Prezada Raquel Cardoso,
De acordo com o Estatuto dos Militares – Lei 6.880/80, o direito do militar e seus dependentes à assistência médico-hospitalar, está assim delineada:
“Art. 50. São direitos dos militares:
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e) a assistência médico-hospitalar para si e seus dependentes, assim entendida como o conjunto de atividades relacionadas com a prevenção, conservação ou recuperação da saúde, abrangendo serviços profissionais médicos, farmacêuticos e odontológicos, bem como o fornecimento, a aplicação de meios e os cuidados e demais atos médicos e paramédicos necessários;
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IV - nas condições ou nas limitações impostas na legislação e regulamentação específicas:
§ 2° São considerados dependentes do militar:
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III - a filha solteira, desde que não receba remuneração;
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§ 3º São, ainda, considerados dependentes do militar, desde que vivam sob sua dependência econômica, sob o mesmo teto, e quando expressamente declarados na organização militar competente:
a) a filha, a enteada e a tutelada, nas condições de viúvas, separadas judicialmente ou divorciadas, desde que não recebam remuneração;
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§ 4º Para efeito do disposto nos §§ 2º e 3º deste artigo, não serão considerados como remuneração os rendimentos não-provenientes de trabalho assalariado, ainda que recebidos dos cofres públicos, ou a remuneração que, mesmo resultante de relação de trabalho, não enseje ao dependente do militar qualquer direito à assistência previdenciária oficial.”
Ou seja, o direito à assistência médico-hospitalar às filhas solteiras e as “nas condições de viúvas, separadas judicialmente ou divorciadas”, desde que NÃO recebam remuneração, estaria garantida, até porque os artigos da Lei 6.880/80 estão em plena vigência, basta acessar o link http://www.planalto.gov.br/CCivil_03/leis/L6880.htm.
Porém, o que se observa na atualidade é que, os órgãos das Forças Armadas, por escassez orçamentária que dificultam sobremaneira a disponibilização do referido direito aos próprios militares ativos e inativos, acabam por restringir o referido direito aos dependentes do militar, em especial, às filhas.
Nesta política, as instituições militares editam inúmeras normas infralegais (portarias, instruções gerais – IG, instruções reguladoras – IR, etc), restringindo a disponibilização do referido direito, principalmente em relação às filhas, se apoiando no inciso IV do Art. 50, ou seja, “nas condições ou nas limitações impostas na legislação e regulamentação específicas”, o que lhe permitiria regulamentar tal direito e, não, restringi-lo ou negá-lo.
Com tais condutas, os órgãos das Forças Armadas, acabam por inibir as filhas de usufruir os referidos direitos previstos na Lei 6.880/80. Muitas delas acabam por acatar tais restrições, por desconhecimento legal ou até mesmo por temor reverencial, até porque, tais negativas são informadas diretamente pelas autoridades militares às interessadas, no interior dos quartéis.
Outras filhas, por sua vez, acabam ingressando com ações na justiça, em desfavor da União (Forças Armadas), que, algumas vezes, ficam à mercê de decisões judiciais, que acabam por aceitar os argumentos do órgão estatal, entendendo pela impossibilidade atual do Estado arcar com esta responsabilidade, prevista em uma legislação (Lei 6.880/80). Tendo com argumento, que a referida norma está de certa forma ultrapassada, em desconformidade com nossa legislação atual, principalmente, com os princípios constitucionais – “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição” (CF, Art. 5º, I), o que convalidaria a política adotada pelos órgãos das Forças Armadas.
Assim, na atual realidade está, de uma lado, as Forças Armadas tendo que priorizar seus escassos recursos; os dependentes do militar e os próprios militares que, mesmo tendo alguns direitos previstos em lei (Lei 6.880/80), não pode usufruir os mesmos, por restrição dos próprios órgãos das Forças Armadas; e, por fim, o Poder Judiciário, cabendo por decidir sua a aplicação ou não das referidas normas, para que as filhas possam ou não usufruir tais direitos.
Vale, contudo ressaltar que a assistência-médico hospitalar, prevista no art. 50, "e", da Lei 6.880/80, bem como, a relação de dependência da filha em relação ao militar, não se enquadra como um direito adquirido (LICC, art. 6º, § 2º), isto porque, é um direito como muitos outros, que pode ser suprimido a qualquer momento, basta que uma nova norma (lei, não portaria!) seja editada, revogando os referidos dispositivos legais, para que deixem de existir. Vale a insistência de que tais normas (leis, não portarias!), na atualidade, ainda não foram editadas, pois os referidos dispositivos da Lei 6.880/80, ainda estão em plena vigência.
Cabe assim, as filhas que se enquadram na condição de dependente prevista no Art. 50, § 2° e § 3°, fazer referido pedido administrativo para usufruir da assistência médico-hospitalar, e, uma vez que seja negado tal direito, poderá recorrer às vias judiciais, através de um advogado de sua confiança.
Gilson Assunção Ajala - OAB/SC 24.492 ([email protected])