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No ano de 2021, o Superior Tribunal de Justiça decidiu um caso interessante a respeito da indenização pelas benfeitorias realizadas pelo arrendatário: o direito de permanecer na propriedade até ser indenizado e o dever de pagar renda por isso. É o Recurso Especial 1.854.120.
Sobre as benfeitorias, é importante começar lembrando que são bens acessórios acrescentados ao imóvel (bem principal) pela pessoa que detém sua posse, com a finalidade de aperfeiçoar seu uso, evitar que se deteriore ou se destrua, ou, ainda, de embelezá-lo ou torná-lo mais agradável.
Neste mesmo sentido, os livros de direito agrário também ressaltam que as obras ou despesas que se fazem no imóvel rural, por aquele que exerce a atividade agrária, merecem tratamento especial e, havendo melhoramentos em propriedade alheia, pressupõem-se os dispêndios dignos de ressarcimento, em que o direito de retenção constitui uma exceção necessária para se evitarem injustiças.
E é neste conceito que se apresentam as classificações das benfeitorias em úteis, necessárias e voluptuárias. As úteis são aquelas que aumentam ou facilitam o uso da coisa, tornando-a mais útil, como a instalação de cercas, porteiras, mata-burros e outras facilidades; já as necessárias são as que têm por fim conservar ou evitar que o bem se deteriore, como a reforma da estrutura dos mangueiros, sedes residenciais etc.; e por fim, as voluptuárias são as de mero luxo, para tornar mais agradável o seu uso, como uma piscina.
Lembrando a conhecida frase jurídica de que cada caso é um caso, pois uma pista de pouso e decolagem de aviões em uma propriedade rural pode ser considerada voluptuária em alguns casos, mas pode ser considerada benfeitoria útil em outros casos, como no pantanal, onde os acessos são difíceis.
E, assim, o Estatuto da Terra, legislação responsável pelos contratos agrários, no artigo 95, inciso VIII, determina que o arrendatário, ao fim do contrato, tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, somente indenizado das voluptuárias quando autorizadas pelo proprietário.
O mesmo artigo e inciso também determinam que enquanto o arrendatário não for indenizado das benfeitorias necessárias e úteis, poderá permanecer no imóvel, nos termos do contrato de arrendamento e nos prazos estabelecidos por lei.
Sobre o caso citado no STJ, a relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, ressaltou que as benfeitorias acompanham o imóvel, de forma que esses melhoramentos introduzidos pelo possuidor direto, em algumas situações, passam para o patrimônio do proprietário (possuidor indireto) quando o bem principal retorna à sua posse.
Com base nestes entendimentos e ainda analisando situação com aplicação do Código Civil, a ministra decidiu que o possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis que fez e de retenção do bem principal, não sendo obrigado a devolvê-lo até seu crédito.
Entretanto, isto não dispensa o possuidor, ou o arrendatário, da obrigação de pagar renda, aluguel ou taxa de ocupação pelo tempo em que usou o bem, o que acabou por anular uma decisão do tribunal de justiça paranaense que isentava do pagamento de aluguéis pelo período da retenção de posse pelas benfeitorias não indenizadas.
Dentre os fundamentos desta decisão estão o enriquecimento ilícito, proibido por lei, motivo pelo qual o possuidor ou arrendatário não pode permanecer na posse, mesmo que por seu direito, sem uma contraprestação, o que caracterizaria uma situação incoerente com a ideia de retorno ao estado anterior à formalização do contrato e de indenização efetiva de todos os prejuízos.
A relatora lembrou de outro caso em que a Quarta Turma do STJ concluiu que a investigação sobre a boa-fé do possuidor pode ser importante para aferir a possibilidade de retenção e de indenização por benfeitorias, mas nada disso dispensa o pagamento pelo uso do imóvel.
Embora seja um caso que trate de direito civil e não especificamente agrário, sendo que a lei civil não é a principal fonte do Direito Agrário, principalmente, com relação aos contratos agrários, serve como parâmetro para aplicação do mesmo raciocínio, mudando apenas os números dos artigos e a lei, já que o Código Civil não trata de contratos agrários.
Por fim, fica o alerta aos arrendadores e arrendatários para que elaborem com muita clareza as cláusulas contratuais, principalmente estas relacionadas às benfeitorias, para que seja possível manter uma boa relação entre as partes, combinando no contrato quando e como fazer as benfeitorias e quais são elas. O contrato faz lei entre as partes.