4. Sociedade civil frágil, patrimonialismo e o Estado regulador.
De início, deve-se falar que o advento do Estado regulador poderia representar um amadurecimento institucional para o Brasil. Poderia, mas não representou. E não representou, em primeiro lugar, porque a mudança de atuação e de intervenção estatal na economia não foi debatida nem decidida com a participação ativa da sociedade. É que a alteração na forma de atuação e de intervenção do Estado na economia foi imposta de cima para baixo, contrariamente ao que ocorreu em outros países, tornando evidente, mais uma vez, a fragilidade da sociedade civil, excluída, neste caso, da definição de seu próprio destino.
Majone (1997) relata que, na Europa, a opção pelo Estado regulador foi feita pelos eleitores, os quais foram convencidos da necessidade de se apoiar um novo modelo de governança que incluísse a privatização de muitas partes do setor público, mais concorrência em toda a economia pelo lado da oferta e reformas de longo alcance no Estado do bem-estar.
Ultrapassada esta questão preliminar, cumpre-nos indagar qual a influência de uma sociedade civil frágil e da cultura do patrimonialismo no âmbito do Estado regulador.
De início, no entanto, é importante ressaltar o fortalecimento da sociedade civil brasileira a partir de meados da década de 1980. Segundo Cardoso (2007), a liberdade individual e a inovação tecnológica possibilitaram novas formas de ação política, realizadas fora dos partidos políticos e sindicatos, o que, sem dúvida, teria fortalecido a sociedade frente ao Estado. Para ele, "os cidadãos são, hoje, mais informados e participantes. Têm múltiplos interesses e identidades".
Sorj (2007) concorda com o fortalecimento da sociedade civil brasileira, principalmente a partir da década de 1980, e ressalta o papel importante da difusão das organizações não-governamentais, as quais se caracterizariam pela defesa de interesses difusos, como a ordem moral, por exemplo.
Seguindo adiante, deve-se relembrar que a fragilidade da sociedade civil requer ou possibilita a atuação do Estado nos espaços deixados em aberto por ela. No modelo social, o próprio Estado preenche os espaços vazios. Já no modelo regulador, cabe ao Estado, em regra, promover a sua ocupação pela iniciativa privada, sob a sua regulação e fiscalização.
Assim, um fenômeno que poderá se revelar no Estado regulador, frente a uma sociedade civil relativamente frágil, será o excesso de regulação, ou seja, excesso na expedição de normas para regular as atividades econômicas e mediar os conflitos existentes entre a sociedade civil consumidora e os prestadores de serviços. Também se dá o nome de juridificação a tal fenômeno.
Nesse particular, pode-se falar que já há sinais da juridificação no Brasil. Efetivamente, apenas considerando o âmbito federal brasileiro, são muitos os entes a exercitarem o poder normativo em áreas específicas, deles sendo exemplos: Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL), Agência Nacional do Petróleo (ANP), Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Para se ter noção da dimensão da atividade normativa da Administração Pública federal brasileira, vale destacar os seguintes dados:
1. Entre janeiro de 2004 e março de 2007, a ANEEL editou 257 resoluções normativas;
2. Entre fevereiro de 1997 e março de 2007, a ANATEL editou 459 resoluções normativas;
3. Entre janeiro de 2004 e março de 2007, a ANP editou 127 resoluções de caráter normativo;
4. Entre outubro de 1992 e março de 2006, a ANVISA editou 48 instruções normativas;
5. Entre abril de 1978 e fevereiro de 2007, a CVM editou 448 instruções de caráter normativo;
6. Entre maio de 1992 e fevereiro de 2007, o CADE editou 44 resoluções normativas.
7. Entre fevereiro de 2002 e dezembro de 2006, a ANS editou 49 instruções normativas e 148 resoluções normativas.
Partilhando do mesmo entendimento quanto ao excesso de normas regulatórias, Falcão (2008) chama atenção para o problema ao registrar que:
Em 2007, o Congresso aprovou 198 leis. Em compensação, apenas três das principais agências reguladoras produziram 1.965 resoluções. A Agência Nacional de Energia Elétrica editou 635, a Agência Nacional de Transportes Terrestres, 726, e a Agência Nacional de Águas, 604. Mesmo sem considerar resoluções das outras sete agências federais (ANVISA, ANS, ANCINE, ANATEL, ANP, ANTAQ e ANAC), são quase dez vezes mais atos normativos. Nos estados, o cenário se repete. No Rio Grande do Sul, por exemplo, a AGERGS produziu 580 resoluções enquanto a Assembléia Legislativa gaúcha elaborou apenas 188 leis estaduais. Existem agências em 19 estados e também no Distrito Federal. Em alguns, mais de uma, como São Paulo e Rio.
Uma sociedade civil frágil também pode conduzir a outras perplexidades no âmbito do Estado regulador. É que o processo de decisão das agências reguladoras envolve, em regra, procedimentos de audiência e consulta públicas, nos quais são ouvidos os agentes do mercado e os consumidores quanto às normas a serem aplicadas a determinadas relações econômicas e de consumo. Quando a sociedade civil não está estruturada a ponto de participar tecnicamente do debate, haverá um confronto desigual com os agentes do mercado, os quais certamente disporão de todos os argumentos técnicos a favor de suas posições.
Caso emblemático é o das revisões tarifárias dos contratos de distribuição de energia elétrica. Essas revisões envolvem elementos tão complexos (parcela A e parcela B da tarifa, empresa de referência, fator X, perdas comerciais, conta de desenvolvimento energético – CDE, contratos de longo prazo, pool, etc.) que, supondo-se que haja um grave erro em sua elaboração pela Agência Nacional de Energia Elétrica, ao consumidor leigo não seria dado entender a questão e pleitear pela correta revisão. Apenas a organização da sociedade civil a ponto de dispor de consultoria especializada possibilitaria a defesa de seu ponto de vista, em busca da modicidade tarifária.
Como não temos, em regra, a efetiva participação da sociedade civil nos procedimentos decisórios das agências reguladoras, a sua presença nesses procedimentos não significa que os seus interesses estejam resguardados.
De outro lado, a cultura do patrimonialismo, apesar de encontrar seu habitat no modelo de Estado social, em razão da dimensão da propriedade pública, pode se manifestar de forma diferente no Estado regulador, mas ainda assim encontra condições para se fazer presente.
É que a forma de nomeação dos dirigentes das agências reguladoras propicia composições políticas com a finalidade de conduzir a tais posições de autoridade pessoas comprometidas com determinados grupos ou interesses.
Exemplo dessa situação pode ser vista no voto do Desembargador Francisco Cavalcanti, do Tribunal Regional Federal da 5ª Região quando do julgamento da apelação cível de nº 342.739/PE. Nesse caso, o TRF da 5ª Região, em ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal, declarou nulo ato de designação para integrar conselho consultivo da ANATEL, na qualidade de representantes dos usuários e da sociedade, do Presidente da Tele Norte Leste Participações S/A e da Telemar Norte Leste S/A e do Presidente da Telebrasil. Certamente esse é apenas um entre vários exemplos que podem ser citados.
5. Conclusão
Após a análise feita acima, o que se observa é que a mudança da forma de atuação do Estado apenas desloca os problemas ocasionados por uma sociedade civil frágil e pela cultura do patrimonialismo para um outro centro de poder, não representando uma virada substancial na história do Estado Brasileiro.
No Estado regulador, o patrimonialismo tenderá a se fazer presente na elaboração de normas, face à supressão da propriedade pública na exploração de atividade econômica, assim como a fragilidade da sociedade mostrará a sua face também nessa mesma fase de elaboração de normas.
Se o Estado regulador possui algumas vantagens em relação ao Estado social, não se pode falar que a sociedade brasileira tenha colhido todas elas. É que, apesar de se ter notado uma melhora considerável na prestação de determinados serviços públicos por meio de empresas privadas (como é o caso da telefonia, que se revelava arcaica enquanto prestada diretamente pelo Estado), a diminuição do tamanho do Estado não representou a redução da carga tributária.
Na verdade, o Estado regulador se desincumbiu de algumas obrigações, as quais passaram a ser cobradas adequadamente pelos investidores privados, e o cidadão viu-se na contingência de ter que pagar tributos (impostos e taxas basicamente) e tarifas por serviços que originariamente eram da obrigação do Estado. Tome-se, como exemplo, a utilização de determinadas rodovias que foram privatizadas. Anteriormente à privatização, competia ao ente público a sua regular manutenção, o que se fazia com os recursos provenientes da arrecadação de impostos. Com a privatização dessas rodovias, o Estado se desincumbiu de sua manutenção, sem que, no mesmo passo, tivesse havido redução da carga tributária. No entanto, além de não ter havido a redução da carga tributária, ainda houve a necessidade de se conferir remuneração ao investidor privado por meio de tarifas. Enfim, o que deve ficar claro é que, desse processo, o único prejudicado economicamente foi o cidadão brasileiro.
Para se usar um sentido figurado, o cidadão brasileiro paga o preço de um Estado "máximo" para ter à disposição um Estado "mínimo". E, o pior de tudo, o Estado brasileiro ainda se revela ineficiente no mínimo que se dispõe a fazer, vide, por exemplo, a situação da saúde e da educação no Brasil.
Assim é que Holanda (1995) defende o ponto de vista de que a simples substituição dos detentores do poder público, com as diferentes visões quanto à atuação do Estado que possuam, é algo meramente superficial e não conduz a transformações significativas.
Adotando em parte a visão defendida por Holanda (1995), entendo que a evolução do modelo social para o regulador teve como ponto positivo a redução do tamanho do Estado, diminuindo-se o espaço para a sua utilização para fins privados. No entanto, a redução do tamanho do Estado e de seu campo de atuação deveria representar invariavelmente a redução do seu peso sobre a sociedade, ou seja, a diminuição da carga tributária. Por fim, uma das formas mais eficazes de se combater o patrimonialismo na manipulação do Estado é a estruturação de instrumentos de controle sobre a sua atuação. No modelo de Estado regulador, torna-se imprescindível a estruturação de controle efetivo sobre a atividade normativa das agências reguladoras, o que ainda não temos no Brasil, seja em razão da ausência de participação substancial da sociedade civil na produção da regulação, seja, de outro lado, em razão da inexistência de mecanismos de controle concentrado de legalidade e legitimidade dessas normas.
Referência:
BOBBIO, Norberto. Ensaios sobre Gramsci e o conceito de sociedade civil. São Paulo: Paz e Terra, 2002.
CARDOSO, Fernando Henrique. A democracia no centro da agenda. In: SORJ, Bernardo, OLIVEIRA, Miguel Darcy de. Sociedade civil e democracia na América Latina: crise e reinvenção da política. São Paulo: Instituto Fernando Henrique Cardoso, 2007.
DINIZ, Eli, e AZEVEDO, Sérgio de. Reforma do Estado e Democracia no Brasil. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1997.
FALCÃO, Joaquim. Agências reguladoras e o Poder Judiciário. In: Folha de São Paulo. Nº 28.907, 25.05.2008.
GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. São Paulo: Malheiros, 2003.
HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
MAJONE, Giandomenico. From the Positive to the Regulatory State: Causes and Consequences of Changes in the Mode of Governance. In: Journal of Public Policy. Vol. 17, Part 2, May-Aug 1997.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2004.
MELO, Marcus André. A política da ação regulatória: responsabilização, credibilidade e delegação. In: Revista Brasileira de Ciências Sociais, vol. 16, n° 46. p. 55, junho/2001.
NUSDEO, Fábio. Curso de Economia: Introdução ao Direito Econômico. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005.
SORJ, Bernardo, OLIVEIRA, Miguel Darcy de. Sociedade civil e democracia na América Latina: crise e reinvenção da política. São Paulo: Instituto Fernando Henrique Cardoso, 2007.
Notas
- Informação obtida na página do BNDES na internet:
http://www.bndes.gov.br/privatizacao/resultados/historico/history.asp
- Informação igualmente obtida na página do BNDES na internet: http://www.bndes.gov.br/privatizacao/resultados/historico/history.asp
- E o autor continuar a discorrer sobre as características do culto ao personalismo em Portugal: "À autarquia do indivíduo, à exaltação extrema da personalidade, paixão fundamental e que não tolera compromissos, só pode haver uma alternativa: a renúncia a essa mesma personalidade em vista de um bem maior. Por isso mesmo que rara e difícil, a obediência aparece algumas vezes, para os povos ibéricos, como virtude suprema entre todas. E não é estranhável que essa obediência – obediência cega, e que difere fundamentalmente dos princípios medievais e feudais da lealdade – tenha sido até agora, para eles, o único princípio político verdadeiramente forte. A vontade de mandar e a disposição para cumprir ordens são-lhes igualmente peculiares. As ditaduras e o Santo Ofício parecem constituir formas tão típicas de seu caráter como a inclinação à anarquia e à desordem. Não existe, a seu ver, outra sorte de disciplina perfeitamente concebível, além da que se funde na excessiva centralização do poder e na obediência".
- Essa relação de causa e efeito entre a escravidão/latifúndio e
sociedade civil frágil/deficiência na prestação de serviços voltados para o
coletivo foi expressamente considerada em Raízes do Brasil:
"Muitas das dificuldades observadas, desde velhos tempos, no funcionamento dos nossos serviços públicos, devem ser atribuídas sem dúvida, às mesmas causas. Num país que, durante a maior parte de sua existência, foi terra de senhores e escravos, sem comércio que não andasse em mãos de adventícios ambiciosos de riquezas e de enobrecimento, seria impossível encontrar uma classe média numerosa e apta a semelhantes serviços".
- "Tais equívocos seriam particularmente nocivos e perigosos, pois quaisquer enganos dos quais resultem mais poderes para o Executivo são muito bem aceitos no País. É que o Brasil mal conhece instituições políticas democráticas. Desde 1500 – quando foi descoberto – até o presente não experimentou mais do que 35 anos de cambaleante democracia política (democracia social não teve um único dia), o que ocorreu entre 1946 e 1964, e desde 1986. Com efeito, durante o período colonial e imperial é óbvio que não se cogitava de democracia. Durante a República Velha, sabidamente, também não houve espaço para sua implantação e as eleições ‘a bico-de-pena’ cuidavam zelosamente de impedir-lhe o nascimento. Sobrevindo a Revolução de 1930 e subseqüente implantação da ditadura getulista, o País continuou insciente do que seria este regime, só conhecido nos países civilizados. Finalmente, com a Constituição de 1946 desvendou-se para nós o mundo até então desconhecido da democracia. Contudo, em 1º de abril de 1964 o Golpe Militar se encarregou de desvanecer estes sonhos, implantando nova ditadura (a dos generais), que se manteve até 1986, em seu final disfarçada por configuração mais branda. Só aí então irá reencetar-se a experiência democrática, e ainda assim tisnada por uma infindável sucessão de decretos-leis, primeiramente, e depois de medidas provisórias, uns e outras de inconstitucionalidade óbvia, mas sempre recebidos com exemplar naturalidade por todo o país".
- "A democracia no Brasil sempre foi um lamentável mal-entendido. Uma
aristocracia rural e semifeudal importou-a e tratou de acomodá-la, onde fosse
possível, aos seus direitos e privilégios, os mesmos privilégios que tinham
sido, no Velho Mundo, o alvo da luta da burguesia contra os aristocratas. E
assim puderam incorporar à situação tradicional, ao mesmo como fachada ou
decoração externa, alguns lemas que pareciam os mais acertados para a época e
eram exaltados nos livros e discursos.
É curioso notar que os movimentos aparentemente reformadores, no Brasil, partiram quase sempre de cima para baixo: foram de inspiração intelectual, se assim se pode dizer, tanto quanto sentimental. Nossa independência, as conquistas liberais que fizemos durante o decurso de nossa evolução política vieram quase de surpresa; a grande massa do povo recebeu-as com displicência, ou hostilidade. Não emanavam de uma predisposição espiritual e emotiva particular, de uma concepção da vida bem definida e específica, que tivesse chegado à maturidade plena. Os campeões das novas idéias esqueceram-se, com freqüência, de que as formas de vida nem sempre são expressões do arbítrio pessoal, não se ‘fazem’ nem ‘desfazem’ por decreto".
- "Com efeito, onde quer que prospere e assente em bases muito sólidas a idéia de família – e principalmente onde predomina a família de tipo patriarcal – tende a ser precária e a lutar contra fortes restrições a formação e a evolução da sociedade segundo conceitos atuais. A crise de adaptação dos indivíduos ao mecanismo social é, assim, especialmente sensível no nosso tempo devido ao decisivo triunfo de certas virtudes antifamiliares por excelência, como o são, sem dúvida, aquelas que repousam no espírito de iniciativa pessoal e na concorrência entre os cidadãos".
- "Em despeito dessas obviedades, durante largo tempo pretendeu-se que, ressalvadas taxativas disposições legais que lhes impusessem contenções explícitas, estariam em tudo o mais parificadas à generalidade das pessoas de Direito Privado. Calçadas nesta tese errônea, sociedades de economia mista e empresas públicas declaravam-se, com o beneplácito da doutrina e da jurisprudência (salvo vozes combativas, mas isoladas), livres do dever de licitar, razão por que os contratos para obras públicas mais vultosos eram travados ao sabor dos dirigentes de tais empresas ou mediante arremedos de licitação; recursos destas entidades passaram a ser utilizados como válvula para acobertar dispêndios que a Administração Central não tinha como legalmente efetuar, ou mesmo para custear ostensiva propaganda governamental, mediante contratos publicitários de grande expressão econômica; a admissão de pessoal, e com salários muito superiores aos vigentes no setor público, efetuava-se com ampla liberdade, sem concursos, transformando-se em ‘cabides de emprego’ para apaniguados; avançados sistemas de aposentadoria e previdência eram, por decisão interna corporis, instituídos em prol de seus agentes, em condições muito mais vantajosas do que as do sistema nacional de previdência ou do próprio regime previdenciário do setor público; despesas exageradas, úteis apenas à comodidade pessoal de seus agentes, eram liberalmente efetuadas, como, exempli gratia, suntuosas hospedagens no Exterior, quando de viagens internacionais de seus dirigentes; sempre sob argüição de serem pessoas de Direito Privado – até que a legislação explicitamente lhe impusesse sujeição de suas despesas à fiscalização do Tribunal de Contas da União –, sustentava-se que estavam livres deste controle; sob o mesmo fundamento e da correlata liberdade que lhes concerniria, multiplicaram-se sociedades de economia mista e empresas públicas, umas criando outras, surgindo, destarte, as de chamada segunda e terceira geração, aptas, pois, a prodigalizar os mesmos desmandos."
- Reportagem publicada na revista Veja em 28.01.1998. Página na internet: http://veja.abril.com.br/280198/p_082.html. Acesso em 17.06.2008.
- Página na internet: http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u409862.shtml. Acesso em 17.06.2008.
- Vale transcrever excerto do texto de Sorj (2007):
"O que aconteceu no Brasil nas últimas décadas? Nos anos 1970 e 1980, durante a ditadura, os grupos mais expressivos da sociedade civil eram a chamada imprensa nanica (os semanários Opinião, Movimento, O Pasquim), os centros de pesquisa, como, por exemplo, o Cebrap, as organizações profissionais, em particular a Ordem de Advogados do Brasil (OAB), as pastorais da Igreja católica, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e o novo sindicalismo, especialmente o do ABC paulista. Que tipo de atores eram esses? Tratava-se de organizações que tinham uma base social bastante definida, como membros das próprias corporações profissionais, leitores dos semanários, membros da Igreja ou, no caso do Cebrap, do público universitário. Os participantes deste segmento se reconheciam como parte de uma aliança de diferentes em função de um projeto político específico: democratizar o País.
As novas organizações, aquelas que passaram a falar em nome da sociedade civil e a ser identificadas como se a constituíssem, são, fundamentalmente, as ONG de um novo tipo. Em outro trabalho, desenvolvi em detalhe uma caracterização das novas ONG, cuja principal originalidade consiste em não possuírem uma base social definida, embora geralmente se pronunciem em nome da sociedade (ou da "sociedade organizada") e/ou de movimentos sociais. Sociologicamente, elas constituem organizações profissionais, nichos de emprego para ativistas sociais. Essas ONG se sustentam com financiamentos externos e se autolegitimam através do apelo a um discurso de ordem moral e demandador do Estado.
mundo das ONG no Brasil e na América Latina tem se estendido enormemente. No Brasil, de acordo com o levantamento do IBGE, com dados de 2002, são 50.000 os que trabalham nos mais diversos campos de defesa de direitos (advocacy), cultura, transparência e projetos sociais. Cada vez mais, empresas privadas aderem ao discurso de "responsabilidade social" e criam suas próprias ONG, sem mencionar aquelas organizadas por políticos e partidos ou a eles associadas, usadas para canalizar recursos públicos, que muitas vezes são meras fachadas para práticas clientelísticas ou corruptas".
- Página na internet: http://www.cnj.gov.br/index.php?option=com_content&task=view&id=4054&Itemid=129. Acesso em 17.06.2008.