Rescisão dos contratos de planos de saúde e a cobrança de aviso prévio

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No ano de 2019, a Justiça determinou que as seguradoras não podem mais cobrar dos seus beneficiários aviso prévio e multa no caso de rescisão dos contratos de planos de saúde coletivos por adesão ou empresarial.

As operadoras e administradoras de planos privados de assistência à saúde no Brasil tem suas condutas regulamentadas por normas da Agência Nacional de Saúde Suplementar (“ANS”) que, enquanto agência reguladora vinculada ao Ministério da Saúde e responsável pelo setor de planos de saúde no Brasil, exerce seu poder regulatório por meio da edição de Resoluções que vinculam a atividade das operadoras de planos de saúde.

A Resolução Normativa 195/2009 da ANS, que dispõe sobre a classificação e características dos planos privados de assistência à saúde e regulamenta a sua contratação, prevê em seu artigo 17 o seguinte:

Subseção II

Da Rescisão ou Suspensão

Art. 17 As condições de rescisão do contrato ou de suspensão de cobertura, nos planos privados de assistência à saúde coletivos por adesão ou empresarial, devem também constar do contrato celebrado entre as partes.

Parágrafo único. Os contratos de planos privados de assistência à saúde coletivos por adesão ou empresarial somente poderão ser rescindidos imotivadamente após a                vigência do período de doze meses e mediante prévia notificação da outra parte com antecedência mínima de sessenta dias.”

Na esteira da referida resolução, os contratos firmados entre beneficíaros de planos de saúde, pessoas físicas ou empresas privadas, e seguradoras de plano de saúde costumam prever o seguinte em seus contratos:

X. Cancelamento do Seguro

X.1 Cancelamento do seguro por iniciativa da Seguradora e/ou Estipulante

XX.1.1 O cancelamento imotivado do seguro por iniciativa da Seguradora e/ou do Estipulante, sem direito a devolução dos prêmios pagos, somente poderá ocorrer após              a vigência inicial definida na contratação do seguro e mediante comunicação por escrito por qualquer das partes, com no mínimo 60 (sessenta) dias de antecedência da              data do efetivo cancelamento, e o pagamento dos prêmios deverá ocorrer neste período.”

(Redação de cláusula hipotética, baseada em contratos elaborados pelas seguradoras)

Contudo, no âmbito da Ação Civil Pública n° 0136265-83.2013.4.02.5101 ajuizada pelo Procon-RJ em face da ANS, foi proferida em 26/02/2014 sentença, já transitada em julgado, no sentido de que o beneficiário de plano de saúde coletivo ou empresarial poderá rescindir seu contrato de seguro sem cumprir o período de um ano de fidelidade e nem arcar com o pagamento de mensalidades extras.

Portanto, não se aplicam mais aos Contratos de Seguro a estipulação de um prazo de vigência mínimo e a instituição de um aviso prévio para cancelamento do Contrato, tendo em vista a anulação do artigo 17 da Resolução Normativa 195/2009, por força da sentença proferida no processo acima citado, que assim dispõe na parte sua parte dispositiva:

Diante de todo o exposto, na forma da fundamentação acima desenvolvida, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na presente demanda para:

a) Declarar nulo o parágrafo único do artigo 17 da RN 195, de 14 de julho de 2009, da ANS, autorizando, de conseguinte, que os consumidores possam rescindir o                      contrato sem que lhe sejam impostas multas contratuais em razão da fidelidade de 12 meses de permanência e 2 meses de pagamento antecipado de mensalidades, impostas no ato administrativo viciado;

b) Condenar a Ré à obrigação de publicar, às suas custas, em dois jornais de grande circulação, em quatro dias intercalados, a parte dispositiva deste julgado de modo aconferir aos consumidores o direito de informação;”

Em cumprimento ao item “b” da sentença, a ANS já publicou inclusive a parte dispositiva do julgado em jornal de grande circulação.

Deste modo, resta concluída a inaplicabilidade do artigo constante dos contratos firmados entre os beneficiários e os planos de saúde que preveem a cobrança do aviso prévio, tendo em vista a execução da sentença proferida nos autos do processo acima mencionado, responsável por modificar o artigo 17 da Resolução 195/2009, que possui caráter vinculante a todas as operadoras de planos de saúde.

Deve-se ter em mente que a decisão de mérito foi proferido em face de uma agência reguladora que tem atuação em todo o território nacional. Todas as seguradoras do país devem então se submeter a orientação dada na sentença, suspendendo a cobrança do avisa prévio, nos casos de rescisão contratual, pois a resolução da ANS, alterada pela decisão, é de caráter nacional.

Além disso, o Novo Código de Processo Civil aduz em seu artigo 506 o seguinte: “A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não prejudicando terceiros”. É dizer, diferentemente do código anterior, o NCPC passa a admitir que a coisa julgada beneficie terceiros. A sentença proferida na ação civil pública está revestida da autoridade da coisa julgado por ter transitado em julgado, tendo portanto eficácia com relação a todos os contratos de plano de saúde vigentes. Os terceiros que podem ser beneficiados são justamente os segurados.

Ocorre que mesmo diante da alteração nas normas da ANS, em favor dos beneficiários, a referida sentença, transitada em julgado, não repercutiu eficazmente de modo a fazer com que as seguradoras suspendessem as cobranças do aviso prévios pelos consumidores de planos coletivos que decidem rescindir o contrato. Tem-se então um aumento do número de ações neste segundo semestre de 2019, por conta dos segurados que optam por buscar seus direitos na Justiça, de modo a obter a restituição dos valores cobrados¹.

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Portanto, não há nenhuma razão de direito que permita a qualquer operadora de plano de saúde desconsiderar a alteração do artigo 17 da Resolução 195/2009, de modo a continuar exigindo um prazo mínimo para a comunicação de cancelamento do Contrato de Seguro de Saúde.


 

1.https://oglobo.globo.com/economia/defesa-do-consumidor/acoes-na-justica-sobre-reembolso-de-plano-de-saude-crescem-265-23965526 

Sobre o autor
Marcelo Macena Monteiro Moraes

Graduando em direito pela UFC

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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