VI – A TÍTULO DE (POSSÍVEL) RESPOSTA
À pergunta, pois, se "possível, sem afronta à Constituição, a execução provisória da pena?", responde-se, ainda que sem foro de definitividade: sim e não, com acréscimo da condicional: dependendo dos contornos fático-jurídicos da hipótese.
Com efeito, responde-se sim, com a cautela de nominar a hipótese de antecipação benéfica de efeitos da condenação – e não de execução provisória da pena -, se, e somente se: 1) subsistente, ou supervenientemente, se afigurar motivação para o encarceramento cautelar do réu condenado e preso (prisão sem pena) ele estiver ou vier a ser; 2) houver o édito de condenação transitado em julgado para a acusação [17]; e 3) haver a defesa, ou mesmo o Ministério Público, manejado recurso em benefício do réu; isto porque a garantia constitucional da presunção de inocência não pode ser considerada em prejuízo da situação daquele a quem se visa garantir (v.g., alguém preso cautelarmente, com condenação - recorrida tão-somente em seu benefício -, a regime inicial aberto).
Já a resposta negativa se impõe, se: 1) liberto estiver o réu condenado e não se patentearem motivos suficientes para sua superveniente (à decisão de condenação) custódia não definitiva (mais uma vez, prisão sem pena); e 2) haver sido interposto recurso para melhoria da situação do réu; ou 3) houver sido brandido pela acusação recurso buscando agravar a situação posta na condenação, sendo certo que, em casos que tais, a ofensa à presunção de inocência é patente, configurando, via de conseqüência, verdadeira antecipação inconstitucional de pena.
Penso, entrementes, que menos mal (não me atrevo a dizer melhor, à vista do até aqui gizado) seria se nova constituição dissesse: "somente será considerado culpado, aquele que tiver contra si, ao menos, sentença penal condenatória recorrível".
Enquanto não, que se jogue, com as regras postas, o jogo processual.
VII – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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2005. Disponível em: <http://jusvi.com/doutrinas_e_pecas/ver/15567>.Acesso em 1ºago.2007
QUEIROZ, Rachel de. João Miguel, 14 ed., São Paulo: Siciliano, 2000.
QUINTANA, Mário. Apud PLETSCH, Natalie Ribeiro. Formação da prova no jogo processual penal: o atuar dos sujeitos e a construção da sentença. São Paulo: IBCCRIM, 2007.
Notas
01QUINTANA, Mário. Apud PLETSCH, Natalie Ribeiro. Formação da prova no jogo processual penal: o atuar dos sujeitos e a construção da sentença. São Paulo: IBCCRIM, 2007, p. 7.
02PLETSCH, Natalie Ribeiro. Formação da prova no jogo processual penal: o atuar dos sujeitos e a construção da sentença. São Paulo: IBCCRIM, 2007, p. 50.
03ARAÚJO, José Osterno Campos de Araújo. João Miguel: Romance de uma absolvição tardia ou o processo como pena. http://www.direitonet.com.br/artigos/x/83/44/834/, acesso em 13.06.2007.
04 QUEIROZ, Rachel de. João Miguel. 14 ed., São Paulo: Siciliano, 2000. Toda indicação de página entre parênteses e não referenciada diversamente refere-se a esta obra.
05Gazeta do povo on line. http://canais.rpc.com.br/gazetadopovo/brasil/conteudo.phtml?id=560709, acesso em 18.06.2007.
06Portal on line da violência contra a mulher. http://www.patriciagalvao.org.br/apc-aa-patriciagalvao/home/noticias.shtml?x=132, acesso em 14.06.2007.
07Idem.
08Poder-se-ia falar também em ponte da culpa, caso se considere que o que separa acusação da condenação não mais seja o muro da inocência – a se destruir, provando eticamente -, mas sim dita ponte da culpa, a ser construída -, e sua construção finda por deitar por terra o óbice à condenação -, também pela força da prova válida, vencendo-se, pois, o abismo adredemente constituído, pela Constituição, entre acusação e condenação.
09Artigo 5º, inciso LVII, da CF/88: "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória".
10Manuel da Costa Andrade – Sobre as proibições de prova em processo penal. Coimbra: Coimbra Editora, 1992, p. 186 -, refere-se ao posicionamento de autores alemães, os quais aludem à "pureza do processo" (K. Rogall), à "superioridade moral do Estado" (F. Dencker), e à "diferença ética entre a perseguição do crime e o próprio crime" (W. Hassemer).
11Alberto M. Binder - Introducción al derecho procesal penal. 2. ed. actualizada y ampliada, 2. reimpresión. Buenos Aires: Ad-Hoc, 2002, p. 124 -, acerca da nominação presunção de inocência, aduz: "Es curioso que em este caso, al contrario de lo que suele ocurrir, la formulación positiva del principio (como de ''inocencia'') ha generado mayores dificultades em su interpretación que su fomulación negativa: si nos referimos a la existencia de uma presunción de inocencia, seguramente encontraremos muchos críticos; sin embargo, si afirmamos que ''ninguna persona puede ser culpable hasta que uma sentencia declare su culpabilidad'', posiblemente el acuerdo sea total. Esto nos señala que en la base del problema existe uma discusión verbal (sobre el sentido y alcances de las palabras) que, sí es soslayada, puede generar falsas discusiones em otros niveles".
12Novo Testamento, Mt. 22, 21.
13BENETI, Sidnei Agostinho. Execução Penal. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 88/89.
14Idem, p. 89.
15www.cjf.gov.br, acesso em 14.06.2007.
16O "pecado" desta corrente é o de se limitar a afirmar a não afronta à Constituição, sem, no entanto, aduzir o porquê de assim se entender. O argumento da ausência de suspensividade dos recursos extraordinário e especial, sobre ver-se colhido em norma de hierarquia inferior à Constituição (artigo 27, par. 2º, da Lei 8.038/90), não justifica, outrossim, o fato de se dar tratamento de culpado (antecipação de pena) a quem ainda não foi declarado como tal, por sentença definitiva. Doutra parte, compartilho do estranhamento do Min. Sepúlveda Pertence que não vê razoabilidade em se sustentar que a presunção constitucional de inocência veda a inclusão do nome do réu no rol dos culpados (o menos), antes de condenado definitivamente, mas não obsta a execução provisória da pena (o mais).
17Pertinente, nada obstante, o acertado adendo de Paulo Queiroz, no sentido de que: "Mas mesmo na presença de recurso da acusação que objetive majorar a pena, temos ser possível, excepcionalmente, a execução provisória, quando se verificar que o eventual provimento do apelo não tiver qualquer repercussão sobre o direito que se pretende ver reconhecido (direito à progressão, ao livramento condicional etc.)". E exemplifica: "Assim, por exemplo, se o Ministério Público apelar para obter a aplicação de uma causa de aumento de pena de 1/3 sobre uma condenação de seis anos, caso em que aumentaria para oito anos, tal circunstância em nada afetará o direito à obtenção de livramento condicional se o réu, primário e sem antecedentes criminais, já houver cumprido mais de ½ da pena, quando lhe bastava o cumprimento de mais de 1/3 (CP, art. 83, I). Sim, porque, ainda que, provido o recurso, a pena venha a ser aumentada para oito anos, o sentenciado já teria atingido mais de 1/3 dessa nova pena, fazendo jus, portanto, ao livramento condicional". Para, por fim, arrematar: "Numa palavra: somente o recurso que possa alterar a situação do sentenciado, prejudicando o reconhecimento do direito que postula especificamente, pode ter o condão de inviabilizar a execução provisória, não o impedindo apelação que em nada modifique tal situação". (QUEIROZ, Paulo, Execução provisória da sentença e garantismo. Jus Vigilantibus, Vitória, 10 mai. 2005. Disponível em: <http://jusvi.com/doutrinas_e_pecas/ver/15567>.Acesso em 1ºago.2007).