Interessante julgado que decidiu que o redirecionamento da execução fiscal em face dos sócios necessita de certidão do oficial de justiça.
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5020243-83.2022.4.03.0000
RELATOR: Gab. 21 - DES. FED. JOHONSOM DI SALVO
R E L A T Ó R I O
O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal Johonsom di Salvo, Relator:
Trata-se de agravo interno interposto pela UNIÃO FEDERAL contra a r. decisão ID 263480284 que deu provimento ao agravo de instrumento do adverso.
A fim de ilustrar o panorama processual, transcrevo parte do relatório da decisão ora agravada:
“Da análise dos autos observa-se que a execução foi proposta em 17/12/2001 em face da empresa () para cobrança de dívida ativa tributária cujo valor original era de R$ 3.100.110,07.
Frustrada a tentativa de citação postal (“AR negativo”), a exequente postulou desde logo a inclusão dos sócios da empresa executada no polo passivo da lide, no que foi atendida, conforme decisão de fl. 33 da execução. O sócio () foi citado em 18/08/2004 e o sócio (), ora agravante, foi citado em 27/08/2004, ambos por Oficial de Justiça (fl. 42 da execução fiscal).
No que interessa ao deslinde da controvérsia, por decisão datada de 23/11/2015 o MM. Juízo, constatando que “até o presente momento não houve diligência de oficial de justiça no endereço tido como sede da empresa, o que se faz necessário para a caracterização de dissolução irregular”, ordenou a expedição de mandado para citação, penhora e constatação em face da pessoa jurídica devedora, a fim de analisar, ulteriormente, a respeito do polo passivo da execução (fl. 168).
O Sr. Oficial de Justiça certificou a não localização da empresa nos endereços diligenciados em 11/07/2017 (fl. 175) e 13/09/2018 (fl. 185).
A empresa foi finalmente citada por edital expedido em 21/06/2021.
Por intermédio da petição ID 77152816, o coexecutado interpôs nova exceção de pré-executividade, agora alegando a nulidade do redirecionamento porquanto calcado em mera devolução de "AR negativo" e, por conseguinte, ocorrência de prescrição intercorrente pelo decurso de prazo superior a cinco anos desde o ajuizamento da execução sem qualquer diligência efetiva para se tentar a citação válida da empresa, seja por mandado, seja por edital.
O MM. Juízo inicialmente rejeitou a pretensão com fundamento na ocorrência de preclusão, no entendimento de que o tema já foi enfrentado anteriormente; referida decisão foi reformada no bojo do AI 5011802-16.2022.4.03.0000, ensejando novo pronunciamento fundamentado pelo qual o d. magistrado rejeitou a exceção por considerar que, no caso, "a constatação do encerramento irregular das atividades da empresa ficou demonstrada quando do retorno negativo do mandado de citação, penhora e intimação (fl. 185). Destarte, considerando que o início do prazo para o redirecionamento se deu em 18/09/2018 (fls.185) não há que se falar no decurso do prazo prescricional para a responsabilização dos coexecutados pelo débito em cobrança."
Daí o presente agravo de instrumento no qual o agravante reitera que o redirecionamento da execução em face dos sócios, autorizado em 2003, deu-se sem a prévia constatação da presumida dissolução irregular da pessoa jurídica.
Reafirma que a execução foi ajuizada em 2001 e que restou frustrada a tentativa de citação postal em face da empresa devedora; na sequência, sem promover nova diligência para localização da firma executada, a exequente requereu a inclusão dos sócios no polo passivo, no que foi atendida, sendo os sócios citados em 2004. Apenas em 2015, observando que não houve diligência de oficial de justiça no endereço tido como sede da empresa, providência necessária para a caracterização da dissolução irregular, o MM. Juízo ordenou a expedição de mandado de citação e penhora em face da firma, inclusive para fins de constatação, para análise a respeito do polo passivo da execução fiscal; tal diligência foi finalmente cumprida em 2018, sendo certificado pelo sr. Oficial de Justiça que a empresa não foi localizada no endereço.
Aponta a desídia da Fazenda Pública quanto à correta citação da empresa executada (citação postal em endereço errado e ausência de novas e efetivas diligências dentro do prazo prescricional), destacando a ilegalidade da inclusão dos sócios sem a constatação de eventual dissolução irregular, decorrendo daí a prescrição intercorrente ante o extenso lapso temporal entre a propositura da execução (2001) e a diligência por Oficial de Justiça no endereço da empresa (2018) que ensejaria o redirecionamento.
Aduz, em caráter subsidiário, que a inclusão dos sócios depende da instauração de Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica, conforme decisão no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas nº 0017610-97.2016.4.03.0000/SP.”
O recurso foi provido por decisão unipessoal na consideração de que o redirecionamento se deu de forma indevida, porquanto ordenado no ano 2003 com base exclusivamente na frustrada tentativa de citação da empresa por via postal (devolução do “AR negativo”), sem que fosse apontada causa apta a justificar a imposição de responsabilidade tributária aos sócios. Por conseguinte, foi ordenada a exclusão dos sócios do polo passivo da ação executiva.
Anoto a interposição de embargos de declaração que foi conhecido e parcialmente provido somente para determinar ao d. Juiz de origem que aprecie, como melhor lhe aprouver, eventual condenação em honorários advocatícios (ID 266485402).
Nas razões do agravo interno (ID 265373194) a recorrente UNIÃO FEDERAL afirma que o pedido de redirecionamento em face dos sócios não se deu apenas com base no AR negativo (tentativa frustrada de citação postal da empresa executada), porquanto também fundado em “outros documentos que servem de indícios suficientes da dissolução irregular”.
Pede o provimento do recurso, determinando-se a reforma da decisão agravada.
Resposta pela parte contrária (ID 265501188).
É o relatório.
V O T O
O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal Johonsom di Salvo, Relator:
Pretende a agravante União Federal a reforma da decisão monocrática que deu provimento ao agravo de instrumento do adverso.
O julgamento unipessoal foi ventilado da seguinte forma:
“…………..
A empresa que deixa de funcionar no endereço indicado no contrato social arquivado na junta comercial, desaparecendo sem deixar nova direção, comprovado mediante certidão de oficial de justiça, é presumivelmente considerada como desativada ou irregularmente extinta, consoante se extrai da Súmula nº 435 do STJ, circunstância apta a ensejar o redirecionamento da dívida em face do sócio-gerente com fundamento no artigo 135, III, do CTN.
Sucede que esta presunção de infração à lei somente é admitida quando certificada pelo oficial de justiça, não bastando a devolução da carta citatória pelos Correios como indício suficiente para se presumir o encerramento irregular da sociedade.
De há muito é unívoca a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. REDIRECIONAMENTO. CITAÇÃO POR AVISO DE RECEBIMENTO. AR DEVOLVIDO. INSUFICIÊNCIA DE INDÍCIO DE DISSOLUÇÃO IRREGULAR A AUTORIZAR A MEDIDA.
1. Para o redirecionamento da execução fiscal ao sócio, buscando sua responsabilização subsidiária, conforme previsto no art. 135 do CTN, é indispensável que este tenha agido com excesso de poderes ou infringido a lei, o contrato social ou o estatuto da empresa.
2. Conforme fixado no REsp 1371128/RS (Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe de 17/9/2014 - representativo de controvérsia), a dissolução irregular da empresa caracteriza infração à lei, de modo que, comprovada tal circunstância, tem-se por possível o redirecionamento pretendido pelo Fisco-credor.
3. Inobstante, "(...) há que se verificar a incidência desse entendimento diante de cada caso concreto, não sendo razoável se proceder ao redirecionamento da execução fiscal, baseando-se, tão somente, em simples devolução de AR-postal sem cumprimento, impondo-se, nesse particular, que se utilizem meios outros para verificação, localização e citação da sociedade empresária." (AgRg no AgRg no REsp 1358007/SP, Rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, DJe de 18/12/2013).
4. Agravo regimental não provido.
(AgRg no AREsp n. 709.952/RS, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 3/12/2015, DJe de 14/12/2015.)
TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. EXECUÇÃO FISCAL. REDIRECIONAMENTO PARA OS SÓCIOS-GERENTES. CARTA CITATÓRIA. AVISO DE RECEBIMENTO DEVOLVIDO. AUSÊNCIA DE INDÍCIO DE DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA EMPRESA. REEXAME DE FATOS E PROVAS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ.
1. (...)
2. A Primeira Seção do STJ no julgamento do REsp 1.101.728/SP, sob o rito dos recursos repetitivos, consolidou o entendimento segundo o qual o redirecionamento da Execução Fiscal para o sócio-gerente da empresa é cabível apenas quando demonstrado que este agiu com excesso de poderes, infração à lei ou ao estatuto, ou no caso de dissolução irregular da empresa, não se incluindo o simples inadimplemento de obrigações tributárias.
3. A simples devolução de carta por AR não configura indícios de prova da dissolução irregular da pessoa jurídica. Precedentes.
4. O Tribunal de origem expressamente consignou que não há nos autos indícios de dissolução irregular da empresa executada, assim como o sócio-gerente não agiu com excessos de poderes ou infrações à lei ou estatuto social. Logo, desconstituir tal premissa requer, necessariamente, o reexame de fatos e provas o que é vedado ao STJ, por esbarrar no óbice da Súmula 7/STJ.
Agravo regimental improvido.
(AgRg no REsp 1368377/PB, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/08/2013, DJe 14/08/2013)
Na hipótese dos autos, o redirecionamento em face dos sócios foi ordenado no ano 2003 com base exclusivamente na frustrada tentativa de citação da empresa por via postal (devolução do “AR negativo”), sem que fosse apontada causa apta a justificar a imposição de responsabilidade tributária aos sócios.
Indevido, portanto, o redirecionamento tal como se deu no feito originário. Por conseguinte, o caso é de exclusão dos sócios do polo passivo da ação executiva.
Por outro lado, a mera determinação judicial posterior no sentido de expedir mandado de citação, penhora e constatação da empresa a ser cumprido por Oficial de Justiça, para fins de caracterização da presumida dissolução irregular, não supre a nulidade do redirecionamento que se deu apenas com base na tentativa frustrada de citação via postal da devedora principal. Noutras palavras, em persistindo interesse da exequente no redirecionamento, diante do resultado da diligência do Sr. Oficial de Justiça (não localização da empresa), far-se-á-se necessário o refazimento da citação em face dos sócios, caso haja requerimento da exequente, pois não se cogita de convalidação do ato citatório nulo. Por conseguinte, afigura-se prematura, e mesmo dispensável, qualquer discussão a respeito da prescrição intercorrente para o redirecionamento neste momento processual.
Deveras, não configurada a responsabilidade dos excipientes ora agravantes - tema de maior abrangência pois se refere a legitimatio ad causam passiva - não há razão para avançar na discussão acerca de matéria que teria interesse somente se os sócios fossem mantidos no pólo passivo (ocorrência de prescrição intercorrente).
No caso, basta o reconhecimento da nulidade da redirecionamento, com determinação de exclusão dos sócios do polo passivo da execução fiscal.
………………”
Em suas razões de agravo interno a União Federal afirma que o pedido de redirecionamento em face dos sócios não se deu apenas com base no AR negativo (tentativa frustrada de citação postal da empresa executada), porquanto também fundado em “outros documentos que servem de indícios suficientes da dissolução irregular”.
Ora, basta a mera leitura do pedido de redirecionamento (ID 26418554 dos autos originais, pág. 37) para verificar a única motivação invocada pela exequente:
“A UNIÃO - Fazenda Nacional vem expor e requerer a V.Exa. o que segue:
O não pagamento dos tributos devidos constitui infração à lei, conduzindo à responsabilização do pessoal do representante da pessoa jurídica de direito privado, nos termos dos artigos 128 e 135, inciso111, do CTN e do artigo 41, inciso V, da Lei no 6.830/80.
Por tais motivos, a União requer: a inclusão do(s) sócio(s) gerente(s) da empresa executado no pólo passivo desta execução fiscal (identificado (s) no(s) relatório(s) em anexo); a(s) citação(ões) respectiva(s), determinando que seja efetuado o pagamento do débito ounomeados bens à penhora. Renuncia à intimação para ciência da decisão que vier a conceder este pedido, nos termos em que foi formulado.”
Tal requerimento foi protocolizado em 27/06/2003, logo após a devolução do AR negativo (tentativa de citação postal da empresa).
Assim, os argumentos postos na minuta recursal são insuficientes para infirmar os fundamentos da decisão agravada.
Pelo exposto, NEGO PROVIMENTO AO AGRAVO INTERNO, mantendo a decisão unipessoal.
É o voto.
E M E N T A
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. REDIRECIONAMENTO EM FACE DOS SÓCIOS REQUERIDO APÓS A DEVOLUÇÃO DO AVISO DE RECEBIMENTO NEGATIVO (TENTATIVA FRUSTRADA DE CITAÇÃO POSTAL DA EMPRESA EXECUTADA). NULIDADE. RECURSO DA UNIÃO FEDERAL IMPROVIDO.
1. Na hipótese dos autos, o redirecionamento em face dos sócios foi ordenado no ano 2003 com base exclusivamente na frustrada tentativa de citação da empresa por via postal (devolução do “AR negativo”), sem que fosse apontada causa apta a justificar a imposição de responsabilidade tributária aos sócios. Indevido, portanto, o redirecionamento tal como se deu no feito originário. Por conseguinte, o caso é de exclusão dos sócios do polo passivo da ação executiva.
2. Por outro lado, a mera determinação judicial posterior no sentido de expedir mandado de citação, penhora e constatação da empresa a ser cumprido por Oficial de Justiça, para fins de caracterização da presumida dissolução irregular, não supre a nulidade do redirecionamento que se deu apenas com base na tentativa frustrada de citação via postal da devedora principal. Noutras palavras, em persistindo interesse da exequente no redirecionamento, diante do resultado da diligência do Sr. Oficial de Justiça (não localização da empresa), far-se-á-se necessário o refazimento da citação em face dos sócios, caso haja requerimento da exequente, pois não se cogita de convalidação do ato citatório nulo.
3. Os argumentos postos na minuta recursal são insuficientes para infirmar os fundamentos da decisão agravada. Agravo interno não provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sexta Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo interno, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.