É bem verdade que no Brasil, o empreendedor que se torna empresário, tem que avaliar em seu Plano de Negócios, muito seriamente, a questão tributária, pois indubitavelmente, terá um sócio “fantasma” chamado Governo, o qual em nada contribui para criar facilidades para quem deseja empreender, mas que está lá, recolhendo impostos de todas as formas possíveis.
De modo a driblar o recolhimento de impostos, tanto empresários quanto trabalhadores, frequentemente, entram em acordo informal, no sentido de equilibrar a oferta e demanda por mando de obra, qualificada ou não.
Neste sentido, surge a figura do chamado freelancer, termo este emprestado do inglês, utilizado para denominar o “profissional autônomo que trabalha com diferentes empresas e capta seus clientes de forma independente, sendo um profissional que atua sem vínculo empregatício formal com empresas no regime CLT”.
Segundo o IBGE, 3,8 milhões de pessoas trabalharam de forma informal em 2020 e 17% delas adotaram as plataformas digitais como Uber, Ifood e Rappi para trabalhar.
Em que pese a vasta legislação trabalhista brasileira, não existe legislação específica que regulamente a atividade de freelancers, mas é importante que os empreendedores, os donos de startups e mesmo os profissionais que desejam trabalhar como freelancers conheçam suas obrigações, direitos, funções e limites.
O freelancer pode assumir qualquer área e função, que estejam ligadas às competências e habilidades profissionais, sem que haja exigências iguais a um colaborador CLT, como registrar seus horários em ponto eletrônico digital, cumprir horário comercial ou fazer ações que fogem do combinado em contrato.
Diante desta relativa “flexibilização”, muitos empregadores, acabam se aproveitando da legislação para obter vantagens do trabalhador, frequentemente violando seus direitos trabalhistas e até caracterizando trabalho análago ao escravo quando da baixa remuneração, excesso de horas trabalhadas, subtração de intervalo para descanso, proibição de idas ao banheiro, não fornecimento de alimentação, não pagamento de horas extras, adicionais noturno ou compensações de pagamento de horas trabalhadas em domingos e/ou feriados.
Mas o que caracteriza o vínculo empregatício, independentemente deste ser formal ou informal?
São cinco os requisitos que caracterizam o vínculo empregatício segundo o ordenamento jurídico trabalhista brasileiro: pessoa física, pessoalidade, habitualidade, onerosidade e subordinação.
O vínculo empregatício, segundo a inteligência da CLT, é considerado:
Art. 3º, CLT - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.
Entende-se como pessoa física, o indivíduo, a pessoa natural, ou seja, a parte que oferece a prestação do serviço deve se enquadrar na categoria “pessoa física”, pois pessoas jurídicas, não possuem vinculo empregatício.
A pessoalidade pode ser entendida como a impossibilidade do empregado contratado serem representadas ou substituídas por conta própria, ou seja, o trabalhador contratado para desempenhar determina função ou tarefa na organização, não poderá atribuir suas atividades a terceiros por vontade própria.
A habitualidade está relacionada a frequência a qual o serviço é prestado ao contratante, ou seja, a simples constância na prestação de serviços, de forma regular (periódica) e habitual, através de escalas ou turnos de trabalho, sendo que o que deve ser considerado é a repetitividade e não a quantidade de horas, dias ou semanas trabalhadas.
A onerosidade é caracterizada pelo trabalho remunerado como forma de compensação pelo serviço prestado, podendo ser constituído por salário fixo, comissões ou utilidades, podendo ser calculada por hora, dia, semana ou mês.
O “trabalho” voluntário, não caracteriza vínculo empregatício, pois não preenche o requisito da onerosidade e é regido pela Lei No 9.608/1998, “onde qualquer atividade não remunerada – quando você não receba nenhum tipo de pagamento ao realizá-la – pode ser considerada trabalho voluntário, seja para uma entidade pública ou privada sem fins lucrativos”.
A subordinação é apresentada como relação de dependência necessária e pessoal do trabalhador na execução do contrato, desprezando-se, assim, que o fundamento da subordinação se dá pela noção de propriedade, pois somente o proprietário gozará do poder de direção. Em suma, há que se caracterizar a relação hierárquica entre patrão e empregado, ou seja, quem dá as ordens e quem as cumpre.
Posto isto, diante dos princípios e da norma trabalhista vigente, engana-se aquele empregador que, pensando em contratar um freelancer ou informal, que irá se escusar de suas responsabilidades trabalhistas, pois havendo a caracterização do vínculo empregatício, pouco importa se o prestador de serviços era CLT ou não.
Temos ainda que mencionar, que devido a condições de hipossuficiente do prestador de serviços, que cabe ao empregador provar que não havia vínculo empregatício entre este e seus freelancers. Em que pese toda a tecnologia disponível, evidências não faltarão ao empregado, tais como mensagens de texto eletrônica, troca de e-mails, fotos, gravações, dentre outras, para provar que ele prestava, de alguma forma, algum tipo de serviço remunerado àquele.
Paulatinamente, com a educação para o trabalho e consciência política, a famigerada e consuetudinária “Lei de Gerson”[1], vai sendo “revogada”, cedendo espaço a a parceria ganha-ganha entre patrões e empregados.
NOTAS
[1] É uma norma não-escrita, não oficial, segundo a qual a pessoa que gosta de levar vantagem em tudo segue-a no sentido negativo de se aproveitar de todas as situações em benefício próprio, sem se importar com questões éticas, morais ou legais.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Decreto-lei Nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Lex: Aprova a consolidação das leis do trabalho. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>. Acesso em 07 set 2023.
BRASL. Lei No 9.608, de 18 de fevereiro de 1998. Lex: Dispõe sobre o serviço voluntário e dá outras providências. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9608compilado.htm>. Acesso em 07 set 2023.