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Enfoques sobre a nova sentença e as formas de cumpri-la

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Agenda 23/12/2010 às 17:06

3. Anotações sobre a nova sistemática

3.1. A nova sistemática do cumprimento de sentenças

Tendo visto quais são as regras de competência, quais as hipóteses merecedoras do novato tratamento para conferir efetividade às sentenças, e quais as sentenças sujeitas à liquidação, vamos ao tema conclusivo do presente estudo.

Nos casos descritos no tópico 2 do Capítulo II, o cumprimento da sentença ocorrerá no mesmo processo em que esta foi proferida, porém em módulo distinto.

Não sendo um processo autônomo, o demandado não será citado, mas intimado pessoalmente, com despacho proferido de ofício, tão logo ocorra, ou o trânsito em julgado, ou tenha sido recebido recurso carente de efeito suspensivo para o adimplemento da condenação, seguindo a regra da parte final do artigo 262 do Código de Processo Civil, que prevê o desenvolvimento do processo por impulso oficial, combinada com o artigo 235 do mesmo diploma legal, que estabelece que as intimações dar-se-ão de ofício. Há divergências doutrinárias no que tange a quem deve ser feita a intimação: se ao condenado ou ao seu advogado. Analisaremos a matéria mais atentamente quando trataremos da sentença que condena a adimplir obrigação pecuniária.

Em relação ao impulso judicial, o tema merece um breve parêntese, pois está diretamente relacionado ao fato de que o Estado não se limita mais em apenas dizer o direito, deixando à parte a tarefa de dar-lhe continuidade, se o quiser. Assume o Estado, neste sentido, as rédeas do cumprimento, já que pode o juiz, inclusive, determinar medidas adequadas ao caso concreto, mesmo que não expressas na lei e nem no pedido imediato do autor, como no caso da tutela específica de que trata o artigo 461 do Código de Processo Civil.

Retornando ao tema, cabe esclarecer de antemão que pode a sentença, enlaçada necessariamente ao pedido, como já vimos, condenar a:

a) fazer ou abster;

b) entregar coisa certa;

c) entregar coisa incerta;

d) adimplir obrigação pecuniária.

3.1.1. A condenação a fazer ou abster

A principal questão a ser esclarecida desde logo é o fato de não ser objeto da sentença a prestação em si, mas o bem que advém dela. Em outras palavras, é o resultado prático oriundo da obrigação o real objeto da sentença. Dessa forma, pela nova regra do § 2º do artigo 461 do Código de Processo Civil, a conversão em perdas e danos tornou-se totalmente excepcional, só ocorrendo no caso de impossibilidade de tutela específica, de obtenção de resultado prático equivalente, ou, ainda, se o credor assim o desejar. Em outras palavras, o novo sistema não busca mais, de forma primordial, o cumprimento da obrigação pelo devedor: busca sim, primordialmente, o resultado. Busca-se a obrigação adimplida, não importando mais se pelo devedor ou por outrem, pois dá-se ênfase na satisfação do credor, que busca obter, na sentença procedente, resultado coincidente ao originalmente pleiteado.

Na sentença, pode o juiz, de oficio ou a requerimento da parte, determinar prazo para que o condenado cumpra a obrigação, findo o qual poderá incidir a multa, de que falamos no ponto 2.2 do Capítulo II, ou qualquer outra medida prevista nos parágrafos 4º e 5º do artigo recém citado. A respeito, convém esclarecer que a multa não conserva relação com o conteúdo econômico da obrigação, mas deve ser imposta em medida razoável, suficiente para pressionar psicologicamente o condenado a cumprir voluntariamente a obrigação, satisfazendo assim a pretensão do credor. Ainda em relação à multa, cumpre observar que deverá ser periódica, podendo ser alterada de ofício, nos termos do § 6º do artigo 461. Por óbvio a alteração não operará retroativamente.

Em sendo continuação do mesmo processo, o recurso cabível de tal decisão não serão os embargos: o demandado deverá defender-se em impugnação, através de simples petição, nos moldes do artigo 475-L do Código de Processo Civil.

Em relação à sentença que impõe obrigação de emitir declaração de vontade, muito embora grande parte da doutrina entenda que esta não seja nada além de uma sentença que impõe um "fazer" (por exemplo, a sentença que impõe o cumprimento de um contrato preliminar), entendemos ser este caso, na verdade, mais afeto às sentenças constitutivas, não condenatórias, posto que o pedido mediato é justamente a constituição de um novo status jurídico, podendo o juiz, em sentença, substituir a declaração de vontade não emitida pelo inadimplente. De fato, tal sentença, levada ao Cartório, produzirá os mesmos efeitos da declaração, não sendo necessário nenhum ato jurisdicional posterior. Não haverá que se falar, aqui, em multa ou em qualquer outra astreinte, sendo que, conforme dispõe o artigo 464 do Código Civil, pode conferir o juiz caráter definitivo ao contrato preliminar.

3.1.2. A condenação a entregar coisa certa

Na sentença, também aqui, pode o juiz, de oficio ou a requerimento da parte, determinar prazo para que o condenado cumpra a obrigação, findo o qual poderá incidir a multa do artigo 475-J. As considerações que fizemos sobre as astreintes no tópico anterior, servem também neste caso, com uma única particularidade: encerrado o prazo para que o condenado entregue a coisa, além de fazer incidir multa, também fará com que o juiz possa, de ofício ou não, expedir mandado de busca e apreensão (em tratando-se de entrega de bem móvel) ou imissão na posse (em tratando-se de entrega de bem imóvel)

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Da mesma forma que ocorre na sentença tratada no tópico anterior, em sendo continuação do mesmo processo, o recurso cabível será a impugnação, através de simples petição, nos moldes do artigo 475-L do Código de Processo Civil.

3.1.3. A condenação a entregar coisa incerta

Cabe aqui tudo o que foi dito no tópico 1.2 desta terceira parte, pois, após a escolha da coisa, o caso será tratado como se de entrega de coisa certa fosse. Vejamos, porém, como e quando tal escolha ocorrerá.

Quando o título não disser a quem incumbe a determinação da coisa, esta caberá, de acordo com o artigo 244 do Código Civil, ao devedor. Pode, contudo caber ao credor, se assim estiver determinado no título. Neste caso, segundo o artigo 461-A § 1º do Código Processual, o credor deverá individualizá-la na exordial, enquanto que, se couber ao devedor, este a individualizará no prazo fixado pelo juiz.

A exordial de que trata o artigo é a petição inicial do módulo processual de conhecimento, não do módulo de cumprimento de sentença. Para reforçar esta afirmação, remetemos à leitura do artigo 629 do Código de Processo Civil, que, em relação a escolha estabelece que "se essa couber ao credor, este a indicará na petição inicial". Disso decorre que, se o devedor não concordar com a escolha do credor, deverá fazê-lo, desde logo, na contestação, sob pena de preclusão.

Se, no entanto, o credor, na inicial, não exercer seu direito de escolha, tal direito passará ao devedor, que o exercerá apenas no módulo de cumprimento. Se este, o devedor, não exercer tal direito no prazo fixado pelo juiz, então, novamente, voltará a ser do credor.

Em qualquer caso, havendo divergência quanto à escolha do outro, poderá decidir o juiz, auxiliado, se o quiser, por perito de sua nomeação (artigo 630 do Código de Processo Civil).

3.1.4. A condenação ao adimplemento de obrigação pecuniária.

A redação do artigo 475-J do Código de Processo Civil determina que, caso o devedor condenado a pagar quantia certa, não o faça voluntariamente, no prazo de 15 dias, o montante atualizado da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor, poderá ser expedido mandado de penhora e avaliação, podendo o exeqüente, desde logo, indicar os bens que quer ver penhorados. Poderá o demandado, em nome do Princípio do Menor Sacrifício (art. 475-R c.c. 620 e 668, todos do Código de Processo Civil) requerer a substituição dos bens, desde que apresente outros, capazes de garantir materialmente o êxito dos atos executórios.

Caso o condenado efetue voluntariamente um pagamento parcial, a norma é clara em estabelecer que a multa recairá apenas sobre o saldo (§ 4º do artigo 475-J).

Note-se que o que depende de requerimento da parte é a expedição do mandado de penhora e avaliação, enquanto a intimação, como já foi defendido no tópico 1 deste Capítulo, deve seguir a regra do impulso oficial.

Anteriormente já acenamos ao fato de existir embate doutrinário sobre o termo a quo do referido prazo quinzenal, além da discordância em relação a pessoa que deverá ser intimada. A respeito, é útil citar as principais correntes: Para Athos Gusmão Carneiro (2007, p. 85) o termo inicial é o momento em que a decisão condenatória torna-se exeqüível, automaticamente, sem necessidade de intimação nem do condenado nem de seu advogado. No mesmo sentido, Humberto Theodoro Jr. (2006b, p.63) afirma que o prazo fluirá "a partir do momento em que a sentença se torna exeqüível". Já para Scarpinella Bueno (2006, p.90), não basta a geração de efeitos, sendo necessário que ocorra a intimação. Ernane Fidélis dos Santos (2006, p. 54) diz que, além de ter ocorrido o trânsito em julgado é necessária a intimação na pessoa do advogado da parte. Por fim, Luis Rodrigues Wambier (2006, p.1) afirma que tal intimação deve ser pessoal e que, só então o prazo começará a fluir. Para que conste, ultimamente, o Superior Tribunal de Justiça, decidindo o Recurso Especial nº 954.859/RS, adotou posição idêntica à do ilustre Humberto Theodoro Júnior, acompanhado por Athos Gusmão Carneiro. O Relator do Acórdão, Ministro Humberto Gomes de Barros, em seu voto, argumentou que:

"a Lei não explicitou o termo inicial da contagem do prazo de quinze dias. Nem precisava fazê-lo. Tal prazo, evidentemente, inicia-se com a intimação. O Art. 475-J não previu, também, a intimação pessoal do devedor para cumprir a sentença. A intimação - dirigida ao advogado - foi prevista no § 1º do Art. 475-J do CPC, relativamente ao auto de penhora e avaliação. Nesse momento, não pode haver dúvidas, a multa de 10% já incidiu (se foi necessário penhorar, não houve o cumprimento espontâneo da obrigação em quinze dias). (...) O termo inicial dos quinze dias previstos no Art. 475-J do CPC, deve ser o trânsito em julgado da sentença. Passado o prazo da lei, independente de nova intimação do advogado ou da parte para cumprir a obrigação, incide a multa de 10% sobre o valor da condenação. Se o credor precisar pedir ao juízo o cumprimento da sentença, já apresentará o cálculo, acrescido da multa."

Data vênia, nos atrevemos a discordar, pois a obrigação de pagar, tornada certa pelo trânsito em julgado, é personalíssima e, portanto, exige intimação na pessoa do próprio condenado, para que tome conhecimento desse fato e possa, em querendo, cumprir voluntariamente a obrigação. Caso contrário, estaremos desobedecendo a explícita regra do artigo 234 do Código Processual, além de desrespeitar o direito de informação dos atos processuais e, por tabela, o princípio do contraditório. Tolhido o contraditório abala-se a própria estrutura do devido processo legal. Desmoronando este, o que resta? Assim, por mais que a lei seja silente em relação ao termo inicial, cremos que o bom senso levará a decisões futuras mais acertadas, pois, menos mal, a presente decisão não vincula qualquer Juiz ou Tribunal sobre a polêmica questão, sendo apenas a indicação de uma tendência.

Pois bem, decorridos os 15 dias cujo termo inicial ainda não está assentado, em subsistindo dívida não quitada, poderá então o credor manifestar seu requerimento de penhora. Se o exeqüente não se manifestar em seis meses a partir do trânsito em julgado da sentença, os autos serão arquivados. Nada impede, contudo, seu desarquivamento após aquele prazo.

A penhora não será feita por mandado, mas por termo nos autos, em apenas dois casos: quando houver, nos autos, a indicação de um imóvel com certidão de matrícula, ou quando o bem penhorado tiver sido indicado pelo demandado.

A avaliação dos bens, pouco importando por qual modalidade foi realizada a penhora, será realizada juntamente com ela, por Oficial de Justiça ou, no caso da avaliação requerer conhecimentos específicos, por Avaliador nomeado pelo juiz.

O devedor será intimado da penhora e da avaliação na pessoa de seu advogado constituído, através de publicação no Diário Oficial. Onde não houver tal expediente, a intimação será feita por via postal, ou através de oficial de justiça, pessoalmente ao condenado ou ao representante legal. Quando nenhuma destas tentativas de intimação for eficaz, proceder-se-á à intimação por edital.

Se houver discordância por parte do executado em relação à avaliação, este poderá, nos termos do inciso III do artigo 475-L, utilizar-se da impugnação, respeitado o prazo de 15 dias, cujo termo a quo dependerá de como foi realizada a intimação da penhora, de acordo com as regras dos artigos 240 e 241 do Código de Processo Civil. Quanto ao prazo quinzenal, há ainda que se ressaltar que este correrá em dobro na hipótese de litisconsórcio passivo, em havendo constituição de advogados diversos pelos litisconsortes.

Alguns juristas, entre eles Araken de Assis (2006, p. 314), acreditam que a impugnação não é um incidente processual, mas ação autônoma, enquanto outros, como Ernane Fidélis dos Santos (2006, p. 60) e Alexandre Freitas Câmara (2006, p. 125), lhe atribuem natureza incidental. Damos razão a estes últimos citados pelo simples fato que seria um paradoxo considerar autônomo um procedimento interno ao sincrético. Se assim fosse, de nada ou de muito pouca valia teriam sido as reformas feitas até aqui.

As demais matérias alegáveis na impugnação, além do citado inconformismo com a avaliação ou penhora, vêm insculpidas nos remanescentes incisos do artigo 475-L.

A impugnação, em regra, não possui efeito suspensivo, de acordo com o artigo 475-M do Código de Processo Civil, caso em que se processará em autos apartados, podendo contudo, o juiz atribuir-lhe tal efeito (e processá-la, portanto, nos próprios autos, de acordo com seu § 2º) nos casos que apresentem condições análogas 28 ao fumus boni iuris e periculum in mora. Araken de Assis (2006, p. 139) e Alexandre Freitas Câmara (2006, p. 133) militam no sentido do efeito suspensivo poder ser concedido ex officio. Ernane Fidélis dos Santos (2006, p. 82) é contrário a esse posicionamento. De nossa parte, até consideramos admissível o efeito suspensivo concedido de oficio, por ter tal impugnação uma natureza cautelar, mas não vemos utilidade nessa concessão oficiosa, já que há oportunidade para o próprio demandado, se assim o desejar, requerê-la.

De toda forma, se concedido o efeito suspensivo, o credor poderá insistir na execução, desde que preste caução, cujo valor será fixado pelo juiz.

Pois bem, recebida a impugnação, o exeqüente deverá ser ouvido no prazo fixado. Se o juiz não fixar nenhum prazo, este será de 5 dias, conforme a regra geral do artigo 185 do Código de Processo Civil. Ouvido o exeqüente, o juiz determinará, se necessário, produção de provas e, caso haja prova oral a ser colhida, designará audiência para tal fim. Ato contínuo, decidirá a impugnação.

Decidindo pela extinção do módulo de cumprimento, tal ato terá natureza de sentença e será, portanto, apelável. No entanto, se a decisão não fizer extinguir o módulo, não terá índole de sentença, mas de decisão interlocutória: o recurso cabível será o agravo de instrumento, de acordo com o § 3º do artigo 475-M do Código de Processo Civil.

Em não havendo impugnação, ou, decidida esta, o artigo 475-R estabelece que serão aplicadas, doravante, no que couber, as regras que regem a execução de título extrajudicial, ou seja, será levado o bem penhorado à hasta pública, a ser realizada nos termos dos artigos 686 a 707 do Código de Processo Civil, efetuando-se, posteriormente, o pagamento ao exeqüente, através da entrega de dinheiro, adjudicação ou conferindo-lhe usufruto do imóvel ou empresa, nos moldes dos artigos 708 a 729 do mesmo diploma legal. Pode aqui, novamente, o executado utilizar-se do expediente da impugnação, questionando a expropriação do bem. Resolvida esta última questão, finalmente o módulo processual de cumprimento sincrético da sentença condenatória, através de atos executórios, findará, por derradeira sentença, nos termos dos artigos 794 e 795 do Código de Processo Civil.

Sobre o autor
Alessandro Carlo Bernardi Valério

Advogado, Tradutor Público e Intérprete Comercial, atualmente exerce o cargo de Vice Presidente do Sindicato Nacional dos Trabalhadores em Embaixadas, Consulados, Organismos Internacionais e Empregados que Laboram para Estado Estrangeiro ou para Membros do Corpo Diplomático Estrangeiro no Brasil - Sindnações

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VALÉRIO, Alessandro Carlo Bernardi. Enfoques sobre a nova sentença e as formas de cumpri-la. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2731, 23 dez. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18101. Acesso em: 5 nov. 2024.

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