O superendividamento do consumidor é uma realidade, um problema sério, no qual os bancos também têm a sua parcela de culpa, em razão da oferta indiscriminada de crédito a consumidores já endividados.
Vale ressaltar que o salário é verba de natureza alimentar, sendo expressamente vedada por lei a sua retenção. Existem inúmeras decisões judiciais nesse sentido.
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Veja uma decisão neste sentido:
"Número do processo: 1.0377.07.009713-6/001(1) Númeração Única: 0097136-52.2007.8.13.0377 Acórdão Indexado!
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Relator: Des.(a) NICOLAU MASSELLI
Relator do Acórdão: Des.(a) NICOLAU MASSELLI
Data do Julgamento: 26/09/2007
Data da Publicação: 15/11/2007
Inteiro Teor:
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - DÉBITO EM CONTA CORRENTE PROVENIENTE DE SALÁRIO - IMPOSSIBILIDADE - ART. 7º, X, CF/88 C/C ART 649, IV, CPC - SOMENTE POSSÍVEL MEDIANTE AUTORIZAÇÃO DO CLIENTE - MULTA PELO DESCUMPRIMENTO - EXCESSIVA - PARCIAL PROVIMENTO. Autoriza o art. 7º, inciso X da CF, a proteção ao salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa. Determina o art. 649, inciso IV do CPC, a impenhorabilidade do salário, salvo para pagamento de prestação alimentícia. Sendo o salário impenhorável, só se considera lícito o débito em conta salário, se o banco for autorizado pelo cliente. A multa pelo descumprimento de decisão judicial não pode ensejar o enriquecimento sem causa da parte a quem favorece, como no caso, devendo ser reduzida a patamares razoáveis.
AGRAVO N° 1.0377.07.009713-6/001 - COMARCA DE LAJINHA - AGRAVANTE(S): BANCO ITAU S/A - AGRAVADO(A)(S): RÚBIA DE AGUIAR SATHLER CÉSAR - RELATOR: EXMO. SR. DES. NICOLAU MASSELLI
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 16ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO.
Belo Horizonte, 26 de setembro de 2007.
DES. NICOLAU MASSELLI - Relator
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
O SR. DES. NICOLAU MASSELLI:
VOTO
Conheço do recurso, presentes os seus pressupostos de admissibilidade.
Trata-se de Agravo de Instrumento com pedido de atribuição de efeito suspensivo proposto por BANCO ITAÚ S/A, em face da douta decisão de 1º grau, autos de AÇÃO ORDINÁRIA proposta por RÚBIA DE AGUIAR SATHLER CÉSAR, ora agravada, em que o Magistrado a quo em seu despacho de fl. 20 TJ, determinou que o agravante se abstivesse de efetuar sem autorização da agravada, lançamentos em sua conta corrente sob pena de multa.
Cuidam-se dos autos de Ação Ordinária interpostos pela agravada em face do agravante em razão de débitos em sua conta salário (nº 7381-6) referentes a empréstimos, financiamentos, cheque especial referentes à outra conta corrente (nº 01799-3).
Alegou a agravada em sua inicial, que possui na agência local do banco agravante 02 (duas) contas correntes, sendo uma convencional e outra para recebimento de salário. Em sua conta convencional adquiriu empréstimos, financiamentos, cheque especial e adiantamentos a depositantes, valores estes debitados mensalmente. Ocorre que com a não movimentação da conta convencional, o banco agravante passou a debitar os valores referentes às operações acima na conta salário da agravada. Requereu então em antecipação de tutela, que o banco se abstivesse de fazer qualquer tipo de débito em sua conta salário.
O Julgador deferiu a liminar, antecipatória, proferindo em seu despacho:
"(...) determino que o requerido se abstenha de efetuar lançamentos de débitos na conta salário da requerente, salvo se houver expressa autorização, sob pena de multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais)".
Inconformado com tal decisão em primeiro grau, a agravante apresentou o Agravo de Instrumento com pedido de efeito suspensivo.
Informações do I. Magistrado Primevo às fls. 97/101 TJ.
Sem contra minuta
A meu ver, razão não assiste ao agravante.
O agravante alega em seu recurso, que a referida conta possui ampla movimentação, não se tratando assim, de conta salário. Analisando os extratos bancários (fls.55/59TJ), verifico, principalmente a partir do ano de 2006, que a agravada teve descontos em sua conta corrente de valores totais do salário, ou seja, o que entrava na conta, o banco descontava. Deve ser esta a "ampla movimentação" alegada pelo recorrente.
Nesse contexto tenho como inaceitável a atitude praticada pela instituição bancária ao proceder, arbitrariamente, aos aludidos descontos, dada a natureza alimentar dos salários, sendo, portanto, vedada a sua retenção para pagamento de dívida perante instituições financeiras oriundas de contrato de cartão de crédito.
Neste sentido, decisão do STJ:
"BANCO. COBRANÇA. APROPRIAÇÃO DE DEPÓSITOS DO DEVEDOR. O banco não pode apropriar-se da integralidade dos depósitos feitos a título de salários, na conta do seu cliente, para cobrar-se de débito decorrente de contrato bancário, ainda que para isso haja cláusula permissiva no contrato de adesão . Recurso conhecido e provido" (STJ, Resp 492.777, Rel. Ministro Rui Rosado de Aguiar).
Este também é o entendimento deste Tribunal:
"É proibida a retenção, pelo banco, da remuneração mensal de médico contratado pelo INSS, a qual se equipara ao salário para os fins do art. 7º, inciso X, da Constituição Federal, texto constitucional de ordem pública e irrenunciável". (TJMG, Apelação Cível n. 360938-3, 9ª Câmara Cível, Rel. Des. Vanessa Verdolim Andrade, j. 01/10/2002).
"Inadmissível se faz a retenção pelo banco de valores creditados a título de salários na conta do servidor público por decorrente débito originado por contrato de mútuo, porque tais verbas têm natureza alimentar e se isentam até mesmo de sofrer constrição judicial, exceto na hipótese de execução por dívida de alimentos, devendo impor a instituição bancária que assim agiu a obrigação de repetir o indébito. "(TJMG, Apelação Cível n. 410.225-8, 14ª Câmara Cível, Rel. Des. Dídimo Inocêncio de Paula, j. 11/03/2004).
"Viola norma constitucional a privação de bens do devedor sem um anterior provimento jurisdicional, bem como a retenção salarial mediante bloqueio de conta corrente efetuada pelo credor em seu próprio benefício." (TJMG, Apelação Cível n. 454757-3, 12ª Câmara Cível, Rel. Des. Nilo Nivio Lacerda, j. 25/08/04).
Como se verifica, os tribunais vêm firmando o entendimento no sentido de que a ordem constitucional, vigente consubstanciada no artigo 5º, LIV, da CF/88, impede a privação de bens do devedor sem um anterior provimento jurisdicional, diante da disposição do artigo 7º, X, da Carta Magna, que veda a retenção salarial, para aliado a certeza emanada do artigo 649, IV, do CPC, considerar impenhoráveis e intocáveis, os vencimentos, salários e os proventos, salvo para pagamento de prestação alimentícia.
A jurisprudência pátria também já firmou o entendimento de que o lançamento de débito em conta somente é possível mediante autorização expressa do correntista, sem o que a conduta reveste-se de total ilicitude, sob a ótica contratual. Neste sentido, colhe-se:
"E M E N T A - CONTRATO DE ADESÃO. CARTÃO DE CRÉDITO. AUTORIZAÇÃO DE DÉBITO EM CONTA CORRENTE. REDAÇÃO CLARA. VALIDADE DO CONTRATO. RECURSO IMPROVIDO. I - É lícito ao banco debitar em conta corrente os valores oriundos de contrato de adesão de cartão de crédito, desde que a cláusula que prevê a autorização dos aludidos débitos tenha sido escrita de forma clara, preservando, assim, o princípio da autonomia da vontade. II - Recurso improvido" (Tribunal de Justiça do Distrito Federal, AC 5200999 DF, 3ª Turma Cível, julg. 23/08/1999, Rel. Des. Nívio Gonçalves, pub. Diário da Justiça do DF de 1º/12/1999, p. 19).
Os extratos apresentados demonstram que o salário da agravada, de R$ 700,00 (setecentos reais) aproximadamente, é absorvido em sua totalidade por lançamentos de débito em conta.
Já no que tange à multa determinada pelo Julgador a quo, caso seja descumprida a ordem, entendo ser esta excessiva. A decisão que arbitra multa por descumprimento pode ser revista a qualquer tempo e grau de jurisdição, não fazendo coisa julgada.
Entendo ser a multa arbitrada em R$ 10.000,00 excessivamente onerosa e superior à expressão econômica da obrigação, podendo gerar enriquecimento ilícito da parte requerida.
Nesse sentido:
"PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. MULTA POR DESCUMPRIMENTO DE DECISÃO JUDICIAL. EXCESSO. REDUÇÃO. A multa pelo descumprimento de decisão judicial não pode ensejar o enriquecimento sem causa da parte a quem favorece, como no caso, devendo ser reduzida a patamares razoáveis. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido." (REsp 793491 / RN ; Recurso Especial, 2005/0167371-8, Relator Ministro Cesar Asfor Rocha, Quarta Turma, DJ 06.11.2006 p. 337).
Mediante tais argumentos, dou parcial provimento ao recurso, para apenas reduzir o valor da multa determinada pelo D. Magistrado para R$ 1.000,00 (mil reais) em caso de descumprimento da decisão, mantendo nos demais fundamentos, incólume a decisão agravada.
Custas pelo agravante.
Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): SEBASTIÃO PEREIRA DE SOUZA e OTÁVIO PORTES.
SÚMULA : DERAM PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
AGRAVO Nº 1.0377.07.009713-6/001"