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Execução específica de acordo de acionistas de sociedade anônima

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Agenda 08/12/2008 às 00:00

4 EXECUÇÃO ESPECÍFICA DO ACORDO DE ACIONISTAS

Uma vez analisadas as variáveis para que o acordo de acionistas seja válido e, conseqüentemente, alcance os fins desejados por seus signatários, cumpre fazer certas considerações sobre o inadimplemento desse acordo.

Uma primeira possibilidade é a utilização de uma cláusula penal existente no pacto de acionistas para ser empregada quando não houver o adimplemento desse pacto por alguma das partes, recaindo, assim, no que denominamos de "tutela ressarcitória".

Nesse contexto, importante destacar que na modalidade de acordo de comando ou defesa não é viável a existência dessa cláusula. Isso porque, em tal situação, o que os acionistas acordam é com relação à maneira como eles exercerão seus votos, não sendo possível, assim, auferir economicamente, de modo antecipado, as perdas e danos ocorridos.

Ademais, como bem salienta Modesto Carvalhosa,

nos acordos de voto não existe a idéia, própria dos negócios bilaterais, de que a prestação devida por um convenente tem como causa a contraprestação que lhe foi prometida. Insista-se que somente como meio existem obrigações receptivas de um para outro convenente, pois têm por fim o exercício do controle ou de voto. O não-cumprimento dessas obrigações de consecução do fim comum enseja, portanto, dissolução e não rescisão, esta típica dos contratos bilaterais e por isso incompatível com os acordos de voto e de controle. Nesses acordos não há preço, requisito indispensável aos de natureza bilateral. Também não há a coisa que se estima pelo preço convencionado [...]. Todos confluem para a mesma prestação, qual seja, o exercício harmonioso e de boa-fé do voto e os efeitos que daí decorrem para o exercício do controle ou de defesa e para a consecução do interesse social (§ 2º). (CARVALHOSA, 2003, p. 555, grifo nosso).

Nos acordos de voto ou controle, portanto, quando ocorrer o inadimplemento por algum dos acionistas, poderá ser requerida a dissolução dele, ocasionando o desfazimento do vínculo existente entre os signatários do pacto de acionistas, colocando fim a qualquer direito ou obrigação nele presente.

Já no que concerne ao acordo de bloqueio, as partes poderão fazer constar uma cláusula estipulando possíveis danos decorrentes da não-observância do acordo por qualquer dos signatários.

Nesse caso, há essa prerrogativa por tratar-se de uma hipótese em que seja viável prefixar economicamente as possíveis perdas e danos. Assim, como bem dispõe Modesto Carvalhosa, "a inobservância da preferência de ordem na aquisição acarreta danos mensuráveis, com respeito ao patrimônio acionário envolvido". (CARVALHOSA, 2003, p. 556)

Em que pese à possibilidade e à existência ou não de uma cláusula penal no acordo de acionistas, certo é que, diante de um inadimplemento por parte de qualquer dos signatários, os que se sentirem prejudicados podem buscar a tutela ressarcitória. Assim, encontrará uma maneira de, pelo menos, compensar financeiramente as perdas e danos sofridos, recebendo uma quantia em dinheiro do equivalente.

Além da tutela ressarcitória, como exposto, há a prerrogativa de quem se sentir prejudicado com o inadimplemento do acordo de acionistas por algum dos signatários deste de buscar a tutela específica.

A Lei n. 6.404/76 trouxe, em seu art. 118, § 3º, a previsão de se poder recorrer a uma execução específica para que as obrigações assumidas no acordo sejam cumpridas. Nesse aspecto, cumpre esclarecer que não havia necessidade de fazer constar na Lei das Sociedades Anônimas tal disposição. Isso porque a tutela específica é uma prerrogativa decorrente da natureza da obrigação que não foi cumprida e não porque determinada lei assim estabeleceu.

Entretanto, essa disposição na Lei de S.A. teve razão de ser, tendo em vista que, anteriormente à sua vigência, havia o entendimento, por parte de doutrinadores, de que a única tutela a ser aplicada quando ocorresse o inadimplemento do pacto de acionistas seria a ressarcitória. Pontes de Miranda era um dos que assim entendiam, como expõe Modesto Carvalhosa, (CARVALHOSA, 1984, p. 258) "afirmando que não se aplicavam à espécie as regras gerais de execução das obrigações de fazer [...]".

Sendo, portanto, plenamente viável a busca pela tutela específica, importante mencionar que esta alcança um resultado muito melhor do que a tutela ressarcitória. Enquanto esta ocasiona um pagamento em dinheiro que seja o mais próximo possível das perdas e danos, a tutela específica permite assegurar a situação que de fato aconteceria se não houvesse o descumprimento por parte de algum signatário do acordo de acionistas.

Assim, a tutela específica protege o direito material almejado pelas partes quando da conclusão do pacto. Há a constituição da situação jurídica que se sucederia ao adimplemento voluntário do acordo. Diferentemente, a tutela ressarcitória não realiza a vontade objetivada pelos signatários, mas apenas tenta recompor, economicamente, o equilíbrio entre eles.

4.2 Acordo de acionistas: título executivo extrajudicial

Para melhor análise da possibilidade de o acordo de acionistas ser considerado ou não um título executivo extrajudicial, cumpre ressaltar a respeito dos elementos que devem compor tal título executivo a ensejar a propositura de uma execução.

Iniciando-se pela legislação processual a ser aplicada neste estudo, tem-se que o art. 585 do Código de Processo Civil apresenta uma relação do que é considerado título executivo extrajudicial. O inciso II do mencionado artigo dispõe sobre o "[...] documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas [...]", o que, dessa maneira, engloba o acordo de acionistas.

Além de constar em um dos incisos do artigo mencionado, há também a necessidade da obrigação contida no título ser líquida, certa e exigível, como prevê o art. 586 Código de Processo Civil.

Como bem expõe o renomado processualista Humberto Theodoro Júnior,

[...] só assim terá o órgão judicial elementos prévios que lhe assegurem a abertura da atividade executiva, em situação de completa definição da existência e dos limites objetivos e subjetivos do direito a realizar.

[...] Não cabendo ao juiz pesquisar em torno da existência e extensão do direito do credor, no curso da execução, toda fonte de convicção ou certeza deve se concentrar no título executivo. (THEODORO JÚNIOR, 2003, p. 32)

Segundo Marcelo M. Bertoldi, é "possível a classificação do acordo de acionistas firmado por duas testemunhas como título executivo extrajudicial a desafiar o processo de execução". (BERTOLDI, 2006, p. 155)

Entretanto, outros doutrinadores não entendem dessa maneira. É o caso de Celso Barbi Filho que, ao expor sobre o acordo de acionistas, afirma ter este

[...] natureza jurídica contratual e, para que sejam identificadas as obrigações dele decorrentes, é necessário que seja interpretado por quem tenha poder de dizer com quem está o direito naquela questão. Só depois é que tais obrigações poderão ser executadas especificamente. Verifica-se, assim, que a execução específica do acordo de acionistas é sempre precedida de uma fase jurisdicional cognitiva. (BARBI FILHO, 1993, p. 162)

Sob essa perspectiva, as obrigações contidas no pacto de acionistas seriam ilíquidas, já que não possuiria um dos requisitos fundamentais, qual seja, o da liquidez. Com isso, não seria considerado título executivo extrajudicial e, conseqüentemente, não ensejaria processo de execução.

Contudo, a necessidade interpretação de certas cláusulas presentes no acordo de acionistas não gera impedimento de sua caracterização como se está propondo.

Como bem esclarece Marcelo M. Bertoldi: "[...] invariavelmente, esses contratos demandariam a interpretação de suas cláusulas, mesmo que mediante operação mental de menor complexidade, mas sempre haveria, mesmo que em grau mínimo, a interpretação das cláusulas contratuais". (BERTOLDI, 2006, p. 160)

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Ressalte-se que, nesse sentido, sem a possibilidade de contratos serem considerados título executivo extrajudicial, o disposto no art. 585, II, do Código de Processo Civil sobre essa prerrogativa deveria ser considerado inaplicável. Mas, como tudo o que se é determinado em lei tem sua significação própria, não se pode desprezar tal disposição legal.

O questionamento sobre a liquidez do acordo de acionistas não tem razão de ser, não podendo prosperar tal posicionamento. Nos acordos de voto ou de bloqueio, estando individualizadas e claramente indicadas quais as obrigações constantes neles, não há que se falar em iliquidez do título.

Quando se assevera que o título possui liquidez, está-se indicando que há como definir com precisão a quantidade em dinheiro ou em bens que deverão ser entregues ao credor. E, na impossibilidade de que isso ocorra, ainda pode-se considerar o título com liquidez, caso possua critérios ou mecanismo para que isso seja determinado. É a hipótese dos acordos de acionistas, em que as obrigações assumidas pelos signatários são concretamente estabelecidas por eles e especificadas no pacto. Assim, o objeto é facilmente individualizado.

Há também o posicionamento de Celso Barbi Filho, citado por Marcelo M. Bertoldi (BERTOLDI, 2006, p. 157) que afirma não ser possível avaliar o pacto de acionistas como um título com liquidez, já que em certas ocasiões deve-se apresentar outro documento, como a ata de reunião prévia, além do próprio acordo. Entretanto, isso em nada prejudica o aspecto formal que o título executivo extrajudicial deve ter a fim de ensejar a execução. Isso porque a apresentação da ata seria simplesmente um documento auxiliar.

4.3 Execução específica do art. 118, § 3º, da Lei n. 6.404/76

4.3.1 Abrangência da expressão "execução específica"

Após explanação no sentido de desconsiderar os argumentos utilizados para indicar que os acordos de acionistas não são títulos executivos extrajudiciais, pois estes podem, conforme debatido, ser tidos como tal, cumpre salientar que nem sempre que se estiver diante de um título executivo, haverá a possibilidade de se ingressar com um processo de execução.

De extrema relevância abordar, dessa forma, o alcance que o legislador buscou ao mencionar a expressão "execução específica", no art. 118, § 3º, da Lei das S.A., como meio a ser utilizado pelos acionistas prejudicados com o não-cumprimento do acordo por parte de algum outro signatário.

Numa análise meramente literal desse dispositivo, tem-se a idéia de que o acordo de acionistas, sendo um título executivo, enseja a propositura de uma execução (Processo de Execução) e, assim, alcança um resultado equivalente ao que existiria caso o pacto tivesse sido plenamente cumprido.

Entretanto, ao observar o que envolve o processo de execução, chega-se à conclusão de que os acordos de acionistas, quando não cumpridos, não serão passíveis da propositura dessa modalidade de provimento jurisdicional.

Como bem ressalta Marcelo M. Bertoldi, um primeiro ponto a ser destacado é o fato de que, no processo de execução, há necessidade de uma "[...] interferência direta no patrimônio do executado, para dele retirar bens na medida suficiente para a satisfação do direito do credor". (BERTOLDI, 2006, p. 154).

Ora, o que se busca com a "execução específica", nos termos do art. 118, § 3º, da Lei das Sociedades Anônimas, não é a prática de invasão do patrimônio do inadimplente.

Acresce-se, ainda, que, quando se estiver diante de um pacto de acionistas no qual conste uma obrigação de emitir declaração de vontade ou de contratar, será irrelevante analisar se ele pode ser considerado, ou não, título executivo.

Conforme se depreende do Código de Processo Civil e do que já foi exposto, quando houver o inadimplemento por parte de algum dos signatários do acordo de acionistas, ao credor restarão duas possibilidades: a primeira é a busca por uma tutela ressarcitória; a segunda, tida como melhor, é a tutela específica.

Neste último tipo de tutela, há a possibilidade de não ser utilizada a via executiva, mas, sim, o processo de conhecimento, como ressalta Marcelo M. Bertoldi:

[...] quando se estiver diante de acordo de acionistas que contenha obrigação de contratar ou emitir declaração de vontade, fica descartada a via executiva para a realização de referidas obrigações, cabendo ao credor a persecução de sentença proferida em processo de conhecimento que venha a produzir os efeitos que se esperavam do ato a que contratualmente o devedor obrigou-se. (BERTOLDI, 2006, p. 161)

A não-utilização da prerrogativa de buscar o processo executivo tendo no acordo de acionistas um título executivo extrajudicial fundamenta-se na legislação processual.

O art. 466-A, introduzido pela Lei n. 11.232/2005, estabelece a respeito da situação em que o acordo disser respeito a uma obrigação de contratar (acordo de bloqueio) e o art. 466-B, do mesmo diploma legal, também introduzido no Código de Processo Civil pela mesma lei mencionada, refere-se à ocasião em que o pacto de acionistas tiver como objeto uma obrigação de emitir declaração de vontade (acordo de voto).

Essa aplicabilidade das normas de processo civil é viável, tendo em vista que o termo "execução" não é empregado unicamente para as hipóteses em que se esteja buscando um processo de execução, também denominado "execução forçada", que se encontra disciplinada nos arts. 566 e seguintes do Código de Processo Civil.

Tal expressão em comento possui um sentido bem mais amplo, podendo ser utilizada até mesmo como uma execução espontânea de alguma obrigação legal ou que tenha sido contratada. Ademais, como é a hipótese dos acordos de acionistas quando são descumpridos, o termo "execução" designa a obtenção da obrigação ora pactuada por meios executivos diversos estabelecidos na legislação processual.

Por isso, não há que se afirmar ter sido o termo "execução específica" utilizada de modo equívoco pelo legislador, pois o que se busca com a prerrogativa definida no art. 118, § 3º, Lei n. 6.404/76 é a geração de conseqüências no mundo jurídico. E estas devem ser idênticas às que ocorreriam caso as obrigações elencadas no acordo de acionistas fossem cumpridas de modo pleno e espontâneo.

4.3.2 Fungibilidade da obrigação acordada

Outro ponto de grande relevância a ser analisado é a questão da fungibilidade das obrigações. Quando se tem uma obrigação infungível é porque ela deve ser cumprida pessoalmente por quem ficou a cargo de realizá-la, em razão de um contrato, por exemplo. Assim, considera-se tal contrato como intuito personae.

Observa-se, ainda, que, diante do inadimplemento de uma obrigação existente nesse tipo de contrato, ao devedor caberá, unicamente, buscar indenização com relação às perdas e danos existentes.

No caso do acordo de acionistas, ao se estabelecerem as obrigações, estas devem ser realizadas pelos signatários que se comprometeram a efetuá-la. Por isso, o pacto estabelecido por acionistas de uma Sociedade Anônima, como o acordo de voto ou de bloqueio, é considerado como um típico contrato intuito personae, sendo, desse modo, classificado como infungível.

Registra-se que a infungibilidade está intrinsecamente ligada à questão subjetiva da relação existente no contrato, sem adentrar no que concerne ao objeto da obrigação. Dessa maneira, não há nada a ser avaliado sobre a obrigação em si, mas da pessoa que deve cumpri-la.

Entretanto, com as alterações trazidas pela Lei n. 11.232/2005, que acrescentou os arts. 466-A e 466-B, entre outros dispositivos, há um importante aspecto no que diz respeito à infungibilidade das obrigações a que estamos nos referindo. Tais artigos dispõem o seguinte:

Art. 466-A. Condenado o devedor a emitir declaração de vontade, a sentença, uma vez transitada em julgado, produzirá todos os efeitos da declaração não emitida.

Art. 466-B. Se aquele que se comprometeu a concluir um contrato não cumprir a obrigação, a outra parte, sendo isso possível e não excluído pelo título, poderá obter uma sentença que produza o mesmo efeito do contrato a ser firmado.

Dessa maneira, conforme se depreende desses artigos, as sentenças obtidas nessas hipóteses produzem o mesmo efeito da declaração não emitida e do contrato que seria firmado. Assim, a obrigação que deveria ser realizada por acionista signatário do acordo em análise é suprida por uma manifestação judicial equivalente.

Ressalte-se que, mesmo havendo a supressão da manifestação do acionista por uma sentença que produzirá os mesmos efeitos, as obrigações ainda são tidas como infungíveis, mas com uma importante observação, como salienta Marcelo M. Bertoldi:

Ocorre, no entanto, que tal infungibilidade é material e não jurídica, de sorte que se verifica cabível ao Estado, por intermédio do Poder Judiciário, fazer com que se produzam todos os efeitos que da declaração não emitida se esperava.

[...] Nesses casos, o que se considera é que o devedor, em contrato ou pré-contrato anteriormente firmado, obrigou-se a emitir declaração de vontade ou de contratar, sem que houvesse a possibilidade de arrependimento. Nessa circunstância, a sentença a ser proferida estará nada mais fazendo senão produzindo os efeitos queridos pelo próprio inadimplente quando da assinatura do compromisso. (BERTOLDI, 2006, p. 165, grifos do autor).

Inquestionável, portanto, que os efeitos gerados por essas sentenças alcancem unicamente o mundo jurídico, uma vez que produz a situação que ocorreria caso os acordos de acionistas fossem cumpridos.

Ademais, não há qualquer medida de constrição sobre o patrimônio ou alguma afetação pessoal do acionista que não realizou sua obrigação ora pactuada. Isso porque, para gerar as conseqüências a que se propõe, tal sentença não necessita compelir o acionista a efetivar a obrigação, uma vez que ela mesma produzirá todos os efeitos acordados pelos acionistas assinantes do pacto.

4.3.3 Sentença

Estabelecendo a sentença uma situação jurídica idêntica à que seria produzida caso houvesse o adimplemento do acordo de acionistas, há duas correntes que buscam enquadrar juridicamente tal sentença.

Há parte da doutrina que entende ter a sentença, que produz os efeitos da declaração acordada pelo acionista inadimplente, eficácia preponderantemente executiva, como expõe Marcelo M. Bertoldi (BERTOLDI, 2006, p. 167), que também menciona autores dessa corrente, como Pontes de Miranda e Humberto Theodoro Júnior.

Segundo esse posicionamento, ao aplicar qualquer dos artigos, qual seja, art. 466-A ou 466-B, há, numa única relação processual, a condenação e a execução.

Utilizando outra argumentação, a maioria dos doutrinadores entende que a sentença é proferida em processo de conhecimento e não de execução.

É o caso de Modesto Carvalhosa (CARVALHOSA, 2003, p. 533), que avalia a sentença como de natureza constitutiva. Dessa forma, por meio dela se obtém o reconhecimento do direito pleiteado pela parte ora prejudicada pelo inadimplemento do acordado entre os acionistas e, também, realiza-se a alteração necessária para que o acordo seja, de fato, cumprido, no sentido de ter seus objetivos alcançados, ainda que por outra via que não ao do adimplemento espontâneo.

Esse autor ainda expõe sobre a sentença em comento: "Eis o grande valor prático da sentença constitutiva que é a sua eficácia própria, capaz de outorgar ao beneficiário a alteração jurídico-substancial desejada, automaticamente, sem depender de uma prestação de quem quer que seja". (CARVALHOSA, 2003, p. 533)

Esse entendimento de ser a sentença proferida em processo de conhecimento e não de execução também é verificado em decisões, como a abaixo transcrita:

Processo civil. Execução de sentença. Alegação de violação da coisa julgada inocorrente. Execução efetuada nos autos da ação principal. Inconsistência da alegação de tratar-se de execução específica de acordo de acionistas. Recurso não conhecido.

I – O pedido contido na inicial da ação, que redundou na execução em curso, restringiu-se às ações preferenciais. O acórdão exeqüendo cingiu-se também a esse tema. Assim, o aresto recorrido não violou a coisa julgada ao cassar a parte da decisão do juiz da execução que incluía outras classes de ações no processo executório, tratando, ao contrário, de evitar que tal afronta ocorresse.

II – Estando a recorrente a promover, nos mesmos autos da ação principal, a execução do julgado, não há como invocar as regras pertinentes à execução específica do acordo de acionistas (art. 118, § 3º da Lei das Sociedades Anônimas). Quanto ao cumprimento das parcelas do acordo de acionistas não abrangidas pelo julgado exeqüendo, a Petroplastic necessitaria formar o título executivo mediante prévio processo de conhecimento, haja vista tratar-se da assunção de obrigações genéricas e não líquidas. (STJ, REsp. n. 413722/RS. Rel. Min. Rel. Sálvio de Figueiredo Teixeira, julgado em 13/5/2003)

Verifica-se, portanto, por meio dessa ementa obtida em recurso especial tramitado no Superior Tribunal de Justiça (STJ), que a execução de uma sentença já proferida em nada se compara à execução específica mencionada no art. 118 da Lei S.A.

Ademais, o Ministro Relator Sálvio de Figueiredo Teixeira, ao comentar a decisão pronunciada pelo Juiz do Tribunal de Justiça, menciona alguns trechos dela, como o seguinte:

O art. 118, § 3º, da Lei das Sociedades Anônimas não atribui a acordo de acionistas força de título executivo extrajudicial. Para promover a ‘execução específica das obrigações assumidas’, é preciso que o interessado ajuíze um processo de conhecimento destinado à obtenção de um título executivo judicial.

E, ao final, já proferindo seu voto, afirma: "Não logra aceitação, por seu lado, a tese aventada pela requerente no sentido de estar promovendo a execução específica do acordo de acionistas. Trata-se de execução fundada em título judicial, nos mesmos autos da ação principal".

Em complemento a essa análise, ainda ressalta:

Ademais, quanto ao cumprimento das parcelas do acordo de acionistas não abrangidas pelo julgado exeqüendo, a requerente necessitaria formar o título executivo mediante prévio processo de conhecimento, haja vista tratar-se da assunção de obrigações genéricas e não líquidas.

Observa-se, diante da análise do julgado, duas importantes conclusões. A primeira é que, no caso em comento, houve reconhecimento do direito existente num pacto de acionistas. E, julgado procedente por meio de uma sentença em processo ordinário, passou-se para a sua execução, ou seja, a fase de execução da sentença (título executivo judicial).

A segunda ressalva é com relação às partes relativas ao acordo que não foram objeto de solicitação na ação principal. Por isso, não poderia o Tribunal e, muito menos o STJ, julgar essa questão, cuja que só mediante novo processo de conhecimento poderia ter reconhecida a pertinência de tal pedido, com a conseqüente execução.

Há que se analisar, também, o fato de as sentenças terem natureza constitutiva e, em razão disso possuírem, como regra geral, uma eficácia ex nunc e, portanto, não tendo seus efeitos retroagidos.

Entretanto, quando se analisa o acordo de acionistas, tratando-se tanto de acordo de voto quanto de bloqueio, os efeitos da sentença serão ex tunc, como esclarece Modesto Carvalhosa:

[...] a sentença constitutiva que substitui o voto proferido em sentido contrário ao acordo de acionistas foge à regra geral e produz os efeitos ex tunc, ou seja, retroage à data da ação ou da omissão do acordante remitente, já que, segundo essa premissa maior, não haveria nenhuma prejudicialidade em relação às outras relações jurídicas e principalmente perante terceiros, tendo em vista a vinculação decorrente do acordo de acionistas. (CARVALHOSA, 2003, p. 533)

4.3.4 Efeitos da sentença em relação à companhia e terceiros

Aproveitando a explanação de Modesto Carvalhosa citada, cumpre analisar a eficácia dessa sentença em relação à companhia e a terceiros.

No caso do acordo de votos, o que ocorrerá é a modificação do resultado obtido numa deliberação em assembléia. Ressalte-se, assim, que somente é possível pretender algo em juízo como tal pedido quando o voto não proferido ou emitido em desconformidade com o acordo de acionistas alterar a deliberação.

Se dessa maneira não fosse, em nada mudaria para a companhia, para os acionistas, tampouco para eventuais terceiros que, porventura, se sentissem prejudicados.

Há, portanto, necessidade de buscar a via judicial unicamente quando o acionista tiver como objetivo alterar o resultado da deliberação, a fim de ver protegido seu direito ora lesado por um inadimplemento de outro acionista. Deve existir, desse modo, um interesse de agir por parte de quem se considerar prejudicado para, de fato, ingressar em juízo e ter a sentença um efeito útil.

No que concerne ao acordo de bloqueio, também é necessária a existência do interesse de agir, ou seja, conforme exposto, ter como objetivo uma modificação no mundo jurídico. Nesse caso, a sentença requerida pelo interessado é a que produzirá os mesmos efeitos da declaração não emitida.

Dessa forma, haverá necessidade paralela a essa de desconsiderar a venda realizada em desacordo com o pactuado entre os acionistas. Como a sentença, nos termos em que é proferida, segundo o art. 466-B do Código de Processo Civil, não tem o condão de desconstituir a venda indevida, o acionista prejudicado deve buscar outros meios para isso.

A opção encontrada é acrescentar um pedido de ineficácia da venda em discordância com o estabelecido entre as partes do acordo de acionista. Caso não fossem somadas as duas requisições, a sentença que gerasse o efeito da vontade não manifestada pelo signatário inadimplente se tornaria inócua, por não conseguir alcançar qualquer resultado prático, tendo em vista não pertencerem mais ao réu as ações ora em questionamento quanto à sua titularidade.

Concluindo-se pela ineficácia da venda, há que se avaliar a titularidade daquele que adquiriu a ação em desacordo com o estabelecido em um pacto de acionistas.

É evidente que, estando tal acordo devidamente registrado e averbado na sede da companhia, ele passa a ser de conhecimento de qualquer interessado que queira ter acesso, conforme explanado em capítulo anterior.

Diante disso, não resta outra implicação senão desconsiderar a possibilidade do terceiro que adquiriu a(s) ação(ões) estar de boa-fé. Isso porque, quando o pacto já estiver sido averbado nos livros e certificados das ações, há a presunção de ciência deste, por ser de fácil acesso a quem desejar conhecer-lhe o conteúdo.

Acresce-se, ainda, a necessidade de ocorrer a tradição, uma vez que a sentença não possui eficácia translativa, mas as ações precisam ser passadas a quem, de fato, possui direito sobre as mesmas, diante do que fora estabelecido no acordo de acionistas.

Ressalta Marcelo M. Bertoldi:

[...] a execução específica agasalhada no art. 118, § 3º, da Lei 6.404, regendo-se processualmente pelo art. 466-B do CPC, não equivale à adjudicação compulsória, mas se restringe à prolação de sentença que produza o mesmo efeito do contrato definitivo, recusado pela parte inadimplente. (BERTOLDI, 2006, p. 170)

Outra observação importante a ser feita, mas, agora, tratando-se de acordo de voto, é a análise de quais conseqüências surgem após a sentença substitutiva da declaração de vontade que deveria ser emitida pelo acionista inadimplente.

Primeiro, não há que se falar em nova deliberação do órgão colegiado, tendo em vista que somente o voto não proferido em desacordo com o pactuado entre os acionista é que sofrerá alteração, sendo, agora, computado da maneira correta, juntamente com os demais votos.

Ademais, no que concerne aos possíveis negócios jurídicos estabelecidos diante do resultado da deliberação, quando não havia sido computado corretamente o voto do acionista que não tenha cumprido sua obrigação presente no acordo, estes deverão ser cautelosamente analisados a fim de verificar a necessidade de serem desconstituídos.

Deve-se atentar para o fato mencionado Marcelo M. Bertoldi:

O desfazimento de referidos atos passa a ser de incumbência da administração da companhia, responsável pela execução das deliberações sociais, cujo conteúdo se alterou por meio de sentença. Assim, muito embora a sentença tenha sua eficácia limitada à alteração da deliberação assemblear, esta alteração trará como conseqüência o direcionamento da atividade dos órgãos de administração da companhia segundo o conteúdo de tal alteração. (BERTOLDI, 2006, p. 171)

Assim, sendo indispensável a modificação de atos, posteriores à deliberação na assembléia e anteriores à sentença, estes serão realizados pela própria companhia. Realiza-se, com isso, no mundo jurídico o que fora acordado entre os acionistas e que ficou plenamente definido na sentença.

Sobre a autora
Katia Lelis Aguiar Pedrosa

Advogada. Mestranda em Direito Empresarial na Faculdade de Direito Milton Campos

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEDROSA, Katia Lelis Aguiar. Execução específica de acordo de acionistas de sociedade anônima. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1986, 8 dez. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12061. Acesso em: 24 dez. 2024.

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