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A lógica jurídica como solução de antinomias

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Agenda 12/09/2009 às 00:00

SUMÁRIO: 1- Introdução. 2- Aspectos Conceituais da Lógica Jurídica: Da Lógica Formal à Nova Retórica. 3- A Lógica Jurídica na Perspectiva Evolutiva do Direito. 4- O Problema das Antinomias. 5- A Lógica Jurídica como Instrumento de Superação de Antinomias. 6- Considerações Finais.


RESUMO:

A lógica formal adotada pelos positivistas contribui para a manutenção do modelo jurídico vigente a partir de uma visão estática. O direito precisa evoluir para acompanhar as mudanças pelas quais passa a sociedade contemporânea. Os conflitos normativos são inevitáveis num sistema jurídico aberto e flexível. Os métodos argumentativos da lógica jurídica, que se utiliza da retórica para persuadir e convencer, bem como melhor fundamentar as decisões, são importantes instrumentos para garantir a unidade e coerência do ordenamento jurídico que não podem ser maculadas nos casos concretos de antinomias.

Palavras-Chave: Lógica Jurídica, Retórica, Conflitos Normativos.


1.Introdução

Inicialmente é de se ressaltar que um sistema jurídico será considerado lógico apenas se revelar unidade e coerência. Para alcançar esse status, o sistema deve ser integrado por normas compatíveis entre si. Todavia, o fato de haver normas conflitantes no mesmo sistema não pode ser suficiente para comprometer seu estado harmônico.

Dada a complexidade do assunto, o presente estudo visa apenas trazer algumas reflexões sobre a possibilidade de se utilizar as técnicas argumentativas da Lógica Jurídica como forma efetiva de superação de antinomias, em complemento aos tradicionais critérios usualmente admitidos para a solução de conflitos normativos.

A partir dos ensinamentos de Chaim Perelman, marco teórico deste trabalho, se empreenderá uma visão crítica do método lógico-dedutivo do positivismo jurídico, buscando-se uma recondução à problematicidade do fato concreto, de modo que a retórica torna-se instrumento poderoso na fundamentação das decisões.

O método subsuntivo adotado pelo positivismo ou pela lógica formal acaba por apenas reproduzir, de modo mecânico, normas abstratas existentes, sem permitir a construção ou reconstrução quando isto se fizer realmente necessário no plano fático, pois não admite a abertura do sistema, já que se preocupa muito mais com a forma (dizer o direito) do que com a justiça e paz social, obtida a partir da aceitabilidade das decisões (dar o direito).

A lógica jurídica que essencialmente tem por escopo a aferição do raciocínio dos juristas na produção do direito traz métodos mais adequados para a compreensão dos fenômenos da sociedade contemporânea.

Para que o objetivo deste trabalho possa ser alcançado é que primeiramente se abordarão alguns aspectos do conceito da lógica jurídica, apresentando as concepções da lógica formal e contrapondo com os métodos persuasivos da retórica. Na sequência, far-se-á uma análise da evolução do Direito no tempo, identificando o momento em que a lógica jurídica ganhou contornos mais expressivos e independentes. Em seguida, será apresentado o problema das antinomias e os tradicionais critérios de solução de conflitos normativos, os quais há muito já têm se revelado insuficientes. E, por fim, será proposta a utilização dos métodos da lógica jurídica como instrumento eficiente para solução de antinomias.


2.Aspectos Conceituais da Lógica Jurídica: da Lógica Formal à Nova Retórica

A ideia de lógica remonta a Idade Antiga (a partir de 500 a.c), inspirada nas teorias de Parmênides e de Heráclito, que por sinal são completamente antagônicas. Para o primeiro, nada podia mudar nem se transformar, além de não se poder confiar nos sentidos, pois tudo sempre existiu, sendo que a razão era a única forma de se levar ao conhecimento, partindo-se de uma realidade estática. Já para o segundo, o mundo estava permeado de contrastes e em constante mutação e movimento, havendo-se de confiar nos sentidos, partindo-se de uma realidade dinâmica. Tratam-se, portanto, de dois métodos clássicos de resolver os problemas epistemológicos, sendo que um não afasta o outro, havendo-se que eleger qual método melhor se adéqua à solução do problema em exame. [01]

Estas teorias foram aperfeiçoadas ao longo do tempo por diversos filósofos, sendo que a Teoria de Parmênides pode ser equiparada à Lógica Formal e a Teoria de Heráclito à Dialética nas suas atuais concepções.

A Lógica Formal é uma maneira de organização do raciocínio sem considerar o conteúdo, partindo-se de premissas para se chegar a uma conclusão, não interessando a veracidade ou falsidade da proposição, apenas a sustentação da validade do argumento. Já a Dialética, atua a partir de um método que agrega o fato ao fenômeno, analisando-o dentro de um contexto universal, pautando-se em contraditórios, conhecendo o que o objeto é a partir do que ele não é. [02]

Conforme se pretende demonstrar neste estudo, a lógica formal não pode ser aplicada indiscriminadamente ao raciocínio jurídico, porquanto o Direito não é uma ciência exata, pois se assim o fosse não estaria permeado de lacunas, obscuridades e antinomias. O Direito não pode, portanto, ser considerado um sistema completo, estático e imutável, em que se possa invocar o silogismo como solução para todo e qualquer caso concreto, havendo que se considerar outras ferramentas de interpretação e integração das normas jurídicas.

Para Dayse Martins, se a lógica for considerada em seu sentido próprio, não será possível identificar semelhanças com a lógica jurídica, que nada mais é do que a própria dialética, ou seja, sinônimo de bom senso.

Carlos Gomes, por outro lado, dá contornos mais independentes à lógica jurídica enquanto ciência:

A lógica jurídica não se contentaria em apenas ser um transplante da regras de lógica formal para o Direito. Assume contornos que superam a lógica da demonstração formal (do raciocínio analítico Aristotélico) alcançando a lógica da argumentação (do raciocínio dialético Aristotélico) que utiliza os instrumentos da dialética para convencer o juiz da pertinência das teses. A lógica jurídica cuidaria de estudar os raciocínios próprios ao mundo do direito. [03]

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Chaim Perelman defende que, na ausência de técnicas unanimemente admitidas, impõe-se o recurso aos raciocínios dialéticos e retóricos, os quais visam estabelecer um acordo sobre os valores e sobre sua aplicação, quando estes são objetos de uma controvérsia. [04]

A noção de acordo foi ignorada pelos juspositivistas, os quais se pautavam simplesmente na busca pela verdade da proposição, através da utilização de métodos dedutivos, indutivos ou empíricos. E é exatamente este consenso, perseguido pela Lógica Jurídica, que vai influenciar a aplicação do Direito, através de uma solução que seja considerada justa, razoável, equitativa ou aceitável.

O cientista jurídico deve ampliar o alcance da razão, reconhecendo que não existe verdade universal, como existe para a ciência matemática. Para que isto se concretize, torna-se fundamental para a aplicação das técnicas da Lógica Jurídica, o domínio da Retórica.

A Retórica procura persuadir por meio do discurso. Quando não é possível garantir a verdade das premissas pelas evidências, como defendem os adeptos da lógica formal, principalmente no caso de noções vagas ou confusas, surge um problema de escolha de decisão que somente será possível a partir da fundamentação para se obter adesão à solução aplicada, o que dependerá da qualidade da Retórica empregada. Deve-se admitir que essa adesão poderá ter intensidade variável quando se estiver diante de valores e não de verdades. E se o que importa é a adesão a determinada tese sustentada, há que se adaptar o discurso ao auditório que se quer persuadir ou convencer. [05]

Se para a Retórica importa mais a adesão do auditório do que a verdade das premissas utilizadas para a conclusão, certo é que para se aplicar o Direito ou dar a solução para o caso concreto, nada impedirá se reinterpretar princípios, se opor ao texto ou espírito da lei, refutar o que revela a experiência, interpretando os termos da lei de modo mais rígido ou flexível, conforme as circunstâncias. Eis o caminho para a superação das antinomias jurídicas.


3.A Lógica Jurídica na Perspectiva Evolutiva do Direito

Partindo-se dos ensinamentos trazidos pelo marco teórico deste estudo, verifica-se que a compreensão da Lógica Jurídica passa, necessariamente, por uma analise preliminar da evolução do Direito. Isto porque a concepção do próprio conceito de Direito evolui conforme as mudanças por que passa a sociedade ao longo do tempo.

De forma bastante didática, Chaim Perelman, distingue três grandes períodos da história do Direito: o da escola da exegese (até 1880), o da escola funcional ou sociológica (até 1945) e o da concepção tópica do raciocínio judiciário (influenciado pelos excessos do regime nacional socialista e pelo processo de Nuremberg). [06]

Sabe-se que, durante muitos séculos, o Direito foi dominado por um ideal de justiça absoluta, originada da divindade, natureza ou da própria razão, sendo que o papel do jurista era a aplicação da solução mais justa para o caso concreto. Assim, a decisão partia da colocação em evidência do problema em uma tradição, evidenciando a semelhança do caso a outra decisão anteriormente aceita ou da subsunção a texto legal que tratasse de caso semelhante. [07]

Na escola da Exegese, o Direito era considerado um sistema dedutivo, semelhante aos sistemas axiomáticos da geometria ou aritmética. Para a solução do caso concreto, bastaria a subsunção do fato a norma. Todavia, dificuldades concretas surgiram nos casos de lacunas, obscuridades e insuficiências das normas, além dos casos de antinomias jurídicas, pois passou a haver uma dependência da formulação de conceitos cada vez mais precisos dos termos das leis por parte da doutrina e jurisprudência, considerando um sistema jurídico absolutamente fechado. [08]

Lembrando as lições de Canaris, um sistema jurídico fechado é definido como uma ordem jurídica constituída casuisticamente, apoiada na jurisprudência e dominada pela ideia de codificação. [09]

Já para a escola funcional, o Direito é apenas o meio do qual se serve o legislador para atingir seus fins e para a promoção de certos valores, podendo ser compreendido somente a partir do meio social ao qual é aplicável. Não se limita a um sistema fechado em que as soluções para os casos concretos são obtidas unicamente a partir da utilização de métodos dedutivos. O juiz deve pautar-se na intenção do legislador quando da positivação de determinada norma, valendo o fim e o espírito da lei. [10]

De acordo com a escola funcional, nos casos em que a situação jurídica se tornar insuportável e a reforma legislativa for difícil, o judiciário precisará recorrer a outros mecanismos como presunções jurisprudenciais e, em casos extremos, à ficção. [11] A partir daí, surgem calorosos debates acerca da competência e poder do juiz na adaptação dos textos legais às mudanças do meio social. Poderia o juiz arrogar os poderes do legislador?

Foi então a partir do processo de Nuremberg e dos excessos cometidos pelo regime nacionalista socialista que passou haver uma orientação antipositivista, acentuando-se a tendência de se aumentar o poder dos juízes e abrindo-se verdadeiro espaço na interpretação e aplicação da lei, desprendidas do que estivesse necessariamente codificado, em busca de uma solução que não seja simplesmente conforme a lei, mas sim equitativa, razoável, aceitável, justa e conciliável com o Direito em vigor, admitindo-se, portanto, um sistema jurídico mais aberto e flexível. [12]

Não se pode reconhecer a validade de um regime totalitário, por exemplo, pelo simples fato de ter se constituído mediante lei. É preciso transcender os limites formais em busca de razoabilidade nas decisões, permitindo-se aos juristas o desprezo ao inaceitável e a busca pelo aceitável.


4.O Problema das Antinomias Jurídicas

O Direito deve ser construído e aplicado de modo a considerar a evolução do meio social no tempo. Assim, não é possível que os textos legais sejam capazes de abarcar todas as mutações pelas quais passa a sociedade ao longo de sua história.

Por este motivo é que não se pode admitir como justa a solução dada pelo aplicador do Direito a determinado caso concreto pautada na simples subsunção do fato a norma, sem qualquer margem para interpretação ou integração. De igual forma, apenas invocar princípios pode não ser eficiente em alguns casos de conflitos normativos, pois a solução poderá depender da ponderação de valores, sendo que é comum a atribuição de igual peso pelas partes, o que dificulta a obtenção de uma decisão verdadeiramente justa e aceitável.

A partir daí torna-se relevante a compreensão das antinomias, para que seja possível a utilização da lógica jurídica como instrumento de superação de conflitos normativos na aplicação do Direito aos casos concretos e como forma de se alcançar a coerência e unidade que se espera do ordenamento jurídico.

O problema das antinomias jurídicas é tratado por Vogas, autora deste artigo, em estudo sobre a "Distinção das Espécies Normativas", da seguinte forma:

As antinomias jurídicas surgem como elementos do sistema jurídico, cuja construção requer a solução de conflitos normativos, pois todo sistema deve e pode alcançar uma coerência interna. Por isso o intérprete e aplicador do direito devem perseguir a coerência lógica, a qual é condição necessária do pensamento jurídico, o que vai depender de um processo interpretativo do jurista. [13]

Ao intérprete caberá saber qual norma deverá prevalecer em caso de conflito, assim caracterizado por Humberto Ávila como uma contraposição concreta entre normas jurídicas. [14]

Maria Helena Diniz define a antinomia como "a presença de duas normas conflitantes, sem que se possa saber qual delas deverá ser aplicada ao caso singular". [15]

Nestes casos, como deve agir o aplicador do Direito para proferir uma decisão justa, coerente e aceitável, de modo a dar uma solução realmente eficaz ao caso concreto? Poderá escolher qualquer uma das normas antinômicas já que são igualmente válidas? Ou deverá se invocar os critérios comumente aceitos para solução de antinomias? E quando estes revelarem-se insuficientes para superar o conflito em exame?

A doutrina tradicional reconhece três critérios mais comuns para a solução de antinomias, quais sejam: o critério cronológico (norma posterior revoga norma anterior), o critério da especialidade (norma especial prevalece sobre norma geral) e o critério hierárquico (norma superior prevalece sobre norma inferior).

Ocorre que não raro estes critérios não conseguem suportar a complexidade das relações entre as normas jurídicas, tornando-se menos simples as respostas a algumas questões. Existe hierarquia entre princípios e regras? Em caso de conflito entre um princípio e uma regra qual deve prevalecer? E se o conflito for travado entre princípios? E se a norma especial ou posterior invocada estiver eivada de vícios de inconstitucionalidades?

Ávila critica a adoção de um modelo de sistematização linear, simples e não gradual do Direito, ressaltando os prejuízos de sua utilização para a hermenêutica, propondo o postulado da coerência como justificativa do reconhecimento de um modelo complementar de sistematização circular (normas superiores condicionam as inferiores, as quais contribuem para determinar os elementos das superiores), complexo (não há apenas uma relação vertical de hierarquia, mas várias relações verticais, horizontais e entrelaçadas entre as normas) e gradual (a observância de vários critérios torna a sistematização mais perfeita). [16]

O simples emprego dos critérios tradicionais na solução de antinomias, via de regra, leva a soluções exclusivas, que não raro podem estar equivocadas. Por esta razão é que se propõe o estudo da lógica jurídica como forma de superação de conflitos normativos.


5.A Lógica Jurídica como Solução de Antinomias

Para Perelman, o raciocínio judiciário tem por escopo a solução de uma controvérsia, na qual argumentações em sentidos diversos objetivam fazer prevalecer um determinado valor para ser aceito em um meio num determinado momento. [17]

Para tanto, faz-se necessário o estudo das técnicas argumentativas. E como a melhor interpretação da lei se concilia com a melhor solução para o caso concreto de modo a tornar as decisões judiciais mais aceitáveis?

O Direito, tal qual está determinado nos textos legais formalmente válidos, não reflete necessariamente a realidade jurídica, principalmente porque, como já foi dito, as regras positivadas nem sempre acompanham a evolução do meio social que é, em verdade, sua finalidade máxima.

Ocorre que os Tribunais, ao longo da história, não hesitaram em tomar decisões, mesmo justificando-as com base em ficção, o que cria mal estar, manifestado pela continuação do litígio pelas partes que têm convicção de seu direito. Somente se alcançará a paz judicial se a solução (aceita socialmente) estiver acompanhada de uma sólida argumentação jurídica. [18]

É claro, porém, que existe a preocupação do judiciário de utilizar meios de conciliar a solução aceitável com a fidelidade à lei. Porém, há que se reconhecer que a existência de um Estado de Direito implica num Poder Judiciário independente. Por exemplo, no caso de uma antinomia entre uma disposição do direito positivo e uma regra de Direito não escrita, pode-se limitar o alcance do texto e criar-se uma lacuna que o juiz preencherá de acordo com a regra do direito não escrito. Isto é perfeitamente possível se for para garantir uma decisão justa e aceitável.

O fato de o juiz submeter-se à lei ressalta a primazia do legislativo na elaboração das regras de Direito, o que não significa monopólio do legislativo na formação do Direito. O juiz possui um poder complementar de adaptar a lei aos casos específicos, torná-la mais flexível, jamais olvidando-se de motivar suas decisões. [19]

A lei não é todo Direito, mas instrumento que guia o juiz na sua tarefa de dar solução ao caso concreto. Esta solução deve ser razoável, aceitável (pela ordem de juristas e instancias superiores), nem subjetiva e nem arbitrária, capaz de se tornar precedente para outros casos.

É na justificação da decisão que se especifica o raciocínio jurídico e que se demonstra às partes que não houve tomada de posição arbitrária. Assim, o Direito se desenvolve equilibrando uma dupla exigência. Uma de ordem sistemática, a partir da elaboração de uma ordem jurídica coerente, e outra de ordem pragmática, a partir da busca de soluções aceitáveis pelo meio. Deste modo, na visão de Perelman, as decisões devem satisfazer três auditórios diferentes: as partes em litígio, os profissionais do Direito e a opinião pública. [20]

O autor apresenta uma teoria que rejeita a lógica formal, tratando de uma ideia bem mais democrática da argumentação jurídica que confere liberdade plena ao jurista para utilização de outras técnicas de argumentação, absolutamente desprendidas de formalidades. Porém, enfatiza a necessidade de justificação ou motivação de decisões, por meio de uma fundamentação racional e convincente. [21]

Na perspectiva do Direito contemporâneo, a teoria de Perelman é bastante coerente e encontra respaldo nas obras de outros autores que rechaçam o positivismo. O que para Perelman consiste na Lógica Jurídica a partir de uma Nova Retórica, para Siches, por exemplo, deve ser entendido como a Lógica do Razoável. Para este autor, deve-se afastar a lógica formal quando a mesma implicar numa conclusão injusta, irritante ou agressiva aos valores prestigiados pelo Direito, razão pela qual se impõe o desenvolvimento de outras formas de raciocínio, diferentes da lógica formal dedutiva, o que não significa afastar arbitrariamente os métodos lógicos, mas sim da aplicação de uma lógica do razoável. [22]

Para Ávila, uma interpretação razoável indica que a interpretação deve ser feita em consonância com aquilo que, para o senso comum, seria aceitável perante a lei. É o que o autor denomina de Postulado da Razoabilidade:

Primeiro, a razoabilidade é utilizada como diretriz que exige a relação das normas gerais com as individualidades do caso concreto. (...) Segundo, a razoabilidade é empregada como diretriz que exige uma vinculação das normas jurídicas com o mundo ao qual elas fazem referência, seja reclamando a existência de um suporte empírico a qualquer ato jurídico, seja demandando uma relação congruente entre a medida adotada e o fim que ela pretende atingir. Terceiro, a razoabilidade é utilizada como diretriz que exige a relação de equivalência entre duas grandezas. [23]

Pelo exposto, em caso de conflitos normativos, caberá ao intérprete e aplicador do Direito ponderar qual valor ou finalidade cada uma das normas antinômicas pretende preservar, considerando-se que esta possibilidade de sopesamento de razões e contra-razões não é privativa dos princípios, mas também de toda e qualquer regra conflitante, o que não significa a necessária declaração de invalidade de uma norma para que a outra possa ser aplicada ao caso concreto.

De acordo com Ávila, a dimensão de peso para a solução de antinomias não é relativa à norma, mas relativa ao aplicador e ao caso, dependo do ponto de vista escolhido pelo observador, sendo que conforme os fatos ou a perspectiva com que se os analisa, uma norma pode ter maior, menor ou até nenhum peso para a decisão. A solução não estaria na estrutura da norma, mas depende do uso que dela se faz. [24]

Portanto, resta claro que além da ponderação como elemento indispensável a ser considerado nas decisões em face de conflitos normativos, a paz e justiça social somente serão alcançadas se houver fundamentação válida, o que é possível a partir dos métodos racionais e argumentativos defendidos por Perelman, tornando assim, aceitável a solução.

Neste sentido, eficiente é o "orador" que, conhecendo bem seu "auditório", eleger os argumentos mais plausíveis, sejam de caráter ideológico ou sentimental, os quais certamente facilitarão a "aceitação" perseguida e o convencimento dos "interlocutores".

Sobre a autora
Rosíris Paula Cerizze Vogas

Advogada, especialista em Direito Tributário pelo IBET, especialista em Direito Empresarial pela UFU/MG, mestranda em Direito Empresarial pela Faculdade de Direito Milton Campos/MG, professora universitária

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VOGAS, Rosíris Paula Cerizze. A lógica jurídica como solução de antinomias. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2264, 12 set. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13492. Acesso em: 22 nov. 2024.

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