INTRODUÇÃO
Dentre os Poderes que mais albergaram poderes no transcorrer das últimas décadas, dúvidas não pairam de que o Judiciário se sobrepõe, sobremaneira, frente aos demais. Aquele que outrora era apenas profetizador das palavras do Rei e, posteriormente, do Chefe do Executivo, ganhou contornos que o elevaram, de tal forma, que a autonomia conquistada pode ter se degenerado em arbitrariedade. Tal se faz sentir de forma mais efetiva nos Tribunais Superiores, em especial no Supremo Tribunal Federal.
Não se produz teratologia ao asseverar-se que, hodiernamente, o Judiciário, ainda que não detenha o maior poder econômico, o tem em poder de mando. É com estas balizas que o presente trabalho almeja demonstrar a ofensa do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal junto ao Código de Processo Civil.
Conforme consta do artigo 96, I, a, da CF/88:
Art. 96 Compete privativamente
I – aos tribunais
a) eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos (grifei).
De uma leitura rarefeita do normativo colacionado infere-se que, atribui-se aos Tribunais a possibilidade de compilarem seus próprios Regimentos Internos, tendo como único óbice a observância das normas de processo e das garantias processuais das partes. Todavia, conforme se buscará demonstrar, tais restrições não são observadas pelo Supremo Tribunal Federal, transmudando-se em inconstitucionais.
Buscar-se-á refutar os argumentos usados pelo Supremo quando proclama a soberania das normas regimentais fundamentando-se na tese de que estas estariam em igual grau hierárquico daquelas reprisadas no CPC. Demais disso, refutar-se-á os fundamentos igualmente usados pelo Guardião da Constituição, no sentido de haver ingerência de outros Poderes frente a seus trabalhos internos.
A questão suscitada neste trabalho apresenta-se de considerável importância, haja vista que objetiva abordar tema pouco discorrido e que demanda maiores digressões. Ao que toca à relevância social do estudo, tal intenta incutir, na doutrina e até mesmo nos Tribunais, reflexões sobre o processo que se opera no Judiciário, qual seja, um desregramento, transformado em autoritarismo, que em muito contribui para a degeneração de tal Poder.
Nesta senda, o trabalho será fracionado em quatro capítulos, sendo que o primeiro buscará abordar o conceito de Regimento, assim como traçará um histórico destes à luz das inúmeras Constituições, até então promulgadas e outorgadas.
No capítulo seguinte consignar-se-á noções acerca da autonomia dos Tribunais para efetuarem seus Regimentos Internos, buscando demonstrar, através da melhor doutrina, que tal autonomia, seja em qual Poder for, não se faz de forma absoluta. Como contraponto assentar-se-á o entendimento predominante nos Tribunais ao que tange a Separação dos Poderes, e, como referido alhures, a suposta ingerência de um Poder sobre outro.
Na seqüência o terceiro capítulo abordará as noções sobre as normas de processo assim como as garantias processuais, tendo em vista que tais conceitos são salutares para uma melhor compreensão do que se deseja sustentar.
Por derradeiro, o último capítulo, ressaltará, em um primeiro momento, as delegações que o próprio CPC faz aos Regimentos Internos, sendo que, posteriormente, tratará das efetivas ofensas do RISTF (Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal) junto às normas e às garantias processuais apregoadas pelo Código de Processo Civil.
1 OS REGIMENTOS INTERNOS DOS TRIBUNAIS NO DIREITO BRASILEIRO
Deocleciano Torrieri Guimarães conceitua regimento como sendo "Normas agrupadas que disciplinam, o serviço interno ou o funcionamento de tribunais, assembleias legislativas, corporações, fundações, instituições civis". [01]
Já o mais conhecido lexicógrafo brasileiro afiança ser o "1. ato, ou efeito ou modo de reger ou dirigir; regime. 2. conjunto de normas que regem o funcionamento duma instituição. 3. Corpo de tropas sob o comando de um coronel". [02]
Não é de modo diverso que, José Náufel, em Dicionário Jurídico Brasileiro sentencia ser um
[...] conjunto de normas que regulam o funcionamento e o serviço interno de câmara legislativas tribunais ou órgãos da administração pública. Exs: Regimento Interna da Câmara dos Deputados, Regimento do Supremo Tribunal Federal. [03]
Deflui-se, assim, tratar-se de compilações de normas que visam disciplinar, no interior de uma instituição, o seu funcionamento, seu modo de agir, estando afeto àqueles que tomam parte nesta conjuntura.
Partindo dessa premissa é que o presente trabalho pretende abordar o Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, buscando demonstrar a sua extensão além dos limites atribuídos pela Constituição Federal de 1988, ferindo frontalmente o atual Código de Processo Civil.
Necessário excursionar, primeiramente, pelas normas que até então regeram os regimentos internos dos tribunais, buscando demonstrar que estes gozavam de considerável autonomia (fruto da separação entre Poderes) para compilarem seus regimentos. Posteriormente, cumpre assentar os limites a que estão submetidos às normas internas dos tribunais, em especial a observância aos direitos e as garantias processuais atribuídas às partes. Por derradeiro, como expresso alhures, há de se assinalar as reais ofensas que o Regimento Interno do Supremo possui frente ao atual CPC.
1.2 Evolução Constitucional dos Regimentos Internos dos Tribunais no âmbito do Direito brasileiro.
O Brasil possui vasta tradição ao que tange à autonomia dos Tribunais para comporem seus próprios Regimentos Internos. Afora a Constituição de 1824, talhada ainda às vistas do Império português, as demais Leis Supremas sempre atribuíram tais misteres a estes.
A Carta Constitucional de 1824 isola-se como a única a não creditar aos Tribunais efetuarem seu próprio regimento. Ainda que propugnasse em seu artigo 9º que "A Divisão, e harmonia dos Poderes Políticos é o principio conservador dos Direitos dos Cidadãos, e o mais seguro meio de fazer effectivas as garantias, que a Constituição offerece." (*sic), tal assertiva por certo não se concretizava.
Corrobora o fato de tratar-se de uma Constituição outorgada, baseada em uma Monarquia Unitária e hereditária com poder centralizado, tendo como característica, sui generis, a existência de quatro Poderes: o Legislativo, o Executivo, o Judiciário e o Poder Moderador, encontrando-se este último acima dos demais, e tendo no Imperador seu condutor supremo.
Diferentemente, a Carta Magna de 1891, materialmente configurada nos moldes da constituição norte americana e imbuída do espírito Liberal, foi, de certa forma, a precursora a assegurar que os Tribunais disciplinassem assuntos que lhes fossem peculiares. Apregoava em seu artigo 58 que "Os Tribunais federais elegerão de seu seio os seus Presidentes e organizarão as respectivas Secretarias". Tem-se aí, ainda que não de forma explícita, a possibilidade de auto-regulação, a qual buscava dar efetividade à Separação dos Poderes, tema posteriormente abordado.
De forma mais contundente, a Constituição de 1934 (em sua exígua existência), oriunda da Revolução Federalista e esculpida nos moldes da constituição alemã propugnava que
Art. 67. Compete aos Tribunais:
a) elaborar os seus Regimentos Internos, organizar as suas secretarias, os seus cartórios e mais serviços auxiliares, e propor ao Poder Legislativo a criação ou supressão de empregos e a fixação dos vencimentos respectivos.
Denota-se que houve considerável avanço, não somente por constar expressamente a competência para a elaboração do Regimento Interno por parte dos Tribunais, mas também porque se buscou atribuir competência para o trato de outras matérias que são afetas somente a estes (organização de secretarias, cartórios, serviços auxiliares etc.).
Já a Constituição de 1937, ainda que fosse outorgada; que concentrasse excessivamente poderes e que estabelecesse eleições indiretas, deixou intacta tal prerrogativa dos tribunais, e fê-lo nos seguintes termos
Art. 93 Compete aos Tribunais: a) elaborar os Regimentos Internos, organizar as Secretarias, os Cartórios e mais serviços auxiliares, e propor ao Poder Legislativo a criação ou supressão de empregos e a fixação dos vencimentos respectivos.
Passada a ditadura do Estado Novo sobreveio a Constituição de 1946 sendo que esta manteve praticamente a mesma redação no que toca ao tema, verbis:
Art. 97 Compete aos Tribunais:
[...]
II - elaborar seus Regimentos Internos e organizar os serviços auxiliares, provendo-lhes os cargos na forma da lei; e bem assim propor ao Poder Legislativo competente a criação ou a extinção de cargos e a fixação dos respectivos vencimentos;
Não houve desvio, neste ponto, quando da outorga da Constituição de 1967.
Ainda que esta tenha representado o período mais execrável da história brasileira, pautando-se, ainda, pelo aumento da influência do Executivo sobre o Legislativo e o Judiciário e escorando-se na suposta "ameaça vermelha", manteve inabalável a disciplina dos tribunais, determinado que
Art. 110 - Compete aos Tribunais:
(...)
II - elaborar seus Regimentos internos e organizar os serviços auxiliares, provendo-lhes os cargos na forma da lei; propor (art. 59) ao Poder Legislativo a criação ou a extinção de cargos e a fixação dos respectivos vencimentos;
Tal redação foi mantida in totun pela emenda 01 de 1969, sendo, posteriormente modificada pela emenda 07 de 1977, passando a constar que
Art. 115. Compete aos Tribunais:
[...]
III - elaborar seus regimentos internos e neles estabelecer, respeitado o que preceituar a Lei Orgânica da Magistratura Nacional, a competência de suas câmaras ou turmas isoladas, grupos, seções ou outros órgãos com funções jurisdicionais ou administrativas;
Por derradeiro, a Carta de 1988 ainda que em um primeiro momento tenha mantido a tradição, possibilitando a auto-regulamentação pelos Tribunais das matérias que lhes sejam privativas, acabou, de forma salutar, impondo restrições, fato este não consignado nas Cartas anteriores. Apregoa em seu Art. 96, I, "a" (grifei):
Art. 96. Compete privativamente:
I - aos tribunais:
a) eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos.
Assim, forçoso concluir que, ainda que a Carta de 88 tenha mantidp a possibilidade dos Tribunais de sintetizarem seus próprios Regimentos Internos, impôs limitações devendo respeito às normas de processo e das garantias processuais das partes.
Ressalte-se, novamente, que é sobre este enfoque e à luz do Código de Processo Civil, que o presente trabalho se desenha, buscando demonstrar a não observância, por parte do Regimento Interno do STF, das referidas restrições, haja vista macular as normas de processo, assim como as garantias processuais das partes.
2 NOÇÕES GERAIS ACERCA DA AUTONOMIA DOS TRIBUNAIS NA ELABORAÇÃO DE SEUS REGIMENTOS INTERNOS
O Princípio da Separação dos Poderes, conforme apregoa a doutrina, é tido como uma das máximas de todo e qualquer Estado de Direito. Conforme assevera a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão "Toda a sociedade na qual a garantia dos direitos não estiver assegurado e a separação de poderes determinada, não tem Constituição". Seguindo esta trilha, a Constituição francesa de 1848 consagrou que "A separação de poderes é a primeira condição de um governo livre".
Para Paulo Bonavides
Nenhum princípio de nosso constitucionalismo excede em ancianidade e solidez o princípio da separação de poderes. Inarredável de todas as Constituições e projetos de Constituição já formulados neste País, desde 1823, data de elaboração do célebre Projeto de Antônio Carlos oferecido à Constituição Imperial, ele atravessou o Império e a República, rodeado sempre do respeito e do prestígio que gozam, as garantias constitucionais de liberdade. A única exceção veio a ser a Carta de 1937, mas esta em rigor não foi uma Constituição e sim um ato de força de natureza institucional, tanto que afastou, por inteiro, o País de toda a sua tradição de liberalismo e representatividade do Poder. Veja-se que depois do desastre de 1937, nem as Constituições outorgadas pela ditadura de 1964, sem embargos da violência de seu autoritarismo, ousaram tocar naquele princípio. [04]
Aduzindo, ainda que
[...] conforme Montesquieu já assinalara, com a clarividência de um pensamento meridianamente lógico – de limitar e controlar poderes, refreando assim a concentração de sua titularidade num único órgão ativo da soberania. A concentração seria, sem dúvida, lesiva ao exercício social da liberdade humana em qualquer gênero de organização do Estado. Titular exclusivo dos poderes da soberania na esfera da legitimidade, é tão-somente a Nação politicamente organizada, sob a égide de um estado de Direito. [05]
Cumpre não descurar que o art. 60, § 4º, inciso III da hodierna Constituição tem como uma de suas cláusulas pétreas, a impossibilidade da separação dos Poderes. Assim: "A Constituição poderá ser emendada mediante proposta (...) § 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:(...) III – a Separação dos Poderes". Dessa forma qualquer tentativa de abolir a separação de poderes por certo restará inexitosa.
Entretanto, ainda que se reconheça a autonomia de cada Poder, tal não se processa de forma absoluta, tendo em vista a necessidade de se impor limites dando-se equilíbrio às relações. Assim, eventual controle que um exerce sobre outro não há de ser tido como ofensivo ao princípio em análise.
Rememorando a teoria dos freios e contrapesos Ricardo Cunha Chimenti, Fernando Capez, Márcio F. Elias Rosa e Marisa F. Santos, em Curso de Direito Constitucional noticiam que
A tripartição, portanto, é a técnica pela qual o poder é contido pelo próprio poder, um sistema de freios e contrapesos (também denominado checks and balances, verificações e equilíbrios ou métodos das compensações), uma garantia do povo contra o arbítrio e o despotismo [06]
Em similar sentido José Afonso da Silva ressalta que
A harmonia entre os poderes verifica-se primeiramente pelas normas de cortesia no trato recíproco e no respeito às prerrogativas e faculdades a que mutuamente todos têm direito. De outro lado, cabe assinalar que nem a divisão de funções entre os órgãos do poder nem sua independência são absolutas. Há interferência, que visam ao estabelecimento de um sistema de freios e contrapesos, à busca do equilíbrio necessário à realização do bem da coletividade e indispensável para evitar o arbítrio e o desmando de um em detrimento do outro e especialmente dos governados. [07]
Assim, ainda que se possa dizer, na expressão moldada por Gomes Canotilho que "A independência dos tribunais é um daqueles kampfbegriffe ("conceitos de luta") de que está povoado o estado de direito" [08], tal deverá ser dada de forma mitigada.
Se é reconhecida a independência dos poderes, podendo, por exemplo o Judiciário perfectibilizar sua lei interna, há de se reconhecer que, diante da possibilidade e, principalmente da necessidade de controle, devem ser respeitados ditames impostos pelos demais Poderes, entre os quais o respeito às normas de processo e às garantias processuais das partes.
3 AS PRERROGATIVAS ASSEGURADAS ÀS PARTES PELO DIREITO PROCESSUAL
Traçado um panorama geral no que diz ao conceito de regimento, sua evolução frente às inúmeras constituições promulgadas e outorgadas assim como sua autonomia frente à doutrina, cumpre declinar os fundamentos demonstrando a ofensa do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal diante das Normas do atual Código de Processo Civil.
Conforme expressado no primeiro capítulo (item 1.2), reza o art. 96, I, alínea "a" da atual Constituição Federal que
Art. 96 Compete privativamente
I - aos tribunais:
a) eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos (grifei).
Infere-se que o constituinte originário delegou aos Tribunais atribuições como a de eleger seus órgãos diretivos. Aliado a isso, dispôs sobre a competência para compilar seus Regimentos Internos, disciplinando a competência e funcionamento dos órgãos jurisdicionais e administrativos, sendo que tal prerrogativa, conforme expresso anteriormente, deriva da independência, bem como da busca pela harmonia entre os Poderes.
Entretanto, quando da feitura dos normativos que regerão seus trabalhos internos, hão de se atentar para as normas de processo bem como para as garantias processuais das partes. Logo, desrespeitadas tais premissas restará alvejado o animus do constituinte, impondo ver declarada a ofensa à Constituição. Neste tocante mister declinar ponderações ao que toca às normas processuais assim como às garantias processuais das partes a fim de corroborar na empreitada que pretende o presente.
3.2 As Normas de Processo à luz da Doutrina
Na acepção de Deocleciano Torrieri Guimarães normas são
Preceitos, regras, modelo, teor, minuta; linha de conduta". Já na ceara jurídica significa "Prescrição legal, preceito obrigatório, cuja característica é a possibilidade de seu cumprimento exigido, se necessário, com o emprego da força, da coerção [...]. [09]
Outrossim, Aurélio Buarque de Holanda Ferreira conceitua como sendo "1. aquilo que se adota como base ou medida para a realização ou avaliação de algo. 2. Princípio, regra. 3. Modelo, padrão". [10]
Tem-se, assim, que são aferições legais que regem condutas, podendo, caso não sejam seguidas, impor a sua realização, ainda que de forma coercitiva. Na atual sociedade, diante da abolição da justiça privada, mister que as relações sejam normatizadas. Nesse sentido Humberto Teodoro Junior enuncia que:
Desde o momento em que, em antigas eras, se chegou à conclusão de que não deviam os particulares fazer justiça pelas próprias mãos e que seus conflitos deveria, ser submetidos a julgamento de autoridade públicas, fez-se presente a necessidade de regulamentar a atividade da administração da Justiça. E, desde então, surgiram as normas jurídicas processuais (grifei). [11]
Já no campo processual preciosa a lição de Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco para quem o direito processual é "O complexo de normas e princípios que regem tal método de trabalho, ou seja, o exercício conjugado da jurisdição do Estado-Juiz, da ação pelo demandante e da defesa do demandado". [12]
Também Humberto Teodoro Junior comentando o tema aduz que "Lei processual é a que regula o processo civil. Não é apenas a que regula a forma, os modos e os termos do desenvolvimento da relação processual ou da tramitação do processo em juízo". [13]
Por fim a contribuição de Luiz Rodrigues Wambier, Flávio Renato Correia de Almeida e Eduardo Talamini para quem normas processuais:
[...] tratam de disciplina processual, da forma como se fará a vinculação da pretensão, com vistas à solução da lide, têm conteúdo nitidamente vinculado à aquilo que acontece em juízo, isto é, quando o litígio chega ao Poder Judiciário (ou, se for o caso, quando se celebra o compromisso arbitral) sob a forma de lide. [14]
3.3 As Garantias Processuais apregoadas às partes.
Deocleciano Torrieri Guimarães, conceituando garantias no âmbito jurídico constitucional aduz ser
Meio de assegurar o direito de alguém contra lesão que resulte do não-cumprimento de obrigação (...)". No que diz respeito às garantias constitucionais assinala ser "conjunto de direitos que a CF garante a todos os cidadãos. Tutela dos direitos fundamentais, assim como mecanismos jurídicos que garantem a harmonia entre os Poderes do estado e sua funções. [15]
Retira-se do vocábulo que garantias seriam instrumentos postos ao dispor da parte podendo esta manejá-los invocando direito seu. Enuncie-se que as garantias, de regra, encontram-se assentadas nas Constituições. A exemplificar-se a Carta de 1824, já trazia em seu art. 179 e, em alguns de seus incisos que
Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte.
I. Nenhum Cidadão póde ser obrigado a fazer, ou deixar de fazer alguma cousa, senão em virtude da Lei.
(...)
IV. Todos podem communicar os seus pensamentos, por palavras, escriptos, e publical-os pela Imprensa, sem dependencia de censura; com tanto que hajam de responder pelos abusos, que commetterem no exercicio deste Direito, nos casos, e pela fórma, que a Lei determinar.
V. Ninguem póde ser perseguido por motivo de Religião, uma vez que respeite a do Estado, e não offenda a Moral Publica.
No mesmo sentido, a atual Constituição, em especial seu artigo 5º, apresenta um amplo rol. A título exemplificativo tem-se que
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
(...)
LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
Entre estas acentuam-se a garantia do princípio da legalidade, a necessidade do respeito ao devido processo legal, da ampla defesa assim como do contraditório, princípios estes podem ter sido alvejados pelo Regimento Interno do STF.
José Joaquim Gomes Canotilho, Professor da Faculdade de Direito de Coimbra, em comentários às garantias processuais assentadas na Constituição portuguesa de 1976, aduziu que, in verbis:
Do princípio do Estado de direito deduz-se, sem dúvida, a exigência de um procedimento justo e adequado de acesso ao direito e de realização do direito. Como a realização do direito é determinada pela conformação jurídica do procedimento e do processo, a Constituição contém alguns princípios e normas designados por garantias gerais de procedimentos e de processo. As principais podem aglutinar-se da forma seguinte.
a) Garantias de processo judicial
Entre estas garantias podem mencionar-se o princípio do juiz legal (art. 32.77), o princípio da audição (art. 28.71), o princípio de igualdade processual das partes (arts. 13.° e 20.72), o princípio da conformação do processo segundo os direitos fundamentais (art. 32.°), o princípio da fundamentação dos actos judiciais (art. 208.71) [...]. (*sic) [16]
Adite-se que, nos termos do § 1º do art. 5º da CF/88 "As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata", sendo que, consoante o § 2º do referido artigo "Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte".