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Dano moral na Justiça do Trabalho

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Agenda 01/10/2000 às 00:00

5. Dano moral contra o empregador

No particular, cumpre destacar que a Constituição Federal, em seu art. 5o, incisos V e X, ao tratar do assunto sob exame, especificamente neste último inciso, fala em pessoas, não as qualificando, ou seja, se pessoa física ou jurídica. Diante do que, pode-se concluir pela possibilidade jurídica (uma das condições da ação) de o empregador ajuizar ação, pedindo indenização por dano moral em face do empregado.

Deve-se expungir o pensamento de que a dor física é imanente ao dano moral. Este prescinde daquela. Prova disso é que "o ordenamento jurídico protege ao menos alguns dos direitos inerentes à personalidade compatíveis com a natureza das pessoas jurídicas, tais como a inviolabilidade da honra e da imagem (CF/88, art. 5o, inc. X), o bom nome comercial ou civil, etc."(26) O autor, que é Ministro do TST, esclarece ainda a distinção entre o dano moral subjetivo e objetivo. O primeiro afeto às pessoas físicas. O segundo concerne tanto às pessoa físicas quanto às jurídicas. E conclui, em síntese, que embora a Súmula no 37 do STJ assegure a cumulação das indenizações por danos material e moral, desde que oriundos do mesmo fato, nada obsta que uma pessoa jurídica tenha no seu pedido tão-somente o de indenização por dano moral, ainda que não tenha havido nenhum abalo no seu patrimônio.

Tanto é verdade que a Lei no 8.078/90 – CDC, em seus artigos 2o e 6o, garante o mesmo direito à pessoa jurídica consumidora.

Wagner GIGLIO, todavia, limita esse entendimento, assegurando que a pessoa jurídica, lato sensu, não é atingida pelo sofrimento, pela dor, sentimentos que nenhuma pessoa jurídica pode ter. Nesse sentido, doutrina o mestre: "Deve o empregado reparar os prejuízos de ordem moral causados ao empregador. Contudo, é preciso ficar claro, a bem da boa técnica jurídica, que o empregador a quem nos referimos é o empregador-proprietário-pessoa física, pois o dano moral é um sofrimento de ordem psíquica, não havendo como considerá-lo a uma pessoa jurídica, ainda que por reflexo ela possa ser atingida pelo dano moral lançado"(27).

Para o mestre, o sofrimento físico configura conditio sine qua non para que se reconheça o dano moral.

Todavia, diante de tudo que foi exposto, sabe-se que a imagem é uma das espécies do gênero dano moral, enquadrando-se, portanto, na categoria dos danos morais objetivos, os quais são perfeitamente imputáveis às pessoas jurídicas.

Com efeito, sabe-se que o empregador, por auferir os bônus do negócio, deve também arcar com os seus ônus, dentre os quais se encontram as obrigações para com os seus empregados. Na hipótese de o empregador indenizar o empregado, pouco há a ser perquirido da capacidade daquele, mas, em se tratando de situação oposta, quais as condições que o empregado efetivamente dispõe para reparar uma lesão ao patrimônio moral do empregador? No tópico em que se abordará a fixação do quantum indenizatório, tratar-se-á do tema.

Por derradeiro, Américo Luiz Martins da SILVA relata que "a realidade tem mostrado que o empregador atingido por atos dos empregados ou dos prepostos que causam a ele danos morais tem se limitado apenas a promover a rescisão por justa causa. Nunca ouvimos falar que, além da rescisão por justa causa, pleiteou uma compensação pelos danos morais causados por empregado ou preposto"(28).


6. Competência para julgar o dano moral

Cumpre, ab initio, elucidar o que se entende por jurisdição e competência para depois então abrir-se o debate se a Justiça Obreira seria competente para conhecer de uma ação de dano moral com origem na relação de trabalho.

Assim, entende-se por jurisidição a atividade "mediante a qual o Estado se substitui aos titulares dos interesses em conflito para, imparcialmente, buscar a pacificação do conflito que os envolve, com justiça"(29), e por competência, o limite, a medida, daquela.

A questão que exsurge é a seguinte: o empregado deve ajuizar ação, pleiteando a reparação por dano moral na Justiça do Trabalho ou na Justiça Comum? Afinal, de quem seria a competência para apreciar e julgar danos morais oriundos da relação de trabalho?

A celeuma acerca da competência ainda persiste, pois, de um lado, o STJ mostra-se reticente em atribuí-la à Justiça do Trabalho, uma vez que "firmou entendimento no sentido de que a causa de pedir e o pedido demarcam a natureza da tutela jurisdicional"(30). De outro, sentenciou o eminente Min. Sepúlveda Pertence, do STF, no julgamento do conflito de jurisdição no 6.059-6, a competência da Justiça do Trabalho ao interpretar o art. 114 da Constituição da República. Sua tese sustenta que, mesmo sendo a questão regrada pelo Direito Civil, o que importa é que, se o dano decorre da relação de emprego, é competente a Justiça do Trabalho. Com efeito, a jurisprudência tende a se uniformizar nesse sentido.

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Sabe-se, pois, com fundamento no art. 7o, inciso XXIX, da Constituição da República, que a prescrição para ajuizamento da ação prescreve em dois anos contados a partir da rescisão contratual. Já o art. 177 do Código Civil estabelece que as ações pessoais prescrevem em 20 anos. Caberia, nesse momento, uma reflexão: É vantagem para o empregado que a Justiça do Trabalho seja competente para julgar danos morais provenientes da relação de trabalho, haja vista que o prazo prescricional é insofismavelmente inferior ao da Justiça Comum? Haveria a tão propalada proteção ao trabalhador empregado?

Não é verdade que a leis trabalhistas são omissas no concernente ao dano moral, mormente quando se destaca dentre os requisitos insertos no art. 3o da CLT o de sujeição ou subordinação do empregado ante o seu empregador, requisito por excelência caracterizador do vínculo empregatício. Assim, estabelece o art. 483 do Estatuto Obreiro que "o empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando: (...) e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama" (grifei). Portanto, é perspícua a idéia de moral inserida na expressão retromencionada.

O art. 114 da Carta Política afastou as dúvidas sobre a competência para julgamento das ações indenizatórios por danos morais oriundas na relação de trabalho, somente restando a controvérsia quanto à aplicabilidade da prescrição, se trabalhista ou civil. E, nesse particular, já se demonstrou que deve ser a civil, uma vez que o instituto da prescrição é regulado pelo direito material, e não processual. Até porque a discussão escapa à celeuma, uma vez que o dano moral é garantia constitucional de todo cidadão, e em absoluto pode-se atribuir à indenização decorrente do dano moral com origem na relação de trabalho a acepção de crédito trabalhista (férias, horas extras, etc. não pagas durante a relação de trabalho).

À guisa de conclusão, quanto ao direito subjetivo de todo cidadão em face do Estado, preceitua o art. 3o do CPC que, "para propor ou contestar ação é necessário ter interesse e legitimidade". No Código Civil, o art. 75 consigna que "a todo o direito corresponde uma ação, que o assegura". E o art. 76 do mesmo diploma legal estabelece que, "para propor, ou contestar uma ação, é necessário ter legítimo interesse econômico, ou moral" (grifei).

Em consonância com o art. 483 retromencionado, o art. 652, IV, também da mesma consolidação, atribui competência material à Justiça do Trabalho para conciliar e julgar "os demais dissídios concernentes ao contrato individual de trabalho".

Em última análise, "se o pedido de reparação por dano moral estiver vinculado à relação empregatícia, a competência será da Justiça do Trabalho"(31). E mais, o Excelentíssimo Ministro do TST João Oreste DALAZEN assim se manifesta acerca do estudo: "Ora, se se reconhece competência à Justiça do Trabalho para conhecer de pedidos de indenização por dano patrimonial, não se compreende o que ditaria a incompetência para a reparação do dano moral"(32).


7. Fixação do quantum

É insofismável que a quantificação do valor que visa a compensar a dor da pessoa requer por parte do julgador grande bom-senso. E mais, a sua fixação deve-se pautar na lógica do razoável a fim de se evitar valores extremos (ínfimos ou vultosos).

Quando se trata de dano patrimonial, é possível calcular-se precisamente o prejuízo patrimonial experimentado pela vítima. Já na reparação do dano moral, cumpre ao prudente arbítrio do juiz fixá-lo.

Há basicamente dois sistemas que visam a quantificar economicamente a compensação do dano moral: o sistema tarifário e o sistema aberto. No primeiro, adotado nos EUA, há uma predeterminação do valor da indenização. No Brasil, utiliza-se o sistema aberto, em que o juiz tem liberdade para fixar o quantum. É o que se infere da leitura do art. 1.553 do Código Civil.

O quantum indenizatório tem um duplo caráter, ou seja, satisfativo-punitivo. Satisfativo porque visa a compensar o sofrimento da vítima, e punitivo porque visa a desestimular a prática de atos lesivos à honra, à imagem, etc. das pessoas.

No âmbito do Direito do Trabalho, a fim de reparar o dano moral sofrido pelo empregado, têm alguns julgados perfilhado o estatuído nos artigos 477 e 478, ambos da CLT. O primeiro estabelece que "... o direito de haver do empregador uma indenização, paga na base da maior remuneração que tenha percebido na mesma empresa". O segundo estabelece que "a indenização devida pela rescisão de contrato por prazo indeterminado será de 1 (um) mês de remuneração por ano de serviço efetivo, ou por ano e fração igual ou superior a 6 (seis) meses".

Esse critério é injusto, uma vez que privilegia o empregado mais antigo em detrimento do mais novo. Este, inclusive, a teor do § 1o do art. 478, não teria direito a nenhuma indenização se o seu tempo de trabalho na empresa fosse inferior a um ano.

No concernente à reparação devida pelo empregado ao empregador, o art. 477, § 5o, da CLT não cria nenhum óbice à autorização inserta no art. 462, § 1o, da mesma Consolidação. De qualquer sorte, tendo em vista que o dano moral se encontra disciplinado no direito material civil, e em atenção ao que dispõe o art. 8o, parágrafo único, da CLT, não há falar em limites para a indenização.

Por último, ainda que sucintamente, relaciona-se alguns critérios em que o juiz deverá apoiar-se a fim de que possa com eqüidade e, portanto, com prudência, arbitrar o valor da indenização decorrente de dano moral, a saber: a) considerar a gravidade objetiva do dano; b) a intensidade do sofrimento da vítima; c) considerar a personalidade e o poder econômico do ofensor; d) pautar-se pela razoabilidade e eqüitatividade na estipulação.

O rol certamente não se exaure aqui. Trata-se de algumas diretrizes que o juiz deve atentar.


8. Conclusão

De todo o exposto, quer-se resgatar quatro pontos fundamentais do presente estudo.

O primeiro concerne à prescrição aplicável na reparação do dano moral na Justiça do Trabalho, que não é certamente a bienal, mas sim a vintenária. Até porque, como já se disse, o instituto da prescrição, in casu, é de índole material. Ainda quanto à prescrição, parece que 20 anos é tempo demasiado se considerada a evolução do mundo desde a edição do Código Civil em 1916 e sua efetiva entrada em vigência em 1917. Com a redução das distâncias regionais em razão da grande teia de informações à disposição dos homens, poder-se-ia pensar, com fulcro no fim último do Direito, o da paz social, um prazo prescricional de 5 anos, por exemplo.

Em que pese à Constituição brasileira estabelecer a imprescritibilidade da prática do racismo(33) (art. 5o, XLII) e da ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático (art. 5o, XLIV), não se pode esquecer que, se a ninguém é imposta a pena perpétua (art. 5o, XLVII, b), razão não há para se deixar em aberto o prazo prescricional para ajuizamento da ação, visando à reparação do dano moral.

O segundo alude à competência, que pode ser concluída com os ensinamentos de Arnaldo SÜSSEKIND, citado por Valdir FLORINDO: "não se exige que o Direito questionado ou a norma legal a ser aplicada pertençam ao campo do Direito do Trabalho. O fundamental é que o litígio derive da relação de emprego (dissídios entre trabalhador e o respectivo empregador)"(34).

O terceiro ponto diz respeito ao dano moral contra o empregador. No particular, pelos fundamentos já expostos, conclui-se pela possibilidade jurídica de o empregador ajuizar ação de reparação por dano moral na Justiça do Trabalho.

O quarto, e último ponto, refere-se à caracterização do dano moral nas fases contratuais e também naquelas que antecedem e sucedem ao contrato de trabalho. Ainda que entendam alguns doutrinadores que o dano moral originado na fase pré-contratual foge à competência da Justiça do Trabalho, porque não infringe cláusula do contrato, é correta a assertiva de que esta é competente para julgá-lo.


Notas:

(1) El daño moral, p. 91.

(2) Dano e Indenização, p. 7.

(3) "art. 6o – São direitos básicos do consumidor: (...) VI – a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos."

(4) Valdir FLORINDO apud Délio MARANHÃO, Dano moral e o direito do trabalho, p. 51.

(5) Alexandre Agra BELMONTE, Instituições civis no direito do trabalho, p. 269.

(6) V Ciclo de estudos de direito do trabalho, p. 165.

(7) Alexandre Agra BELMONTE, Instituições civis no direito do trabalho, p. 270.

(8) TRT/9ª R. Dano moral – prescrição. Revista LTr, no 9, p. 1282-1283.

(9) Súmula no 37 do STJ.

(10) Oswaldo Moreira ANTUNES apud Antônio Luís da CÂMARA LEAL, A prescrição intercorrente no direito processual do trabalho, p. 7- 8.

(11) Manual da reclamatória trabalhista: da petição inicial à resposta, p. 120-121

(12) Moreira DÉCIO, Elementos de direito civil, p. 107.

(13) A prescrição intercorrente no direito processual do trabalho, p. 35.

(14) Décio MOREIRA, Elementos de direito civil, p. 109.

(15) Ver artigo 177 do Código Civil.

(16) Clóvis BEVILÁQUA, Código civil comentado, v.1, p. 504.

(17) Clóvis BEVILÁQUA, Código civil comentado, v.1, p. 505.

(18) Ver arts. 550 (usucapião extraordinário) e 551 (usucapião ordinário), ambos do Código Civil.

(19) Damásio E. de JESUS, Código penal anotado, p.280.

(20) João José LEAL, Direito penal geral, p. 472.

(21) João José LEAL, Direito penal geral, p. 476.

(22) Máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime.

(23) Nilton MAIA, apud Márcio Túlio VIANA, In: Revista LTr 53-01/73.

(24) Silvio RODRIGUES, Direito civil. p. 185.

(25) Cesare Bonesana BECCARIA. Dos Delitos e das Penas. Tradução Lucia Guidicini, Alessandro Berti Contessa, p. 92

(26) João Oreste DALAZEN, V Ciclo de estudos de direito do trabalho, p. 161.

(27) Wagner GIGLIO, Justa causa, p. 251.

(28) Américo Luiz da SILVA, O dano moral e a sua reparação civil, p. 277.

(29) CINTRA, GRINOVER e DINAMARCO, Teoria geral do processo, p. 129.

(30) João Oreste DALAZEN, V Ciclo de estudos de direito do trabalho, p. 174.

(31) Domingos SPINA, II Ciclo de estudos de direito do trabalho, p. 81.

(32) V Ciclo de estudos de direito do trabalho, p. 176.

(33) A Constituição Federal prescreve que o crime de racismo é inafiançável (a prisão não será relaxada em favor do criminoso) e imprescritível (a pena é perene, não ficando o Estado impedido de punir a qualquer tempo o autor do delito).

(34) Dano moral e o direito do trabalho, p. 87.


Referências bibliográficas:

ANTUNES, Oswaldo Moreira. A prescrição intercorrente no direito processual do trabalho. São Paulo: LTr, 1993.

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MAIA, Nilton. In: Revista LTr 53-01/73.

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Revista LTr. Dano moral – prescrição. TRT/9ª R. São Paulo, v. 62, no 9, set. 1998.

Sobre o autor
Augusto Cesar Ramos

advogado, especialista em Direito e Processo do Trabalho pelo CESUSC

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RAMOS, Augusto Cesar. Dano moral na Justiça do Trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 46, 1 out. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1208. Acesso em: 2 nov. 2024.

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