noticiado na mídia em relação a uso desse tipo de veículo pela Polícia Rodoviária Federal[8], envolvendo Range Rover Velar P300 SE R-Dynamic, Porsche Cayenne GTS, Toyota Tundra 5.7 V8, Mercedes Benz E300, BMW 330i M Sport 2.0, BMW 320i 2.0, Jeep Grand Cherokee Limited 3.6.

Aqui um dilema, visto que se tais veículos ficarem parados sem uso, apenas para exposição, haverá depreciação substancial do valor e, eventualmente, ter os componentes e peças comprometidos em vista do não uso e, lado outro, a efetiva utilização do veículo acarreta um gasto considerável com combustível, troca de peças, seguros, ...

Essa prática administrativa deve ser analisada a partir do princípio da eficiência e, por tabela, da economicidade, merecendo, em tópico apartado, o desenvolvimento do seu conteúdo.


III - PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA

Quando se estuda os princípios, importa mencionar o salto qualitativo que esse tipo de norma jurídica teve dentro do denominado pós-positivismo.

Em síntese apertada, no positivismo jurídico, de um lado estariam as regras representando o direito posto ou positivado e, de outro, estariam os princípios que representariam o direito pressuposto ou ideal, para alguns, o direito natural, de forma que os princípios seriam meras diretrizes para a construção do direito, não possuindo estes força normativa, assumindo, portanto, um papel secundário no ordenamento jurídico.

Ocorre que, notadamente, após as atrocidades da segunda guerra mundial e de condutas realizadas sob o manto da legalidade, se discutiu o papel do direito, o qual deveria refletir os valores mais caros da sociedade, a exemplo, da justiça, relevando-se verdadeiro paradoxo a prática de injustiças a partir do direito, de forma que a aplicação da lei, como principal instrumento de veiculação do direito nos sistemas jurídicos da civil law, pode ser injusta, entretanto, deve haver mecanismos para a sua superação e/ou exclusão do ordenamento jurídico.

Nesse cenário, os valores passam a ser incluídos no ordenamento jurídico através dos princípios, os quais, no pós-positivismo, passam a ter força normativa, a significar que, ao lado das regras, os princípios são espécies de normas jurídicas e, portanto, bastante por si só, na solução dos conflitos.

Os princípios se diferenciam das regras, porque na leitura destas é possível identificar seu campo de aplicação visto que haverá referência ao sujeito e/ou objeto e/ou situação jurídica, enquanto que aqueles, pela abstração inerente, depende, para a sua aplicação da análise do caso concreto, observando que os princípios não perderam a sua função de base ou estrutura do ordenamento jurídico, de forma que as regras devem ser construídas, interpretadas e aplicadas a partir dos princípios.

Nesse contexto, o princípio da eficiência, não pode ser considerado um enfeite ou, meramente, uma diretriz, mas norma jurídica com força normativa para pautar toda e qualquer conduta administrativa, desde elaboração das regras, passando pela sua interpretação e interpretação e findando em sua aplicação.

OLIVEIRA (2020, p. 42) nos ensina que a medida administrativa será eficiente quando implementar, com maior intensidade e com os menores custos possíveis, os resultados legitimamente esperados. GRIFO NOSSO

Já CARVALHO FILHO (2021, p. 82) informa que:

O núcleo do princípio é a procura de produtividade e economicidade e, o que é mais importante, a exigência de reduzir os desperdícios de dinheiro público, o que impõe a execução dos serviços públicos com presteza, perfeição e rendimento funcional. GRIFO NOSSO

Em reforço, importa registrar o conceito de MORAES (2020, p. 412):

Assim, princípio da eficiência é aquele que impõe à Administração Pública direta e indireta e a seus agentes a persecução do bem comum, por meio do exercício de suas competências de forma imparcial, neutra, transparente, participativa, eficaz, sem burocracia e sempre em busca da qualidade, primando pela adoção dos critérios legais e morais necessários para a melhor utilização possível dos recursos públicos, de maneira a evitar-se desperdícios e garantir-se uma maior rentabilidade social. GRIFO NOSSO

Aqui, revela a importância de destacar esse aspecto do princípio da eficiência, qual seja, a utilização dos recursos públicos da melhor forma possível, relacionando-se, nesse aspecto, com a regra da economicidade, a refletir o uso adequado e racional dos recursos públicos.

Nesse sentido, o Tribunal de Contas da União[9] já manifestou que:

A compra ou a locação de veículos deve sempre ser baseada em critérios técnicos de economicidade e contemplar os diversos aspectos que influenciam a vida útil de sua frota, garantindo maior transparência ao processo de renovação.

A finalidade de se manter carros oficiais é permitir o deslocamento de agentes públicos para e no exercício de suas funções, de forma que um veículo popular atinge essa finalidade de igual forma que um veículo de luxo, não justificando, portanto, sob a ótica do princípio da eficiência e da economicidade a aquisição, locação e manutenção de veículos de luxo vez que tal conduta caracteriza verdadeira ostentação com os recursos públicos retirados, compulsoriamente, dos contribuintes para a manutenção da estrutura estatal.

Um julgado do Tribunal Regional Federal da 1ª Região[10], em que pese não tratar especificamente de veículos, retrata bem retrata a discussão aqui posta, o qual, em síntese apertada, discutiu a nulidade do art. 20 da Portaria nº 41/2014, editada pelo Procurador Geral da República, cuja redação assegurava o direito ao uso de passagens aéreas, para voos internacionais, na classe executiva, aos membros do Ministério Público da União e, em determinadas circunstâncias, também a algumas categorias de servidores do MPU e seus acompanhantes, observando que a União, buscando a nulidade desse dispositivo, trouxe, entre outros argumentos que tal expediente violava os princípios republicano (supremacia do interesse público sobre o interesse particular), da moralidade, da economicidade e da razoabilidade.

Foi deferida antecipação de tutela em primeira instância para, entre outros, obstar a aquisição de passagens aéreas na classe executiva e, contra esta decisão, foi interposto agravo de instrumento, cujo Relator, Desembargador Souza Prudente, manteve a decisão, sendo oportuno destacar o seguinte trecho da fundamentação:

3) DA VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO REPUBLICANO - Uma das notas distintivas entre monarquia, república e despotismo, na tipologia das formas de Governo inaugurada com Maquiavel e continuada com Montesquieu, diz respeito à igualdade: "na República, tem de haver uma relativa igualdade, na monarquia desigualdade em benefício de uma nobreza que é necessária para a própria existência do poder real, e no despotismo aquela igualdade que se dá quando todos são escravos." Então, na República Federativa do Brasil, não é tolerável que se pretenda distinguir determinada categoria de servidores públicos, ainda que se trate de agentes políticos (pois mesmo sendo agentes políticos não deixam de ser servidores públicos), pela classe diferenciada nos aviões em que viajam. A autoridade, em uma República, não se legitima em razão de signos exteriores de distinção, mas sim na investidura nas elevadas funções públicas que desempenham quando nomeados para cargos públicos. O artigo 20 da Portaria nº 41/2014-PGR/MPU, "a pretexto de regulamentar artigos de lei", concede "benefício que cria uma verdadeira classe privilegiada de cidadãos, sem que haja qualquer justificativa para isso, fazendo uso de dinheiro público de forma pouco eficiente, ignorando a escassez de dinheiro do erário", o que soa como "eterno retorno do Brasil à época das oligarquias e dos privilégios pessoais, em detrimento do cidadão pagador de tributos." A concessão do benefício como elemento de distinção social fica clara com a assertiva do Sub-Procurador Geral da República Brasilino Santos, que ao defender a medida, asseverou: "Ou é Procurador da República ou é descamisado. Tem que separar as coisas." A frase gerou indignação no então Senador Pedro Simon, que foi à tribuna do Senado para criticar a medida e o comentário, considerando que classe executiva não pode ser medida para aferir a dignidade e a seriedade de agentes públicos. É realmente inexplicável, em um ambiente institucional republicano, a afirmação segundo a qual, para se ter dignidade na função exercida, é necessário viajar em classe executiva, pois se trata de "benefício com dinheiro público, cuja essencialidade para o desempenho funcional está longe de ser evidente." Em uma República, destaca-se o princípio da supremacia do interesse público, a informar que inexiste espaço constitucional/institucional "para atos administrativos que instituam verdadeiros benefícios que aproveitem a uma única pessoa ou a classe específica de pessoas, quando estes não apresentem qualquer motivação que vise resguardar direitos fundamentais ou ainda quando estes não aproveitem ao interesse público. Do contrário, se assim o fosse, nos distanciaríamos do próprio princípio republicano, tendo em vista a concentração de poder excessiva." E continua a parte autora: "assegurar mediante Portaria que um grupo específico de aproximadamente 2000 pessoas possua o direito de realizar viagens na classe executiva (...) não atende, evidentemente, aos interesses da coletividade, sendo injustificável (...). Trata-se, além disso, de evidente priorização de interesse particular em detrimento do público. (...) as prerrogativas não conferem à Administração Pública o direito de gozar de quaisquer regalias. GRIFO NOSSO

Ainda, na referida fundamentação do julgado, há a demonstração da evidente violação do princípio da eficiência a partir de um dado objetivo, qual seja, a diferença de preço entre a passagem aérea na classe econômica da classe executiva, vide:

5) DAVIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA O artigo 20 da Portaria nº 41/2014-PGR/MPU escolheu a opção mais custosa sem a devida contrapartida em termos de serviço público, em clara ofensa aos princípios da eficiência e da economicidade (artigos 37 e 70 da Constituição da República). É necessário deixar claro que a autonomia financeira e administrativa do MPU não possibilita escolhas que infrinjam o princípio da economicidade, eis que sempre será necessário pesar a relação entre o benefício social e o custo social de um determinado ato administrativo. A parte autora fornece dois exemplos que deixam muito claro que a opção constante no ato normativo impugnado é ilegal e inconstitucional, eis que, na verdade, não há escolha discricionária porque é caso de "redução da discricionariedade a zero" (item 2, acima), pois somente há uma única conduta válida para o administrador: se a intenção da norma é possibilitar que o agente político/servidor público esteja em condições físicas ideais para trabalhar no exterior, é imensamente mais econômico paga-lhe uma diária a mais do que pagar-lhe viagem aérea na classe executiva, pois é muito mais econômico viajar em classe econômica e pagar uma diária a mais de hotel. Em uma hipotética viagem de Brasília a Nova Iorque, a passagem aérea na classe econômica custa R$ 2.497,00, enquanto que na classe executiva o mesmo trecho, na mesma data hipotética, custa R$ 12.628,00. É muito mais econômico pagar uma diária a mais para que o agente político/servidor público descanse um dia e uma noite no local de destino e esteja em condições ideais de descanso, ao custo de US$ 416,00, do que pagar uma passagem na classe executiva. É mais econômico porque a diferença na classe do voo permitiria o pagamento de aproximadamente mais 8 diárias.

A viagem na classe econômica tão como na classe executiva atinge a mesma finalidade, qual seja, permitir o deslocamento do agente público para e no exercício de suas funções e, dessa forma, há evidente e clara violação ao princípio da eficiência e da economicidade traduzido em verdadeira ostentação com recursos públicos.

A argumentação desenvolvida no julgado, acima referenciada, também aqui se aplica visto que há evidente violação do princípio da eficiência quando recursos públicos custeados pela população são utilizados para a aquisição, locação e/ou manutenção de veículos de luxo para permitir o deslocamento de agentes públicos para e no exercício de suas funções, visto que a mesma finalidade seria alcançada usando veículos, ditos, populares, com custo substancialmente inferior ao veículo de luxo.

Referida conduta administrativa deve ser combatida e extirpada de nosso ordenamento jurídico porque não só viola o princípio da eficiência, mas, também, o princípio da moralidade, quanto a mesma população que sustenta a opulência, a pomposidade, a suntuosidade, enfim, a ostentação de gestores públicos, é obrigada a contentar com a ausência, precariedade ou deficiência dos serviços públicos, a exemplo, do próprio sistema de transporte público.

Se a regra contida no art. 6º da Lei Federal nº 1.081/50, se o princípio, com status constitucional, da eficiência, não são capazes de inibir e reprimir o uso inadequado de recursos públicos no uso de veículos de luxo, em boa hora, surge, o art. 20 da nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº 14.113/2021), que torna como regra geral e obrigatória a vedação para toda e qualquer aquisição de artigos de luxo realizada pela Administração Pública, vide:

Art. 20. Os itens de consumo adquiridos para suprir as demandas das estruturas da Administração Pública deverão ser de qualidade comum, não superior à necessária para cumprir as finalidades às quais se destinam, vedada a aquisição de artigos de luxo.

§ 1º Os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário definirão em regulamento os limites para o enquadramento dos bens de consumo nas categorias comum e luxo.

§ 2º A partir de 180 (cento e oitenta) dias contados da promulgação desta Lei, novas compras de bens de consumo só poderão ser efetivadas com a edição, pela autoridade competente, do regulamento a que se refere o § 1º deste artigo.

No âmbito federal referida regra legal já foi regulamentada através do Decreto nº 10.818 de 27/09/21, trazendo a seguinte definição:

Art. 2º Para fins do disposto neste Decreto, considera-se:

I - bem de luxo - bem de consumo com alta elasticidade-renda da demanda, identificável por meio de características tais como:

a) ostentação;

b) opulência;

c) forte apelo estético; ou

d) requinte;

Clarividente que mais uma norma legal não vai inibir ou reprimir tal prática histórica, herança do patrimonialismo, de alimentar verdadeiras mordomias com recursos públicos, se não houver uma mudança de cultura, notadamente, dos Tribunais de Contas e do Ministério Público, visto que os exemplos citados demonstram que a aquisição, locação e manutenção de veículos de luxo, também, é adotada por esses próprios órgãos de controle da atividade administrativa.

Ainda, mais paradoxal, é a atitude de determinados gestores, notadamente, municipais, os quais, ao mesmo tempo que esbanjam pomposidade no uso de veículos de luxo contratados com recursos públicos, são incapazes de assegurar os direitos fundamentais mais básicos da população, tais como, saneamento, saúde e educação.

Reportamo-nos a crítica de MOTTA (2019, p. 495), que ao tratar do princípio da eficiência, esclarece:

A adoção do referido princípio, para nós, ou é fruto da tradicional verborragia legislativa ou com objetivos ainda não suficientemente esclarecidos.

No primeiro caso, vemos que o legislador brasileiro gosta de tentar consertar os problemas do país apenas com a alteração de textos legais, sem se preocupar com a efetiva aplicação deles. Veja-se que os outros quatro princípios estão no art. 37, caput, há mais de dez anos e nem por isso foram obedecidos em grau bastante. Bastaria cumprir os quatro princípios já postos que o país estaria muito bem, obrigado. Será que a inclusão de mais uma palavra na carta vai mudar alguma coisa?

O uso dos recursos públicos para garantir a privilégios de um grupo seleto de agentes públicos não é moralmente aceitável porque não traz qualquer melhoria na qualidade de vida da população que vem a ser a responsável por bancar uma pesada carga tributária para manter o governo ostentação.


IV - CONCLUSÃO

Há uma prática muito comum na Administração Pública Brasileira de gastar os recursos públicos, não para atender o mínimo existencial e as necessidades básicas da população, mas para ostentar verdadeiras e absurdas mordomias de uma parcela expressiva de agentes públicos, que vão do caviar aos veículos de luxo.

A própria disponibilização de carros oficiais para determinados agentes públicos é eticamente questionável e moralmente inaceitável, notadamente, na aquisição, locação e/ou manutenção de carros de luxo, visto que a extravagância que vai do banco de couro, do sistema multimídia, do ar condicionado com dual zone e outros itens não presentes na maioria dos carros comercializados no mercado nacional, se sobrepõe a própria finalidade desse tipo de contratação que é permitir o deslocamento do agente público no exercício das funções e para o exercício das funções.

A ostentação, a pomposidade e a extravagância na contratação e manutenção de veículos de luxo para uma seleta classe de agentes públicos não acarreta qualquer melhoria na prestação de serviços públicos, sacrificando ainda mais os contribuintes que arcam com uma pesada carga tributária para proporcionar essas mordomias, violando o princípio da eficiência e a regra da economicidade, vez que não se faz o uso adequado dos recursos públicos, sem falar que há, também, violação da moralidade, da razoabilidade e da proporcionalidade, quando constatado que os recursos públicos utilizados para bancar mordomias, fazem falta para atender as necessidades essenciais da comunidade.

Ainda que haja normas jurídicas em nosso ordenamento jurídico capazes de inibir e reprimir a pomposidade no gasto público, há necessidade de uma mudança cultural patrimonialista, inclusive, dos próprios órgãos de controle que se dão ao luxo de usufruir, também, das mordomias proporcionada com os recursos públicos, o que vai depender de uma maior participação da sociedade em acompanhar, fiscalizar, questionar o uso dos recursos públicos.

Enquanto a sociedade permanecer inerte, contentando-se com o deslocamento em pé no transporte público e assistindo pela janela a passagem do carro oficial, no qual o agente público está perfeitamente confortável no banco de couro, se refrescando no ar condicionado dual zone, e ouvindo a sua música preferida no sistema multimídia, não haverá norma jurídica suficiente para inibir e reprimir o governo ostentação, mantendo-se o princípio da eficiência, sob o aspecto da economicidade, como mera peça de enfeite em nosso Texto Constitucional.


V - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARAÚJO, Edmir Netto D. Curso de direito administrativo. Disponível em: Minha Biblioteca, (8th edição). Editora Saraiva, 2018.

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. Disponível em: Minha Biblioteca, (35th edição). Grupo GEN, 2021.

COUTO, Reinaldo. Curso de Direito Administrativo. Disponível em: Minha Biblioteca, (4th edição). Editora Saraiva, 2019.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. Disponível em: Minha Biblioteca, (34th edição). Grupo GEN, 2021.

MAZZA, Alexandre. Manual de direito administrativo. Disponível em: Minha Biblioteca, (10th edição). Editora Saraiva, 2019.

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MOTTA, Sylvio. Direito Constitucional. Disponível em: Minha Biblioteca, (28th edição). Grupo GEN, 2019.

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  1. "luxo", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2021, https://dicionario.priberam.org/luxo [consultado em 29-12-2021].

  2. luxo | Definição ou significado de luxo no Dicionário Infopédia da Língua Portuguesa (infopedia.pt)

  3. TCU - Acórdão n.º 3341/2010-1ª Câmara, TC-012.829/2005-6, rel. Min-Subst. Marcos Bemquerer Costa, 08.06.2010

  4. Untitled Document (mpms.mp.br) Acesso em 29/12/2021.

  5. 11-EDITAL-VEÍCULO-SUV-BLINDADO.-assinado.pdf (vitoriadoxingu.pa.gov.br). Acesso em 29/12/2021.

  6. Prefeitura de Coari vai gastar mais de R$ 3 milhões com aluguel de carros de luxo - O Convergente. Ac

  7. COMISSÃO ESPECIAL DE LICITAÇÃO (tce.go.gov.br)

  8. Sete novos carros de luxo passam a compor a frota da PRF Português (Brasil) (www.gov.br). Acesso em

  9. Acórdão TCU nº 4.786/2009-2ª Câmara

  10. AI 0045317-31.2015.4.01.0000, DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, TRF1, DP 28/08/2015.


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CORREA, Fabiano Batista. Governo ostentação: a utilização de veículos de luxo no serviço público e o princípio da eficiência . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 27, n. 6770, 13 jan. 2022. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/95695. Acesso em: 27 abr. 2024.