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Aborto e a liberdade feminina: uma visão de direito humano

Agenda 14/03/2024 às 17:37

A palavra Liberdade etimologicamente deriva do latim "libertas, - atis", que significa condição da pessoa livre.

Para Emmanuel Kant, a liberdade está disposta à universalidade do dever em relação ao social e também, por que não, dizer atrelada ao Imperativo Categórico Kantiano e aos seus discursos sobre moralidade e inclinações pessoais. Ressaltando que a legalidade é o exercício pleno destes através de disposições normativas convencionais ou não que regem os primórdios e que evoluem constantemente de acordo com a mudança nos fatos sociais.

Sendo, portanto, a liberdade individual um conceito da sociologia e da teora política, faz-se os posicionamentos jurídicos a seguir.

Segundo Decreto 678 de 1992 que promulga o Pacto de São José da Costa Rica, está delimitado em seu art. 7 o seguinte:

1. Toda pessoa tem direito à liberdade e à segurança pessoais.

2. Ninguém pode ser privado de sua liberdade física, salvo pelas causas e nas condições previamente fixadas pelas constituições políticas dos Estados-Partes ou pelas leis de acordo com elas promulgadas.

 

 

Na Convenção Americana Sobre Direitos Humanos, assinada na Conferência Especializada Interamericana sobre Direitos Humanos, San José, Costa Rica, em 22 de novembro de 1969, que foi promulgada depois de longos anos pelo Decreto acima, consta:

 


PREÂMBULO

 

Os Estados americanos signatários da presente Convenção,

 

Reafirmando seu propósito de consolidar neste Continente, dentro do quadro das instituições democráticas, um regime de liberdade pessoal e de justiça social, fundado no respeito dos direitos essenciais do homem;

 

Reconhecendo que os direitos essenciais do homem não derivam do fato de ser ele nacional de determinado Estado, mas sim do fato de ter como fundamento os atributos da pessoa humana, razão por que justificam uma proteção internacional, de natureza convencional, coadjuvante ou complementar da que oferece o direito interno dos Estados americanos;

 

Considerando que esses princípios foram consagrados na Carta da Organização dos Estados Americanos, na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e na Declaração Universal dos Direitos do Homem e que foram reafirmados e desenvolvidos em outros instrumentos internacionais, tanto de âmbito mundial como regional;

 

Reiterando que, de acordo com a Declaração Universal dos Direitos do Homem, só pode ser realizado o ideal do ser humano livre, isento do temor e da miséria, se forem criadas condições que permitam a cada pessoa gozar dos seus direitos econômicos, sociais e culturais, bem como dos seus direitos civis e políticos; e

 

Considerando que a Terceira Conferência Interamericana Extraordinária (Buenos Aires, 1967) aprovou a incorporação à própria Carta da Organização de normas mais amplas sobre direitos econômicos, sociais e educacionais e resolveu que uma convenção interamericana sobre direitos humanos determinasse a estrutura, competência e processo dos órgãos encarregados dessa matéria,

 



Segundo artigo 12 sobre Liberdade de consciência e de religião, em seu item 3., se entendido de maneira ampliativa observa-se que crença é a moral individualista e individual e que a liberdade do homem e da mulher não possui autolesão ou lesão à ordem pública ou lesão à outrem entendido que aos pupilos em item 4. é garantido o direito de convicção dos pais, portanto, o aborto pode ser abarcado como liberdade de crença individual ou coletiva.

 

Ademais, em artigo 13[1], preconiza-se a liberdade de pensamento e expressão, o que só vem a ratificar entendimento elabora pela Autora.

 

A luta até hoje pelo direitos civis das mulheres é constante, e é uma falta de observação e de consideração do legislador não realizar orientação e estudo ampliativo dos tratados e convenções de direitos humanos se baseando em falsos princípios de eticidade, quando na prática, às crianças nunca é observado princípio da proteção integral, inclusive, são os mais destruídos, seja pela família e/ou Estado e/ou sociedade, seus principais zeladores na teoria. Em sentido sucinto: O aborto em todas as suas variáveis só é criminalizado porque quem gera a cria é a mulher, pois se fosse um homem, nunca seria um fato típico penal.

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Quais são as lesões implicadas por uma mulher ao abortar? Tão somente a si mesma enquanto isto não é garantido efetivamente pelo Estado, e autolesão é impunível. Quando à ordem pública, na verdade, é até crucial que muitas abortem para que não haja tanta miséria e morte de crianças por fome e pobreza e falta de saneamento e tantos outros direitos que deveriam ser cumpridos pelo Estado em sentido amplo e nem há sombra desta concretização destes. Ou seja, o Estado acaba sendo um pai que abandonou a criança na maternidade, mas agora quer determinar as rédeas da vida dos cidadãos.

O aborto típico, antijurídico e culpável, exceto quando o prioriprogenitor determina a escolha, é plenamente viável e um fato existente e coexistente na sociedade, e sempre vai existir, o que falta é regulamentação e auxílio estatal para ajudar e preservar a saúde e vida das mulheres, pois aí sim, é caso de saúde e ordem pública.

O autoaborto não deveria ser nem objeto de pauta do Superior Tribunal Federal se fosse realizada interpretação ampliativa, como já elaborado.

O aborto em todas as suas figuras “típicas” não deveria ser considerado material, pois o que deve ser considerada é a saúde da gestante ou a não aceitação desta em se tornar mãe, o resultado naturalístico ao meu ver é deturpado, pois atinge a natureza a liberdade feminina individual, material e formal, e liberdades de crença e de pensamento, portanto, sujeitos à ponderação segundo Hart por se tratar de um hard case hermeneuticamente falando.

E tratando de matéria penal, a Autora ousa pronunciar que o autoaborto e com consentimento se trata de um efeito colateral do sistema, um estado de necessidade defensivo-agressivo, portanto, perde a característica de ilicitude, deixando de ser uma conduta criminosa.

Para desfecho, cita-se Ronald Dworkin em Prefácio da obra O Império do Direito[2]: “(...) Como pode a lei comandar quando os textos jurídicos emudecem, são obscuros e ambíguos?”.

 

 

 

           

 

 

 

 

 



[1] 1.      Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão.  Esse direito compreende a liberdade de buscar, receber e difundir informações e idéias de toda natureza, sem consideração de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro processo de sua escolha.

[2] DWORKIN, Ronald. O império do Direito. 2ª edição. Editora Martins Fontes, São Paulo, 2007, prefácio, XII;

Sobre a autora
Greice Paula Miranda Serra

Advogada, Assessora jurídica, Pós-graduada em Direito Público.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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