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O princípio da boa-fé processual e a ineficácia prática da multa por litigância de má-fé

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Agenda 08/11/2010 às 12:39

A cominação de multa de até 1% sobre o valor da causa, para os casos de litigância de má-fé, não guarda proporcionalidade com as inúmeras condutas possíveis.

Resumo: O princípio da boa fé processual, vertente objetiva da boa fé, é aquele que impõe um comportamento leal, ético, de acordo com a boa-fé, em nada se relacionando com a intenção do sujeito do processo (boa fé subjetiva). É norma impositiva de condutas em conformidade com a boa-fé objetivamente considerada, sem se perquirir acerca das más ou boas intenções. Considerando que o mencionado princípio atua através de uma cláusula geral da boa-fé, não demandando rol taxativo, e sim exemplificativo, a cominação de multa de até 1% sobre o valor da causa, para os casos de litigância de má-fé, não guarda proporcionalidade com as inúmeras condutas possíveis e contrárias à boa-fé. Destarte, não cumpre a norma do art. 18, caput, do CPC as suas funções punitiva e inibitória, não tendo, portanto, eficácia prática perante nosso ordenamento jurídico, revelando a necessidade de uma alteração legislativa, no sentido de conferir maiores poderes ao magistrado para que este possa fazer respeitar o aludido princípio.

Palavras-chave: Boa fé processual; litigância de má fé; irrisoriedade da multa.

Sumário: 1. Introdução. 2. Fundamentação teórica. 3. Conclusão. Referências.


1. INTRODUÇÃO

A ineficácia prática da multa cominada para os casos de litigância de má-fé é a principal problemática a ser tratada neste artigo. Com efeito, diante do princípio da boa-fé processual, que deve permear todo o desenrolar do processo, a cominação de penalidade irrisória, para os casos de litigância de má-fé, retira a própria eficácia prática da norma punitiva, que fica sem poder intimidante apto a fazer valer o festejado princípio.

Considerando que o princípio da boa-fé processual atua através de uma cláusula geral da boa-fé, não demandando rol taxativo, e sim exemplificativo, a cominação de multa de até 1% sobre o valor da causa, para os casos de litigância de má-fé, não guarda proporcionalidade com as inúmeras condutas possíveis e contrárias à boa-fé. Destarte, não cumpre a norma do art. 18, caput, do CPC as suas funções punitiva e inibitória, não tendo, portanto, eficácia prática perante nosso ordenamento jurídico.

A escolha desse tema justifica-se porque, na sua atividade como Juiz de Direito, o presente subscritor depara-se constantemente com demandas em que as partes, visando obter proveitos ilícitos, tentam "literalmente" enganar o magistrado, agindo diretamente contra o mencionado princípio. Em tais casos, é inquietante a idéia de a parte, praticamente, sair impune, uma vez a ínfima multa cominada em lei.

O princípio da boa-fé processual, por atuar, como já dito, através de uma cláusula geral da boa-fé, não esgota as possibilidades de condutas contrárias ao mesmo, necessitando, portanto, a apreciação do caso concreto. Identificando o magistrado uma conduta agressora de tal princípio, deve aplicar com rigor a penalidade. Ocorre que, mesmo que o julgador aja com o máximo rigor, aplicando o teto da multa prevista (1% do valor da causa) aos casos de litigância de má-fé, ainda assim não vai ser suficiente para punir e, nem tampouco, inibir o infrator a agir de forma semelhante no futuro.

É preciso um maior rigor na punição de tais casos, não só a fim de conceder aplicabilidade ao princípio em comento, como também para imprimir maior respeito ao Poder Judiciário. Nesse sentido, há de se perscrutar sobre a margem de opção do magistrado para os casos em que se observe a quebra do mencionado princípio, sobrelevando a necessidade de atribuir ao Estado Juiz um maior leque de atuação, não se limitando a, apenas, aplicação de multa.


2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

O princípio da boa-fé processual é aquele que determina que todos os sujeitos do processo devem se comportar de acordo com a boa-fé objetiva, entendida esta como norma de conduta. Tal princípio é extraído do art. 14, II, do CPC: "São deveres das partes e de todos aqueles que de qualquer forma participam do processo: (...) II - proceder com lealdade e boa-fé".

A boa-fé pode ser dividida em objetiva e subjetiva. A primeira diz respeito à norma, isto é, é a norma que impõe um comportamento leal, ético, de acordo com a boa-fé. Já a segunda diz respeito a fato, a um estado de consciência, opondo-se a má-fé. É no primeiro contexto que se insere o princípio da boa-fé processual, que, como visto, vem delineado pelo inciso II do art. 14 do CPC. Tal dispositivo legal em nada se relaciona com a boa-fé subjetiva (a intenção do sujeito do processo). Ao revés, é norma impositiva de condutas em conformidade com a boa-fé objetivamente considerada, sem se perquirir acerca das más ou boas intenções.

Alcança não só as partes, mas todos aqueles que de qualquer forma participam do processo, inclusive o próprio magistrado.

Brunela Vieira de Vincenzi sustenta que a boa-fé e seus princípios derivados são aplicáveis ao processo civil por força de um processo evolutivo na sociedade – o direito, como mutável e dinâmico que é, com base nos influxos sociais, busca outros modos de pacificação com justiça. E completa:

"A transformação da sociedade, os novos conflitos verificados, a complexidade dos direitos e de seus titulares, os valores tutelados são fatores que demonstram a mudança de paradigma; uma mudança de paradigma é uma mudança de pressupostos básicos do campo de conhecimento, uma mudança nas regras do jogo, um novo conjunto de regras. (...) Uma mudança de paradigma é uma revolução. (...) Em outras palavras, surgem novos conflitos que já não podem ser solucionados com o modelo antigo. (...) O Direito, então, como um sistema de segunda ordem, inegavelmente, recebe influxos da sociedade (input), que exige a eficaz pacificação dos conflitos verificados no sistema social. A regra da boa fé objetiva, por seu turno, vem estabelecer e definir novos limites para o exercício dos direitos" [01].

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A consagração do princípio da boa-fé processual foi resultado de uma expansão da exigência de boa-fé do direito privado ao direito público. A jurisprudência alemã entendeu aplicável o § 242 do Código Civil alemão (cláusula geral de boa-fé) também ao direito processual civil e penal. De um modo geral, a doutrina seguiu o mesmo caminho. Na verdade, a boa-fé objetiva expandiu-se para todos os ramos do Direito, mesmo os "não civis" [02] .

Nesse sentido é o escólio de Aldemiro Rezende Dantas Júnior [03], para quem

"também no campo do direito processual se viu a escalada da aceitação da boa-fé objetiva, o que também é fácil de se compreender, uma vez que o processo não tem um fim em si mesmo, servindo como instrumento para o direito material, e por essa razão tende a refletir, ainda que o faça de modo esmaecido, algumas características deste. Logo, no processo civil, não poderia deixar de ser, repercutiram as influências da boa-fé sobre o direito privado".

A boa-fé objetiva pós-constitucional caracteriza-se como uma nova forma de solucionar conflitos em sede de direito processual civil, emergindo como um novo e eficaz instrumento delimitador dos direitos e vinculador do Juiz a um pronunciamento concreto, consoante leciona Humberto Theodoro Júnior [04]:

"Em nome da lealdade e da boa fé, deverá o juiz impedir genericamente a fraude processual, a colusão e qualquer conduta antiética e procrastinatória. Não há uma tipicidade para as infrações morais Tal como preconiza o Código Processual Modelo Iberoamericano, os atos processuais, dentro de uma cláusula geral, "deberán ser lícitos, pertinentes e útiles. Habrán de ser realizados com veracidad y buena fé y tener por causa um interés legítimo".

E ainda Aldemiro Rezende Dantas Júnior [05]:

"(...) E veja-se que nem poderia ser diferente, pois o direito de ação, embora a afirmação soe um tanto quanto acaciana, nada mais é do que um direito subjetivo, e como tal, também encontra limites, uma vez que é deferido ao seu titular para que cumpra determinadas finalidades, ou seja, para que desempenhe uma determinada função. Logo, como todo e qualquer direito subjetivo, o direito de ação não é ilimitado, e ao ser exercido deve obedecer aos limites que lhes são inerentes, dentre os quais se destaca a boa fé".

Tal princípio atua mediante a utilização da cláusula geral da boa-fé, não demandando rol taxativo e sim exemplificativo, haja vista o extenso e imprevisível leque de situações que podem surgir durante o tramitar de um processo.

"Daí ser correta a opção da legislação brasileira por uma norma geral que impõe o comportamento de acordo com a boa-fé. Em verdade, não seria necessária qualquer enumeração das condutas desleais: o inciso II do art. 14 do CPC é bastante, exatamente por tratar-se de uma cláusula geral" [06].

No mesmo sentido ensina Cândido Rangel Dinamarco [07]:

"Inversamente, constituem litigância de má-fé os atos infratores dos deveres diretamente arrolados no art. 14, ainda quando não constantes do elenco de infrações contido nos incisos do art. 17. Eventuais lacunas são só aparentes, porque a norma de encerramento contida no inc. II do art. 14 manda que todos procedam com lealdade e boa-fé, reputando-se litigância abusiva eventuais condutas sem lealdade ou sem boa-fé, ainda quando especificadas em tipos legais bem precisos".

Assim, podemos concluir que, frente à cláusula geral da boa-fé objetiva, as condutas delineadas no art. 17 são apenas exemplificativas, não esgotando o rol de atitudes desleais, imbuídas de má-fé.

Fincadas tais premissas, passamos, então, a comentar as conseqüências dos atos praticados contra o princípio da boa-fé processual, dando enfoque àqueles cometidos pelas partes.

Pedimos vênia para transcrever o art. 18, caput, e parágrafos do CPC, eis que imprescindível para uma melhor compreensão do quanto exposto:

Art. 18. O juiz ou tribunal, de ofício ou a requerimento, condenará o litigante de má-fé a pagar multa não excedente a um por cento sobre o valor da causa e a indenizar a parte contrária dos prejuízos que esta sofreu, mais os honorários advocatícios e todas as despesas que efetuou.

§ 1º Quando forem dois ou mais os litigantes de má-fé, o juiz condenará cada um na proporção do seu respectivo interesse na causa, ou solidariamente aqueles que se coligaram para lesar a parte contrária.

§ 2º O valor da indenização será desde logo fixado pelo juiz, em quantia não superior a 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa, ou liquidado por arbitramento.

Note-se que, em caso de conduta contrária ao festejado princípio, isto é, em caso de litigância de má-fé, o juiz e o tribunal ficam vinculados ao teto máximo de multa de 1% sobre o valor da causa, sem prejuízo da indenização em favor da parte contrária, relativa aos prejuízos que tenha sofrido, mais honorários advocatícios e outras despesas que, porventura, tenha feito.

Pois bem, atuando como magistrado de 1º grau, a prática tem nos revelado que a cominação legal de tais penalidades não impõem medo naquele que visa agir de má-fé, não sendo suficientes para demovê-lo de tal idéia. Se ele realmente estiver disposto àquele ato contrário à boa-fé processual, irá fazê-lo, sem temer a multa irrisória prevista no art. 18, caput, do CPC, e nem tampouco a aludida indenização. No que toca a esta última, ante a sua existência condicionada a prejuízos à parte contrária, deixaremos de abordá-la neste trabalho, que será direcionado apenas para a referida multa.

Citemos dois exemplos que demonstram o quanto exposto, ressalvando, desde já, que são inúmeras as hipóteses de quebra desse princípio:

1) a parte, ao ajuizar determinada ação, valora a causa intencionalmente em valor ínfimo, muito inferior ao seu proveito econômico vindicado, em total descompasso com o art. 259, do CPC. Tal atitude, em verdade, reflete o intuito de pagar a menor as custas processuais correspondentes, num flagrante desrespeito ao princípio da boa-fé objetiva. Nesses casos, pelo fato de o requerido não ter ainda sido citado (não havendo, portanto, que se falar na indenização prevista na parte final do art. 18, caput, do CPC), a parte autora sabe que o máximo que poderá lhe acontecer, além de complementar as custas (caso o Juiz determine de ofício ou caso eventual incidente de impugnação ao valor da causa - art. 261, do CPC - seja julgado procedente) é ser condenada em até 1% do valor da causa, nos termos do art. 18, caput, do CPC (hipótese rara), o que, ante a irrisoriedade da mesma, não é capaz de demovê-la da idéia de tentar recolher a menor as mencionadas custas. É o chamado "jogar o barro na parede para ver se cola", expediente, infelizmente, muito utilizado no mundo forense. Na prática, a parte apenas, e se determinada a tanto pelo Juiz, retifica o valor da causa, complementando as custas, sem nem sequer ser condenada na litigância de má-fé, pois, no mais das vezes, alega erro escusável ao valorar a causa.

O Juiz tem que ter extremo cuidado ao analisar o valor atribuído a uma causa, pois, caso não se aperceba de tal vício (e não haja impugnação da parte contrária), estará chancelando evidente quebra do princípio da boa-fé processual (além de homologar um recolhimento a menor aos cofres públicos), ferindo, ademais, outro princípio de matiz constitucional, o da igualdade, haja vista que quem valorou corretamente sua causa e recolheu regularmente as custas estará sendo tratado de forma igual aos que não o fizeram.

Isso acontece muito em ações indenizatórias, em que, apesar de a parte quantificar na causa de pedir e no pedido o valor dos danos, atribuindo-os, por exemplo, em R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais), atribui à causa o valor de R$ 1.000,00 (um mil reais), "apenas para efeitos fiscais". Ora, se teve condições de visualizar o montante dos danos desde já, o caso não é mais de pedido genérico (art. 286, II ou III, do CPC), devendo, destarte, atribuir corretamente o valor da causa com o total dos danos alegados no corpo da petição inicial.

2) ao ajuizar uma ação, determinada pessoa, detentora de alto padrão econômico, requer o benefício da assistência judiciária gratuita (art. 3º, da Lei 1.060/50), afirmando não possuir condições de arcar com as custas processuais e os honorários advocatícios, sem prejuízo próprio ou de sua família, situação bastante corriqueira no mundo jurídico. Deixando de lado a discussão doutrinária e jurisprudencial acerca da necessidade, ou não, da comprovação da hipossuficiência para o deferimento do benefício, suponhamos que o Juiz determine que a parte, no prazo de 10 (dez) dias, comprove sua renda e despesas mensais, assim como junte sua última declaração do Imposto de Renda. No prazo concedido, vem a parte requerente e, com o nítido propósito de ludibriar o Juiz, não junta a declaração do IR, acostando apenas comprovantes de despesas e tão somente um de seus comprovantes de renda (sendo que, caso juntasse todos, sua hipossuficiência restaria afastada), não fazendo menção aos outros. Ora, nesse exemplo, o autor feriu de morte o princípio em comento, vez que agiu imbuído de má-fé, de forma desleal, objetivando enganar o Estado-Juiz a fim de se locupletar de um benefício a que não faz jus.

Pergunta-se: o autor teve receio em agir dessa forma? Não temos dúvida em afirmar que não. Para ele, vale mais a pena tentar não pagar as custas processuais do que, caso assim seja determinado, pagá-las e, excepcionalmente, ser condenado em irrisório 1% do valor da causa. Nesse exemplo, vamos mais longe ainda: nem mesmo o art. 4º, §1º, da Lei 1.060/50 ("presume-se pobre, até prova em contrário, quem afirmar essa condição nos termos desta Lei, sob pena de pagamento até o décuplo das custas judiciais") é capaz de inibir a parte de agir com má-fé, conforme se tem percebido ao longo do tempo.

Nesses dois exemplos citados, bastante costumeiros na seara cível (sem prejuízo de inúmeros outros vistos na prática e citados em doutrina), entendemos ficar bastante explícita a quebra do princípio da boa-fé processual objetiva, motivo pelo qual sustentamos a ineficácia prática intimidante da multa do art. 18, caput, do CPC, que deveria ser cominada em valor muito maior, sem prejuízo de outras sanções, de forma a coibir aqueles imbuídos de má-fé a agirem de tal forma. Como está atualmente, não temos dúvida, será mais atraente à parte agir como pretende, mesmo correndo o risco de lhe ser aplicada a multa, levando-se em consideração o seu valor ínfimo e irrisório.

Para tanto, é mister uma alteração legislativa no mencionado dispositivo legal, aumentando o seu teto de aplicação e conferindo outras possibilidades ao julgador. Ora, de nada adianta o legislador penalizar aqueles que agem contra a boa-fé objetiva, se tal penalidade não os alcança em sua parte mais sensível: o bolso! É fato público e notório no Brasil que o cidadão só passa a respeitar as decisões judiciais quando, ainda que indiretamente, elas possam afetar o seu patrimônio.

Nesse sentido, já houve até uma tentativa legislativa, através do Projeto de Lei Federal 4198, de 08 de março de 2001, de autoria do Deputado Federal Alberto Fraga (PMDB-DF), que aumentava o teto da multa para até 10% (dez por cento) do valor da causa. Esse projeto recebeu parecer favorável da Câmara de Constituição e Justiça, tendo o relator Luiz Antônio Fleury (PTB-SP) apresentado um substitutivo no sentido de impor, também, um limite mínimo de 5 % (cinco por cento), variando, assim, a multa entre 5 % a 10% do valor da causa. Infelizmente o mencionado projeto foi arquivado pela Câmara dos Deputados, nos termos art. 105, de seu Regimento Interno, isto é, por falta de interesse dos Deputados na matéria. Afirmamos isso, pois, ao analisar o mencionado dispositivo do RICD (Regimento Interno da Câmara dos Deputados), verifica-se que o mesmo trata de matérias que não chegaram a ter seu mérito votado, tendo sido alcançadas pelo decurso do tempo sem votação.

Eis a redação do art. 105, do RICD:

Art. 105. Finda a legislatura, arquivar-se-ão todas as proposições que no seu decurso tenham sido submetidas à deliberação da Câmara e ainda se encontrem em tramitação, bem como as que abram crédito suplementar, com pareceres ou sem eles, salvo as:

I - com pareceres favoráveis de todas as Comissões;

II - já aprovadas em turno único, em primeiro ou segundo turno;

III - que tenham tramitado pelo Senado, ou dele originárias;

IV - de iniciativa popular;

V - de iniciativa de outro Poder ou do Procurador-Geral da República.

Parágrafo único. A proposição poderá ser desarquivada mediante requerimento do Autor, ou Autores, dentro dos primeiros cento e oitenta dias da primeira sessão legislativa ordinária da legislatura subseqüente, retomando a tramitação desde o estágio em que se encontrava.

Como se vê, o projeto sequer chegou à ir para votação em plenário, tendo sido arquivado em 31 de janeiro de 2007, conforme informações colhidas no site da Câmara dos Deputados (<www.camara.gov.br/Sileg/Prop_Detalhe.asp?id=92845>).

Apesar da relevância do aludido PL 4198/2001, entendemos que ele, mesmo aprovado, não seria suficiente para o que propomos, haja vista que 10% sobre o valor da causa ainda não inibe o mal intencionado.

O projeto do Novo Código de Processo Civil (Projeto de Lei do Senado nº 166, de 2010) perdeu a oportunidade de consertar tal irrisoriedade, haja vista estipular multa com teto de até 2% do valor da causa, alçada que continua sendo insuficiente para o fim a que se destina. Eis a redação provisória do art. 70 do mencionado projeto:

Art. 70. O juiz ou o tribunal, de ofício ou a requerimento, condenará o litigante de má fé a pagar multa não excedente a dois por cento sobre o valor da causa e a indenizar a parte contrária dos prejuízos que esta sofreu, além de honorários advocatícios e de todas as despesas que efetuou.

Na verdade, o Juiz não deveria ficar vinculado a limite algum, e nem tampouco a, apenas, multa.

É mister uma alteração legislativa, no sentido de conferir ao magistrado maiores poderes de atuação em casos de tal jaez, autorizando-o, por exemplo, a utilizar-se do mesmo mecanismo previsto no art. 461, § 5º, do CPC, que faculta a ele, a fim de efetivação da tutela específica ou da obtenção do resultado prático equivalente, a tomada das medidas necessárias.

Destarte, sem embargos de outras (o rol é apenas exemplificativo), o magistrado poderia impor ao litigante de má-fé multa (sem limite prefixado), busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras etc. Aos que entendem que tal medida é concentrar poderes demais nas mãos do Juiz, ressaltamos que foram essas medidas (dentre outras inseridas numa teoria do direito contemporâneo) que conferiram maior celeridade à tutela jurisdicional e ao processo, entendido este como instrumento do direito material, sem um fim em si mesmo. A multa, por exemplo, e a critério do magistrado, pode ser modificada em seu valor ou periodicidade, caso se constate a sua insuficiência ou excesso (art. 461, § 6º, do CPC), o que reflete o dever irrogado ao Estado-Juiz de agir ponderadamente, respeitando o princípio da proporcionalidade.

Sobre o autor
José Marcelo Barreto Pimenta

Juiz de Direito no Estado de Sergipe. Mestrando em Direito Público pela Universidade Federal da Bahia - UFBA

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PIMENTA, José Marcelo Barreto. O princípio da boa-fé processual e a ineficácia prática da multa por litigância de má-fé. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2686, 8 nov. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17782. Acesso em: 23 dez. 2024.

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