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O advogado e a litigância de má-fé na Justiça do Trabalho

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Agenda 27/04/2009 às 00:00

A CONDENAÇÃO DO ADVOGADO COMO LITIGANTE DE MÁ-FÉ

O artigo 18 do Código de Processo Civil estabelece a punição ao litigante de má-fé

Art. 18. O juiz ou tribunal, de ofício ou a requerimento, condenará o litigante de má-fé a pagar multa não excedente a um por cento sobre o valor da causa e a indenizar a parte contrária dos prejuízos que esta sofreu, mais os honorários advocatícios e todas as despesas que efetuou.

§ 1º Quando forem dois ou mais os litigantes de má-fé, o juiz condenará cada um na proporção do seu respectivo interesse na causa, ou solidariamente aqueles que se coligaram para lesar a parte contrária.

§ 2º O valor da indenização será desde logo fixado pelo juiz, em quantia não superior a 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa, ou liquidado por arbitramento.

Como já vimos, há quem compreenda pela possibilidade do advogado ser responsabilizado pela litigância de má-fé.

No entanto, sob esse prisma, necessário se faz analisar como essa responsabilidade poderá alcançar o advogado em caso de ser constatada qualquer uma das condutas tipificadas nos incisos I até VII do artigo 17 do Código de Processo Civil.

Há quem entenda pela condenação solidária da parte e seu advogado; existem posições mais extremas em que o advogado deva ser condenado sozinho no processo isentando a parte que o mesmo defende; em posição oposta, há quem compreenda que, muito embora se reconheça que o advogado incorreu em conduta elencada nos incisos do artigo 17 do CPC, não é possível condenar (sozinho ou solidariamente) o advogado dentro dos próprios autos do processo, mas somente em ação própria, em observância ao artigo 32 e seu parágrafo único da Lei Federal nº 8.906 de 04 de julho de 1994:

Art. 32. O advogado é responsável pelos atos, que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa.

Parágrafo único. Em caso de lide temerária, o advogado será solidariamente responsável com seu cliente, desde que coligado com este para lesar a parte contrária, o que será apurado em ação própria.

No primeiro e segundo casos, o posicionamento de que o advogado deverá ser condenado por litigância de má-fé solidariamente com seu representado ou mesmo individualmente, dentro dos próprios autos do processo trabalhista, encontra uma boa quantidade de defensores.

Na hipótese primeira, temos a situação de responsabilidade solidária, com base na situação de concorrência do advogado e seu cliente para lesar a parte contrária, contemplada pelo parágrafo único do artigo 32 da Lei Federal nº 8.906/94.

Esclarece o Professor Leonel Maschietto (2007, p. 139) que "(...) em alguns casos específicos as partes e seus advogados podem ‘conjuntamente e de forma pactuada’ agirem de má-fé, como por exemplo naquela situação em que o próprio advogado e a parte sabem da efetiva impossibilidade de reforma de uma determinada matéria pelo Tribunal Regional do Trabalho (caso de uma revelia, p. ex.) e, mesmo assim, maliciosamente combinam a interposição do recurso ordinário com o fim específico de protelar o feito".

LEONEL MASCHIETTO (2007, p. 140), mencionando o entendimento de DÁRCIO GUIMARÃES DE ANDRADE (1999) ressalta, em relação ao artigo 32 e seu parágrafo único da Lei nº 8.906/94, que "tal disposição é perfeitamente aplicável ao Processo do Trabalho, quando se verifica o comportamento reprovável por parte dos causídicos. Assim sendo, havendo a condenação por lide temerária, poderá a parte beneficiada cobrar do advogado ou do seu cliente o valor respectivo, ou mesmo de ambas".

Nessa esteira, segue a compreensão de que se constatada a ocorrência da má-fé processual, nos termos elencados pelo artigo 17 do Código de Processo Civil, por quaisquer das partes e seu respectivo advogado, o próprio Juiz do Trabalho poderá apreciar e decidir como incidente dentro dos próprios autos, observando os princípios da celeridade e da economia processual, podendo a própria Justiça do Trabalho promover a sua execução nos termos do artigo 144 da Constituição Federal [06], através de requerimento da parte prejudicada.

A respeito, citamos algumas decisões dos nossos Tribunais:

"LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. CARACTERIZAÇÃO. RESPONDABILIDADE SOLIDÁRIA DO ADVOGADO. Interposto agravo de instrumento para elidir intempestivamente de recurso ordinário protocolizado após decorridos 23 dias da intimação da sentença, caracterizada está a litigância de má-fé. O advogado da agravante deverá responder solidariamente. O art. 32 da Lei 8.906/94, qe exige apuração em ação própria, só de aplica na hipótese do inciso V, do art.17 do CPC. Descabe interpretação ampliativa para acobertar conduta ilícita" (TRT 2ª Região, Ac. Nº 20040477848, 9ª T., julg. 2.9.2004, publ. 24.9.2004, proc. nº 20040099800, Rel. Juiz Antonio Ricardo).

"AÇÃO RESCISÓRIA. ADVOGADO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA COM SEU CONSTITUINTE. É maciça a jurisprudência no sentido de que a aplicação do art. 32, do Estatuto da OAB no Processo Trabalhista, em razão de seus princípios e características peculiares, permite a atribuição imediata ao advogado de responsabilidade solidária com seu constituinte, pelo ônus da sucumbência, desde que os autos contenham elementos suficientes para se considerar a lide temerária" (TRT 3ª Região, AR 0561/96, publ. 29.8.1997, Rel, Juiz Nereu Nunes Pereira).

Outrossim, há quem defenda posição ainda mais extrema, de que a responsabilidade pela má-fé processual pode ser dirigida ao advogado da parte, sem, contudo, atingir esta última.

Na construção desse entendimento, Arruda Alvim (1996), citado em excelente artigo do Juiz Federal Francisco Barros (2001, p. 11), ressalta que, em relação à lide, cabe maior responsabilidade ao advogado do que a parte que ele representa:

"Certamente, tal dever de advogar conforme o direito é muito mais pertinente ao advogado do que aos litigantes. É ele uma expressão de que não se pode, conscientemente, intencionalmente, pedir providências jurisdicionais contra a lei, isto é, naqueles casos em que não é possível, absolutamente, qualquer discussão. Aliás, a hipótese já é contemplada pela nossa Lei nº 8.906, de 04/07/94 (art. 34, inc. VII), que capitula tal procedimento do advogado como infração disciplinar".

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E acrescenta quanto ao anteprojeto do Código de Processo Civil, em seu artigo 24, que "era expresso em admitir que o juiz responsabilizasse também o procurador, preceito este que não subsistiu na redação final da lei" (ALVIM, 1996, apud BARROS, 2001, p. 11).

E expõe, no mais, que "a responsabilidade do advogado, embora não tenha constado expressamente nessa parte do Código de Processo Civil, não deixou de figurar no Código de Defesa do Consumidor e no Estatuto dos Advogados, que contemplam a responsabilidade desse profissional" (ALVIM, 1996, apud BARROS, 2001, p. 11).

Por fim, ensina o eminente processualista que:

"O Código de Defesa do Consumidor refere-se a que os advogados responde, tal como os demais profissionais liberais, por culpa - culpa sem adjetivação alguma – Código de Defesa do Consumidor, art. 14, § 4 (Esse texto refere-se aos profissionais liberais, abrangendo pois,a figura do advogado). Sustentavamos que, diante da promulgação daquele Código, teria sido revogado o art. 103, XV, da Lei nº 4.215, de 27 de abril de 1963, então vigente, que se referia a culpa grave, como causa para responsabilização do profissional. Do mesmo modo que o Código do Consumidor, isto é, sem fazer qualquer menção à culpa grave, dispõe o art. 32, caput da Lei 8.906/94, novo Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil, ao se referir à responsabilização do advogado pelos atos que, no exercício profissional, pratique com dolo ou culpa. Este, portanto, o sistema atual no que pertine ao tema" (ALVIM, 1996, apud BARROS, 2001, p. 11).

Francisco Barros (2001, p. 12), por sua vez, também defende que "a responsabilidade do advogado pode e deve ser apurada nos mesmos autos, sem necessidade de ajuizamento de uma outra ação para esse fim, providencia excessivamente onerosa". E justifica essa posição "pelo fato de ser mais fácil apurar-se essa responsabilidade nos próprios autos, com economia de tempo e dinheiro, tendo muitas das vezes ficado devidamente comprovada a circunstância de que o advogado foi quem agiu com dolo ou culpa nos autos".

O Professor Leonel Maschietto (2007, 142), de forma objetiva, ressalta que:

"Nas hipóteses em que o advogado agir sozinho e sem a concorrência do cliente ou terceiro, deverá ele mesmo suportar as penas impostas nos preceitos legais, afastando-se, nestes casos, qualquer suposição de aplicação da culpa objetiva da parte pela outorga do mandato".

Em outra posição, sustenta que o advogado até poderá praticar a litigância de má-fé, na forma do artigo 17 do Código de Processo Civil; não obstante, o magistrado estaria impedido de condená-lo, sob a argumentação de que o advogado, sendo indispensável à administração da justiça [07], não se submete hierarquicamente ao magistrado ou aos membros do Ministério Público (Lei nº 8.906/94, artigo 6º), e, dessa forma, o juiz não possui legitimidade para punir o advogado, cumprindo-lhe, simplesmente, dar a notícia do que consta nos autos à Ordem dos Advogados do Brasil, considerando que a referida Lei nº 8.906/94, em seu artigo 70, estabelece que compete exclusivamente ao Conselho Secional da O.A.B. o poder de punir disciplinarmente os advogados (MASCHIETTO, 2007, p. 131).

Sobre tal entendimento, podemos transcrever algumas decisões:

"MANDADO DE SEGURANÇA. RESPONSABILIDADE DO ADVOGADO. De acordo com o disposto no artigo 32 da Lei Federal nº 8.906/1994, de 04 de julho de 1994 (dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil - OAB), o advogado é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa e, em caso de lide temerária, o advogado será solidariamente responsável com seu cliente, desde que coligado com este para lesar a parte contrária, o que será apurado em ação própria. Segundo o artigo 70, do mesmo diploma legal, o poder de punir disciplnarmente os inscritos na OAB compete exclusivamente ao Conselho Seccional em cuja base territorial tenha ocorrido a infração, salvo se a falta for cometida perante o Conselho Federal. Se assim não fosse, a igualdade hierárquica entre juiz e advogado, prevista em seu artigo 6º, ficaria comprometida" (TRT 2ª Região, Mandado de Segurança, Ac. SDI nº 04665/2007-0, proc. nº 11795.2005.000.02.00-3, julg. 26.11.2007, Rel. Juiz Marcelo Freire Gonçalves).

ADVOGADO. CONDENAÇÃO SOLIDÁRIA. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. Artigo 32 da Lei nº 8906/94. Se, por um lado, o advogado responde por atos que praticou, na caracterização da litigância de má-fé, por outro, não poderá ser condenado por esse procedimento nos próprios autos. A apuração da responsabilidade do advogado tem suas regras, não podendo o Juiz, a seu critério, amoldar a lei e daí aplicar-lhe corretivos econômicos, só permitidos mediante apuração inequívoca de sua participação nos atos caracterizadores da litigância de má-fé, com contraditório amplo e através de ação própria" (TRT 2ª Região, Mandado de Segurança, proc. nº 00589/1997-4, Ac. SDI nº 1997012599, julg. 11.9.1997, publ. 30.9.1997, Rel. Juiz Argemiro Gomes).


CONCLUSÕES

Diante de todo o exposto, passamos a tecer nossas conclusões sobre o tema abordado.

Em princípio, quanto à possibilidade de reputar o advogado como litigância de má-fé, nos moldes do artigo 17 do CPC, compreendemos, com o devido respeito à posição contrária, pela sua absoluta impossibilidade, eis que, em primeira análise, o advogado não é parte do processo, mas sujeito deste.

Os deveres impostos pelo artigo 14 do Código de Processo Civil (com aplicação subsidiária ao processo trabalhista) alcançam o advogado, visto que o mesmo participa do processo e a norma é expressamente ampliativa neste sentido. Todavia, o mesmo não ocorre com o artigo 17, que restringe sua aplicação tão somente ao litigante, ou seja, àquele que contende no processo.

E o advogado não é litigante; não é ele quem vem a juízo contender contra a parte adversa, mas sim a parte que ele representa.

Portanto, sendo incabível considerar litigante de má-fé o advogado, é inaplicável, por conseqüência, as penalidades decorrentes, dispostas no artigo 18 do Código de Processo Civil.

A imputação da litigância de má-fé e decorrentes penalidades, se restringem, pois, apenas às partes, com exclusão dos demais sujeitos do processo. Pois, da mesma forma que não há o que se falar em litigância de má-fé pelo magistrado, pelo perito designado pelo juízo para atuar na ação judicial ou em relação ao serventuário responsável pelo curso do processo na secretaria da Vara Trabalhista, o mesmo ocorre em relação aos respectivos advogados das partes envolvidas na lide.

Advogado, necessário mais uma vez ressaltar, não é parte do processo sob seu patrocínio e, neste sentido, aliás, já decidiu a Colenda 01ª Turma do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 06ª Região:

"Tratando-se de imposição de sanção por litigância de má-fé, a cumulação subjetiva restringe-se aos casos de litisconsórcio ativo e passivo, isto é, não se estende à figura do procurador judicial, uma vez que o advogado não é parte da relação processual, mas procurador judicial (artigo 36 do CPC). Recurso ordinário acolhido" (TRT 6ª Região, proc. TRT-RO-6.301/00, por unanimidade, julg. 30.4.2001, Rel. Juiz Nelson Soares Junior).

Leonel Maschietto (2007, p. 140 e 141), aliás, menciona a pertinente crítica direta de Edson de Arruda Câmara (2001) ao artigo publicado por Dárcio Guimarães Andrade (1999), supra mencionado:

"Costuma-se dizer que ‘ao médico, ao padre e ao advogado’ não se deve sonegar a verdade. Em realidade, não é isso o que acontece: via de regra não se escondem do médico os fatos de interesse ao tratamento para que esse se torne mais eficaz, ao advogado não se dizem todos os fatos com suas filigramas e entrelinhas, eis que se espera que o advogado só trabalhe sobre aquilo que beneficiar o cliente".

E conclui:

"Querer imputar ao causídico fato que é de inteira responsabilidade da parte é algo que escandaliza a consciência jurídica e do que não se compadece o Direito, a partir mesmo da assertiva conhecida de que ‘o advogado é a boca que fala pela parte’".

Deveras, a crítica tem sentido, em se tratando que, na maioria das vezes, o advogado deve atuar confiando no que lhe diz o seu cliente, não sendo raras as situações em que se vê surpreendido e levado a erro por omissões e inverdades da parte que representa.

Ainda, apenas com a intenção de argumentar, em sentido contrário ao entendimento mais extremo que busca isentar a parte de quaisquer responsabilidades em relação aos atos praticados por seu advogado, seja por desconhecimento da lei ou dos atos de seu procurador, tal tese cai por terra diante da simples análise do artigo 03º do Decreto-Lei nº 4.657, de 04 de setembro de 1942, o qual determina que "ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece", além de que, ao conceder mandato ao seu advogado para representá-lo, isso não desobriga a respectiva parte das conseqüências decorrentes de sua escolha pelo profissional em questão, bem como da ausência do exercício da vigilância sobre a execução do trabalho deste (compreensão do artigo 186 do Código Civil Brasileiro [08]).

Outrossim, mesmo que, apenas por hipótese, o artigo 17 do Código de Processo Civil se estendesse aos sujeitos do processo – o que não ocorre – ainda assim, por força do que determina o parágrafo único do artigo 32 da Lei nº 8.06/94, não se constata a possibilidade do magistrado condenar solidariamente o advogado em relação ao seu cliente dentro dos autos da ação trabalhista em que se apura qualquer das condutas relacionadas no artigo 17 do Código de Processo Civil.

Isto porque, por imposição da referida norma, quis o legislador preservar o princípio do contraditório e da ampla defesa, ao determinar a apuração da responsabilidade do advogado em ação própria.

Sobre o princípio da celeridade e economia processual, deve preponderar o do exercício do contraditório e da ampla defesa, o qual é assegurado pelo artigo 05º, inciso LV, da Constituição Federal, não podendo ser privilegiada a maior velocidade no curso do processo e a redução de despesas em detrimento da concessão de todas as possibilidades de ser contestada a imputação que é feita, garantido-se todos os meios admissíveis de defesa.

Além do mais, a responsabilização do advogado no mesmo processo em que representa uma das partes não pode prevalecer nem sob o argumento de caracterizar-se patente e inequívoco nos autos do processo que o advogado estaria agindo com má-fé, na forma do artigo 17 do CPC, haja vista que, muitas vezes, há elementos desconhecidos, a primeira vista, para o magistrado que julga a lide e que poderão ser apresentados e melhor analisados em ação própria.

Quanto à alegação de que o § único do artigo 32 do Estatuto da O.A.B. estaria restrito à hipótese do inciso V do artigo 17 do CPC trata-se de uma interpretação equivocada da norma. Isto porque, entre "proceder de forma temerária em qualquer incidente ou ato do processo" e "caso de lide temerária" vai uma diferença considerável. A segunda hipótese é mais abrangente, abarcando as hipóteses de litigância de má-fé, nos moldes do artigo 17 do Código de Processo Civil, inclusive o seu inciso V, mas não apenas.

Ademais, o artigo 6º da Lei nº 8.906/94 é claro ao determinar que "não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público, devendo todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos". Ou seja, o advogado não está sob as ordens do juiz e, no exercício de sua atividade profissional, não deverá ter receio de desagradar ao magistrado ou a qualquer autoridade (parágrafo 02º do artigo 31 da Lei nº 8.906/94).

Portanto, o juiz não tem qualquer ascendência sobre o advogado no exercício de sua função e nem tem autoridade para aplicar punição disciplinar a este, pois, por determinação expressa do artigo 70, "caput", da Lei nº 8.906/94 "O poder de punir disciplinarmente os inscritos na OAB compete exclusivamente ao Conselho Seccional em cuja base territorial tenha ocorrido a infração, salvo se a falta for cometida perante o Conselho Federal".

Entretanto, não se deseja sustentar a irresponsabilidade do advogado em relação aos seus atos, no exercício de sua atividade profissional. Tão somente defendemos a aplicação das normas vigentes, a observância do princípio do contraditório e da ampla defesa, bem como da manutenção da independência de seu exercício profissional e em patamar de igualdade em relação ao magistrado e membros do Ministério Público.

O Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 14, dispõe que "A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa". Trata-se, portanto, de responsabilidade civil subjetiva, em que deverá ser apurada a culpa ou o dolo do profissional liberal.

O advogado é profissional liberal por excelência, razão pela qual a sua responsabilidade civil não é presumida, carecendo da devida apuração de culpa ou dolo em relação aos atos cometidos no exercício de sua atividade profissional.

Assim, se prejudicada a parte por seu advogado em decorrência de ser reputada litigante de má-fé, deverá, em ação própria, buscar, de forma regressiva, a correspondente indenização perante seu advogado, bem como os demais danos materiais e/ou morais que, porventura, entender cabíveis.

Quanto à parte adversa, beneficiada pela condenação em litigância de má-fé, se possuir provas quanto a coligação do advogado contrário e seu representado para prejudicá-lo, poderá, também em ação própria, requerer a responsabilidade solidária de ambos (advogado e seu cliente), com base no artigo 32 e seu parágrafo único da Lei nº 8.906/94, combinado com o artigo 927 e seu parágrafo único do Código Civil Brasileiro [09].

Sobre o tema, o Professor Leonel Maschietto (2007, p. 150), reconhecendo que os advogados condenados às penas da litigância de má-fé acabam por não ter oportunidade de defesa, propõe que, "em caso de eventual detecção de litigância de má-fé do advogado no transcorrer do processo, que seja instaurado um ‘processo cautelar incidental de apuração de responsabilidade do advogado’", que ocorreria em parelelo ao processo principal, nos termos do artigo 796 do Código de Processo Civil [10],garantindo, dessa maneira, o exercício do contraditório e da ampla defesa.

E sugere, ainda, a inserção de um inciso IX no artigo 888 do CPC [11] com o seguinte comando: "IX - a apresentação de defesa por parte do advogado litigante de má-fé para que o juiz possa rever ou ratificar sua posição quanto à responsabilidade do advogado no ato malicioso".

Trata-se, ao nosso ver, de uma proposição inteligente do Professor Maschietto e coerente com o seu entendimento em favor da possibilidade de considerar o advogado como litigante de má-fé – opinião que, com o devido respeito, não compartilhamos.

Todavia, em termos de Direito Processual, a sugestão ofertada é admissível, podendo a instauração de um processo incidental ser a resposta mais justa e lógica para apurar o eventual enquadramento do advogado em alguma das condutas relacionadas no artigo 17 do Código de Processo Civil.

Não obstante, ao sugerir a inclusão do inciso IX, supra transcrito, no artigo 888 do CPC, a menção "advogado litigante de má-fé" não nos parece a mais correta, não apenas porque o advogado não é e jamais poderia ser "litigante", visto que não é parte na ação, mas, também, porque a referida expressão já reputa o advogado como incurso nas hipóteses descritas no artigo 17 do Código de Processo Civil, enquanto que a intenção do inciso sugerido objetivaria a instauração de procedimento incidental, possibilitando ao advogado defender-se da imputação de responsabilidade pelo alegado ato malicioso.

E isso porque, depois de prolatada a sentença, o magistrado não poderá voltar atrás na condenação do advogado nas penas da litigância de má-fé, conforme estabelece o artigo 463, incisos I e II, do Código de Processo Civil. Portanto, o termo "posição" não deve ser entendido como "condenação por sentença", mas por decisão interlocutória, não havendo o que se falar por "advogado litigante de má-fé", mas sim "advogado acusado de conduta reputada como litigância de má-fé" ou "advogado suspeito de conduta reputada como litigância de má-fé".

Outrossim, para a sua correta aplicação, deveria o artigo 17, "caput", do CPC ter substituído a frase "Reputa-se litigante de má-fé aquele que:" para "Age com má-fé as partes bem como todos àqueles que participem do processo que:"; inserindo um parágrafo 3º no artigo 18 do Código de Processo Civil: "§ 3º - Nas mesmas penas incidirá todos àqueles que participarem do processo" [12].

Encerramos o presente trabalho sem a pretensão de despejar uma pá de cal nesse polêmico assunto, que nem de longe se encontra pacificado tanto pela doutrina quanto por nossos tribunais, mas acreditamos ter, de alguma forma, contribuído para melhor esclarecer alguns pontos sobre tão extenso e debatido tema.

Obviamente, poderão surgir divergências coerentes e críticas construtivas, as quais serão sempre bem acolhidas, vez que, tratando-se de Direito, ciência humana, o que se busca é o seu constante aperfeiçoamento.

Sobre o autor
Regis Cardoso Ares

Advogado. Sócio do escritório Ares e Takehisa Advogados, em Santos(SP). Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Santos. Pós-Graduado "Lato Sensu" em Direito Processual Civil pela Universidade Católica de Santos e em Direito Processual do Trabalho pela Universidade Católica de Santos. Pós-Graduando "Lato Sensu" em Direito e Processo do Consumidor pela Universidade Católica de Santos. Professor.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ARES, Regis Cardoso. O advogado e a litigância de má-fé na Justiça do Trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2126, 27 abr. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12698. Acesso em: 23 dez. 2024.

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