TJSP ignora Lei de Arbitragem e diverge de aplicação do STJ

Ao desconsiderar a sentença arbitral e admitir a possibilidade de revisão do mérito da questão, desembargador da capital paulista estremece a segurança jurídica

30/04/2019 às 11:09
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Desembargador de São Paulo ignora a Lei de Arbitragem admitindo a possibilidade de revisão do mérito da questão, o que diverge da aplicação do STJ e estremece a segurança jurídica.

Em recentes decisões, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) ignorou a aplicação da Lei de Arbitragem (Lei 9.307/96), que tem objetivo de resolver os conflitos de interesses de forma rápida, clara e com custos reduzidos para as partes envolvidas no litígio. Esse descarte da sentença arbitral tem embaraçado as execuções e anulado as decisões que reconhecem a incompetência do Poder Judiciário ante as cláusulas arbitrais.

As decisões são de relatoria do desembargador Carlos Henrique Abrão, membro da 14ª Câmara de Direito Privado do TJSP, e que diz que a sentença arbitral não seria de tutela definitiva e que sua execução seria, na verdade, uma liquidação provisória de título judicial. E ainda posicionou o título executado como “mera sentença arbitral”, com o entendimento de que a ação anulatória impediria a sua execução, mesmo já tendo sido proferida sentença de improcedência.

Nas palavras do referido magistrado “a estabilidade e segurança jurídicas se fazem pela formação da coisa julgada, e não pura e simplesmente por sentença arbitral (...)”. O desembargador ainda admite a possibilidade de o Poder Judiciário reapreciar e modificar o mérito da sentença arbitral, indo totalmente contra o que prega o Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Para o STJ “a sentença arbitral não se sujeita a reexame de mérito nem pelo árbitro e nem pelo juiz estatal, adquirindo, desde sua prolação, a imutabilidade decorrente da coisa julgada”, em palavras do Rel. Ministro Marco Buzzi em Recurso Especial (REsp) julgado em 2015. No mesmo sentido, o Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva em outro REsp julgado em 2017 também já decidiu que “a execução de sentença arbitral não perde o seu caráter definitivo, em virtude do ajuizamento de ação anulatória, que não é dotada de efeito suspensivo”.

O professor de direito e doutor pela Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, Geraldo Fonseca entende que o magistrado está equivocado. “A própria Lei de Arbitragem estipula no artigo 18 que o árbitro é juiz de fato e de direito, e a sentença que proferir não fica sujeita a recurso ou a homologação pelo Poder Judiciário. O art. 32, §2º, completa o raciocínio estabelecendo que em caso de eventual anulação de sentença arbitral, caberá ao próprio árbitro ou tribunal arbitral a articulação de nova sentença arbitral, não se sujeitando a revisão pelo Poder Judiciário.”

Como complemento, Fonseca assegura que “existe a jurisprudência classificada no Brasil do Superior Tribunal de Justiça que não pode entrar no mérito da arbitragem a menos que tenha uma nulidade no processo arbitral. Isso foi estabelecido até mesmo por uma questão de segurança jurídica, já que caso contrário a lei existente nem precisaria existir. Logo, a decisão do desembargador está claramente equivocada e precisa ser revisada de acordo com o que é de entendimento dos órgãos superiores, pois essa divergência enfraquece a instituição da arbitragem no país e desestimula aqueles que buscam tribunais arbitrais para escapar dos impasses do Poder Judiciário”, conclui.

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