Ausência de personalidade jurídica dos serviços notariais e de registro: impossibilidade de responsabilização do titular com base nas regras da sucessão empresarial.

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Impossibilidade de responsabilização do titular dos serviços notariais e de registro com base nas regras da sucessão empresarial.

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que a delegação de serviços notariais e de registro não enseja a criação de sociedade empresarial com personalidade jurídica própria e patrimônio autônomo[1]. Segundo esse entendimento, nem o cartório pode ser considerado sociedade empresária, nem o seu titular pode ser considerado empresário individual. Os cartórios e serventias extrajudiciais, em sentido amplo, seriam entidades administrativas sem personalidade jurídica. Logo, em regra, somente o patrimônio do titular é que poderia ser comprometido para satisfazer as obrigações contraídas durante o período em que exerceu as atividades.

De acordo com essa perspectiva, a transferência da titularidade do cartório (sucessão de serviços notariais e de registro) não poderia ser tratada como sucessão empresarial e, consequentemente, dar ensejo à responsabilização do sucessor (atual titular) pelas divisas e obrigações contraídas pelo sucedido, antes do início da sua gestão.

Em síntese, tendo em vista a inaplicabilidade das regras da sucessão empresarial, conforme o entendimento esboçado, o titular do serviço só responderia pessoalmente pelas obrigações contraídas ao tempo da sua atuação.

Este posicionamento foi adotado no seguinte julgado:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE DO ATUAL TITULAR DO CARTÓRIO POR DÍVIDAS TRABALHISTAS ANTERIORES AO PERÍODO DE SUA GESTÃO. A HIPÓTESE NÃO PODE SER ANALISADA CONFORME OS PRESSUPOSTOS DA SUCESSÃO EMPRESARIAL PORQUANTO SERVIÇOS NOTARIAIS E DE REGISTRO NÃO SÃO DOTADOS DE PERSONALIDADE JURÍDICA. AGRAVO INTERNO DO PARTICULAR A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. Discute-se nos autos se o atual titular de unidade registral é responsável pelo pagamento de verbas trabalhistas antes de assumir a titularidade da serventia.

2. No presente caso, o Agravante assumiu a titularidade do Cartório em 17.2.2010, por aprovação em concurso público, e os pedidos de licenças prêmio formulados na exordial se referem ao período entre 22.3.1972 e 31.1.2005.

3. A hipótese não é de sucessão de empresas, mas de serviços notariais e de registro, os quais não possuem personalidade jurídica. Sendo assim, a hipótese não deve ser analisada conforme os pressupostos da sucessão empresarial, não fazendo sentido que o agravante seja tomado como sucessor e responda por dívidas anteriores ao seu período de gestão.

4. Ainda que o empregado continue a prestar serviço ao novo titular, acolher tal requisito, sem restrições, seria isentar o antigo serventuário pela responsabilidade do período de sua gestão.

Entretanto, com base nos elementos dos autos, vê-se que o empregado deixou de prestar serviços ao cartório muito antes do Agravante assumir, já que os valores pleiteados datam do período de 1972 a 2005, e o agravante assumiu o cartório em 2010.

5. Essa Corte Superior tem entendido que os cartórios, por serem instituições administrativas, ou seja, desprovidos de personalidade jurídica não podem responder por irregularidades ocorridas na época do antecessor na delegação.

6. Nega-se provimento ao Agravo Interno do Particular.

AgInt no AREsp 1212432/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 01/06/2020, DJe 04/06/2020.

 

 


 

[4] Art. 12 da Lei nº 8.935/94

 


[1] A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça manifestou-se noutro sentido. Salientou-se que: “[...] na prestação de serviços de registros públicos (cartorário e notarial), além de manifesta a finalidade lucrativa, não há a prestação de serviço sob a forma de trabalho pessoal do próprio contribuinte, especialmente porque o art. 236 da CF/88 e a legislação que o regulamenta permitem a formação de uma estrutura economicamente organizada para a prestação do serviço de registro público, assemelhando-se ao próprio conceito de empresa. [...].”

REsp. 1.328.384/RS, Rel. p/ Acórdão Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe 29.5.2013.

Sobre o autor
Antonio Evangelista de Souza Netto

Juiz de Direito de Entrância Final do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Pós-doutor em Direito pela Universidade de Salamanca - Espanha. Pós-doutor em Direito pela Universitá degli Studi di Messina - Itália. Doutor em Filosofia do Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP (2014). Mestre em Direito Empresarial pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP (2008). Coordenador do Núcleo de EAD da Escola da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná - EMAP. Professor da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados - ENFAM. Professor da Escola da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo - EMES. Professor da Escola da Magistratura do TJ/PR - EMAP.

Informações sobre o texto

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