A violência contra a mulher não é um fato novo. Pelo contrário, é tão antigo quanto a humanidade. O que é novo, e muito recente, é a preocupação com a superação dessa violência como condição necessária para a construção de nossa humanidade. E mais novo ainda é a judicialização do problema, entendendo a judicialização como a criminalização da violência contra as mulheres, não só pela letra das normas ou leis, mas também, e fundamentalmente, pela consolidação de estruturas específicas, mediante as quais o aparelho policial e/ou jurídico pode ser mobilizado para proteger as vítimas e/ou punir os agressores. (Mapa da Violência de 2015. 1ª Edição Brasília – DF – 2015)
É tempo de cancelar da nossa vida aquilo que não vale a pena, e, nesse sentido, valorizar o que é mais importante: viver a vida com muita luz e sabedoria, sempre rechaçando as trevas que nos fazem perder os caminhos na escuridão do tempo. É tempo de amar mais, com intensidade, fraternidade e espírito de amor desmedido, pois quem não sabe amar o semelhante não está preparado para viver em sociedade. Um dia, certamente, a sociedade deixará de aplicar, naturalmente, a excepcionalidade da Lei Maria da Penha, porque os homens aprenderão a respeitar e valorizar as mulheres, sem necessidade de imperativo de leis e sem a necessidade de sentimento de posse. (Prof. Jeferson Botelho)
Hoje, 07 de agosto de 2024, uma data muito importante para a história da sociedade brasileira, aniversário dos 18 anos de existência da Lei Maria da Penha do Brasil. São quase duas décadas de existência de uma norma de proteção aos legítimos direitos da mulher. Conquista que entra para o rol de ações de afirmação e aprimoramento da promoção dos direitos humanos; uma longa história de sofrimento, superação, avanços e conquistas para a humanidade. Um feixe de luz é lançado sobre a sociedade brasileira; uma espécie de iluminismo contemporâneo na defesa dos interesses e direitos das mulheres; um salvo-conduto simbolizando liberdade e proteção; instrumento de combate à repressão levado a efeito por uma categoria minoritária que se acha melhor que todo mundo, uma minoria arrogante que pensa ser o dono do mundo, lembrando que o gênero homem é apenas e tão somente parte de uma engrenagem social, apenas uma anatomia, nada mais que isso, ninguém é superior a ninguém, e assim, caminha a humanidade com sua dinamicidade.
Destarte, a Lei nº 11.340, de 07 de agosto de 2006, denominada LEI MARIA DA PENHA, nasceu da necessidade premente de se protegerem os direitos da mulher no Brasil, diante da violência exacerbada, e, para o eficaz enfrentamento, logo no seu artigo 1º, a festejada lei anuncia como objetivo a criação de mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, com base na Constituição da República de 1988, na Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, de 1979, e na Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher.
É certo que não há espaço no mundo atual para fomentar ideias de desigualdades entre homens e mulheres, em desrespeito aos direitos de 4ª Dimensão, e, tanto isso é verdade, que todas as Constituições brasileiras, desde 1824, dispõem sobre o princípio da igualdade. Assim, temos a chamada igualdade formal, o que se busca doravante é a tão sonhada e almejada igualdade material.
Logo no artigo 226, a Carta Magna preceitua que a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado, sendo que no § 8º o mesmo dispositivo informa que o Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.
A Lei Maria da Penha, no artigo 1º, também faz menção à Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, a famosa Convenção de Belém do Pará, adotada em Belém do Pará, Brasil, em 9 de junho de 1994, no Vigésimo Quarto Período Ordinário de Sessões da Assembleia Geral. A referida Convenção foi ratificada por meio do Decreto nº 1.973, de 1º de agosto de 1996.
A primeira consideração relevante foi que a Lei Maria da Penha foi declarada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em fevereiro de 2012, em decorrência da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 19. Ainda em 2012, o STF definiu que o Ministério Público (MP) poderia iniciar ação penal sem necessidade de representação da vítima — Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4424.
Da mesma forma, reconhece que o respeito irrestrito aos direitos humanos foi consagrado na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e na Declaração Universal dos Direitos Humanos, e reafirmado em outros instrumentos internacionais e regionais.
Afirma-se que a violência contra a mulher constitui violação dos direitos humanos e liberdades fundamentais e limita, total ou parcialmente, a observância, gozo e exercício de tais direitos e liberdades.
Convence que a eliminação da violência contra a mulher é condição indispensável para seu desenvolvimento individual e social e sua plena e igualitária participação em todas as esferas de vida, e que a adoção de uma convenção para prevenir, punir e erradicar todas as formas de violência contra a mulher, no âmbito da Organização dos Estados Americanos, constitui positiva contribuição no sentido de proteger os direitos da mulher e eliminar as situações de violência contra ela.
Assim, combater a violência contra a mulher é exercício de atividade constante na sociedade atual. Não há espaços para estagnação. As ações devem ser contínuas, uma necessidade perene e dinâmica, deve ser um ato de repetição, até que um dia se possa sonhar num exercício totalmente inócuo, porque os homens aprenderam a respeitar naturalmente os direitos das mulheres.
Não custa nada sonhar que um dia a norma de proteção à mulher será meramente simbólica, pois mesmo em pleno vigor não será mais aplicada porque caiu em desuso, será uma lei puramente de enfeite, e assim, o Delegado de Polícia, o Promotor de Justiça, o Advogado, o Defensor Público e os Juízes, todos estarão desempregados porque não haverá mais casos para investigar e tampouco processos para julgamento.
Mas por enquanto é preciso parar de sonhar. É hora de acordar. Nesse sentido, mais uma vez o legislador pátrio modificou a norma, no sentido de amparar e apoiar as ações de enfrentamento à violência contra a mulher.
Aqui mais uma feliz tentativa do legislador pátrio de fortalecer as medidas de proteção e combate à violência contra a mulher, lembrando que a referida lei não ampara tão somente as mulheres vítimas de violência doméstica ou familiar, mas todas as mulheres estão inseridas no âmbito da proteção da norma, agora para destinar recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública para as ações de enfrentamento da violência contra a mulher.
Há necessidade de envidar esforços diários, constantes, salientando que todo e qualquer meio de obstar a violência contra a mulher deve sempre receber eco social, notadamente, daquelas pessoas que amam respeitar valores, que nasceram para fazer a diferença, sendo preciso gritar bem alto para que todos possam ouvir, e assim, pavimentar o caminho da paz, do amor, da ética e da valorização, e nessa toada cada homem deve trilhar por esse caminho da clareza, carregando nas mãos uma bússola, na alma o sentimento de solidariedade, no coração a certeza do amor, transcendental, pulsando forte e despertando para a vida, os olhos apontando a exata direção da luz, que nos conduz ao caminho do respeito e fidelidade aos direitos da mulher.
Com todo esse aparato de garantias e salvaguardas, a Lei Maria da Penha, foi considerada pela ONU a terceira lei mais importante do mundo, mas que infelizmente tem vigência num território que ocupa a quinta posição no ranking de país mais violento no mundo, em casos de feminicídio, uma verdadeira e indubitável incongruência em termos práticos e teóricos. Os pesquisadores usaram como base dados de 2013, que colocam apenas El Salvador, Colômbia, Guatemala e Rússia à frente do Brasil. A violência contra a mulher cresceu no ano passado, no Brasil, em comparação ao ano de 2022, segundo dados da 18ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgados recentemente.
No total, 1.238.208 mulheres foram vítimas de algum tipo de violência no Brasil, somente em 2023. Os números envolvem homicídio e feminicídio (consumadas e tentadas), agressões em contexto de violência doméstica, ameaça, perseguição (stalking), violência psicológica e estupro.1
Espera-se que não seja tão somente uma utopia, uma luz radiante efêmera, fugaz, uma quimera qualquer, mas que seja a Lei Maria da Penha uma legislação meramente temporária ou excepcional, com tempo marcado para perder a vigência, ou por conta de um tempo puramente excepcional, porque logo os homens passarão a respeitar os direitos da mulher – tudo natural e espontaneamente e nesse caso, não haverá mais necessidade da existência dessas leis, ficarão arquivadas nos alfarrábios do tempo, ficarão depositadas nos museus históricos – e saberão reconhecer que a violência contra a mulher constitui violação dos direitos humanos e liberdades fundamentais, tomarão ciência da realidade de que o papel da mulher é infinitamente o mais importante nas relações humanas, imprescindível e inegociável, porque mulher é símbolo de garra, dedicação, amor, superação, a verdadeira heroína que faz toda a diferença na humanidade.
A violência é a pior cegueira do mundo. Quando enxergarmos que somente a coletividade pode construir um futuro melhor, seguiremos rumo a um horizonte mais igualitário. Assim, combater a violência contra a mulher é exercício de atividade constante na sociedade atual. Não há espaços para estagnação. As ações devem ser contínuas, uma necessidade perene e dinâmica; deve ser um ato de repetição, até que um dia se possa sonhar num exercício totalmente inócuo, porque os homens aprenderão a respeitar naturalmente os direitos das mulheres.
Nesse sentido, não custa nada sonhar que um dia a norma de proteção à mulher será meramente simbólica, pois mesmo em pleno vigor não será mais aplicada porque caiu em desuso, será uma lei puramente de enfeite, e assim, o Delegado de Polícia, o Promotor de Justiça, o Advogado, o Defensor Público e os Juízes, todos estarão desempregados porque não haverá mais casos para investigar nem tampouco processos para julgamentos.
Nesse dia, os corações baterão de profunda alegria, lágrimas cairão dos olhos, aviões farão sobrevoos rasos jogando flores vermelhas, pétalas brancas cairão nas cabeças dos homens, cartazes anunciarão o fim da violência, ouvirão chilreios de pássaros, escutarão melodias de amor, no alto das montanhas formarão lindos arrebóis, crianças correndo nos bosques, alto-falantes anunciarão mensagens de motivação, de amor profundo. Mas por enquanto é preciso parar de sonhar. É hora de acordar. Nesse sentido, mais uma vez o legislador pátrio modificou a norma, no sentido de amparar e apoiar as ações de enfrentamento à violência contra a mulher.
Em cada alvorecer nasce uma esperança de dias melhores; e quando o homem passar a respeitar naturalmente os direitos das mulheres, sem necessidade de leis coercitivas, certamente, nesse dia haverá maior brilho lunar, as estrelas hão de colorir a obscuridade da terra; o sol brilhará com maior intensidade, os pássaros cantarão em sinfonia; trovões anunciarão a paz na humanidade, a primavera estará mais florida; o arco-íris riscará os céus com brilho de cores; os poetas líricos despertarão suspiros poéticos e saudades; o mundo anunciará a paz entre os homens num minuto de silêncio; um turbilhão de luzes iluminando as mentes dos homens, dando-lhes discernimento e sabedoria para entenderem que as mulheres são néctar de paz, são sujeitos de direitos, dotadas de grande amor no coração, imprescindíveis para o crescimento da humanidade; passarão a entender que elas estão para a sociedade como o oxigênio está para a vida.
Por derradeiro, vamos parar de estimular romantismo penal e fazer uma reflexão muito séria. Se o Brasil possui uma das leis mais importantes do mundo na defesa dos direitos da mulher, segundo entendimento da ONU, não pode figurar no ranking de 5º país onde mais se pratica feminicídios no mundo, então é hora de refletir e mudar imediatamente o aplicador da lei; menos mídias e mais efetividade nas Instituições de combate à criminalidade; menos garantismo penal simbólico e monocular; mudanças nos atores que trabalham no combate à essa modalidade criminosa; decerto precisamos de menos narcisismos e mais efetividade nas ações preventivas e repressivas; todo dia uma mulher entra para as estatísticas criminais neste país da impunidade; hoje, por ser um dia simbólico de comemoração dos 18 anos da Lei Maria da Penha todo mundo vai para as redes sociais falar sobre conscientização social e educação nas escolas sobre esse gravíssimo problema de violência contra a Mulher, mas o próprio Estado é o principal responsável quando alguns afirmam que a Lei Maria da Penha é um conjunto de normas diabólicas . É preciso parar de falar e fazer mais. O problema não está nas leis; seguramente, ele está no intérprete das leis, encontra-se na interface entre o computador e a cadeira giratória nos gabinetes suntuosos. O problema reside na incompetência de quem faz gestão governamental. Verdadeiros amadores a procura de holofotes. Daqui a pouco começam as campanhas eleitorais e vão aparecer um monte de idólatras de plantão falando em políticas públicas de prevenção e combate à violência contra a mulher. Um bando de oportunistas num banquete de engodos.
REFERÊNCIAS
BOTELHO. Jeferson. Capítulo 1º do Livro Violência Doméstica. Avanços e Desafios da Lei Maria da Penha como Aparato de Prevenção. Editora Mizuno. 2ª edição. 2024.
Nota
Dados divulgados pela Universa UOL em 18 de julho de 2024.