Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

Código de Defesa do Contribuinte

Agenda 01/06/2000 às 00:00

O Projeto de Lei Complementar do Senado nº 646 de 1999, de autoria do Senador Jorge Bornhausen, do PFL de Santa Catarina, denota, sem sobra de dúvidas, o primeiro passo do cidadão brasileiro rumo à modernidade em matéria fiscal. O projeto que prevê a instituição do Código de Defesa do Contribuinte se reveste de cidadania em proporções não vistas desde o Código de Defesa do Consumidor e do Estatuto da Criança e do Adolescente, ambos em vigor desde 1990.

          É inegável que o referido diploma legal positiva garantias constitucionais dos cidadãos em matéria tributária e reduz o abismo existente entre fisco e contribuinte, mas não fica apenas nisso, lança o Brasil na vanguarda mundial no que tange a legislação tributária, na esteira da defesa dos direitos fundamentais do contribuinte e a busca da justiça fiscal.O nosso país passa, portanto, a figurar no grupo em que, por exemplo, já se encontram Estados Unidos com a sua Declaração de Direitos do Contribuinte II (Taxpayer Bill of Rights II) que data de 30 de julho de 1996, e a Espanha através da "Ley de Derechos y Garantias de los Contribuyentes", que foi publicada em de 26 de fevereiro de 1998.


Releva assinalar alguns avanços que se destacam no referido projeto de lei complementar. Inicialmente não poderá o fisco proceder à interdição de estabelecimentos, proibir o contribuinte de transacionar com repartições públicas; proíbe ainda, a instituição de barreiras fiscais e outros meios coercitivos para a cobrança extrajudicial de tributos, previstos nos arts. 13 e 14 do referido projeto.

Outro avanço está no art. 26. Trata-se da vedação ao impedimento do contribuinte de fruir de benefícios e incentivos fiscais ou financeiros, ou de ter acesso a linhas oficiais de crédito ou de participar de licitações, quando estiver pendente contra ele processo administrativo ou judicial, em matéria tributária. Já o art. 37, I e III veda à Administração Fazendária recusar, em razão de débitos tributários pendentes, autorização para o contribuinte imprimir os documentos necessários ao desempenho de suas atividades; ou bloquear, suspender ou cancelar inscrição do contribuinte sem a observância dos princípios do contraditório e da prévia e ampla defesa. Não menos importante, é a vedação do inciso V do mesmo artigo, que acaba com a possibilidade do uso de força policial nas diligências ao estabelecimento do contribuinte, salvo se com autorização judicial na hipótese de justo receio de resistência.

Talvez a maior evolução encontra-se no art. 18, que assegura explicitamente o direito de defesa ou de recurso, administrativo ou judicial, sem condicionamento a depósito, fiança, caução, aval ou outro ônus qualquer, exceto na execução fiscal, nos termos da lei processual aplicável. Como é sabido, atualmente o conhecimento de recurso administrativo em sede tributária é vinculado ao depósito prévio de 30% do valor em discussão, o que violenta o art. 5º, XXXIV, "a", da Constituição Federal, mas que é pratica comum em várias instâncias administrativas.

Outro ponto que merece ser citado é o da inscrição do contribuinte inadimplente no CADIN (Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal). Conforme a redação do art. 36, parcelado o débito tributário, e se cumprido o acordo, não pode o cidadão-contribuinte continuar a sofrer os ônus da inadimplência. O projeto define o parcelamento como novação, o que faz com que o contribuinte retorne ao pleno estado de adimplência, inclusive para a obtenção de certidões negativas de débitos fiscais.

Importante assinalar ainda o que diz respeito aos prazos estabelecidos para as decisões da Administração Fazendária, fazendo com que o contribuinte não fique à mercê a "boa-vontade" estatal ao mesmo tempo em que é penalizado em seus negócios pela falta de um posicionamento do Fisco. Destarte, conforme o art. 46, circunscrita a Administração Fazendária ao objeto lançado no termo de início da fiscalização, tem ela prazo de 90 dias para ultimar as diligências. Ao passo em que, o prazo máximo para emitir decisão nos processos, nas solicitações ou nas reclamações será de 30 dias, na forma dos arts. 19, XII e 41. Nas consultas o prazo é de 30 dias, com a ressalva importante de que, oferecendo o contribuinte sua interpretação, prevalecerá esta se o Fisco não observar o prazo da lei (art. 31). Visando ainda o equilíbrio entre as partes, todos os prazos são prorrogáveis uma única vez, por igual período e mediante justificação.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Mister tratarmos também da defesa do referido Código, prevista no art. 47. São criadas ações administrativas e judiciais, de iniciativa individual ou coletiva, nos moldes do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, art. 81 e seguintes) alargando o espectro de defesa do contribuinte-cidadão, que conta agora com a legitimação do Ministério Público e das associações civis para a ação coletiva na defesa dos direitos e garantias explicitados no projeto. Tal dispositivo não apenas reforça processualmente as garantias dos contribuintes, mas principalmente, passa a assegura-los explicitamente enquanto direitos transindividuais.


No entanto, não queremos sustentar aqui - e não é este o objetivo – que o projeto a que nos referimos reveste-se de perfeição jurídica irretocável, pelo contrário. O texto, ao nosso ver merece ainda inúmeras alterações para que possa aumentar sua juridicidade. O art. 16, por exemplo, que traz o instituto de desconsideração da personalidade jurídica para o direito tributário (apesar de alguns autores entenderem que este já está consagrado no Código Tributário, o que não nos parece correto), necessita de quase completa reforma, sob pena de inviabilizar a sua aplicação concreta.

Apesar das impropriedades citadas, entre outras, o Projeto de Código de Defesa do Contribuinte inaugura uma nova era para a relação entre contribuinte e fisco no nosso país, pois se trata de um diploma que tem o objetivo de renovar e fortalecer a cidadania do contribuinte, complementando as normas constitucionais e sintonizando a legislação brasileira com a internacional, justamente num momento em que a modernização fiscal é extremamente necessária face à globalização à expansão das economias nacionais.

Sobre o autor
Rafael Peixoto Abal

advogado tributarista em Florianópolis (SC), mestrando em Direito pela UFSC

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ABAL, Rafael Peixoto. Código de Defesa do Contribuinte. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 42, 1 jun. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1312. Acesso em: 23 dez. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!