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As consequências da não observância dos prazos regressivos para a citação estipulados no NCPC

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Agenda 28/09/2022 às 22:19

Resumo: Trata-se de trabalho de conclusão de curso de Pós-graduação em Direito Processual Civil em que se analisam as consequências da não observância dos prazos regressivos para a citação encontrado no novel CPC, e o papel e responsabilidade do Oficial de Justiça na identificação de tal fato jurídico. Como conclusão obtém-se que no caso do ato de citação – ato de responsabilidade do Oficial de Justiça – em específico aquela que se refere a atos processuais com prazo regressivo, a nulidade se torna existente quando da não observância de tal requisito de validade, sendo de responsabilidade do Oficial de Justiça garantir que tal prazo seja obedecido, sob pena de nulidade insanável e ato não passível de ser convalidado.

Palavras chaves: Nulidade; Prazo Regressivo; Citação; Oficial de Justiça.

  1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho visa trazer à discursão a questão da possibilidade do reconhecimento ou não da nulidade das citações quando da não observância dos prazos regressivos exigidos na nova sistemática do Código de Processo Civil de 2015, e qual a atribuição do Oficial de Justiça nestes casos.

Bülow, em 1868, com seu livro Teoria dos pressupostos processuais e das exceções dilatórias, observou que a relação jurídica processual se distingue da de direito material por três aspectos: a) por seus sujeitos (autor, réu e Estado-juiz); b) por seu objeto (a prestação jurisdicional); c) por seus pressupostos (os pressupostos processuais). (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO. p. 298)

Às vezes a exigência de determinada forma do ato jurídico visa a preservar interesses de ordem pública no processo e por isso quer o direito que o próprio juiz seja guardião de sua observância. [...] (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO. p. 367)

É que há o entendimento, já herdado nas doutrinas que analisaram o código anterior, de que mesmo nula uma citação pode se convalidar quando o réu se manifestar voluntariamente no processo.

Contudo:

Uma das novidades em termos procedimentais do Novo Código está na previsão de uma audiência de conciliação ou de mediação antes da apresentação da defesa pelo demandado. Trata-se de previsão que visa a estimular a solução consensual dos litígios (art. 3º,§2º, CPC), concedendo à autonomia privada um espaço de maior destaque no procedimento. Além disso, constitui manifestação de uma tendência mundial de abrir o procedimento comum para os meios alternativos de solução de disputas, tornando a solução judicial uma espécie de ultima ratio para composição de litígios. [...] (MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, comentado, p. 427)

Diante disso, o novo CPC, ao invés de estimular uma cultura do litígio e da sua heterocomposição, procura fomentar a cultura do diálogo e da autocomposição. Isso porque, em vez de desenhar um procedimento em que a primeira participação do réu é uma participação litigiosa (oferecimento de defesa mediante contestação), engendrou um procedimento em que a sua primeira participação no processo é uma  participação voltada para o diálogo, na medida em que o réu é citado para comparecer a uma audiência voltada para a conciliação (art. 334), que poderá inclusive desembocar em uma tentativa de mediação do litígio por conciliadores e mediadores especializados (arts. 165 e 175). Apenas quando todas as partes manifestarem expressamente o desinteresse na autocomposição ou for impossível a autocomposição pela natureza do direito debatido é que se assinalará prazo ao réu para, querendo, contestar  o pedido (art. 334, § 4º). (MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, p. 359-360)

Neste contexto, contudo, com a marcação da nova audiência prévia de conciliação ou mediação é possível adotar o posicionamento de realizar citações, desconsiderando os prazos regressivos para efetivá-las, e assim assumindo o risco de a nulidade não se convalidar ante a possibilidade do réu não se apresentar à mesma? E quais as consequências processuais que tal posicionamento pode implicar na prática?

Estas são as questões que trazemos a tona para iniciar o debate doutrinário e, assim, de certa forma, contribuir para o aperfeiçoamento da prática processual.

  1. DA CITAÇÃO

O centro da discursão, neste presente trabalho, envolve um importantíssimo ato processual, da mais elevada essencialidade para o processo, e que se trata da comunicação processual que dá início a relação jurídica processual. Trata-se, pois, de uma exigência que se coaduna perfeitamente com os Princípios Constitucionais do Contraditório e da Ampla Defesa, posto que sem a citação não há como alguém tomar conhecimento, de forma válida, da ação que outrem propõe contra sua pessoa.

É, também, condição de aperfeiçoamento do processo, conforme se infere a seguir:

[...] A citação angulariza a relação, aperfeiçoando o processo, considerando que, embora a ação seja considerada proposta quando a petição inicial é protocolada, essa situação permanece em estado de hesitação até o réu seja convocado a apresentar a sua defesa. (MONTENEGRO FILHO, p. 245)

Neste contexto, a doutrina assim define o instituto da Citação:

[...] definiu-se ontologicamente a citação como um ato de integralização da relação jurídica processual (que é triangular); e teleologicamente a citação dá ao citado a oportunidade de ingressar na relação jurídica processual e defender seus interesses, máxime pela apresentação de defesa. (PAULA, p 159)

Contudo, o réu ao ser citado não é simplesmente “chamado” para integrar a relação processual, havendo, por parte do mesmo, discricionariedade para escolher, mas sim, “convocado”. É que não é da escolha do réu integrar ou não o processo, bastando que a citação seja válida para que o mesmo esteja integrado à relação processual.

A doutrina moderna, destarte, assim explica o ato processual em comento:

Com a citação, dá-se notícia ao demandado de que foi ajuizada ação em que se pede tutela jurisdicional contra ele e, citado, passa o demandado a integrar a relação processual. Não apenas “dá-se ciência”, mas vai-se além, e chama-se (ou convoca-se). Essa definição condiz com o que ocorre com o réu ou o executado, mas cita-se, também, o interessado em procedimentos não contenciosos (denominados, pela lei, de jurisdição voluntária) que, então, recebe a notícia sobre o requerimento respectivo (cf. art. 721 do CPC/2015). A despeito da redação do art. 238 do CPC/2015, aquele que é citado não é chamado para “vir integrar” a relação processual; quem é citado é, como se disse, “convocado”, mas integra a relação processual tão só pelo fato de ter sido citado. Com a citação há nova relação, distinta da anterior, que havia apenas entre demandante e juiz (por isso, é possível afirmar, sob certa perspectiva, que inexiste processo quando o réu; sobre ineficácia do processo, enquanto não citado o réu, cf. comentário ao art. 239 do CPC/2015). A citação, assim, “é ato de comunicação responsável pela transformação da estrutura do processo, até então linear – integração por apenas dois sujeitos, autor e juiz – em triangular, constituindo pressuposto de validade dos atos processuais que lhe seguirem” (STJ, Resp 1.280.855/SP, rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª T., j. 06.03.2012). [...] (MEDINA, p. 387).

Seguindo o raciocínio doutrinário supramencionado, a definição do ato de comunicação processual em comento, no Novo Código de Processo Civil de 2015, é informada em seu artigo 238, e faz uma interpretação autêntica, ao rezar que: “Citação é ato pelo qual são convocados o réu, o executado ou o interessado para integrar a relação processual.”.

É, pois, salutar a preocupação do operador do direito em preservar e evitar que o ato de citação seja eivado de qualquer vício que o invalide, tamanha é a sua importância para todo o processo, posto que é pressuposto de validade deste. É o que tentaremos analisar e mostrar nos próximos tópicos.

  1. OS PRAZOS REGRESSIVOS DA CITAÇÃO NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Antes de adentrar efetivamente na questão que aqui se propõe, necessário torna-se analisar alguns pontos essenciais para se entender a problemática, principalmente inovações que o novo diploma processual traz, dentre os quais o prazo regressivo entre a citação e a audiência prévia.

O novel Código de Processo Civil – Lei nº. 13.105, de 16 de março de 2015 – introduziu no ordenamento jurídico pátrio um novo procedimento, o procedimento comum, e, com ele, várias inovações, dentre elas, a necessidade de respeito a prazo regressivo para a citação, a contar da data da audiência preliminar de conciliação ou mediação.

Os prazos regressivos em si, contudo, não são uma novidade na lei processual e a doutrina os definem, sem nenhuma celeuma, conforme se expõe na citação abaixo transcrita:

Existem alguns prazos que são contados de trás para frente. São prazos de antecedência, isto é, o mínimo de distância que um ato deve ter em relação a um outro que lhe sobrevenha. Como exemplos podem ser citados o de dez dias para arrolar testemunhas, antes da audiência de instrução, e o de dez dias que deve mediar a citação e a audiência inicial [...]. A contagem inicia-se no primeiro dia útil que antecede o ato subsequente. [...] A partir daí, ele flui regressivamente até chegar-se ao último dia, o mais distante do ato subsequente. O último dia deve ser também útil, sob pena de prorrogar-se ao dia útil imediatamente antecedente. (GONÇALVES, p. 307-308)

Inclusive, a contagem se realiza da mesma forma que os prazos progressivos, excluindo o dia do começo e incluindo o do vencimento. É o que leciona Fux, a seguir:

Há prazos em que a contagem é regressiva [...]. Deveras, na contagem regressiva dos prazos, deve-se observar também a regra do art. 184 do CPC[3]. Isto é, o prazo não pode ter início em dia em que não houve expediente forense, mas sim no primeiro dia útil anterior. (FUX, Luiz. p. 335)

Observa-se a instituição de referidos prazos regressivos nos seguintes artigos do NCPC:

Art. 334. Se a petição preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência.[4] (Grifo Nosso)

Art. 695[5]. [...]

§ 2º. A citação ocorrerá com antecedência mínima de 15 (quinze) dias da data designada para a audiência.[6] (Grifo Nosso)

     Tal inclusão de referido prazo regressivo no lapso entre a citação e a audiência inicial se deu porque o NCPC concedeu extrema importância à audiência prévia de conciliação ou mediação no procedimento comum, criando vários atos que podem ser realizados antes da mesma, tudo no intuito de tornar viável a autocomposição das partes, evitando, assim, desgastantes e prolongadas disputas judiciais.

Esse, pois, é o prazo mínimo a ser respeitado. Não há, a nosso ver, justificativa para que o prazo mínimo seja tão logo. (MEDINA, p. 561).

No mesmo sentido é Cambi, a seguir citado:

A audiência de conciliação ou de mediação deve ser agendada com prazo mínimo, especialmente para que o réu possa se preparar adequadamente, inclusive comunicar-se com seu advogado ou com um defensor público. Para tanto, é indispensável a citação do réu e o agendamento da audiência com, pelo menos, vinte dias de antecedência. Por sua vez, uma vez designada a audiência, deverá o autor ser intimado na pessoa de seu advogado (art. 334, §3º, NCPC). (CAMBI, Eduardo, p. 887)

Nesse contexto, forçoso é concluir que as palavras “devendo” e “ocorrerá” encontradas nos dispositivos legais supracitados devem ser interpretados de forma literal e sistemática – posto que as consequências legais futuras, ante a importância e natureza da citação, devem ser consideradas – em respeito, pois, aos princípios da Legalidade, Efetividade, Eficiência e do Devido Processo Legal.

É o que tentaremos expor nos tópicos a seguir.

  1. DA NULIDADE NA CITAÇÃO

  1.  DA NULIDADE

Nulidade é a consequência legal que se impõe ao ato processual eivado de vícios. Para a doutrina, [...] sob a ótica de mediana compreensão, é a decorrência natural do defeito da forma processual [...] (OLIVEIRA, p. 326), e, [...] A consequência natural da inobservância da forma estabelecida é que o ato fique privado dos efeitos que ordinariamente haveria de ter. (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO. p. 363)

  1.  DA CITAÇÃO VÁLIDA

É consenso entre aqueles que dialogam nas disputas travadas nos processos judiciais que determinada nulidade de ato processual apenas será declarada se ocorrer prejuízo às partes, caso, realizado de outra forma, alcance sua finalidade. O que tanto era previstos na legislação revogada quanto no nosso atual CPC: Art. 276. Quando a lei prescrever determinada forma, o juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade.

Igualmente observa-se do seguinte artigo, também extraído do NCPC:

Art. 283. O erro de forma do processo acarreta unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados, devendo ser praticados os que forem necessários a fim de se observarem as prescrições legais.[7] [...]

Contudo, o mesmo não pode ser entendido quanto aos atos de comunicação processual, posto que o mesmo código que permite uma flexibilização nas declarações de nulidades de atos processuais distintos destes, conforme retromencionado, parece não conceder tal tratamento no caso das citações e intimações.

Ora, se realmente indistintamente os atos processuais devem ser convalidados, ainda que nulos, se não ensejarem prejuízos, então porque o NCPC traria dispositivo específico dizendo que se não se observar as formalidades legais dos atos de comunicações processuais, diferentemente dos demais atos processuais, aqueles serão nulos, conforme se transmite o dispositivo: Art. 280. As citações e as intimações serão nulas quando feitas sem observância das prescrições legais?

O que é reforçado pela ressalva informada na inteligência do artigo 188 do NCPC: “Art. 188. Os atos e os termos processuais independem de forma determinada, salvo quando a lei expressamente a exigir, considerando-se válidos os que, realizados de outro modo, lhe preencham a finalidade essencial.[8]

São, pois, atos solenes[9] cujo tratamento relativo às nulidades é mais rigoroso, conforme leciona insigne doutrinador na citação a seguir:

A forma nas intimações e citações é da essência do ato e não apenas meio de prova. Daí por que o código considera nulos os atos de comunicação processual feitos sem observância dos preceitos legais. [...] Admitem, todavia, suprimento pelo comparecimento da parte, desde que não tenham sofrido prejuízo em sua defesa pela deficiência do ato (art. 282 e 239, §1º).[10]

A natureza transrecisória e as consequências legais da citação nula respondem a indagação dos parágrafos anteriores a citação supra, posto que denotam um prejuízo que vai além das partes e afronta o próprio Ordenamento Processual.

E é o que veremos nos próximos tópicos.

  1.  DA EXIGIBILIDADE DE OBSERVÂNCIA DOS PRAZOS REGRESSIVOS NA CITAÇÃO NO NCPC

A Teoria dos Prazos revela cindo Princípios Informativos, quais sejam: Utilidade; Continuidade; Inalterabilidade; Peremptoriedade; e Preclusão. No que se impõe a analisar neste trabalho, apenas o Princípio da Inalterabilidade é que se mostra relevante.

É que a prática de alguns juízes, digo minoria, de admitir nas secretarias das varas que os mesmos exercem a jurisdição – a disponibilização do mandado de citação ao Oficial de Justiça em lapso inferior aos prazos regressivos exigidos no NCPC – pode configurar uma arbitrariedade que afronta o referido Princípio da Inalterabilidade dos prazos.

Leciona a doutrina:

Por esse princípio, que também deriva do princípio da utilidade, não pode o juiz alterar ou modificar prazo. Daí decorrem os princípios da improrrogabilidade e o da irredutibilidade. Há uma exceção a respeito. Havendo acordo entre as partes, pode-se prorrogar ou reduzir os prazos dilatórios. [...] (DANTAS, p. 517)

Ou seja, ao admitir, o juiz, que sua secretaria disponibilize o mandado de citação ao Oficial de Justiça poucos dias antes da audiência prévia de conciliação ou mediação, estar-se-á, em verdade, alterando o prazo regressivo exigido pela lei. Um flagrante desrespeito ao princípio em tela.

No mais, é preciso diferenciar o prazo trintídio (Artigo 334, Caput, do NCPC) direcionado ao juiz, para dar o despacho inicial, com o prazo regressivo objeto de analise desse presente trabalho: o prazo de 20 ou 15 dias de antecedência da citação em relação a audiência prévia de conciliação ou mediação.

É que por obvio, ante as dificuldades que uma vara pode conter, em face da extrema quantidade de processos, bem como da ausência de sanção para o caso do juiz inobservar o trintídio retromencionado, não se revela razoável admitir qualquer vício neste caso, conforme se depreende do seguinte entendimento doutrinário:

Esse mesmo dispositivo também determina que essa audiência deva ser designada num prazo de até 30 (trinta) dias. Todavia é preciso interpretar essa regra como uma diretiva a ser aplicada pelo juiz, mas não como uma norma impositiva por dois motivos: primeiro que, em termos processuais, nenhuma sanção poderá ser aplicada ao juiz caso desrespeite o trintídio solicitado pelo artigo 334; quando muito haverá uma sanção disciplinar ao juiz em vista de reiterados desrespeito ao trintídio (portanto em razão de vários processos e não especificamente de um). O segundo porque a regra do trintídio contida no artigo 334 não olha para a realidade dos juízos, onde a designação de uma audiência deve estar de acordo com a disponibilidade da sua agenda, de tal sorte que esse prazo pode ser desrespeitado justificadamente. Portanto, reitera-se que o trintídio assinalado no artigo 334, caput, do CPC, se referea uma diretiva e não a uma regra impositiva. (PAULA, p. 175)

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Diferentemente, contudo, é o desrespeito ao prazo de 20 ou 15 dias (Ações de Família) de antecedência da citação em relação a audiência prévia de conciliação ou mediação, posto que, por ser a citação um ato solene, de observância irredutível da formalidade, deve, indubitavelmente, obedecer todos os nuances estipulados pela lei, dentre os quais, em especial, o prazo regressivo retromencionado, sob pena de declaração de nulidade da referida comunicação processual e de todos os atos subsequentes.

Passemos, nos tópicos seguintes, a aprofundar a questão em tela.

  1.  DO DEVER DE SE RECONHECER NULIDADES ABSOLUTAS

Vimos que a citação é ato jurídico processual da mais extrema estima. A importância do ato citatório é de tal envergadura que não se presume a sua regularidade. [...] (FUX, Luiz. p. 363) É preciso, pois, fazer juízo de validade do ato citatório, para, numa análise técnica, declarar-se que o mesmo é regular. Por isso diz-se que o mesmo não é meramente ato de prova, mas de essência do processo.

Tanto é assim, que sem a citação não existe relação jurídica processual e, consequentemente, não há processo propriamente dito. É o que leciona a doutrina no trecho a seguir:

São apontados como pressupostos de existência o pedido, a investidura na jurisdição daquele a quem o pedido é endereçado e as partes, salientando-se, inclusive, a necessidade da citação do réu, sob o pressuposto de que sem ela não existiria relação jurídica processual e, assim, processo propriamente dito, mas apenas uma relação jurídica entre o autor e o juiz. [...] (MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, p. 543)[11]

Observe que a citação valida é pressuposto processual de validade do processo, gerando nulidade absoluta que não se convalida nem com o transito em julgado.

Salienta Neves:

Doutrina majoritária aponta acertadamente que a citação válida é pressuposto processual de validade do processo, sendo que o vício nesse ato processual gera uma nulidade absoluta, que excepcionalmente não se convalida com o transito em julgado, podendo ser alegado a qualquer momento, mesmo após o encerramento do processo. [...] (NEVES, p. 61)

Trata-se, pois, de matéria de ordem pública.

E, referindo-se a nulidades,

[...] nas absolutas a forma é destinada a resguardar interesses de ordem pública, ao passo que, na relativa, busca apenas a preservação dos interesses das próprias partes. Na nulidade absoluta, a exigência do respeito à forma é mais imperativa e cogente do que a relativa. (GONÇALVES, p. 314-315)

Depreende-se, pois, que o vício que se apresenta na forma da citação gera nulidade absoluta, posto que a observância da solenidade do ato processual citatório objetiva resguardar os interesses de ordem pública.

Neste sentido, hialino é o dever lídimo do juiz de declarar referidas nulidades no caso em tela.

Diante de uma irregularidade, em sentido amplo, deve o juiz: mandar repetir o ato indispensável e declarado nulo, ao mesmo tempo que deve, também, declarar todos os demais atingidos e que igualmente devem ser repetidos; ou mandar retificar o ato, alterando-o parcialmente ou complementando-o. O ato será considerado sanado ou convalidado se a parte expressamente o aceitar, ou, no caso em que não haja nulidade absoluta, deixar de manifestar-se contra o modo como foi praticado. [...] (GRECO FILHO. p. 80)

Indubitável, pois, o mister do juiz de declarar nulidades absolutas, principalmente quando atingem atos que se consubstanciam essenciais ao desenvolvimento válido do processo, em especial o ato processual de citação.

Considerando, porquanto, que a inobservância do prazo regressivo nos atos citatórios hodiernos é desrespeito a formalidade exigida pela lei, e, com isso, gera ato nulo que se configura como absoluto, por ensejar consequências que afrontam diretamente normas cogentes, de interesse público, como, por exemplo, o §5º do artigo 334 do NCPC que estipula prazo de 10 (dez) dias de antecedência da audiência prévia de conciliação ou mediação para que o réu, por petição, indique seu desinteresse na autocomposição, a citação realizada sem observância do prazo regressivo do caput do mesmo artigo, se desrespeitado, deve ser  declarada nula ex officio pelo magistrado.

  1.  INOBSERVÂNCIA DO FORMALISMO NAS NULIDADES ABSOLUTAS

Conforme vimos, com a citação realizada de forma inválida, [...] a ineficácia do ato decorre sempre do pronunciamento judicial que lhe reconhece a irregularidade (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO. p. 364), e, as excludentes [...] da obtenção da finalidade e da ausência de prejuízo, não se aplicam, todavia, no caso de nulidade absoluta [...] (GRECO FILHO. p. 77)

Neste intento, mister é a necessidade do operador do direito, no caso, o Oficial de Justiça, de ater-se aos requisitos legais para a prática do ato citatório, em especial ao tempo correto, posto que pelo contrário, estar-se-á a admitir a realização de ato processual eivado de vício insanável, haja vista a natureza absoluta da nulidade em tela.

É o que leciona Câmara, no seguinte trecho de sua obra:

O ato processual (empregada a expressão aqui em sentido amplo, de modo a englobar também o negócio processual) deve ser realizada em conformidade com um tipo (isto é, um esquema abstrato predisposto pela lei). Assim é que o ato processual precisa ser praticado no tempo correto, no lugar certo e pelo modo adequado. Qualquer inobservância dessas exigências implicará um vício formal, por força do qual se terá o ato atípico. Pois o ato processual atípico é inválido. (CÂMARA, p. 148)

E, ainda, conclui:

Será, pois, inválido o ato processual sempre que praticado com inobservância de alguma norma jurídica que estabeleça uma forma a ser respeitada quando de sua prática. A forma dos atos processuais é uma garantia de segurança jurídica e de respeito às normas, e existe para que se estabeleçam técnicas adequadas para a produção dos resultados a que os atos processuais se destinam. O vício de forma, portanto, contamina o ato processual, tornando-o inválido. (CÂMARA, p. 149)

Ou seja, em matéria de atos processuais solenes – como é o caso da citação – o brocardo “os fins justificam os meios” não se aplica, posto que os meios são da mais alta essência do ato, sendo a observância aos requisitos formais condição sine qua non para que tais atos se consubstanciem em juridicamente válidos.

  1.  O INTERESSE PÚBLICO COMO NORTE DO JUIZ NO RECONHECIMENTO DA NULIDADE

O reconhecimento da nulidade de uma citação, contudo, não é necessário quando o interesse público torna a ausência da mesma um fato jurídico irrelevante, ante ao desfecho que o juiz pode dar, fundando-o nos princípios da economia processual e celeridade. É que às vezes a falta de citação não é relevante quando a própria lei possibilita o desfecho com a extinção do processo sem a citação do réu.

É o que revela Neves:

[...] Com a citação válida do demandado complementa-se a relação jurídica processual, sendo tal ato de essencial importância para a regularidade do processo. Existem previsões legais, entretanto, que permitem a extinção do processo antes da citação do réu (arts. 285-A e 295 do CPC[12]), não se podendo afirmar que nesses casos a citação seja indispensável. A citação válida, portanto, só pode ser considerada pressuposto processual nos processos em que a citação é necessária, havendo somente nesses casos irregularidade procedimental se não ocorrer a citação válida. (NEVES, p. 61)

Ou seja, em resumo: a falta de pressuposto processual apenas impede o julgamento do mérito quando instituído em favor do interesse público. (Grifo Nosso) [...] (MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, p. 550)

No mais, não seria razoável, nem condizente com os Princípios da Celeridade e Economia Processual, por exemplo, numa demanda em que a matéria seja exclusivamente de direito – sem conteúdo probatório a ser analisado –, e, havendo jurisprudência pacifica favorável ao réu e não sendo realizada a citação de forma válida, após várias tentativas, o juiz extinguir tal processo sem resolução de mérito. Mais plausível seria se este juiz julgasse o mérito proferindo sentença de improcedência do pedido do autor.

É o que se leciona a seguir:

Semelhante raciocínio explica a razão de ser dos arts. 282, §2º. e 488 do CPC. Essas normas, embora não digam respeito apenas aos casos de defeitos ligados aos pressupostos processuais, conferem ao juiz poder de, sempre que o mérito for favorável a parte a quem aproveitaria o pressuposto processual não presente, proferir sentença de mérito ao seu favor. Quando o mérito for favorável ao réu, a ausência de pressuposto voltado a sua proteção não retira do juiz o dever de proferir sentença de improcedência, de modo que a ausência de pressuposto impedirá a tutela do direito material, mas não o julgamento do mérito. No caso em que o mérito é favorável ao autor, o juiz poderá conceder a tutela do direito se o pressuposto negado tiver o objetivo de proteger-lhe. (MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, p. 550)

No mesmo sentido, voltando ao tema desta monografia, se daria o desfecho de uma ação quando a citação, no processo civil, se desse sem observância dos prazos regressivos de 20 ou 15 dias, este último caso nas ações de família, e que, apesar da nulidade absoluta que aqui defendemos, se a lide tratar de matéria exclusivamente de direito, jurisprudencialmente pacífica e favorável ao réu, ainda que este não integre a ação por entender que a citação inválida não lhe obriga a se apresentar à audiência prévia de conciliação ou mediação, nem de contestar, o juiz, em observância ao artigo 488[13] do CPC, bem como aos Princípios da Celeridade e Economia Processual, à bem do interesse público, poderá, mesmo sem o pressuposto de validade processual em comento, proferir sentença de improcedência do pedido, extinguindo-se, assim, com resolução do mérito, o processo exemplificado.

  1.  DA NATUREZA TRANSRESCISÓRIA DA CITAÇÃO

Pelo contrário, contudo, se o processo se desenvolver seguindo seu curso, mesmo com a citação inválida, a pretexto, por exemplo, do réu ser revel por não se apresentar a audiência de conciliação ou mediação, nem contestar, havendo inobservância do prazo regressivo que antecede tal audiência, a citação perpetuar-se-á no processo com o vício que a torna nula, e, sendo este ato de comunicação da essência do processo, mesmo que referida lide transite em julgado, devido a sua natureza transrecisória, poder-se-á retornar a análise do mérito por estar flagrante a nulidade de todo o processo.

De forma não diferente é o raciocínio de neves a seguir transcrito:

Importante consignar a singularidade da nulidade absoluta gerada nesse caso. A citação válida é considerada tão essencial para a regularidade do processo que sua ausência na demanda judicial gera uma nulidade absoluta sui generis. Como não interessa ao sistema jurídico a convalidação desse vício, entende-se que esse vício não se convalida nunca, podendo a qualquer momento ser alegado pela parte, até mesmo após o prazo de ação recisória, por meio da ação de querela nullitatis. Trata-se de vício transrescisório que, apesar de situação no plano da validade, jamais se convalida. (NEVES, p. 61)

Indubitável é, pois, os malefícios que a atitude de fazer “vista grossa” a eventual nulidade gerada pela inobservância de prazos regressivos que a lei impõe entre o ato da citação e a realização da audiência prévia de conciliação ou mediação.

  1.  DA ADEQUADA INTERPRETAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS

Vimos que A citação será invalida se, realizada em desacordo com as prescrições legais (art. 280, CPC), não cumprir com a sua finalidade e causar prejuízo à parte. [...] (MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, comentado, p. 336).

A doutrina, no entanto, leciona e informa a existência do Princípio da Instrumentalidade das Formas, a seguir explicado:

As invalidades (perdoe-se a insistência) resultam de vícios de forma (entendido o conceito de forma em seu mais amplo, a abranger o tempo, o lugar e o modo pelo qual o ato processual deve ser praticado). E isto decorre do fato, já mencionado, de que a forma do ato processual é um mecanismo constitucionalmente legítimo de asseguração dos resultados a que cada ato se dirige. Assim é que praticar o ato com observância de forma garante que os resultados a que o ato processual se dirige serão alcançados. Pois é exatamente daí que resulta o princípio da instrumentalidade das formas (art. 277), por força do qual o ato praticado por forma diversa da prevista em lei será reputado válido “se, realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade”.

Deve-se compreender por finalidade do ato o objetivo a que o mesmo, por força de lei, se dirige. Trata-se, pois, do exame da finalidade a partir de um critério funcional, e não da análise dos objetivos pretendidos por aquele que pratica o ato. [...] (CÂMARA, p. 150) (Grifo Nosso)

Neste intento, revela-se que a citação, hodiernamente, não tem por finalidade apenas dar conhecimento ao réu da demanda que a ele se confronta, nos moldes da doutrina quando da análise do Código de Processo Civil de 1973: Citação é ato pelo qual se dá ciência ao réu ou interessado da existência do processo, e se lhe concede a possibilidade de defender. (Gonçalves, p. 319).

O novo CPC deu alcance maior ao referido conceito incluindo os desideratos do novel Princípio da Cooperação, haja vista que, ao assim conceituar a comunicação processual em comento – Art. 238. Citação é o ato pelo qual são convocados o réu, o executado ou o interessado para integrar a relação processual – determinando, portanto, que a citação, na verdade, convoca o réu para o diálogo processual, e, ao mesmo tempo, traz diversos atos teleologicamente consubstanciados com o interesse público de primar pela autocomposição, como forma de resolução das lides, em verdade, a citação, ao menos de início, convoca o réu para, juntamente com o autor, chegarem a uma solução.

É que, após a referida convocação, o réu poderá realizar vários atos que, inclusive, antecedem a audiência prévia de conciliação ou mediação. São atos como, por exemplo: certificar, o Oficial de Justiça, a proposta de autocomposição apresentada por qualquer das partes, na ocasião de realização de ato de comunicação que lhe couber (Art. 154, VI, CPC); manifestação de desinteresse na autocomposição pelo réu em 10 (dez) dias de antecedência da audiência de conciliação ou mediação (Art. 334, §2º, CPC); etc.

Ora, a finalidade da citação já não é mais a de simples noticiadora ao réu da demanda que se propõe contra o mesmo, mas, também, em observância ao Princípio da Cooperação, a de convite coercitivo para integrar a lide e, após e em consequência, proporcionar às partes um lapso de tempo processual para chegarem, caso haja consenso, numa solução por meio da autocomposição.

Logo, o Princípio da Instrumentalidade das Formas apenas pode se aplicar, no caso da citação, quando esta atinge a finalidade supramencionada.

Revela-se flagrante, pois, que a não observância do prazo regressivo que se exige legalmente entre a citação e a audiência de conciliação ou mediação, caso o réu deixe de comparecer à supramencionada audiência, não se convalida com fundamento no Princípio da Instrumentalidade das formas, haja vista que a inobservância de referido prazo tem implicações negativas no que diz respeito ao desiderato da lei, que, em face do Princípio da Cooperação, exige a busca permanente pela resolução da lide por meios conciliatórios. E, se se desconsidera o prazo regressivo em tela, comprometido fica o Princípio da Cooperação, não havendo como concretizar qualquer acordo antes da audiência de conciliação ou mediação.

No mais, o Princípio da Segurança Jurídica prevalece em tal situação, posto que o operador do direito deve sopesá-lo com o Princípio da Instrumentalidade das Formas, conforme se observa da hialina argumentação a seguir citada:

É de suma importância alertar para o fato de que o mau manuseio desse instrumento se tornará em arbítrio. Os operadores do direito devem encontrar um equilíbrio, o que não é nada fácil lidar com essa ciência processual. Assim, o formalismo do sistema processual pode ser um obstáculo à obtenção do fim almejado. Por outro lado, as formas processuais correspondem a uma necessidade de ordem, visando garanti o devido processo.

O fito do processo é a busca da paz social. Instrumento do direito material, sendo o responsável pela consecução da justiça.

Outro objetivo do processo é conferir às partes segurança jurídica e, para tanto, o legislador, estabeleceu os procedimentos previamente na norma, à luz dos princípios constitucionais e processuais indispensáveis na condução do processo, tais como a ampla defesa, o devido processo legal e o contraditório. ( SANTOS, p. 47-48). (Grifo Nosso)

Conclui-se, pois, que o Princípio da Instrumentalidade das Formas só se aplica para convalidar eventual nulidade na citação se esta se realizar com respeito ao prazo regressivo que antecede a audiência de conciliação ou mediação, caso contrário, estar-se-á a se permitir flagrante e grave afronta ao Princípio da Cooperação e do Devido Processo Legal.

  1. DA OBRIGATORIEDADE DA REALIZAÇÃO DA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO OU MEDIAÇÃO

Em verdade, “Na audiência de mediação ou conciliação buscar-se-á, inicialmente, a restauração da comunicação entre as partes, configurando, pois interessante oportunidade de concretizar o princípio da oralidade, já que em tais momentos os sujeitos do processo poderão travar contato pessoal.” (TARTUCE; DELLORE. p. 137)

É neste momento, em especial, que os Princípios da Celeridade, Duração Razoável do Processo, Economia, e Eficiência podem se consubstanciar no resultado almejado pelo Princípio da Efetividade, que se concretiza pela via excepcional da autocomposição.

O novel Código de Processo Civil, neste contexto, e pelo mesmo motivo dando maior importância a tal instituto processual, determinou que a referida audiência de conciliação ou mediação é etapa quase que obrigatória, visto que apenas não será realizadas em hipóteses taxativamente indicadas no §4º do artigo 334 do diploma em comento.

A doutrina já se apercebeu desse fato, conforme se transcreve no trecho a seguir:

O legislador infraconstitucional previu que a audiência de tentativa de conciliação ou a sessão de mediação passa a ser etapa quase obrigatória do processo, só não sendo designada (§4º do art. 334)

  1. se o juiz indeferir a petição inicial;
  2. se o juiz rejeitar liminarmente o pedido (improcedência liminar do pedido);
  3. se ambas as partes manifestarem desinteresse na autocomposição;
  4. se o juiz verificar que a causa não versa sobre direito que admita a autocomposição (direito indisponível). (MONTENEGRO FILHO, p. 405)

Todavia, as críticas a obrigatoriedade da audiência de conciliação ou mediação prévia, no Rito Comum, já possui uma minoria doutrinária que a ela tentam flexibilizar. Tal corrente, observando situações fáticas que podem ocorrer no cotidiano de uma Vara Cível, tem por argumento apenas a eventual dificuldade que a marcação das referidas audiência possam ensejar.

É o que se defende na citação a seguir transcrita:

Falando sobre um direito que é real, não meramente hipotético, sabemos que alguns (vários) órgãos do Poder Judiciário estão abarrotados de processos, com pautas de audiências superlotadas, o que resulta na designação de audiências para mais de um ano após a prolação do despacho por meio do qual o magistrado prevê a prática do ato.

Com isso, e considerando que o novo CPC estabelece que o magistrado deve designar audiência em quase todos os processos, não é difícil imaginarmos que as pautas serão ainda mais sobrecarregadas, pelo menos até que o Poder Judiciário (e isso depende da existência de recursos) monte estrutura paralela, criando centros de conciliação e mediação.

Quando o magistrado constatar essa situação, entendemos que pode deixar de designar a audiência de tentativa de conciliação ou sessão de mediação no início do processo, em vez disso determinar o aperfeiçoamento da citação do réu, valorizando o princípio da razoável duração do processo, que, por estar abrigado por norma constitucional (inciso LXXVIII do art. 5º da CF), sobrepõe-se ao artigo inserido no novo CPC, objeto dos nossos comentários. (MONTENEGRO FILHO, p. 407)

Data venia, acreditamos não ser óbice, hodiernamente, entender-se como obrigatória a marcação e realização de audiência de conciliação ou mediação prévia, posto que nas grandes Comarcas existem Centrais de Conciliação ou Mediação, instituídas pelos próprios Tribunais, que realizam dezenas de audiência por dia, garantindo-se, assim, um fluxo maior das pautas de tais audiências, não havendo, pois, em se falar em afronta ao Princípio Constitucional da Razoável Duração do Processo.

Depreende-se, pois, que, na verdade, a audiência de conciliação ou mediação informada no artigo 334 do Código de Processo Civil é indubitavelmente obrigatória, restando, contudo, flexibilizada tal indispensabilidade apenas quando ocorrer um dos casos que o §4º do mesmo artigo taxa.

A melhor doutrina também assim reza, ao analisar a alínea “c” do §4º do artigo 334 do novel CPC:

[...] Apesar do emprego, no texto, do vocábulo “ambas”, deve-se interpretar a lei no sentido de que a sessão de mediação ou conciliação não se realizará se qualquer das partes manifestar, expressamente, desinteresse na composição consensual. Basta que uma das partes manifeste sua intenção de não participar da audiência de conciliação ou de mediação para que esta não possa ser realizada. É que um dos princípios reitores da mediação (e da conciliação) é o da voluntariedade, razão pela qual não se pode obrigar qualquer das partes a participar, contra sua vontade, do procedimento de mediação ou conciliação (art. 2º, § 2º, da Lei nº. 13.140/2015). [...] (CÂMARA, p. 201)

Em face do Princípio da Voluntariedade nos procedimentos conciliatórios ou de mediação, o doutrinador supracitado revela que basta um não querer para que a audiência não se realize. Evidente, contudo, que isso não afasta o caráter obrigatório de referida audiência, posto que apenas não se realizará, se, e somente se, a situação retromencionada, ou as demais hipóteses constantes das alíneas do §4º do artigo 334 do CPC, ocorrerem no processo.

  1. DA INCUMBÊNCIA IMPLICITA DO OFICIAL DE JUSTIÇA DE ZELAR PELA VALIDADE DOS ATOS PROCESSUAIS QUE PRATICA

Antes de adentrar na análise das consequências da não observância dos prazos regressivos nas citações, mister é saber se o Oficial de Justiça – aquele que realiza o ato de citação – pode ou não se recusar a cumprir um mandado entregue em tempo não hábil a garantir o respeito aos prazos regressivos informados nos artigos 334 e 695 do NCPC.

É certo que há jurisprudência no sentido de rechaçar a possibilidade de Oficial de Justiça alegar nulidade com intuito de se resguardar e não realizar ato nulo. Sempre com fundamento no artigo que se refere as incumbências de referido cargo, que no NCPC é informado no seguinte artigo:

Art. 154. Incumbe ao Oficial de Justiça:

I – fazer pessoalmente citações, prisões, penhoras, arrestos e demais diligências próprias do seu ofício, sempre que possível na presença de 2 (duas) testemunhas, certificando no mandado o ocorrido, com menção ao lugar, ao dia e à hora;

II – executar as ordens do juiz a que estiver subordinado;

III – entregar o mandado cartorário após seu cumprimento;

IV – auxiliar o juiz na manutenção da ordem;

V – efetuar avaliações, quando for o caso;

VI – certificar, em mandado, proposta de autocomposição apresentada por qualquer das partes, na ocasião de realização de ato de comunicação que lhe couber.[14]

No artigo seguinte ao supracitado, contudo, é flagrante uma incumbência implícita no NCPC atribuída aos Oficiais de Justiça, que é a de se abster de realizar ato nulo, com dolo ou culpa, sob pena de Responsabilidade Civil, inclusive com menção expressa à possibilidade do Estado agir regressivamente em relação ao servidor que realizar tal ato.

É o que vemos a seguir:

Art. 155. O escrivão, o chefe de secretaria e o oficial de justiça são responsáveis, civil e regressivamente, quando:

I – sem justo motivo, se recusarem a cumprir no prazo os atos impostos pela lei ou pelo juiz a que estão subordinado;

II – praticarem ato nulo com dolo ou culpa.[15] (Grifo nosso)

Hialino, pois, é o dever do Oficial de Justiça de atuar com primazia da validade dos atos, precavendo e evitando realizar ato nulo flagrante e de sua atribuição. Posto que é seu dever cumpri ordens superiores, exceto quando manifestamente ilegais.[16]

Ora, analisando o artigo 155 do Código de Processo Civil de 2015 conjuntamente com o artigo 193 da Lei dos Servidores Públicos do Estado de Pernambuco de nº. 6.123/1968, a par da interpretação correta de que o Oficial de Justiça não pode alegar nulidade de um ato do juiz, o mesmo não se pode concluir quando o ato processual é de atribuição e responsabilidade daquele primeiro.

Pois, se o Oficial de Justiça realizar ato nulo, de sua atribuição, ainda que por ordem do Juiz, de quem será a responsabilidade por esse ato?

Uma coisa, por exemplo, é o Oficial de Justiça intimar a parte de uma decisão eventualmente nula, que apesar de assim o ser, não compete ao mesmo alegar tal nulidade, mas apenas às partes e seus advogados. A responsabilidade da nulidade é do juiz que praticou o ato. Outra, contudo, é o Oficial de Justiça receber ordem para realizar um ato de comunicação processual em total desacordo com os requisitos legais de validade do mesmo. Neste último caso, mesmo não havendo dolo de causar a nulidade, há a culpa do servidor que mesmo tendo conhecimento de tal erro assim o fez.

Indubitável, pois, é a incumbência, que no Código de Processo Civil apresenta-se implícita, do Oficial de Justiça de atuar com a devida precaução e perícia ao realizar os atos de sua competência, evitando-se, assim, de trazer aos autos atos nulos, em especial a citação que possui natureza transrecisória.

Neste contexto, passemos a analisar a importância de se realizar a citação observando-se os prazos regressivos informados no NCPC.

  1. DOS PRINCÍPIOS DA CELERIDADE E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL

Às vezes, na tentativa de ser eficiente, alguns juízes tentam dar celeridade aos processos e, neste intento, atuam flexibilizando algumas regras processuais e assim o ajustando de acordo com o “andar da carruagem”, e, em alguns casos, acabam por prejudicar o processo sem notar o futuro desastre processual que pode se dar com a eventual declaração de nulidade em instâncias superiores.

De certo, o Princípio da Celeridade se correlaciona com o da efetividade do processo, exigindo-se respeito aos mesmos para que se concretize o devido processo legal, conforme nos lembra o seguinte doutrinador:

A busca deve ser a da obtenção dos melhores resultados possíveis, com a máxima economia de esforços, despesas e tempo. O princípio se imbrica com o da efetividade do processo: afinal, a duração razoável é necessária para que o processo seja eficiente. (GONÇALVES, p. 105)

É preciso, no entanto, observar o que nos lembra, com altiva eloquência, o brilhante doutrinador que assessorou os parlamentares relatores do NCPC, a seguir citado:

É preciso, porém, fazer uma reflexão final como contraponto.

Não existe um princípio da celeridade. O processo não tem de ser rápido/célere: o processo deve demorar o tempo necessário e adequado à solução do caso submetido ao órgão jurisdicional.

Bem pensadas as coisas, conquistou-se, ao longo da história, o direito à demora da solução dos conflitos. A partir do momento em que se reconhece a existência de um direito fundamental ao devido processo legal, está-se reconhecendo, implicitamente, o direito de que a solução do caso deve cumprir, necessariamente, uma série de atos obrigatórios, que compõem o conteúdo mínimo desse direito. A exigência do contraditório, os direitos a produção de prova e aos recursos certamente atravancam a celeridade, mas são garantias que não podem ser desconsideradas ou minimizadas. É preciso fazer o alerta, para evitar discursos autoritários, que pregam a celeridade como valor. Os processos da Inquisição poderiam ser rápidos. Não parece, porém, que se sinta saudades deles.[17] (Grifo Nosso)

O mesmo pode-se falar dos atos de comunicação processual como ato preparatório da audiência prévia de conciliação ou mediação.

No caso que se analisa neste trabalho, sob a garantia do §1º do artigo 239 e 276 do NCPC, alguns juízes admitem a inobservância do prazo regressivo dos artigos 334 e 695, marcando a audiência prévia de conciliação ou mediação em data com lapso inferior ao necessário para se realizar a citação com antecedência de 20 e 15 dias, respectivamente aos artigos supra, entendendo que se o réu comparecer ao ato e aquela atingir sua finalidade, ainda que na forma distinta da prevista em lei, aquele se convalida.

O que é juridicamente coerente, mas não totalmente correto!

Supramencionada exigência legal não pode ser ignorada sob o argumento da celeridade, posto que, uma vez pautada na solenidade e na validade dos atos processuais, estes devem obedecer fielmente ao que informa como requisito a lei. O legislador ao estabelecer prazos não o faz através de “normas ditas imperfeitas, isto é, sem sanção correspondente”. Ao revés, as regras processuais são cogentes por natureza. [...] (FUX, Luiz. p. 335)

De certo é que a lei não iria exigir esse lapso entre a citação e a audiência prévia de conciliação ou mediação em vão. Trata-se de tempo considerado pelo legislador necessário, e cuja observância está umbilicalmente ligada ao Devido Processo Legal, e, antecedente a uma possível autocomposição, garantindo-se às partes refletir sob os benefícios de um eventual acordo e as desvantagens de um contencioso que demore anos. Ou seja, o processo também tem que demorar o tempo necessário e adequado para que as parte chequem ao preferível fim de uma extinção do processo por conta da autocomposição.

No mais, existem consequências negativas que podem decorrer de uma citação nula por não observância dos prazos regressivos dos artigos 334 e 695 do NCPC e que impossibilitariam a convalidação do ato nulo.

É o que veremos no tópico a seguir.

  1. DA EXISTÊNCIA DE HIPÓTESE FÁTICA IMPEDITIVA DA CONVALIDAÇÃO DO ATO NULO EM CASO DE DESRESPEITO AO PRAZO REGRESSIVO NA CITAÇÃO

Existe uma hipótese fática que tornaria ineficaz a interpretação convencional, entre os juízes, de que no caso de comparecimento do réu à audiência, a citação nula se convalidaria.

Trata-se do caso em que o réu, citado de forma nula por não se obedecerem os prazos regressivos exigidos no NCPC, não comparece.

O artigo 239 do Novel Código de Processo Civil assim reza:

Art. 239. Para validade do processo é indispensável a citação do réu ou do executado, ressalvadas as hipóteses de indeferimento da petição inicial ou de improcedência liminar do pedido.

§2º. Rejeitada a alegação de nulidade, tratando-se de processo de:

I – conhecimento, o réu será considerado revel;

II – execução, o feito terá seguimento.[18] (Grifo nosso)

Ora, o comparecimento espontâneo do réu supre a falta ou nulidade da citação. Isso é uma certeza. Mas também é certo que o não comparecimento do réu, citado de forma nula, inviabiliza a convalidação do referido ato defeituoso. Não há a formação da triangulação subjetiva exigida pela Teoria Geral do Processo – não se forma a relação processual autor-juiz-réu.

E se o réu, que tomou conhecimento de ação contra sua pessoa, por citação nula, que não observou o prazo regressivo do artigo 334 do NCPC, por exemplo, não comparecer à audiência prévia de conciliação ou mediação? O que ocorrerá? Quais as consequências?

Acaso o juiz entenda convalidada a citação realizada sem observância do prazo regressivo exigido pelo CPC, em face do Princípio da Instrumentalidade das formas, estar-se-á em verdade “forçando a barra”. A revelia que eventualmente se dê afasta a convalidação do ato nulo. É que “A regra inspirada em princípio de equidade nulifica o processo, acaso ocorra a revelia e, arguido o defeito ora previsto em lei, impõe-se a declaração de nulidade.” (FUX, Luiz. p. 364)

Ignoradas são essas consequências pelos que adotam a interpretação de convalidação do ato nulo por comparecimento do réu.

O que mostraremos nos itens a seguir.

  1. DOS PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ PROCESSUAL, DA LEGALIDADE E O NÃO COMPARECIMENTO DO RÉU À AUDIÊNCIA PRÉVIA DE CONCILIAÇÃO OU MEDIAÇÃO

Antes de adentrar na análise dos prejuízos que uma citação nula, pela não observância dos prazos regressivos do NCPC, pode ensejar, iremos tratar da influência do princípio da boa-fé processual no comportamento do réu, que recebendo citação nula, não comparece à audiência prévia de conciliação ou mediação.

É cediço que o novel Código de Processo Civil absolveu[19] o Princípio da Boa-fé originário do Direito Material, conforme se observa no seguinte artigo: “Art. 14. São deveres das partes e de todos aqueles que de qualquer forma participam do processo: […] II – proceder com lealdade e boa-fé.”[20] (Grifo nosso)

Neste contexto, o réu descrito no primeiro parágrafo deste tópico estaria realizando ato que afronta o princípio da boa-fé processual ao não comparecer a audiência em tela? Não comparecer à audiência prévia de conciliação ou mediação, quando citado de forma nula, é ato atentatório à dignidade da justiça?

De certo é que a boa-fé processual, que o NCPC se refere, inclusive em seu artigo 5º – “Art. 5º. Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comporta-se de acordo com a boa-fé” – é a objetiva. O que é confirmado por Didier ao lecionar: [...] “O art. 5º. do CPC não está relacionado à boa-fé subjetiva, à intenção do sujeito processual: trata-se de norma que impõe condutas em conformidade com a boa-fé objetivamente considerada, independentemente da existência de boas ou más intenções.”[21]

Forçoso, pois, é concluir que o réu que não comparece a audiência, por ter sido citado sem observância dos prazos regressivos do Código de Processo Civil de 2015, não age em afronta ao princípio da boa-fé processual, posto que – ainda que suas intenções não sejam as melhores – objetivamente falando, ele não se apresenta à audiência prévia de conciliação ou mediação justamente para que a citação nula não se convalide. Situação perfeitamente aceitável!

Pauta-se, destarte, o réu da situação hipotética descrita no parágrafo anterior, no Princípio da Legalidade – “[...] o procedimento tem de ser aquele definido pela lei, para cumprir a garantia constitucional do “devido processo legal” (CF, art. 5º LIV)”[22] – atendendo-se, assim, às exigências do art. 8 do NCPC, em especial: aos fins sociais e às exigências do bem comum, que se consubstanciam, in casu, na concretização da autocomposição no processo civil.

  1. DO PREJUÍZO AO PROCEDIMENTO COMUM E AS CONSEQUENCIAS DO NÃO ATENDIMENTO À FORMA DA CITAÇÃO INFORMADA NOS ARTIGOS 334 e 695, §2º DO NCPC

Por fim, chegamos ao ponto em que indagamos: que prejuízos processuais decorrem de ato de comunicação processual – citação – que foi realizado em desrespeito aos prazos regressivos informados no novel CPC, quando o réu não comparece a audiência previa de conciliação ou mediação?

Primeiramente, vejamos quais os atos que são realizados no lapso entre a citação e a audiência previa de conciliação ou mediação, a seguir expostos:

Art. 154. [...]

Parágrafo único. Certificada a proposta de autocomposição prevista no inciso VI, o juiz ordenará a intimação da parte contrária para manifestar-se, no prazo de 5 (cinco) dias, sem prejuízo do andamento regular do processo, entendendo-se o silêncio como recusa.[23] (Grifo nosso)

Art. 334.[24] [...]

§ 5º. O autor deverá indicar, na petição inicial, seu desinteresse na autocomposição, e o réu deverá fazê-lo, por petição, apresentada com 10 (dez) dias de antecedência, contados da data da audiência.

[...] (Grifo nosso)

§ 8º. O não comparecimento injustificado do autor ou do réu à audiência de conciliação é considerado ato atentatório à dignidade da justiça e será sancionado com multa de até dois por cento da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União ou do Estado.

[...](Grifo nosso)

§ 11.A autocomposição obtida será reduzida a termo e homologada por sentença.

É hialino o prejuízo ao procedimento comum estipulado no novel CPC, haja vista que se não se observar o prazo regressivo exigível na citação estar-se-á a tornar inefetivas as normas supracitadas, inviabilizando a concretização de uma autocomposição acordada de forma segura.

Se o Oficial de Justiça, por exemplo, citar o réu cinco dias antes da audiência previa de conciliação ou mediação certificando proposta de autocomposição, até que o juiz despache determinando as providências do artigo 154, inciso VI, do CPC, é provável que haja autocomposição na audiência sem que uma das partes seja intimada para manifestar sobre a certidão em comento.

Ou mesmo a audiência tornar-se fadada a não ter acordo em face do desinteresse de uma das partes, e assim consubstanciar-se em ato, a audiência, desnecessário e que afronta a economia processual.

De outra ponta, como executar a multa estipulada no §8 do art. 334 do NCPC em decorrência da ausência injustificada do réu, se sua ausência se justifica pela nulidade da citação em inobservância ao prazo regressivo?

E não para por aqui!

Além do flagrante prejuízo ao procedimento comum, também há as consequências processuais da não observância dos prazos regressivos dos artigos 334 e 695, §2º do NCPC.

Uma vez nula a citação, nos moldes do parágrafo anterior, podemos enumera as seguintes consequências:

A título de exemplo, vejamos um caso concreto, observado em Acórdão do TJMS, em que a Procuradoria Geral de Justiça suscitou nulidade da audiência de conciliação prévia em caso que o Município de Corumbá-MS deixou de comparecer à audiência, razão pela qual a magistrada de primeiro grau arbitrou multa de 2% sobre o valor da causa, por ser ato atentatório a dignidade da justiça, a ser revertida em favor do Estado de Mato Grosso do Sul, com base no § 8º, do art. 334, do CPC/2015, que a seguir expomos:

- Da preliminar de nulidade da audiência.

Em parecer, o representante da Procuradoria-Geral de Justiça suscitou, de ofício, preliminar de nulidade da audiência, em razão da não observância do prazo mínimo de antecedência de 20 (vinte) dias úteis entre a citação e intimação e a data da audiência, conforme estabelecido no caput do art. 334, do CPC/2015. Confira-se: Art. 334. Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência. Por sua vez, o art. 219, do CPC/2015, prevê que a contagem dos prazos processuais, será em dias úteis. Confira-se: Art. 219. Na contagem de prazo em dias, estabelecido por lei ou pelo juiz, computar-se-ão somente os dias úteis. Parágrafo único. O disposto neste artigo aplica-se somente aos prazos processuais. Dorival Renato Pavan explica: "Em se tratando de prazos processuais – assim considerados, por exemplo, aqueles para contestar, para recorrer e de maneira geral para o advogado falar nos autos – a contagem será feita apenas em dias úteis, regra válida tanto para os prazos já estabelecidos em lei ou para aqueles que forem fixados ou determinados pelo juiz (art. 219 e seu parágrafo único, sem correspondência com o CPC/1973)." *destaquei. Necessário também destacar que o inciso II, do art. 231, do CPC/2015, prevê que a contagem do prazo inicia-se com a data da juntada aos autos do mandado cumprido. Confira-se: Art. 231. Salvo disposição em sentido diverso, considera-se dia do começo do prazo: (...) II - a data de juntada aos autos do mandado cumprido, quando a citação ou a intimação for por oficial de justiça; Na hipótese dos autos, verifica-se que a ação foi ajuizada pelo Ministério Público Estadual, ora agravado, em 21.03.2016 e, em 29.03.2016, a magistrada de primeiro grau proferiu decisão indeferindo o pedido de tutela provisória e determinando a citação dos requeridos Município de Corumbá e Estado de Mato Grosso do Sul, bem como intimação da audiência designada para 02.05.2016 (f. 10). Em 01.04.2016 (f. 40-41 dos autos principais), constata-se que houve a citação do Município de Corumbá, bem como sua intimação acerca da audiência designada para 02.05.2016. A juntada do mandado de citação e intimação, devidamente cumprido, deu-se em 04.04.2016 (f. 40). Veja-se que a data inicial do prazo era 04.04.2016, que, contados em dias úteis, terminaria somente em 03.05.2016, levando-se em consideração o feriado ocorrido nos dias 21 e 22 de abril. Assim, constata-se que não foi observado o prazo mínimo de 20 dias úteis para a intimação do requerido acerca da audiência designada, razão pela qual deve ser insubsistente o ato realizado em 02.05.2016. Soma-se a isto o fato de que a Recomendação n. 1, do Conselho Superior da Magistratura, de 24.05.2016 dispensa[25] a prévia audiência de conciliação ou mediação nas causas em que figurarem como parte Fazenda Pública Municipal, Estadual ou Federal, no âmbito dos processos distribuídos na Justiça Comum Estadual de Mato Grosso do Sul. Logo, acolho a preliminar suscitada de ofício pelo representante da Procuradoria-Geral de Justiça para anular a audiência de 02.05.2016, tornando-a sem efeito, bem como a decisão a ela subsequente[26] , que arbitrou multa de 2% (dois por cento) sobre o valor da causa, a ser revertida em favor do Estado de Mato Grosso do Sul, com base no § 8º[27], do art. 334, do CPC/2015. Assim, fica prejudicada a análise do mérito.
(TJMS. Agravo de Instrumento n. 1405414-28.2016.8.12.0000,  Corumbá,  4ª Câmara Cível, Relator (a):  Des. Odemilson Roberto Castro Fassa, j: 10/08/2016, p:  15/08/2016).

Conforme se observa do supracitado Acordão, nem mesmo a multa pelo não comparecimento à audiência prévia de conciliação ou mediação pode ser executada, face a flagrante nulidade que se dá quando da não observância do prazo regressivo informado no artigo 334, caput, do CPC. Imaginem os danos que possam ocorrer nas outras hipóteses enumeradas neste tópico?

Todas essas mazelas trazem profundos prejuízos e insegurança às partes e devem ser consideradas quando do cumprimento dos mandados de citação.

11 CONCLUSÃO

Indubitável é, pois, a necessidade de se observar os prazos regressivos informados nos artigos 334 e 695, §2º do NCPC, sob pena de – se o réu não comparecer a audiência prévia de conciliação ou mediação pelo fato da citação nula – as consequências serem desastrosas e inescusáveis, tendo, pois, o Oficial de Justiça a atribuição de fiscalizar a validade deste ato de comunicação processual, sob pena de ser responsabilizado civilmente, por dolo ou culpa, inclusive regressivamente.

Neste intento, ponderando-se os Princípios da Instrumentalidade das Formas com o Princípio da Segurança Jurídica, bem como considerando-se todas as consequências negativas que eventual declaração de nulidade da citação, realizada nos moldes supramencionados, possam ensejar, em especial as decorrentes da natureza transrescisórias da citação, inevitável é, pois, a conclusão de que não há ordem jurídica justa sem a observância do devido processo legal.

É o que se leciona a seguir:

[...] O que importa acima de tudo, como ficou dito, é colocar o processo no seu devido lugar, evitando os males do exagerado processualismo (tal é o aspecto negativo do reconhecimento do seu caráter instrumental) – e ao mesmo tempo cuidar de predispor o processo e o seu uso de modo tal que os objetivos sejam convenientemente conciliados e realizados tanto quanto possível. O processo há de ser, nesse contexto, instrumento eficaz para o acesso à ordem jurídica justa. [...] (DINAMARCO, p. 365-366)

O respeito fiel ao prazo regressivo informado nos artigos 334 e 695, §2º do NCPC é medida que se impõe cogente para validade do ato de comunicação citatório. Do contrário, o Código de Processo Civil será apenas um grande território sem fronteiras, onde basta um exercício sofismável de interpretação para que suas regras sejam desconsideradas.

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Sobre o autor
Wellington Santos de Almeida

Mestre em Ciências Jurídicas pela Veni Creator Christian University - VENIUNI; É especialista em Execução de Ordens Judiciais pelo Centro Universitário Mário Pontes Jucá - UMJ; em Direito Processual Civil pela UNINASSAU, em parceria com a ESA-PE/OAB-PE; em Direito Público e em Direito do Estado pela Universidade Anhanguera-Uniderp; em Direito Ambiental pela Faculdade Venda Nova do Imigrante - FAVENI; e em Perícia Judicial e Extrajudicial, Perícias de Avaliação Patrimonial de Bens e Direitos e Perícia Econômica e Financeira, pela FACUMINAS. Graduando em Licenciatura em História pela UFRPE. Bacharel em Direito pela Associação Caruaruense de Ensino Superior - ASCES. É Oficial de Justiça do TJPE. http://lattes.cnpq.br/1616787000925954.

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