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Desconstruindo o princípio de supremacia do interesse público.

Incompatibilidades com o sistema jurídico brasileiro

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Agenda 10/12/2009 às 00:00

4 DA RELAÇÃO COM OS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E PONDERAÇÃO

O Postulado da Proporcionalidade é indispensável para adequar princípios e interesses conflitantes. Da sua aplicação busca-se o alcance da decisão mais acertada no caso concreto ou em um eventual choque abstrato de normas – princípios.

Daniel SARMENTO conceitua:

O emprego do princípio da proporcionalidade busca otimizar a proteção aos bens jurídicos em confronto, evitando o sacrifício desnecessário ou exagerado de um deles em proveito da tutela do outro. Neste sentido, ele é de especial importância no campo dos direitos fundamentais, como fórmula de limitação de medidas que restrinjam estes direitos. Um dos seus objetivos, como o nome já revela, é a busca de uma justa e adequada "proporção" entre os interesses em pugna. Por isso, a aplicação do princípio da proporcionalidade exige a realização de ponderações minuciosas e devidamente motivadas, nas quais se torna fundamental a atenção sobre as particularidades da situação concreta sob análise [40].

Percebe-se do conceito acima que a flexibilidade de análise nos conflitos da sociedade é indispensável ao bom andamento e ‘justiça’ das decisões judiciais. Por certo, não há compatibilidade entre um pensamento de proporcionalidade e uma decisão antecipada em prol do interesse público. Com o mesmo fundamento, SARMENTO:

Talvez a mais séria objeção dogmática ao princípio da supremacia do interesse público sobre o particular seja a de que ele não é compatível com o princípio da proporcionalidade, que constitui importantíssimo parâmetro para aferição da constitucionalidade das restrições aos direitos fundamentais. Com efeito, o princípio da proporcionalidade, cuja vigência no ordenamento brasileiro é hoje reconhecida, em uníssono pela doutrina e jurisprudência, estabelece critérios intersubjetivamente controláveis para resolução de colisões envolvendo interesses constitucionais [41].

Ademais, além de impedir qualquer possibilidade de sopesamento de interesses, o ‘princípio’ base do Direito Administrativo também é incompatível com a hermenêutica constitucional da concordância prática [42], como visto no tópico 2 deste trabalho.


CONCLUSÃO

O artigo tem inicio com as seguintes problemáticas sobre o "princípio" supremo do interesse público: "De fato, trata-se de um princípio no seu sentido técnico? A Supremacia do Interesse Público é compatível como o sistema de normas e regras? Há constitucionalidade, quando da sua aplicação clássica?".

Após os argumentos apresentados, se chega a uma resposta negativa para todas essas questões, ou seja, não há que se falar em princípio da supremacia – mas, sim, em regra de prevalência -, não há harmonia do citado princípio administrativo com o sistema e muito menos adequação com a Constituição de 88, especialmente por abalar os Direito Fundamentais.

Por certo, possuir uma visão prévia, cuja preponderância do interesse público é soberana e inconteste, atrapalha sobremaneira o alcance da decisão ideal no caso concreto. Não se questionou que o Estado, em determinadas situações, possuísse vantagens – prerrogativas, na linguagem administrativa –, mas que tais vantagens sejam determinadas quando apresentadas a um fato (mundo real), não de antemão e de forma abstrata (até porque não se fala em princípio, mas em regra de prevalência). Se o ato administrativo necessita de imperatividade, autoexecutoriedade e presunção de legitimidade para possibilitar uma boa administração, que tenha tais características, mas não definidas sem análise das necessidades reais de um fato apresentado.

Ademais, a crítica se acirra quando se verifica que a postura atacada ofende sobremaneira garantias adquiridas com muito empenho histórico. Até mesmo porque nasce contaminada pelo absolutismo e autoritarismo de regimes anteriores que tratavam os cidadãos, ou melhor, os sujeitos apenas como subordinados.


REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

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SCHIER, Paulo Ricardo. Filtragem Constitucional: Construindo uma nova dogmática jurídica. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1999.


Notas

  1. MORAIS, Alexandre. Direitos Fundamentais: teoria geral, comentários aos art. 1° a 5° da Constituição Federal da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência. São Paulo: Atlas, 2000, p. 39.
  2. SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 33.
  3. JUSTEN FILHO, Marçal. Conceito de Interesse Público e a "Personificação" Direito Administrativo. Revista Trimestral de Direito Público. São Paulo: Malheiros. n° 26, p. 118.
  4. MELLO, Celso Antonio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. 15ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2002, p. 53.
  5. Ibidem, p. 57.
  6. ALESSI, Renato. Sistema Istituzionale Del Diritto Amministrativo Italiano. 2ª ed. Milão: Giuffrè, 1960, p. 197 e notas de rodapé 3 e 4. apud MELLO, Celso Antonio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. 15ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2002, p. 57.
  7. ALESSI, Renato. Institucines de Derecho Administrativo. Tomo I. Traducción dela 3ª edición italiana por Buenaventura Pellisé Prats. Barcelona: Bosch, Casa Editorial, 1970, p. 183.
  8. Ibidem, p. 185.
  9. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 33. ed. São Paulo: Malheiros Editoras, 2007. p. 103.
  10. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p.572.
  11. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Constituição dirigente e vinculação do legislador, Coimbra: Coimbra, 1994, p. 1142-1143 apud SARMENTO, Daniel. Interesses Públicos vs. Interesses Privados na Perspectiva da Teoria e da Filosofia Constitucional. In: SARMENTO, Daniel (organizador). Interesses Públicos versus Interesses Privados: Descontruindo o Princípio de Supremacia do Interesse Público. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 91.
  12. SARMENTO, Daniel. Interesses Públicos vs. Interesses Privados na Perspectiva da Teoria e da Filosofia Constitucional. In: SARMENTO, Daniel (organizador). Interesses Públicos versus Interesses Privados: Descontruindo o Princípio de Supremacia do Interesse Público. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 48.
  13. Ibidem, p. 27.
  14. HESSE, Konrad. Elementos de direito constitucional da República Federal da Alemanha. pg.38 apud SCHIER, Paulo Ricardo.Ensaios sobre a Supremacia do Interesse Público sobre o Privado e o Regime Jurídico dos Direitos Fundamentais. Disponível em: www.mundojuridico.com.br Acesso em 18.06.2008.
  15. SCHIER, Paulo Ricardo. Artigo: Ensaios sobre a Supremacia do Interesse Público sobre o Privado e o Regime Jurídico dos Direitos Fundamentais. Disponível em: www.mundojuridico.com.br Acesso em 18.jun.2008. p.1 e 2.
  16. ARAGÃO, Alexandre Santos. A "Supremacia do Interesse Público" no Advento do Estado de Direito e na Hermenêutica do Direito Contemporâneo.In: SARMENTO, Daniel (organizador). Interesses Públicos versus Interesses Privados: Descontruindo o Princípio de Supremacia do Interesse Público. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 7.
  17. SARMENTO, Daniel. A Ponderação de Interesses na Constituição Federal. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2000, p. 161.
  18. MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade. Brasília: Celso Bastos Editor, 1998, p. 32 – 33.
  19. SARMENTO, Daniel. Interesse..., p. 88.
  20. Ibidem, p. 87.
  21. Sobre a consensualidade na Administração Pública, veja-se MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Administração Pública Consensual. Mutações do Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p. 37.
  22. BINENBOJM, Gustavo. Da Supremacia do Interesse Público ao Dever de Proporcionalidade: Um novo Paradigma para o Direito Administrativo. In: SARMENTO, Daniel (organizador). Interesse Público versus Interesse Privado: Desconstruindo o Princípio de Supremacia do Interesse Público. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007. p. 165-166.
  23. TÁCITO, Caio. Evolução Histórica do Direito Administrativo. Disponível em : <htttp://www.mundojuridico.com.br/artigo/adm/03/F.PDF> Acesso em: 25 mar. 2009.
  24. BINENBOJM, op. cit., p. 119.
  25. Ibidem, p.120.
  26. OTERO, Paulo. Direito Administrativo – Relatório. Coimbra: Coimbra Editora. 2001. p. 227.
  27. BINENBOJM, op. cit., p. 123.
  28. Ibidem, p. 125.
  29. ÁVILA, Humberto Bergmann. Repensando o "Princípio da supremacia do interesse público sobre o particular". In: SARLET, Ingo Wolfgang (org.). O Direito Público em Tempos de Crise. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999. p. 102 – 103.
  30. Ibidem, p. 104.
  31. Ibidem, p. 105.
  32. ALEXY, Robert. Theorie der Grundrechte. 2 ed. Frankfurt am Main, 1994, p.80. apud ÁVILA, Humberto Bergmann. Repensando o "Princípio da supremacia do interesse público sobre o particular". In: SARLET, Ingo Wolfgang (org.). O Direito Público em Tempos de Crise. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999. p.108.
  33. ÁVILA, Humberto Bergmann. Op. Cit., p. 105.
  34. ÁVILA, Humberto Bergmann. Op. Cit., p.108.
  35. HESSE, Konrad. Grundzüge des Verfassungsrechts der Bundesrepublik Deutschaland. 20 ed. Heidelber: Müller, 1995, p.28. apud ÁVILA, Humberto Bergmann. Repensando o "Princípio da ... p.112-113.
  36. ALEXY, Robert. Theorie der Grundrechte. 2. es. Frankfurt am Main, 1994, p. 100. apud. ÁVILA, Humberto Bergmann. Op. Cit,. p. 112.
  37. MEDAUAR, Odete. O Direito Administrativo Moderno. 5. ed. São Paulo: RT, 2001. p. 153.
  38. Alexandre Santos de Aragão, Daniel Sarmento, Gustavo Binenbojm, Humberto Ávila, Paulo Ricardo Schier, dentre outros.
  39. SARMENTO, Daniel. Interesse..., p. 102.
  40. SARMENTO, Daniel. Interesse..., p. 100.
  41. Ibidem, p. 99.
  42. SCHIER, Paulo Ricardo. Filtragem Constitucional: Construindo uma nova dogmática jurídica. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1999.
Sobre o autor
Wayne Vinicius Di Francisco Rodrigues

Pós-graduando em Direito Contemporâneo do Curso do Prof. Luiz Carlos.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RODRIGUES, Wayne Vinicius Di Francisco. Desconstruindo o princípio de supremacia do interesse público.: Incompatibilidades com o sistema jurídico brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2353, 10 dez. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13992. Acesso em: 25 nov. 2024.

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