Revisão criminal

09/05/2022 às 20:54
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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO MATO GROSSO.

J. F. M., brasileiro, casado, representante comercial, portador da carteira de identidade nº xx e CPF nº xx residente em Sobral-CE, na Av. P.o n.º X, bairro Centro CEP: 62.000-00, por seu procurador in fine assinado, com escritório na Rua X, nº x,  Sobral-CE, CEP , onde receberá intimações e notificações na forma da lei, vem à presença de Vossa Excelência, promover a presente

REVISÃO CRIMINAL

fazendo-o com fundamento nos incisos I, II e III do art. 621, do Código de Processo Penal, pelos motivos e fatos a seguir aduzidos:

I. DOS FATOS

A ré tem contra si sentença penal condenatória com trânsito em julgado de crime de furto de veículo automotor especialmente qualificado para fins de transporte para estadual ou internacional, conduta tipificada no art. 155, &5 do CP, como pena prevista de 03 a 08 anos de prisão, recebendo em concreto a pena de cinco anos de reclusão em regime fechado na Penitenciária de _____, a partir de 05/11/2011.

Na data dos fatos, em 18/10/2010, a ré fora presa em flagrante delito. Trata-se de flagrante previsto no artigo na forma do artigo 302, III do CPP, assim o crime de furto qualificado não chegou a se consumar, mas tão somente a consumação do furto simples.

Na audiência de instrução e julgamento, prevista no art. 400 do CPP, durante o depoimento das testemunhas, que constam nas fls.___ dos autos do processo crime, seguindo os ritos legais do Livro I, Título VI, capítulo VI do CPP, o depoente, pretenso comprador de boa-fé, confirmou a intenção da acusada em negociar o carro fora do território brasileiro. A ré confessou o crime em interrogatório, sendo obedecida as formas dos art. 197 e 200 do CPP, para fins de individualização da conduta art. 29 do CP, e eventual condenação Art.59 do CP e outros benefícios legais.

Cumpre-nos registrar que o bem furtado não foi restituído a vítima, ou ao seu patrimônio ou espólio, encontrando-se em local ignorado e não sabido, até a sentença final condenatória.

Apurou-se que ré, para fins de dosimetria da pena em eventual condenação, art.59 do CP, possuía maus antecedentes e é reincidente específica nesse tipo de crime, conforme qualificação da ré nas fls____, em atenção ao mandamento legal do art. 6, VIII e IX do CPP, conforme consta na qualificação da ré.

Infelizmente a vítima Gabriela veio a falecer no dia seguinte à subtração, em 19/10/2010, vitimada de enfarte sofrido logo após os fatos, uma vez que o veículo era essencial à sua subsistência. O resultado morte em nenhum momento foi querido ou desejado pela ré, se manifesta como designo absolutamente autônomo. Trata-se de causa absolutamente superveniente, que por si só poderia ter causado o resultado morte, que se originou na conduta delituosa da ré, mas não em sua esfera de consciência e vontade, cabendo a aplicação na espécie do caput do artigo 13 do CP.

Ao cabo da instrução criminal, a ré foi condenada a cinco anos de reclusão no regime inicial fechado para cumprimento da pena privativa de liberdade, a condenação transitou definitivamente em julgado, e a ré iniciou o cumprimento da pena em 10 de novembro de 2012.

A ré informou que, no dia 27 de outubro de 2010, antes de ser denunciada, que ocorreu em 30 de outubro de 2010, acolhendo os conselhos maternos, indicou o local onde o veículo estava escondido. O filho da vítima, nunca mencionado no processo, informou que no mesmo dia do telefonema, foi ao local e pegou o veículo de volta, sem nenhum embaraço, bem como que tal veículo estava em seu poder desde então.

Trata-se de fato novo que não consta dos autos do processo-crime nem foi levado a conhecimento do douto representante do MP, ou do Meritíssimo juiz sentenciante, antes da sentença penal em definitivo, fato, que implicou na impetração desta revisão de sentença criminal, para fins de restabelecer a justiça da decisão.

II. DO DIREITO

2.1. Do cabimento

O art. 621, inciso I, segunda parte, do Código de Processo Penal, prevê a revisão

dos processos findos quando a sentença condenatória for CONTRÁRIA À EVIDÊNCIA DOS AUTOS.

Art. 621. A revisão dos processos findos será admitida:

  1. - quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos;

II - quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos; III - quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena.

Segundo a doutrina de Nilo Batista,

"a evidência dos autos só pode ser algum coisa que resulte de uma apreciação conjunta e conjugada da prova. Não basta que o decisório se firme em qualquer prova: é mister que a prova que o ampare seja oponível, formal e logicamente, às provas que militem em sentido contrário" (Decisões criminais comentadas, Rio de Janeiro, Ed. Líber Júris, 1976, p. 120).

Perfeitamente CABÍVEL, portanto, a presente Revisão Criminal.

2.2. Desclassificação da conduta

Estabelecido que o objeto do crime não foi levado para fora do país, ao contrário, o mesmo foi devolvido ao filho da vítima antes da denúncia, faz-se mister a DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA PARA FURTO SIMPLES, com apenamento máximo de reclusão de 04 anos, do artigo 155, fazendo jus, mesmo no apenamento mais desfavorável a ré, se imputada pena base máxima menor que 04 (quatro) anos, o início do cumprimento da pena em regime semiaberto por força do art. 33, §2, b, uma vez que a reincidência do crime de furto qualificado pelo transporte internacional, pode ter reflexos temperados pelas circunstâncias judiciais do crime Súmula 269 STJ.

Estas circunstâncias são inteiramente favoráveis a ré, pois confessou o crime e restituiu a coisa objeto de furto.

2.3. Excesso de Pena

A ré foi condenada como incursa em conduta tipificada no art. 155, §5 do CP, Furto Qualificado Transporte para outro País, pela como pena prevista de 03 a 08 anos de prisão, recebendo em concreto a pena de cinco anos de reclusão em regime fechado na Penitenciária de ______, a partir de 05/11/2011.

O juiz sentenciante condenou a ré em 5 anos de prisão, em regime fechado desconsiderou a atenuante genérica da confissão do Artigo 65, inciso III, d do CP, mesmo em face da prisão em flagrante, que conforme exposição de motivos da parte especial, item 54 pode ocorrer antes, durante e depois do crime, compatível portanto com a prisão em flagrante.

Art. 65 - São circunstâncias que sempre atenuam a pena:

[...]

III - ter o agente:

d) confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime; {grifos nossos}

A confissão faz parte do processo-crime devidamente documentada. Trata-se de circunstância atenuante em favor da acusada que possui o direito público a seu favor, portanto de conhecimento necessário na ratio da sentença penal condenatória, a semelhança de todo as atenuantes do artigo 65 do CP quando incidente aos fatos, para fins da aplicação da Súmula 545 do STJ - Quando a confissão for utilizada para a formação do convencimento do julgador, o réu fará jus à atenuante prevista no artigo 65, III, d, do Código Penal.

Os fatos acimados indicam que a dosagem da pena foi abusiva e contrária ao texto legal, não sendo contemplado em qualquer caso a desclassificação da conduta criminosa para furto simples, a restituição do produto do crime como circunstância de natureza pessoal a favor da ré para fins de concessão do regime semiaberto, bem como não tratou da confissão da ré em processo, justificando assim a revisão criminal fundada no art. 621, I do CPP.

Art. 621. A revisão dos processos findos será admitida:

I - quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos;

2.4. Crime Formal Próprio

Trata-se de crime preterdoloso, crime de furto simples na conduta antecedente, e culpa no fato consequente no homicídio, devendo a ré responder ao aumento da pena em um terço do concurso formal próprio.

A ré responde por força do Art. 19 do CP a causa especial de agravamento da pena o qual infere que Pelo resultado que agrava especialmente a pena, só responde o agente que o houver causado ao menos culposamente, mas não no concurso material, pois apesar de cabível por se tratar de condutas de crimes diferentes, o crime consequente é culposo, não se inseriu na consciência e vontade do agente, que não poderia supor, diante das circunstâncias, que o bem tinha a natureza de relevância de fonte de sobrevivência a vítima, muito menos que sua ação geraria o resultado morte.

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Há crime formal próprio, identicamente, diante de uma só conduta, em todo seu curso criminoso, os designo da vontade da ré fora um só, o furto, não se inserido o resultado no fato consequente, a morte, esta constituindo-se causa absolutamente independente, conforme previsão do art. 13 do CP. Assim apresentado, temos o concurso formal próprio do artigo 70 do CP, digno de aumento no patamar de 1/6 a ½ da pena base, senão vejamos:

Relação de causalidade

Art. 13 - O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.

[...]

Concurso formal

Art. 70 - Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade. As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no artigo anterior. {grifos nossos}

Deve-se frisar, entretanto, que permanece a ré ter o início da pena em regime semiaberto, pois a pena base não entra no computo para esta concessão. O direito penal deve ser interpretado restritivamente, assim as causas de aumento de pena entram no computo somente no caso de crimes continuado Súmula 723 do STF, passemos a analisar:

Não se admite a suspensão condicional do processo por crime continuado, se a soma da pena mínima da infração mais grave com o aumento mínimo de um sexto for superior a um ano.

Não há o que se falar de unificação de pena no regime de concurso formal, por força de eventual conexão objetiva do crime, inocorrente no caso, inaplicável portanto disposto na Súmula 715 do STF.

A pena unificada para atender ao limite de trinta anos de cumprimento, determinado pelo art. 75 do código penal, não é considerada para a concessão de outros benefícios, como o livramento condicional ou regime mais favorável de execução.

2.5. Circunstância Especial de Diminuição de Pena

A ré restituiu a coisa furtada ao patrimônio da legítima da finada vítima, por intermédio de seu filho, herdeiro legal da vítima finada, de forma livre e desembaraçada, no dia 27 de outubro de 2010, antes de ser denunciada, em 30 de outubro de 2010, fato que não se fez constar nos autos de processo-crime. Sendo assim, a ocultação do bem objeto de furto, e que se constituiria prova no processo -crime acimado, dolosa ou não, se deu única e exclusivamente por ato do filho da vítima, não havendo o que se imputar a ré, afastando, por conseguinte, a incidência do art. 630, §2, a, do CPP.

Art. 630. O tribunal, se o interessado o requerer, poderá reconhecer o direito a uma justa indenização pelos prejuízos sofridos.

[...]

§ 2o A indenização não será devida:

a) se o erro ou a injustiça da condenação proceder de ato ou falta imputável ao próprio impetrante, como a confissão ou a ocultação de prova em seu poder;

Faz jus portanto ao benefício legal do artigo 16 do CP, uma vez que reparou integralmente o dano patrimonial, com a redução obrigatória da pena em 1/3 a 2/3 da pena base, na forma prevista artigo 68 do CP.

III. DOS PEDIDOS

Diante do exposto, com base no art. 626, do CPP, roga a revisionanda a Vossa Excelência o que segue:

  1. Que merece a ré ter RECONHECIDA A ATENUANTE GENÉRICA DA CONFISSÃO para fins de dosimetria da pena, conforme previsto no artigo 65, d do CP;

  2. Que merece a ré ter RECONHECIDA A REDUÇÃO DA PENA EM FACE DO ARREPENDIMENTO POSTERIOR, conforme previsto no artigo 16 do CP;

  3. Que seja DESCLASSIFICADA A CONDUTA DA RÉ PARA FURTO SIMPLES, conforme previsto no artigo 626 do CP, sem prejuízo do estabelecido no parágrafo único deste artigo,

  4. Que a SENTENÇA PENAL condenatória exarada em desfavor da ré, seja NULA AB INITIO, em sua integridade, extensão e efeitos, restabelecendo o status quo libertas, anterior a condenação da ré, e que seja EMITIDO IMEDIATO MANDADO DE SOLTURA DA RÉ, determinando sua colocação em liberdade sem quaisquer condições ou termos;

  5. Que o tribunal ANULE O PROCESSO AB INITIO, sem prejuízo do preconizado no art. 626, § único;

  6. Caso o tribunal entenda que não caiba anulação do processo-crime que PROCEDA A REVISÃO DA PENA DA RÉ, diante da nova classificação do crime, conforme previsto no artigo 626 do CP, sem prejuízo do estabelecido no parágrafo único deste artigo; e

  7. Que seja estipulada justa INDENIZAÇÃO EM FAVOR DA RÉ, em face do exercício arbitrário do Estado ao executar sentença criminal abusiva contra ré, atentando contra sua liberdade, em face do art. 630 do CPP.

Nestes Termos,

Pede e Espera Deferimento.

Local, data

SAMANTHA WINNIE BARROS LIMA

Advogada

OAB/UF n° XX.XXX

Sobre a autora
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