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00 - RORSum
RECORRENTE: CARLOS ADRIANO PEREIRA
RECORRIDA: ATENTO BRASIL S.A.
RELATOR: ANTÔNIO NEVES DE FREITAS
PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO
Trata-se de processo com tramitação pelo rito sumaríssimo, nos moldes da Lei nº 9.957, de 12.01.2000, cujos autos foram distribuídos imediatamente após a chegada a este Tribunal, sem manifestação da d. Procuradoria.
Dispensado o relatório, nos termos do artigo 852-I, caput, da CLT.
VOTO
JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE
Conheço do recurso ordinário interposto pelo reclamante, satisfeitos seus pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade.
JUÍZO DE MÉRITO
VÍNCULO DE EMPREGO
Às fls. 276/281 (letra "a") de seu apelo, o demandante expõe suas razões de inconformismo com a r. sentença que afastou o vínculo de emprego entre as partes, no período de 20/06/2020 a 23/06/2020, sob o fundamento precípuo de que não houve contratação e sequer efetivo labor em favor da ré. Pugna pela reforma da r. decisão primeva, a fim de que seja reconhecida a relação empregatícia no citado interstício, além de quitados 05 dias de treinamento supostamente realizado em período anterior.
Em suma, torna o laborista a ressaltar toda a prova documental que entende suficiente à comprovação do pacto laboral, ainda que de exígua duração.
Examino.
Como se sabe, o objeto do contrato de trabalho é a prestação pessoal de serviço subordinado do empregado ao empregador, não eventual e mediante pagamento de salário.
Noutro dizer, para que se reconheça a efetiva relação de emprego, cumpre perquirir acerca da presença dos fatos constitutivos essenciais, que por lei a definem (subordinação, onerosidade, labor por pessoa física com pessoalidade e não eventualidade).
Na sistemática processual trabalhista, quando se nega a existência de qualquer prestação de trabalho, a prova do vínculo de emprego incumbe, exclusivamente, à parte autora, por ser fato constitutivo de seu direito (art. 818, I, da CLT).
Por outro lado, admitida a prestação de serviços, ainda que dissociados da relação empregatícia, incumbe à parte ré a prova inequívoca de se tratar, efetivamente, de labor autônomo, ou diversa situação, porquanto constitui fato impeditivo ao reconhecimento da relação empregatícia, presumindo-se, caso não se desonere do encargo processual, tratar-se, de fato, de relação de emprego (art. 818, II, da CLT).
No caso específico destes autos, a empresa ré admitiu que o autor foi seu empregado, de 09/04/2019 a 10/10/2019, laborando na função de "OPERADOR DE TELEMARKETING ATIVO E RECEPTIVO I". Contudo, no período concernente ao suposto segundo contrato de trabalho (20/06/2020 a 23/06/2020), a empresa negou qualquer prestação de serviços, permanecendo, dessarte, o encargo do obreiro de comprovar suas alegações.
E, permissa venia, entendo que o reclamante desvencilhou-se, a contento, de comprovar o contrato de trabalho iniciado em 20/06/2020.
Com efeito, o registro em CTPS (fl. 34) comprova que o reclamante foi contratado pela ré, no dia 20/06/2020, para trabalhar como "OPERADOR SAC I", mediante o pagamento salarial de R$998,00 mensais.
Diversamente do entendimento exarado na origem, não há nos autos elementos que demonstrem, seguramente, tratar-se de anotação fraudulenta.
Como bem se sabe, tem sido usual as empresas promoverem as anotações na Carteira de Trabalho, por meio de adesivos impressos com os dados da contratação, diretamente sobrepostos sobre a página do documento. Dessa forma, entendo assistir razão ao recorrente, quando afirma (fls. 278/279):
Sustenta ainda a R. Sentença de que o nome do Recorrente, na CTPS, veio logo abaixo do nome da Recorrida, motivo pelo qual o documento não seria verdadeiro. Pois bem, quem assina a CTPS não é o empregado e sim o empregador, se este comete algum erro, não deveria o empregado ser penalizado por tais. Entretanto, observando com cuidado o documento, por tratar-se de grande empresa, assim como na última assinatura que consta juntada, tem se o procedimento atualmente adotado, as empresas apenas pregam adesivo com as informações do contrato a fim de agilizar os procedimentos, principalmente em se tratando da Recorrida, como já dito, com mais de 80.000 (oitenta mil) empregados pelo mundo. Desse modo, o que me parece é que a parte do recorte deveria ter sido feita um pouco mais acima, permitindo ficar apenas o nome da empregadora, a parte de baixo, presume-se ser, parte de controle que deveria ser colacionado em documentos da ré. Outrora, convenhamos, todos devem corroborar que caso o Recorrente fosse falsificar documentos, não cometeria erros tão grosseiros, visíveis facilmente aos olhos de qualquer leigo, motivo pelo qual volta a reiterar o pedido de Reforma da R. Decisão.(grifei).
Nos termos dos artigos 29 e 40 da CLT, bem como da Súmula nº 12 do c. TST, as anotações constantes da CTPS do empregado geram a presunção juris tantum,acerca da veracidade de seu conteúdo, incumbindo à parte que pretende infirmá-la produzir a respectiva prova, de forma robusta, inequívoca.
Nesse sentido, destaco o seguinte precedente turmário:
ANOTAÇÕES DA CTPS. PRESUNÇÃO RELATIVA DE VERACIDADE. INEXISTÊNCIA DE PROVA CONTRÁRIA. A teor da Súmula 12 do TST, as anotações da CTPS possuem presunção relativa de veracidade, competindo à parte que as impugna demonstrar que os registros não correspondem à realidade - ônus do qual o reclamante não logrou se desvencilhar. (TRT da 3.ª Região; PJe: 0010103-82.2021.5.03.0079 (ROT); Disponibilização: 22/06/2022; Órgão Julgador: Quinta Turma; Relator: Paulo Mauricio R. Pires).
A mais que isso, o contrato de trabalho de fls. 21/22, noticia a contratação do autor, em 20/06/2020, para exercer o cargo registrado em CTPS ("OPERADOR SAC I"), mediante o pagamento do salário equivalente ao anotado no referido documento (R$998,00 mensais) e, diversamente do sentenciado, destaca o CPF do demandante no seu primeiro parágrafo, referente à qualificação das partes.
Isso não bastasse, os documentos de "Declaração do Empregador", reproduzidos às fls. 37 e 40 do processo, devidamente assinados por representante da empresa, noticiam a contratação do reclamante, em 20/06/2020, e que, na data de suas respectivas assinaturas (23/06/2020), ele ainda permanecia empregado na ré.
É o suficiente, a meu ver, para que se entenda satisfatoriamente cumprido o ônus probatório do laborista, quanto ao vínculo de emprego no período mencionado na ingressual, haja vista que os citados documentos não foram devidamente ilididos, pela ré, em seu conteúdo e veracidade.
Com a devida venia do d. entendimento originário, o simples fato de o reclamante não se recordar, com segurança, do nome da empregada responsável pela assinatura de sua CTPS (conforme depoimento pessoal - fl. 255) não invalida o teor de seu registro, haja vista que o documento contém a assinatura de dois representantes da ré, não sendo razoável esperar que o laborista se lembre dos nomes de empregados de empresa notoriamente grande.
Lado outro, o fato de os documentos apresentados pelo demandante conterem assinaturas digitalizadas, por si só, não afasta sua autenticidade, tratando-se de recurso amplamente utilizado nos dias atuais, principalmente pelas grandes empresas. Ademais, não é possível inferir que se trata, efetivamente, de assinaturas digitalizadas.
E a participação do autor em processos seletivos conduzidos por empresas diversas não se incompatibiliza com o reconhecimento da relação empregatícia, no mesmo período.
Saliento que a própria ré, em sede de contrarrazões (f. 290, antepenúltimo parágrafo), admitiu ter entregado ao reclamante, em 22/06/2020, 05 máscaras para prevenção da Covid-10, conforme documentado à fl. 137 (id 17bdd95), o que comprova a subordinação jurídica do obreiro à empresa, no período em análise. Observe-se que o citado documento faz referência à necessidade de utilização das máscaras "nos deslocamentos empresa/residência e durante a jornada de trabalho" (grifei). Além disso, já faz expressa referência ao número de registro do laborista ("Re 1341653").
Portanto, impõe-se o reconhecimento do vínculo empregatício havido entre as partes, no período de 20/06/2020 a 23/06/2020.
Lado outro, não há nos autos a prova de realização de treinamento em período diverso da contratação, razão pela qual não se há cogitar de qualquer direito consectário.
Provejo, pois, parcialmente, nesses termos, para declarar o vínculo de emprego do autor com a empresa ré, no período de 20/06/2020 a 23/06/2020, no cargo de "OPERADOR SAC I" e salário mensal de R$998,00, e para determinar o retorno dos autos à d. Vara de origem, a fim de que sejam apreciados e julgados os demais pleitos formulados na inicial, evitando-se, assim, a supressão de instância.
Fica prejudicada a análise dos demais tópicos de apelo concernentes ao reconhecimento do vínculo, bem como da pretensão recursal indenizatória decorrente de suposto dano moral.
LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ
A configuração da litigância de má-fé exige a demonstração inequívoca de dolo processual, o que não se constata no caso destes autos, em que a empresa reclamada limitou-se a exercer o direito de se defender, nos estritos limites legais.
Desprovejo, pois, a pretensão pela incidência da multa por litigância de má-fé, em desfavor da reclamada.
CONCLUSÃO
Conheço do recurso ordinário interposto. No mérito, dou-lhe parcial provimento para declarar o vínculo de emprego do autor com a empresa ré, no período de 20/06/2020 a 23/06/2020, no cargo de "OPERADOR SAC I" e salário mensal de R$998,00, e para determinar o retorno dos autos à d. Vara de origem, a fim de que sejam apreciados e julgados os demais pleitos formulados na inicial, evitando-se, assim, a supressão de instância. Fica prejudicada a análise dos demais tópicos de apelo concernentes ao reconhecimento do vínculo, bem como da pretensão recursal indenizatória decorrente de suposto dano moral.
ACORDAM os Desembargadores do Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, pela sua 5ª Turma, em Sessão Telepresencial, realizada em 26 de julho de 2022, à unanimidade, em conhecer do recurso ordinário interposto; no mérito, dar-lhe parcial provimento para declarar o vínculo de emprego do autor com a empresa ré, no período de 20/06/2020 a 23/06/2020, no cargo de "OPERADOR SAC I" e salário mensal de R$998,00, e para determinar o retorno dos autos à d. Vara de origem, a fim de que sejam apreciados e julgados os demais pleitos formulados na inicial, evitando-se, assim, a supressão de instância; prejudicada a análise dos demais tópicos de apelo concernentes ao reconhecimento do vínculo, bem como da pretensão recursal indenizatória decorrente de suposto dano moral.
Tomaram parte no julgamento os Exmos. Desembargadores Antônio Neves de Freitas (Relator), Paulo Maurício Ribeiro Pires (Presidente e 2º votante) e o Exmo. Juiz Convocado Delane Marcolino Ferreira (3º votante, substituindo a Exma. Desembargadora Jaqueline Monteiro de Lima, em gozo de férias regimentais)
Presente a Representante do Ministério Público do Trabalho, Maria Helena da Silva Guthier.
Secretária: Rosemary Gonçalves da Silva Guedes.
ANTÔNIO NEVES DE FREITAS
Relator
ANF/f