Modelo de Parecer Jurídico - Direito de Família - Reconhecimento e Dissolução de União Estável

Leia nesta página:

PARECER JURÍDICO

ENDEREÇAMENTO: À Sra. (xxxxxx)

EMENTA: DIREITO CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA. CONVIVÊNCIA PÚBLICA, CONTÍNUA E DURADOURA. CASAMENTO RELIGIOSO. RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL. PARTILHA DE BENS.

RELATÓRIO:

Trata-se de consulta formulada por (xxxxxxx), separada de fato, desempregada, acerca da viabilidade jurídica de permanecer no imóvel em que reside atualmente, adquirido, onerosamente, entre os anos de 2017 e 2018, na constância da união estável com seu ex-companheiro, Sr. (xxxxxx), cuja duração foi de 21 anos. Aduz a interessada que a união com o ex-companheiro foi firmada apenas na igreja, elucidando que, dessa união, advieram dois filhos: uma filha, que conta, atualmente, com 16 anos, e um filho, de 25 anos. Destaca, ainda, a Sra. (xxxxxx) que o casal encontra-se separado de fato há, aproximadamente, 04 anos e, ainda, que o Sr. (xxxxxx) detém a guarda da filha menor. Ademais, afirma que, durante a convivência conjugal, o ex-companheiro adquiriu, além do imóvel mencionado, um veículo automotor, através de financiamento, bem como que, após cerca de 05 meses, desfez-se a convivência do casal.

É o relatório. Passo a opinar.

FUNDAMENTAÇÃO

A priori, observa-se que, em razão da existência de características específicas, tem-se a configuração da união estável, entidade familiar cujo reconhecimento encontra amparo legal na Carta Magna, especificamente no seu art. 226, §3°, conforme se verifica, in verbis:

Art. 226, § 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.  

Nesse sentido, uma vez consolidado o vínculo de convivência entre o casal, assim como o embaralhar do patrimônio, o comprometimento recíproco e o entrelaçamento de vidas, surge o fato-ato jurídico da união estável, ensejando a incidência das normas constitucionais e, ainda, das normas supletivas e cogentes, de modo a converter a relação fática em relação jurídica.

Assim, a partir da identificação de elementos objetivos e, ainda, do pressuposto de caráter subjetivo, qual seja, o desejo de constituir família verifica-se que a relação construída entre a Sra. (xxxxxx) e o Sr. (xxxxxxx) revela a constituição da união estável, cujas características encontram-se elencadas no art. 1.723, do Código Civil que, ressalte-se, limitou-se a reproduzir a redação já existente, constante do art. 1°, da Lei 9.278/96. Veja-se:

Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.

Nessa perspectiva, em consonância com o dispositivo supracitado, pode-se concluir que o reconhecimento da união estável pressupõe a existência de uma convivência pública, duradoura e contínua dos companheiros, estabelecida com o objetivo de constituição de família, de modo que os conviventes assumem, perante a sociedade, a condição de como se casados fossem.

Ademais, destaque-se que, embora não haja, para a configuração da união estável, a exigência legal referente ao decurso de lapso temporal mínimo, não deve o vínculo de convivência ser efêmero, tendo em vista os aspectos de durabilidade e de continuidade mencionados na lei e, notadamente, presentes, in casu, haja vista o estabelecimento da relação do casal pelo período de 21 anos.

À vista disso, cumpre transcrever os seguintes entendimentos jurisprudenciais, em casos análogos:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - DIREITO DE FAMÍLIA - AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL - CONVIVÊNCIA PÚBLICA, DURADOURA E CONTÍNUA ESTABELECIDA COM O OBJETIVO DE CONSTITUIÇÃO DE FAMÍLIA - COMPROVAÇÃO SUFICIENTE - PARTILHA DOS BENS - APELO NÃO PROVIDO. 1- As provas dos autos, notadamente os depoimentos testemunhais, dão conta de que a demandante viveu em união estável com o demandado, coexistindo convivência pública, duradoura e contínua estabelecida com o objetivo de constituição de família, tendo sido destituída pelo comportamento agressivo do réu. 2- Partilha dos bens - os bens foram adquiridos pelo esforço comum, impondo-se a partilha do patrimônio. 3- Apelo não provido.

(TJ-PE - APL: 5099854 PE, Relator: Humberto Costa Vasconcelos Júnior, Data de Julgamento: 24/10/2018, 1ª Câmara Regional de Caruaru - 1ª Turma, Data de Publicação: 01/11/2018)

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APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL RELACIONAMENTO PÚBLICO E NOTÓRIO - PERÍODO DA CONVIVÊNCIA - ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO - RECONHECIMENTO DA UNIÃO ESTÁVEL - COABITAÇÃO REQUISITO PRESCINDÍVEL - RECURSO DESPROVIDO. A união estável resta configurada uma vez comprovados a presença dos requisitos subjetivos (animus de constituir família e relacionamento afetivo do casal) e objetivos (convivência alastrada no tempo e em caráter contínuo). A Lei não exige a coabitação como requisito essencial para caracterizar a união estável. Na realidade, a convivência sob o mesmo teto pode ser um dos elementos a demonstrar a relação comum, mas a sua ausência não afasta, por si só, o reconhecimento de uma união estável.

(TJ-MS - AC: 08011191720148120016 MS 0801119-17.2014.8.12.0016, Relator: Des. Marcelo Câmara Rasslan, Data de Julgamento: 02/06/2021, 1ª Câmara Cível, Data de Publicação: 11/06/2021)

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Ainda nesse sentido, oportuno mencionar os ensinamentos do ilustre doutrinador Flávio Tartuce:

A lei não exige prazo mínimo para a sua constituição, sendo certo que o aplicador do direito deve analisar as circunstâncias do caso concreto para apontar a sua existência ou não. Os requisitos, nesse contexto, são que a união seja pública (no sentido de notoriedade, não podendo ser oculta, clandestina), contínua (sem que haja interrupções, sem o famoso dar um tempo que é tão comum no namoro) e duradoura, além do objetivo de os companheiros ou conviventes de estabelecerem uma verdadeira família (animus familiae). (TARTUCE, 2019, p. 490)

No que tange ao regime de bens, não havendo estipulação pelos conviventes, incidirá, nos termos do artigo 1.725, do CC/02, o da comunhão parcial, de modo que os bens amealhados durante a convivência do casal serão considerados como produto da colaboração mútua, pertencendo, por conseguinte, a ambos, em partes iguais.

Neste diapasão, ainda que ocorra a aquisição de determinado bem por apenas um dos companheiros, em nome próprio, não haverá titularidade exclusiva, tendo em vista que, em razão do estado de mancomunhão, os bens adquiridos durante a convivência transformam-se em propriedade comum do casal e, portanto, havendo a dissolução da união estável, deverão os bens comuns ser partilhados de forma igualitária.

Vejamos o teor do artigo 1.725, do CC/02:

Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.

Assim, considerando que a aquisição do imóvel, em nome próprio, pelo ex-companheiro da Sra. (xxxxx), ocorreu durante o período de convivência do casal entre os anos de 2017 e 2018 e, ainda, tendo em vista a pretensão do Sr. (xxxxxx) no sentido de vender o referido imóvel, o valor deste, conforme as diretrizes fixadas em lei, deverá ser dividido pela metade entre os ex-companheiros.

Outrossim, no tocante à aquisição do veículo automotor, pelo ex-companheiro, Sr. (xxxxxx), através de financiamento, cumpre salientar que integrará a partilha dos bens somente a fração correspondente às parcelas pagas durante a convivência conjugal.

Dessa forma, faz-se mister destacar a plausibilidade do ingresso de ação de reconhecimento e dissolução de união estável com partilha de bens, de modo que, a partir da demanda, restará fixado o período de vigência da relação isto é, seu termo inicial e final sendo, ainda, identificado o acervo patrimonial comum, a fim de que se estabeleça sua divisão.

Oportuno ressaltar que, em observância à disposição contida no art. 9°, da Lei 9.278/96, a competência da demanda contendo matéria referente à união estável é da vara de família. Veja-se:

Art. 9° Toda a matéria relativa à união estável é de competência do juízo da Vara de Família, assegurado o segredo de justiça.

CONCLUSÃO

Ante o exposto, opino pelo cabimento de ação de reconhecimento e dissolução de união estável com partilha de bens.

É o parecer.

Juazeiro do Norte/CE, 26 de agosto de 2021.

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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