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Comentários e críticas às novas leis trabalhistas

Agenda 01/02/2000 às 01:00

a) Rito Sumaríssimo - Lei 9.957, de 12.01.2000

Desde a apresentação do ante-projeto desta Lei no Congresso Nacional, estudamos a proposta na AAT/SP e consideramos o mesmo desnecessário do ponto de vista processual e também que seria incapaz, no aspecto prático, de trazer uma solução imediata aos problemas da Justiça do Trabalho.

Ainda não vislumbro a curto prazo que esta Lei possa trazer algum desafogo ao enorme número de processos trabalhistas hoje existentes, pois o enorme número de ações não existe em razão do rito processual adotado nas JCJs, pois a CLT já prevê o rito sumário, através da possibilidade na convocação de audiências una, conforme o previsto na CLT.

O processo do trabalho sempre se pautou pela informalidade e pelo principio da oralidade, prova disso é que há dezenas de anos a Justiça do Trabalho era o único ramo do judiciário que admitia o "jus postulandi" onde empregado pode reclamar diretamente na JCJ contra seu empregador, sem a assistência de um advogado.

Destaco ainda a tamanha imperfeição técnica na redação desta Lei, pois parece que virou moda a inclusão de novos dispositivos no corpo de leis já existentes, aproveitando-se um artigo já existente, mas renumerando-o com letras (A, B, C, D, etc). Outro exemplo idêntico a este ocorreu no caso da ação monitória, inserida a partir dos artigos 1.102 do CPC.

É certo que o rito sumaríssimo não é nenhuma novidade, pois foi na CLT que muitos juristas de outrora, se inspiraram quando da reforma do Código de Processo Civil em 1973, podendo-se exemplificar ainda que o rito da Lei da Ação Civil Pública e a do Código de Defesa do Consumidor também tiveram inspiração na CLT.

Na verdade, a justiça do trabalho não precisa de meras simplificações e arremedos, mas sim de um código do trabalho completo, definitivo e que assim acabe de vez com a regra estabelecida no artigo 659, da CLT, que prevê a aplicação subsidiária do CPC no processo do trabalho.

A inexistência de um código do trabalho permite que ainda ocorram situações, por exemplo, nos Dissídios Coletivos que são regulados por uma Instrução Normativa do TST - Tribunal Superior do Trabalho de n.º 04/93.

A Justiça do Trabalho é lenta também porque lhe faltam verbas, recursos humanos e materiais, não tem prédios adequados, mas falta-lhe principalmente vontade política dos governantes para solucionar os problemas.

A justiça do trabalho tem sido alvo de intervenções externas, que na verdade buscam impor alterações que irão permitir uma rápida globalização do direito, justificada por um falso discurso de redução do chamado "custo brasil" que confunde gastos de pessoal com investimentos em programas sociais (PIS, FGTS, Previdência, etc).

A lei 9.957 inovou apenas ao propor uma nova modalidade de rito processual vinculando-o apenas ao valor da causa, a qual não poderá ultrapassar 40 (quarenta) salários mínimos, o que "data vênia" é mero simplismo e isso não nos parece que irá resolver o principal problema que é o do acúmulo de ações, posto que com este valor é a grande maioria dos processos que hoje tramitam no Judiciário Trabalhista.

Outra situação de grande jaez existente nesta lei, é a de que permite ao juiz da causa escolher a prova que será produzida, pois a nosso ver isso representará uma grande violação ao principio do amplo direito de defesa, capitulado no inciso LV do artigo 5o da Constituição Federal (artigo 852-D) (*).

Esse dispositivo acima citado é perigoso, pois não se pode a busca de uma simplificação processual arriscar investir no tortuoso caminho de se cometer uma inconstitucionalidade, que poderá, ao invés de antecipar o provimento judicial esperado, retardá-lo ainda mais, visto que uma das partes, que for prejudicada pelo cerceamento ao seu amplo direito de defesa, estará autorizada a interpor inúmeros recursos, chegando até ao Supremo Tribunal Federal.

Com isso a persistir esta desatenção, o princípio da a ampla defesa e o do contraditório poderão ser relevados pelas Autoridades Judiciárias.

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Outro aspecto de igual importância refere-se ao que se entende por "pedido liquido" ou "pedido ilíquido", pois a lei não define o que é um ou o que é outro. Vejamos o caso, por exemplo, de um trabalhador que queira reclamar horas extras, ajuizar pedido cujo valor não exceda a 40 salários mínimos, porém quando da prolação da sentença esta poderá resultar em valor superior já que neste tipo de pedido o valor nem sempre se pode apurar de imediato.

Outra imperfeição nos chama a atenção que é aquela que impõe ao reclamante o ônus de informar ao Juízo, caso o reclamado mude-se de endereço (§2º do artigo 852-B). Isso impõe ao reclamante e a seu patrono o dever de ficar vigiando diuturnamente se o empregador mudou-se, pois neste caso se o mesmo deixar, de propósito, que as correspondências da JCJ continuem sendo dirigidas a seu endereço antigo, irá provocar incidentes processuais que poderão causar nulidade no processo.

E também mais uma vez também desrespeitou-se a regra da presença obrigatória do advogado na administração da Justiça, a teor do disposto no artigo 133 da nossa Constituição Federal. Perdeu-se a oportunidade de fixar parâmetros mais definidos, tal como já existe nos procedimentos desta natureza que ocorrem nos Juizados Civis onde a figura do advogado é indispensável apenas nas causas superiores a 20 (vinte) salários mínimos, facultando-se a parte estar acompanhada ou não de advogado nas causas de até 20(vinte) salários mínimos.


b) Comissões de Conciliação Prévia - Lei 9.958/00

Este projeto havia sido apresentado com o fito de que, com a instituição das Comissões de Conciliação Prévia, seria obrigatório que o empregado recorresse à mesma, como pré requisito para ajuizar uma ação perante a Justiça do Trabalho.

É certo que esta lei traz um ponto extremamente positivo que é o que visa superar e quebrar o gelo nas relações contratuais, colocando as partes frente a frente, para discutirem seus problemas, porém, viola o dispositivo constitucional que exige a presença do Sindicato nas negociações e na assistência ao empregado.

Esta lei é incompleta pois o legislador perdeu uma grande oportunidade que era a de dotar as partes do poder de, não havendo um acordo, escolherem um árbitro privado que solucionaria mais rápido os problemas, até porque já existe em vigor no Brasil a Lei 9.307 que é de 1996 a qual possibilita o uso da arbitragem (um terceiro, pessoa imparcial) na solução de conflitos.

Obrigatório notar contudo que existem direitos que são irrenunciáveis, tais como o do salário, razão pela qual estes não poderão ser objeto sequer de discussão nas referidas comissões.

Esta lei é facultativa e não exige que as partes adotem este tipo de procedimento prévio e interno nas empresas, porém, sem a intervenção do Sindicato isso ainda assim é muito perigoso, já que nos dias de hoje no Brasil ainda é muito comum que, quando da admissão de empregados muitos Departamentos de Pessoal exijam que o mesmo assine tantos e vários papéis e formulários, que o empregado, no afã de obter logo o novo emprego, as vezes, assina até folhas em branco ou formulários não preenchidos.

Dá até para se imaginar como será quando o empregado for chamado na sala em anexo ao RH para, perante estas "comissões" que serão formadas para funcionar dentro das empresas e terá que dizer se aceita ou não a proposta da empresa, para, por exemplo, "negociar" direitos lesados no curso do contrato.

Haverá assim uma enorme desvantagem nestas comissões que venham a funcionar no ambiente da empresa: o risco é que ela será estruturada e financiada pela empresa, criando-se um evidente grau de dependência dos membros da comissão, para com o empregador. Já da parte dos trabalhadores estes poderão não contar com nenhum apoio técnico para a solução dos conflitos, tais como assistência contábil e jurídica.

Não havendo exigência da presença obrigatória do Sindicato, empresas inidôneas poderão constituir tais comissões para atuarem de forma paralela aos Sindicatos, afastando a entidade da participação nas discussões e soluções dos conflitos, pois nem sempre estes serão de natureza individual, já que um problema de natureza individual que ocorre repetidas vezes se torna um problema coletivo.

Poderá ocorrer ainda que empresas mal intencionadas dispensem o empregado, deixe de pagar seus direitos rescisórios e ela mesmo recorra a comissão para propor um "acerto amigável" e realizado tal acordo este será homologado pelo Juiz.

Frise-se para arrematar que diante de uma comissão formada e funcionando no âmbito das empresas, o empregado dificilmente estará em condições de negar-se a "autocomposição", pois, invariavelmente suas condições serão tão desvantajosas, que tampouco irá poder sequer discutir e argumentar contra o acordo que lhe será proposto. Logo sem a presença dos Sindicatos tais comissões tendem a ser fadadas ao insucesso.

Referidas comissões somente funcionarão com eficácia se observado que é primoroso a exploração de todo o potencial nas relações coletivas, quer como mecanismo de solução de divergências, quer como meio para estreitar e fortalecer as relações entre os atores sociais envolvidos.

A OIT através da Convenção 154/81, que trata do "Fomento da Negociação Coletiva" fixou como principio o reconhecimento mútuo da representatividade, a aceitação da legitimação e o reconhecimento da predisposição das partes de estabelecer um processo de comunicação fundado no diálogo franco, leal e objetivo, orientado para o fim de se conciliar.


NOTA

(*) O inciso LV e o "caput" do art. 5º da nossa Carta Magna preceituam o seguinte:

"Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

LV - Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; (...)"

Sobre o autor
Aparecido Inácio

advogado sindical em São Paulo (SP), especialista em Direito do Trabalho e em Processo Civil pela Universidade São Francisco (SP), membro da AAT/SP (Associação dos Advogados Trabalhistas de São Paulo)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

INÁCIO, Aparecido. Comentários e críticas às novas leis trabalhistas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 39, 1 fev. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1226. Acesso em: 20 dez. 2024.

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