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Não incidência do ICMS na importação de produtos para o ativo fixo de empresa prestadora de serviços

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Agenda 07/01/2010 às 00:00

5. A DEFESA DO CONTRIBUINTE COM BASE NOS PRINCÍPIOS DA NÃO-CUMULATIVIDADE, DA ISONOMIA E DA VEDAÇÃO AO EFEITO CONFISCATÓRIO

Toda a Constituição da República, inclusive o sistema tributário, está estruturada com o fim de proteger os Direitos Fundamentais, principalmente o direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.

Desta forma, o tributo que não obedecer tais imperativos constitucionais são ilegais e inválidos. Nas afirmações de Torres (in SCHOUERI, 2003, p. 452) e Ichihara (in FOLMANN, 2006, p.325), os direitos garantidos como fundamentais perante a tributação aparecem como verdadeiros instrumentos de defesa dos sujeitos passivos da obrigação tributária. Sendo assim, o tributo passa a ser visto como o preço da liberdade, sendo protegido pelos direitos fundamentais que e podem ser relativizados pelo exercício do poder de tributar.

Tais direitos não podem ser mitigados em face de princípios do direito administrativo (superioridade do bem público sobre o privado) ou financeiro, devendo ser sempre observados. Sendo assim, uma das formas de defesa do contribuinte em face das arbitrariedades do Fisco está na invocação do seu bem maior, como a vida e a liberdade, em contraposição com a necessidade da arrecadação estatal.

Por isso, e considerando-se posição atual do Supremo Tribunal Federal sobre o assunto, no sentido de que não incide ICMS sobre a importação de produtos para o ativo fixo da empresa se esta for prestadora de serviços, as premissas maiores, ou seja, os princípios do direito ganham especial relevância.

Dada a visão econômica do STF, a maior tese encontrada pelos juristas para afastar a incidência do ICMS ganhou contornos essencialmente práticos e econômicos, no sentido de evocar situações de onerosidade excessiva com referido tributo, deixando assim técnica da regra-matriz da incidência de lado. Não se pode ignorar tal linha de pensamento e, portanto, ainda que sumariamente, é preciso destacar o que seria a não-cumulatividade do ICMS.

Previsto na Constituição da República no artigo 155, §2º, dispõe que o imposto não será cumulativo, ou seja, que se compensará o que for devido em cada operação relativa, via de regra, à circulação de mercadorias. Aplica-se diretamente ao Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e sobre o Imposto sobre Operações de Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS). Vale lembrar que não vem a ser a norma determinante da não-cumulatividade mero preceito, mas sim em uma diretriz obrigatória.

Na opinião de MACHADO (2007, p. 398), a não-cumulatividade "constitui um dos graves defeitos de nosso sistema tributário", uma vez que é complexo, enseja fraudes, atinge a atividade agropecuária, possui alíquotas elevadas, impede a outorga de isenções e gera atritos entre o Fisco e os contribuintes.

Infelizmente, na prática o que se verifica é que o grande número de dispositivos que tentam normatizar adequadamente esta regra são ineficientes, pois as desigualdades econômicas entre Estados e a dimensão do território brasileiro prejudicam a aplicação da não-cumulatividade.

Pode-se verificar que a essência do ICMS é, basicamente, a da sua não-cumulatividade, de modo a conferir ao contribuinte a compensação do tributo devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou Distrito Federal. Ou seja, haverá a incidência quando houver uma cadeia de contribuintes deste imposto, de forma isonômica, entre todos que estão na mesma situação jurídica.

É exatamente aí que reside a tese de defesa dos contribuintes acerca do ICMS nas importações. Isso porque, ao se exigir o pagamento do ICMS para o desembaraço aduaneiro, inexiste um terceiro mercador com quem se possa compensar o tributo pago, já que o fornecedor, localizado no exterior, v.g., não se submete a legislação brasileira.

Veja-se que o princípio da não-cumulatividade impõe o tratamento isonômico entre as partes que estão na mesma situação jurídica, já que a carga tributária deve ser uniforme dentro do cenário de contribuintes. Não é o que ocorre na presente narrativa pois, se adimplido integralmente o pagamento do ICMS, sem poder ser compensada com operação anterior (por que inexistente no caso), estar-lhe-á impondo um tratamento totalmente desigual, contrário aos ditames constitucionais.

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Decorre deste ponto o rompimento com outro significativo princípio constitucional, que é isonomia, mérito este de grande relevo em defesa dos contribuintes.

Diretamente ligada à capacidade contributiva e à igualdade, a isonomia está expressa no art. 150, inciso II da Constituição, devendo ser interpretado conforme o caso concreto, pois é impossível estabelecer todas as situações possíveis no mundo real.

Consiste na exigência de que todo contribuinte deve ser tratado igualmente a outros contribuintes que se encontrarem na mesma situação. Deve-se dar igual tratamento para situações equivalentes de capacidade contributiva. Tal princípio veda a ocorrência de discriminação tributária, que privilegiem ou favoreçam determinadas pessoas físicas ou jurídicas.

Baseando-se neste princípio, conforme afirma MACHADO (2007, p. 68), cabe ao legislador seu papel fundamental de disciplinar "as desigualdades naturais existentes entre as pessoas". Isso, obviamente, confere ao legislador um certo poder discricionário, por envolver uma análise subjetiva. Uma vez descritos padrões de diferenciação, os contribuintes que ali se enquadrarem devem ser tomados de maneira igual.

A incidência de ICMS sobre os equipamentos importados para uso exclusivo na prestação de serviços, sem oportunidade de compartilhar o valor do imposto incidente em operações anteriores, impõe uma sobrecarga injusta/inconstitucional/ilegal do tributo, com efeito confiscatório do patrimônio da empresa importadora. Nesse sentido, BASTOS e MARTINS (1990, P. 162) defendem que "todo o sistema terá que ser revisto, mas principalmente aquele tributo que, quando criado, ultrapasse o limite da capacidade contributiva do cidadão".

Como bem lembrado por MERSAN (1988, P. 55), "é difícil estabelecer um conceito do confisco mas nos parece oportuno recordar que ele pode dar-se quando se absorve a totalidade, a maior parte do capital ou da renda tributária e assim deve entender-se que é confiscatório o ato que em virtude de uma obrigação fiscal determina uma injusta transferência patrimonial do contribuinte ao Fisco, injusta em seu montante ou por falta de causa jurídica, ou finalmente porque aniquila o ativo patrimonial. Pode dizer-se que equivale à exação, com a diferença de que em lugar de ser ilegal, é inconstitucional".

Em consonância com o princípio constitucional da igualdade, o direito tributário preocupa-se com a noção de igualar proporcionalmente a carga tributária sobre os contribuintes. Oliveira (in SCHOUERI, 2006, p. 520) a define como "o atributo do contribuinte que emana e provém do conteúdo econômico necessariamente existente em todo e qualquer pressuposto de fato da obrigação tributária", isto é, todos os fatos geradores devem ter um conteúdo econômico do qual se subtrai uma parcela destinada ao erário público.

Constitucionalmente previsto no art. 145, §1º da Constituição da República, tal princípio enuncia que sempre que possível, o tributo deve levar em consideração a capacidade econômica do contribuinte, sob pena de ser considerada ilegal.

Refere-se como capacidade contributiva a aptidão dos indivíduos de arcar com o ônus tributário, com base em uma disponibilidade econômica específica, também denominada de habilitação do sujeito passivo em suportar determinada carga tributária.

Nas palavras de CASSONE (2003, p. 117), "percebe-se, assim, que o exame da infringência da capacidade contributiva envolve sérias dificuldades, por requerer apreciação objetiva e subjetiva". Para piorar, tal enunciado deve ser aplicado "sempre que possível", o que deixa uma margem bastante discricionária para o legislador elaborar os tributos.

Porém, via de regra, toda obrigação tributária deve observar este princípio, incidindo onde haja riqueza, em qualquer de suas etapas de existência, seja na aquisição, na manutenção ou no consumo.

Alinhando o princípio da proibição do efeito confiscatório dos tributos com o princípio da não-cumulatividade, pode-se observar que os mesmos se tocam e se complementam. Supondo-se que em algum momento, ou em determinada operação, o ente tributante venha a estabelecer a proibição total ou parcial do dever-poder do contribuinte de creditar-se do imposto incidente nas operações anteriores, estará ele, a um só tempo, provocando o efeito cumulativo, condutor de um aumento artificial no preço das mercadorias, produtos e serviços, em prejuízo do consumidor final.

Do mesmo modo, também estará acarretando um efeito confiscatório, porque sobre o mesmo preço está ocorrendo mais de uma incidência do mesmo imposto, a retirar de cada um dos agentes do ciclo, mais imposto do que o efetivamente devido. Assim, em nenhuma hipótese, o contribuinte poderá ser proibido de proceder aos créditos correspondentes ao imposto incidente nas operações anteriores, sob pena de provocar o efeito confiscatório, o que é vedado pela Constituição (art. 154, IV).


6. CONCLUSÃO

O Direito nunca foi e nunca será uma ciência exata e, por isso, não existe certeza sobre matéria alguma. Apesar de alguns dispositivos serem expressos, claros e inequívocos, é preciso sempre considerar aspectos econômicos, políticos e sociais. No entanto, esta premissa pode ser admitida por alguns, mas jamais pelos técnicos do direito.

Admitir imprecisões terminológicas, interpretações dissonantes de preceitos constitucionais e violações a princípios fundamentais do Direito é destruir conquistas históricas de renomados e batalhadores juristas.

Por isso, em que pese a questão da incidência do ICMS na importação de bens para o ativo fixo por prestadores de serviços se mostre consolidada sobre fundamentos econômicos, ou seja, não seria devido o referido tributo por violar preceitos como a não cumulatividade e isonomia, ainda há que se ressuscitar os critérios materiais da regra-matriz de incidência.

Quando a Constituição prevê um imposto, de competência estadual, incidente sobre "operação de circulação de mercadoria", está explícita a hipótese imponível, única e exaustiva, definidora da realização do tributo.

Desta feita, obter para si, bem oriundo do exterior, jamais se subsume às noções de circulação de mercadoria, afastando por completo a incidência do referido tributo sobre a presente narrativa. Essa é a interpretação jurídica da discussão, e que deveria prevalecer nos tribunais brasileiros.


BIBLIOGRAFIA

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BASTOS, Celso Ribeiro: MARTINS, Ives Gandra da Silva. Comentários à Constituição do Brasil. V. 6, t. I. São Paulo: Saraiva, 1990.

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SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário. Volume 1. São Paulo: Quartier Latin, 2003;


Notas

01 RE 193.817/RJ. Tribunal Pleno. DJU 10.08.2001

Sobre o autor
Kristian Rodrigo Pscheidt

Professor em Direito. Mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2014). Especialista em Teoria Geral da Norma e Interpretação pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET/SP). L.L.M em Direito de Negócios pela FMU (2014). Especialista em Direito Tributário pelo Centro Universitário Curitiba (2010) . Graduação em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (2008). Graduação em Jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (2004). Advogado no S. B. Lewis Advogados & Consultores (www.lewis.adv.br)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PSCHEIDT, Kristian Rodrigo. Não incidência do ICMS na importação de produtos para o ativo fixo de empresa prestadora de serviços. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2381, 7 jan. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14056. Acesso em: 22 nov. 2024.

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