Revogação de prisão preventiva

17/12/2015 às 13:58
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Petição de revogação de prisão preventiva de Réu preso pelo crime contido no art. 157, § 2º, I, II e IV do CP

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA ÚNICA DA COMARCA DE ARINOS – MG

Autos nº

URGENTE: RÉU PRESO

                                   FULANO DE TAL, brasileiro, solteiro, estudante, filho de Augusta Mendonça Almeida e Orlando do Prado Sobrinho, inscrito no CPF sob o nº 019.649.396-07 e portador de documento de identidade MG-19.834.201, residente e domiciliado na Rua 12, Condomínio 137/1, casa 07, Vicente Pires, DF, CEP 72007-575, por sua Advogada que esta subscreve (procuração anexa), nos autos da Ação Penal em epígrafe que lhe move a Justiça Pública, vem respeitosamente à presença de Vossa Excelência requerer REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA, pelos fatos e fundamentos abaixo expostos.

                                   O Requerente foi preso em flagrante delito e denunciado pelo crime do artigo 157, § 2º, I, II e IV do Código Penal e encontra-se atualmente no Presídio da comarca de Unaí.

                                   A prisão em flagrante foi convertida em prisão preventiva (fls. 70 a 72), onde o nobre magistrado fundamentou a conversão nos preceitos dos artigos 310 e 312 do CPP, mormente para garantir a ordem pública (fls. 70 – verso).

                                   Em que pese o entendimento do nobre magistrado, os requisitos autorizadores da prisão preventiva não estão presentes no caso em tela, conforme se verá adiante.

                                   O Código de Processo Penal, relativamente à prisão preventiva, dispõe o seguinte:

Art. 312.  A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. 

                                   Sobre a primeira parte do dispositivo, Guilherme de Souza Nucci, em seu Código de Processo Penal Comentado, esclarece que (pág. 670): “extrai-se da jurisprudência o seguinte conjunto de causas viáveis para autorizar a prisão preventiva, com base na garantia da ordem pública: a) gravidade concreta do crime; b) envolvimento com o crime organizado; c) reincidência ou maus antecedentes do agente e periculosidade; d) particular e anormal modo de execução do delito; e) repercussão efetiva em sociedade, gerando real clamor público”. O ideal é a associação de, pelo menos, dois desses fatores,”

                                   Neste diapasão, é mister observar que:

a)  Não há que se falar em gravidade do delito in casu. Conferir: STJ: “A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que a existência de indícios  de autoria e prova da materialidade do delito, bem como o juízo valorativo sobre a gravidade genérica do crime imputado ao Requerente e sua periculosidade abstrata, não constituem fundamentação idônea a autorizar a prisão cautelar, se desvinculados de qualquer valor concreto ensejador da configuração dos requisitos do art. 312 do CPP.” (HC 245703-MG, 5ª.T., Rel. Gilson Dipp, 28.08.2012, v.u.) (grifei);

b)  O Requerente não apresenta nenhum envolvimento com o crime organizado;

c)   O Requerente é réu primário, estudante e é um cidadão comum que nunca representou qualquer perigo para o convívio em sociedade;

d)   A execução do delito não evidencia nenhuma crueldade, não foram utilizados explosivos  ou outros meios capazes de gerar perigo comum, do que se pode concluir que a consumação do crime não apresenta nada de anormal;

e)  O caso não alcançou nenhuma repercussão social, e em nada alterou a credibilidade da Justiça e do sistema penal.

                                   Pela análise acima, resta claro que o Requerente não apresenta nenhum risco à ordem pública, conforme fundamentado pelo nobre magistrado no momento da conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva. Corrobora este entendimento o julgamento do HC 94404-SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJe-110, divulgado em 17.06.2010 e publicado 18.06.2010, cujo trecho está abaixo transcrito:

A PRISÃO PREVENTIVA - ENQUANTO MEDIDA DE NATUREZA CAUTELAR - NÃO PODE SER UTILIZADA COMO INSTRUMENTO DE PUNIÇÃO ANTECIPADA DO INDICIADO OU DO RÉU. - A prisão preventiva não pode - e não deve - ser utilizada, pelo Poder Público, como instrumento de punição antecipada daquele a quem se imputou a prática do delito, pois, no sistema jurídico brasileiro, fundado em bases democráticas, prevalece o princípio da liberdade, incompatível com punições sem processo e inconciliável com condenações sem defesa prévia. (...) A GRAVIDADE EM ABSTRATO DO CRIME NÃO CONSTITUI FATOR DE LEGITIMAÇÃO DA PRIVAÇÃO CAUTELAR DA LIBERDADE. - A natureza da infração penal não constitui, só por si, fundamento justificador da decretação da prisão cautelar daquele que sofre a persecução criminal instaurada pelo Estado. Precedentes. A PRESERVAÇÃO DA CREDIBILIDADE DAS INSTITUIÇÕES E DA ORDEM PÚBLICA NÃO SE QUALIFICA, SÓ POR SI, COMO FUNDAMENTO AUTORIZADOR DA PRISÃO CAUTELAR. - Não se reveste de idoneidade jurídica, para efeito de justificação do ato excepcional da prisão cautelar, a alegação de que, se em liberdade, a pessoa sob persecução penal fragilizaria a atividade jurisdicional, comprometeria a credibilidade das instituições e afetaria a preservação da ordem pública. Precedentes. A PRISÃO CAUTELAR NÃO PODE APOIAR-SE EM JUÍZOS MERAMENTE CONJECTURAIS. - A mera suposição, fundada em simples conjecturas, não pode autorizar a decretação da prisão cautelar de qualquer pessoal (...) O CLAMOR PÚBLICO NÃO BASTA PARA JUSTIFICAR A DECRETAÇÃO DA PRISÃO CAUTELAR. - O estado de comoção social e de eventual indignação popular, motivado pela repercussão da prática da infração penal, não pode justificar, só por si, a decretação da prisão cautelar do suposto autor do comportamento delituoso, sob pena de completa e grave aniquilação do postulado fundamental da liberdade (...) O POSTULADO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA IMPEDE QUE O ESTADO TRATE, COMO SE CULPADO FOSSE, AQUELE QUE AINDA NÃO SOFREU CONDENAÇÃO PENAL IRRECORRÍVEL. (...) (grifei).

                                   Prosseguindo ao exame do disposto, também não se pode afirmar que a razão da prisão preventiva seja a conveniência da instrução criminal, vez que o Requerente não possui sequer meios ou razões para obstruir a investigação. Primeiramente, já confessou a autoria do delito, mostrando-se prestativo para com a apuração dos fatos e é improvável que venha atentar contra elas. Por fim, a suposta arma do crime já se encontra em poder das autoridades, de forma que não há como o Requerente suprimir provas da autoria.

                                   Ademais, data venia, o nobre magistrado não motivou as razões pelas quais considera que a prisão preventiva asseguraria a conveniência da instrução criminal, contrariando o disposto no artigo 93, IX da Constituição Federal. Sobre a ausência de fundamentação, leciona Nucci (pág. 684): “trata-se de constrangimento ilegal a decretação da prisão preventiva, quando o juiz se limita a repetir os termos genéricos do art. 312 do Código de Processo Penal, dizendo, por exemplo, que decreta a prisão preventiva pra “garantia da ordem pública”, sem demonstrar efetivamente, conforme os fatos do processo ou procedimento, de onde se origina esse abalo.

Nesse caminho: STJ: “Viola o disposto no art. 315 do CPP a decretação da prisão preventiva sem fundamentação vinculada ou concreta. O juiz deve sempre, para tanto, indicar efetivamente o suporte fático, de caráter extra-típico ou de peculiar e grave modus operandi, que justifique a segregação antecipada” (RHC8.105-SP, 5ª. T., rel. Felix Fischer, 20.04.1999, v.u., DJ 24.05.1999, p.181)”  (grifei)

                                   Nesse sentido: STF: “O decreto de prisão preventiva há que fundamentar-se em elementos fáticos concretos, que demonstrem a necessidade da medida constritiva” (HC 101.244-MG, 1ª T., rel. Ricardo Lewandowski, 16.03.2010, v.u.).

                                   A motivação das decisões judiciais repercute de forma imensurável no âmbito do processo, preservando o direito à ampla defesa, ao devido processo legal e à segurança jurídica. Assim "visa a possibilitar aos interessados impugnarem, com efetividade, as decisões dos magistrados e tribunais sobre as questões que lhes tenham sido postas à análise, bem como a garantir à sociedade que a deliberação jurisdicional foi proferida com imparcialidade e de acordo com a lei" (AVENA, p. 18).

É, pois, através da fundamentação da decisão que se avalia o exercício regular do Poder Judiciário, assegurando aos cidadãos garantia contra a arbitrariedade do poder punitivo estatal (decorrente do Estado Democrático de Direito). Noutros dizeres, a fundamentação é "garantia processual que junge o magistrado a coordenadas objetivas de imparcialidade e propicia às partes conhecer os motivos que levaram o julgador a decidir neste ou naquele sentido" (STF. HC. 105.879/PE. Rel. Ayres Britto. T2. Julg. 05.0.2011).

Após exaustivamente demonstrar que a prisão preventiva em tela não encontra amparo na disposição do artigo 312 do CPP, atente-se ao parágrafo único do artigo seguinte:

Art. 313.  Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva: 

(...)

Parágrafo único.  Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida.

                                   Ora, o Requerente já foi devidamente qualificado e possui moradia fixa, não havendo sombra de dúvida sobre sua identidade civil e localização. Desta forma, por que saturar ainda mais o já abarrotado sistema carcerário brasileiro com um preso sem nenhuma periculosidade e que possui endereço e identidade certos?

                                   Em relação à gravidade da conduta para se justificar o decreto da prisão preventiva, a jurisprudência é vasta:

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. CRIME DE ROUBO CIRCUNSTANCIADO. PRISÃO PREVENTIVA. ACUSADO REVEL. NECESSIDADE DA CUSTÓDIA CAUTELAR NÃO DEMONSTRADA. AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO CONCRETA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS PROVIDO.

1. A disposição prevista no art. 366 do Código de Processo Penal, inserida no ordenamento jurídico pela Lei n.º 9.271/96, não constitui hipótese de custódia cautelar obrigatória. Assim, a decisão que decreta a prisão preventiva, quando o réu é revel, também deve fazer menção à situação concreta, de forma a justificar a necessidade da prisão preventiva, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal.

2. O roubo circunstanciado não é crime hediondo, nos termos do rol taxativo do art. 1.º, da Lei 8.072/90, razão pela qual tal conclusão - inidônea - não pode justificar segregação cautelar.

3. É assente o entendimento nesta Corte de que a gravidade abstrata do delito em si não justifica a decretação de prisão processual (HC 178.830/SP, 6.ª Turma, Rel. Min. SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, DJe de 29/05/2013, v.g.).

4. A intenção de fuga, desde que concretamente demonstrada, pode justificar a necessidade da decretação da prisão preventiva para assegurar a aplicação da lei penal. Contudo, na presente hipótese, tal fundamentação não foi consignada pelo Juízo Processante, o qual decretou a custódia cautelar do Recorrente sem declinar quaisquer argumentos concretos.

5. Embora tenha o Parquet Federal, no Parecer oferecido no presente recurso, aduzido ser o Recorrente réu em mais de um processo-crime, tal fato não constou como fundamento do decreto constritivo ora impugnado. Portanto, não pode ser justificativa para desprover o recurso, sob pena de reforço de fundamentação em via de impugnação exclusiva da defesa.

6. Recurso ordinário em habeas corpus provido, para revogar o decreto prisional expedido em face do ora Recorrente, nos autos do processo-crime n.º 292.01.2008.013588-9 (2.ª Vara Criminal da Comarca de Jacareí/SP).

(RECURSO ORDINARIO EM HABEAS CORPUS 2013/0060916-0, Rel. Ministra LAURITA VAZ, publicado no DJE de 19/12/2013). (grifei)

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Ainda: STJ: “A gravidade do delito, por si só, não é razão suficiente para autorizar a custódia cautelar”, devendo haver outros requisitos associados a esse (HC 29.888-SP, 5ª T., rel. Laurita Vaz, 04.03.2004, v.u., Bol. AASP 2.379, p.3.161).

Não se pode olvidar que a falta de elementos concretos caracterizadores da periculosidade do agente e da gravidade da conduta é sustentáculo para a soltura do indiciado em prisão preventiva, conforme já decidiu acertadamente o Tribunal de Justiça do Paraná em caso muito semelhante:

DECISÃO: ACORDAM os integrantes da Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Paraná, por unanimidade de votos, em conceder a ordem, com extensão ao corréu. Oficie-se à MMª. Juíza de Direito da Vara Criminal da Comarca de Cianorte para que lavre o respectivo termo de comparecimento a todos os atos do processo e, aceitas as condições por BRUNO MAGNESI e PAULO HENRIQUE DE SOUZA JORGE, expeça alvará de soltura se por outro motivo não estiverem presos. EMENTA: HABEAS CORPUS. PACIENTE PRESO EM FLAGRANTE PELA PRÁTICA DO CRIME DE ROUBO MAJORADO. PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. GRAVIDADE ABSTRATA. PERICULOSIDADE NÃO DEMONSTRADA COM DADOS CONCRETOS. ORDEM CONCEDIDA, COM EXTENSÃO AO CORRÉU."Para decretar a prisão preventiva, deverá o magistrado fazê-lo com base em elementos concretos e individualizados aptos a demonstrar a necessidade da prisão do indivíduo, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal." (STF, HC 113119, Relator: Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 13/11/2012, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-237 DIVULG 03-12-2012 PUBLIC 04-12-2012). -- HC

(Processo: 1030529-0 (Acórdão), Rel. Rogério Kanayama, publicado no DJ: 1096 10/05/2013) (grifei)

Imperioso, por fim, destacar que a regra é a liberdade provisória, e a prisão é a exceção, em respeito inclusive ao princípio constitucional da presunção de inocência. Sobre a premissa, ensina Eugênio Pacelli de Oliveira na obra Curso de Processo Penal (pág. 471):“a partir, então, da Constituição de 1988, com todas as profundas alterações nela inseridas, de modo especial em relação às garantias individuais de quem se acha submetido a processo penal, o princípio da inocência tornou-se efetivamente uma realidade normativa, com toda a carga de positividade que vem expressa no art. 5º, §1º, da CF, segundo o qual “as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais tem aplicação imediata”. Com isso, a privação da liberdade deve ser sempre a exceção, daí porque depende de ordem escrita e fundamentada de autoridade judicial competente, e com base exclusivamente em razões de natureza cautelar.”

Assim, o direito à liberdade é garantia fundamental, bem jurídico tutelado pelo próprio Direito Penal, não podendo ser tolhido senão em virtude de motivo relevante.

Diante de todo o exposto, requer-se a revogação da prisão preventiva, com a expedição de ALVARÁ DE SOLTURA, por ser medida de justiça! Caso Vossa Excelência entenda necessário, seja a prisão preventiva substituída por uma das medidas cautelares previstas no art. 319 do Código de Processo Penal.

                                   Pede deferimento.

                                   Arinos, 17 de dezembro de 2015.

                                   Maria José Pereira - OAB/MG 89.957

                                  

Sobre o autor
Maria Pereira

Advogada há 7 anos atuando nas áreas Cível (Família, Sucessões, Contratos, Consumidor), Criminal e Extrajudicial (Inventários e Divórcios em Cartório).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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