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Direitos e interesses.

(Re)pensando a relação para além de uma compreensão semântica

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Agenda 13/01/2008 às 00:00

Notas

01 Todavia, Ferrater Mora (2001:4:2959) lembra que foi Stuart Mill, em sua autobiografia, o primeiro a lançar mão do termo utilitarismo (utilitarism). Todavia, isso não ameaça a posição pioneira de Bentham, que pode continuar a ser conhecido como o fundador dessa tradição, fazendo uso, porém, do termo, em inglês, utilitarian, em texto escrito em 1870.

02 "O princípio da utilidade reconhece esta sujeição [à dor e ao prazer] e coloca como fundamento desse sistema, cujo objetivo consiste em construir o edifício da felicidade através da razão da lei. Os sistemas que tentam questionar este princípio são meras palavras e não uma atitude razoável, capricho e não razão, obscuridade e não luz" (BENTHAM, 1979:3).

03 "[...] O interesse da comunidade, eis uma das expressões mais comuns que pode ocorrer na terminologia e na fraseologia moral. Em conseqüência, não é de estranhar que muitas vezes se perca de vista o seu significado exato. Se a palavra tiver um sentido, será o seguinte. A comunidade constitui um corpo fictício, composta de pessoas individuais que se consideram como constituindo os seus membros. Qual é, neste caso, o interesse da comunidade? A soma dos interesses dos diversos membros que integram a referida comunidade" (BENTHAM, 1979:4). E prossegue o autor: "[...] É inútil falar do interesse da comunidade, se não se compreender qual é o interesse do indivíduo. Diz-se que uma coisa promove o interesse de um indivíduo, ou favorece os interesses de um indivíduo, quando tende a aumentar a soma total dos prazeres, ou então, o que vale afirmar o mesmo, quando tenda a diminuir a soma total de suas dores" (BENTHAM, 1979:4).

04 Estranhamente, para Marías (2004:394), o utilitarismo não poderia ser considerado como egoísta, pois haveria um caráter social no fato de se buscar a maior felicidade do maior número de pessoas. Resta saber se a felicidade do maior número de pessoas seria ou não justificável ainda que em razão do sacrifício de outras.

05 Larenz (1997:60-62) destaca que três pressupostos devem estar presentes no estudo do pensamento de Ihering: (1) Ihering desloca o eixo do problema do legislador – como pessoas individuais – para a sociedade, como ator. Todavia, ainda compreende o Direito como apenas a norma coercitiva posta pelo Estado; (2) mesmo assim, atribui a cada norma jurídica uma relação de conteúdo correlato a um fim – qual seja, o benefício da sociedade, justificação máxima para existência da norma. Dessa forma, se pode afirmar que o Direito passa a ser entendido como norma coercitiva do Estado voltada para a realização de um serviço de fim social. A norma, portanto, para ser compreendida, depende de uma analise sociológica, e não de um exame psicológico que perquira a vontade do legislador; e (3) não reconhece a existência de uma hierarquização objetiva dos fins da sociedade, tratando-se mais de um produto histórico mutável.

06 "O Estado, como realidade em ato de vontade substancial, realidade que esta adquire na consciência particular de si universalizada, é o racional em si para si: esta unidade substancial é um fim absoluto, imóvel, nele a liberdade obtém o seu valor supremo, e assim este último fim possui um direito soberano perante os indivíduos que em serem membros do Estado têm o seu mais elevado ser. [...] Quando se confunde o Estado com a sociedade civil, destinando-o à segurança e proteção da propriedade e das liberdades pessoais, o interesse dos indivíduos, enquanto tais, é o fim supremo para que se reúnam, do que resulta ser facultativo ser membro do Estado. Ora, é muito diferente a sua relação com o indivíduo. Se o Estado é o espírito objetivo, então só como membro é que o indivíduo tem objetividade, verdade e moralidade. A associação como tal é o verdadeiro conteúdo e o verdadeiro fim, e o destino dos indivíduos está em participarem de uma vida coletiva; quaisquer outras satisfações, atividades e modalidades de comportamento têm seu ponto de partida e o seu resultado neste ato substancial universal" (HEGEL, 2003:217).

07 Uma reação contra essa tese foi a negativa dada na Sentença n. 22/1984 da Corte Constitucional espanhola. Tratava-se de um caso em que se discutia um conflito entre o direito fundamental à inviolabilidade do domicílio e interesses públicos.

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08 MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Interesses difusos: conceito e legitimação para agir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1988. p. 35-37.

09 Segundo Maciel Júnior (2004:15), os interesses coletivos "são comuns a uma coletividade de pessoas e somente a elas, assentando-se em um vínculo jurídico definido que as congrega, como por exemplo, a sociedade, a família".

10 "Vivemos em uma economia cuja preocupação se dirige ao trabalho, consumo, comércio e produção em massa, com reflexos no campo social, e na presença do Estado promocional e intervencionista, o Estado de welfare. Em conseqüência, as relações tomam novo dimensionamento, engendrando problemas antes inexistentes, como o ‘dano de massa’, ou seja, a possibilidade de um ato ilícito ou prejudicial a um número ilimitado ou indeterminado de pessoas como na hipótese dos consumidores" (MACIEL JÚNIOR, 2004:19).

11 Para Sarmento (2005:110), essa leitura por demais elástica "do conceito de direito fundamental corre o risco de esvaziar a dimensão moral destes direitos, que justifica sua proteção reforçada, operando assim uma espécie de ‘nivelamento por baixo’".

12 Utilitaristas, na seqüência do pensamento iniciado por Bentham, compreendem que a lei é uma "infração" contra a liberdade, de modo que, nesse sentido, de fato pode-se afirmar uma competição entre liberdade e igualdade. Todavia, como adverte Dworkin (2002:413), essa é uma compreensão por demais larga do que seja liberdade. "Podemos dizer, por exemplo, que uma pessoa tem um direito à liberdade se for de seu interesse ter liberdade, isto é, se ela quiser tê-la ou se for bom para ela ter esse direito. Neste sentido, eu estaria disposto a admitir que os cidadãos têm um direito à liberdade. Neste mesmo sentido, porém, eu teria igualmente de conceder que eles têm um direito, pelo menos em termos gerias, a sorvete de baunilha". E mais adiante prossegue em sua crítica: "Dizer que, se os indivíduos têm esses direito, no longo prazo, o conjunto da comunidade como um todo estará em melhor situação não é uma resposta. Essa idéia – a de que os direitos individuais podem conduzir à utilidade geral – pode ou não ser verdadeira, mas ela é irrelevante para a defesa dos direitos enquanto tais, pois quando afirmamos que alguém tem um direito de expressar livremente suas opiniões, no sentido político relevante, queremos dizer que ele tem o direito de fazê-lo, mesmo quando não for de interesse geral" (DWORKIN, 2002:417-418).

13 "Essa perspectiva é mais radical do que aquela findada na chamada ‘interdependência dos direitos’, que comporia o núcleo fundamental e indivisível dos direitos humanos. Isso porque, aqui, não se trata simplesmente de uma aplicação ponderada, proporcional ou compromissória de normas constitucionais, semanticamente consideradas, que pretende restringir ou otimizar o exercício dos direitos" (CATTONI DE OLIVEIRA, 2003:133).

14 No mesmo sentido, Cattoni de Oliveira (2003:135-136), que realiza uma leitura conjunta da Lei da Ação Civil Pública (art. 1º da Lei n. 7.347/85) e do Código de Defesa do Consumidor (arts. 81, 83, 91, 94, 97, 98, 103, § 3º, e 104).

15 Outro exemplo: "é correto afirmar, por exemplo, que uma associação de pescadores pode defender em juízo o direito ao ‘meio ambiente ecologicamente equilibrado’ (Constituição da República, art. 225), numa situação concreta de lesão ou de ameaça, porque seus associados ou, até mesmo, toda uma coletividade retira o seu sustento e desenvolve formas de vida culturais em que a pesca legalmente permitida assume papel central, ainda que tal finalidade ‘ambientalista’ ou ‘cultural’ não esteja prevista em seus estatutos. Afinal, não há pesca de peixe morto, contaminado ou ameaçado de extinção" (CATTONI DE OLIVEIRA, 2003:138).

Sobre o autor
Flávio Quinaud Pedron

Mestre e Doutor em Direito pela UFMG. Professor do Mestrado da Faculdade Guanambi (Bahia). Professor Adjunto no curso de Direito do IBMEC/MG. Professor Adjunto da PUC-Minas (graduação e pós-graduação). Advogado em Belo Horizonte (MG).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEDRON, Flávio Quinaud. Direitos e interesses.: (Re)pensando a relação para além de uma compreensão semântica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1656, 13 jan. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10835. Acesso em: 22 dez. 2024.

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