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Breves considerações sobre a punibilidade de agentes políticos em função da auto-promoção pessoal.

A violação dos princípios constitucionais relativos à Administração Pública pelo dolo na conduta

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Resumo: Sustenta-se a impossibilidade de condenação em ação civil pública por improbidade administrativa do agente político que divulga pelos meios convencionais de comunicação em massa os resultados satisfatórios obtidos ao longo de sua gestão administrativa. A caracterização do enaltecimento pessoal capaz de violar os princípios constitucionais relativos à Administração Pública somente infringe as disposições constitucionais e infra-constitucionais, caso haja nítida má-fé na conduta. O mero ato de propalar o desenvolvimento e conclusão de obras ou projetos não induz a auto-promoção em decorrência do agente político estar obrigado, pelo princípio da publicidade e pelas imposições da lei de responsabilidade fiscal, a prestar contas de seus atos durante o mandato para o qual fora eleito. A aplicação de sanção depende da análise minuciosa do caso concreto para se constatar a real intenção do administrador público em criar condições favoráveis a si mesmo ou a outrem.

Palavras-chave: Agente político – auto-promoção – princípios constitucionais – improbidade administrativa – dolo.


1 - Introdução

Constatar qualquer tipo de excesso não aparenta ser uma tarefa muito fácil, ainda mais se for preciso investigar o caso concreto para mensurar a conduta de determinado sujeito. Assim ocorre quando os agentes políticos, no exercício de suas atribuições, realizam atividades na condução da Administração Pública, independentemente da esfera de governo.

A Constituição e a lei 8.429/1992 ao regulamentarem o dever de probidade, além de estabelecerem os limites objetivos dos atos dos gestores públicos, prescrevem também sanções pelo abuso cometido em razão da função. A questão a ser debatida refere-se aos limites da divulgação dos objetivos traçados, desenvolvidos e concluídos.

É necessário avaliar até que ponto é permitido ao administrador público se valer dos mecanismos de informação impresso, visual ou virtual para noticiar ao povo a prestação de contas e os resultados alcançados. A Constituição expressamente autoriza a propagação de informações com conteúdo informativo, educativo ou de orientação social, sem, contudo, haver promoção pessoal e lesão ao erário.

Veda-se a vinculação da imagem do agente através da inclusão de nomes, símbolos ou imagens que promovam o enaltecimento pessoal de sua autoridade e até de servidores públicos. Nota-se, dessa forma, que somente no caso concreto será possível definir se houve ou não a prática desse ato.

A conduta deve se pautar pelo dolo, isto é, pela intenção precípua de causar danos à Administração Pública e, sobretudo, de favorecer pessoalmente o administrador. A sobreposição da sua imagem à obra ou projeto, nessas circunstâncias, tem caráter ímprobo e ofende os princípios constitucionais que balizam os deveres impostos a qualquer agente ou servidor público.

A divulgação do trabalho do administrador público não caracteriza a promoção pessoal, de modo a não causar uma série de conseqüências nefastas à moralidade, se ficar comprovada a transparência do ato e o intuito de atender às aspirações do princípio da publicidade, tão perseguida nos principais sistemas democráticos.

Dessa forma, para sustentar esse ponto de vista, será feita uma análise exegética do termo "improbidade administrativa" no âmbito da Constituição e da lei 8.429/92. Em seguida demonstrar-se-á a atipicidade da conduta do agente político ao divulgar de boa-fé os resultados atingidos com as obras e projetos durante sua gestão para, por fim, de definir os critérios para aplicação de sanção àquele que violar a Constituição e a lei mencionada.


2 – A exegese da expressão "improbidade administrativa" no contexto da Constituição da República de 1988 e da lei 8.429/1992

A probidade administrativa é o dever de exercer as funções, sem aproveitamento de vantagens ou facilidades decorrentes das atribuições típicas do cargo exercido, seja em proveito pessoal ou de terceiro. [01] Analisa-se a obrigação de retidão na esfera pública no contexto da realização de obras e projetos, o que implica vedação de realização de propaganda de atos particulares ao longo do mandato eletivo, como também no período eleitoral.

Essa conduta exigida de modo geral de qualquer agente público desdobra-se em múltiplas facetas. Contudo, procura-se criticar a forma contraditória pela qual se tenta punir, especificamente uma das espécies de agente público, ou seja, o agente político, pelos resultados vantajosos conquistados durante sua gestão administrativa.

Entende-se não estar configurada as hipóteses sancionatórias delineadas na lei 8.429/1992 se não houve associação do nome, símbolo ou imagem do então responsável supremo pela Administração Pública federal, estadual, distrital ou municipal à obra ou projeto, cuja consequência culmina no intuito doloso de auto-promoção pessoal.

Dessa forma, não é possível vislumbrar a improbidade administrativa decorrente da prática de ato que atente contra os princípios relativos à Administração Pública, sobretudo, a moralidade administrativa. A improbidade deve estar assentada na má-fé, paralelamente à desonestidade, e conduzir de forma objetiva a uma ilícita vantagem mediante artimanhas que façam aumentar o prestigio pessoal do administrador público.

Essas características de ilegalidade não se consubstanciam quando o agente político divulgar informações veiculadas em instrumentos de comunicação em massa, se este agiu estribado pela boa-fé e com a finalidade de prestar contas à população. Por certo que a realização de obras públicas que atendam ao interesse da população e venham a melhorar a qualidade de vida no Município, pode ser objeto de publicidade, entendida como verdadeira prestação de contas políticas por parte dos gestores que prestam o serviço para o qual foram eleitos.

A Constituição veda, todavia, é o abuso da vinculação da autoridade pública aos resultados satisfatórios da Administração Pública com propósito doloso, e não da divulgação da obra realizada em seu mandato. Ademais, não há vedação à utilização de instrumento publicitário particular, desde que atendido ao fim expressamente consignado no texto constitucional e não tenha marcas e símbolos que induzam a associação do agente político à obra ou projeto de forma maliciosa para obtenção de prestígio popular.

É muito comum propagandas institucionais que visam a transmitir ao cidadão as realizações de planos governamentais sem que haja caracterização de ilícito, devido à ausência de subjetividade ilícita da propaganda. Somente investigando o caso concreto para se aferir se a conduta contrariou a regra proibitiva prevista na lei infra-constitucional, para assim, se caracterizar a ilicitude.

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O subjetivismo da matéria conduz à inevitável ilação de que cada caso concreto, que consubstancia matéria eminentemente factual, reclama exaustiva análise das provas e do próprio intento do agente político, isto é, a prova do elemento subjetivo (dolo e má-fé para atingir fim ilícito).

O caso enfocado reclama plena prova de violação do teor das prescrições apontadas pela lei 8.429/92, porque o texto constitucional não veda a publicidade de atos, programas, obras, serviços e campanhas governamentais. A Constituição não proibiu a divulgação de informações ao povo, apenas determinou a adequação da publicidade oficial, pois é dever da Administração Pública propiciar a transparência de seus atos.

Nesse sentido, Alexandre de Moraes discorre sobre o assunto sustentando que o:

[...] legislador constituinte, ao definir a presente regra, visou à finalidade moralizadora, vedando o desgaste e o uso do dinheiro público em propagandas conducentes à promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos, seja por meio da menção de nomes, seja por meio de símbolos ou imagens que possam de qualquer forma estabelecer alguma conexão pessoal entre estes e o próprio objeto divulgado. (MORAES, 2002, p. 889)

É certo que a norma constitucional estabelece os diversos princípios a que deve se submeter à Administração Pública, como o da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade que, a propósito, representa a própria transparência dos atos administrativos, e o da eficiência. Ressalte-se, assim, que prevalece a publicidade dos atos administrativos, sendo que inúmeros órgãos institucionais, em diversas esferas da federação, utilizam em larga escala dos meios informativos para prestação de contas e atendimento à prescrição constitucional.

Maria Sylvia Zanella de Pietro corrobora o entendimento de que deve-se perquerir a intenção do agente político quanto à propagação dos resultados e trabalhos desenvolvidos pela Administração Pública, senão vejamos:

[...] a rigor, qualquer violação aos princípios da legalidade, da razoabilidade, da moralidade, do interesse público, da eficiência, da motivação, da publicidade, da impessoalidade e de qualquer outro imposto à Administração Pública pode constituir ato de improbidade administrativa. No entanto, há de se perquirir a intenção do agente, para verificar se houve dolo ou culpa, pois, de outro modo, não ocorrerá o ilícito previsto na lei. (PIETRO, 2001, p. 687)

Assim, se for evidenciado que a conduta imputada ao agente ocorreu devido ao dolo, caracterizado estará o ato de improbidade administrativa por atentado ao princípio constitucional da impessoalidade, segundo o qual se exige objetividade no atendimento ao interesse público, sendo proibida qualquer espécie de promoção pessoal de autoridades ou agentes.


3 A atipicidade de conduta do agente político como ato de improbidade na divulgação de obras e projetos

Nas vésperas ou no curso do período eleitoral é muito comum candidatos a cargos de mandato eletivo promover homenagens ou eventos festivos, comemorativos e até em retribuição pela confiança externada pela sociedade civil durante suas gestões administrativas. Esse fato muito típico em municípios brasileiros ao longo de algumas décadas, onde a prática da política assistencialista necessariamente apresenta-se como atributo da boa governança, tornou-se mais restrito com a vigência da lei nº. 8.429/1992.

Frequentemente os meios de comunicação em massa publicam notícias cujos protagonistas são alvos de investigações por abuso de poder político em razão de auto-promoção. Nesse sentido, o Ministério Público corriqueiramente apresenta-se como autor de ações civis de improbidade administrativa considerando os agentes políticos como incursos nos delitos capitulados nos artigos da mencionada lei. [02]

O Parquet assevera, comumente, que o administrador público, aproveitando-se da sua condição funcional no âmbito da unidade federada administrada, utiliza-se de recursos do erário em proveito próprio, promovendo propaganda pessoal e vinculando seu nome e sua imagem às obras e feitos da Administração Pública.

Sob a alegação de que esse tipo de divulgação não atende ao caráter educativo, informativo ou de orientação social, mas, tão-somente, de promoção do agente, é que se considera haver um atentado contra os princípios da moralidade e da impessoalidade previstos no artigo 37 da Constituição da República de 1988, no que tange aos resultados exitosos alcançados pela Administração Pública, verbis:

A Administração Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

§ 1º. A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.

Efetivamente, o ato de tornar público os objetivos traçados, desenvolvidos e concretizados por qualquer esfera administrativa é algo comum na realidade brasileira, sendo um fato marcante na história constitucional do Brasil. Os governos da pré-ditadura militar, da época da ditadura e do período democrático registraram suas características e enfatizaram seus momentos de glória, como sempre lembram a população e a mídia nacional.

Recentemente, a transição presidencial decorreu do prestígio logrado por um governo rotulado de social, que acabou se mantendo na Administração Pública Federal por ter se tornado reconhecido pelo sucesso obtido entre os integrantes de camadas da população mais precárias. A partir dos resultados positivos de programas sociais e de infra-estrutura reiteradamente divulgados, tais como: "Programa Universidade para Todos (PROUNI)", "Minha Casa, Minha Vida", "Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)", "Bolsa Família", entre outros, que o último chefe do Poder Executivo federal recebeu índices de aprovação popular jamais noticiados.

Esse fato proporcionou a notoriedade de sua gestão administrativa e o reconhecimento do povo pelas metas concluídas e ainda em andamento. Diferentemente, o antepenúltimo governo ficou marcado por priorizar o setor econômico, sem conseguir, outrossim, o mesmo prestígio popular. Nessas circunstâncias, não existe razão para se punir o bom governante se este prestar contas pelos meios convencionais de informação moderadamente e sem o dolo de provocar o próprio enaltecimento.

Com o aumento sistemático da publicidade institucional, até mesmo em tempos precedentes ao pleito eleitoral, cada vez fica mais difícil se verificar a existência de beneficiamento particular pelos agentes políticos. Sustentar a caracterização da improbidade administrativa pela mera propagação de obras e projetos diretamente pelo administrador público não enseja, a priori, ofensa aos princípios constitucionais relativos à Administração Pública.

É inevitável que a implementação de projetos sociais, execução de obras públicas e outras melhorias levadas à população geram dividendos políticos aos seus executores, os quais são capitalizados por sua divulgação. Assim, inexistem motivos para se punir o bom governante quando respeitado os limites delineados no § 1º, do artigo 37 da Constituição. Todavia, a realidade tem demonstrado que, mesmo se atendo a essa norma constitucional, a divulgação das produções da Administração Pública é, via de regra, satisfatória aos seus gestores, o que pode ocasionar a ilação de se tratar de propaganda pessoal própria.

A jurisprudência entende que a divulgação das obras e projetos publicados não podem ser caracterizados como ato de improbidade caso não esteja configurada a lesão ao erário e a intenção de promoção pessoal, verbis:

APELAÇÃO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - PREFEITO MUNICIPAL - PUBLICIDADE - PROMOÇÃOPESSOAL - LESIVIDADE AO ERÁRIO - AUSÊNCIA - RECURSO NÃO PROVIDO. A publicidade de atos, programas, obras e serviços dos órgãos públicos de conteúdo informativo e educativo, sem indicar promoção pessoal e lesividade ao erário, se revela infensa à improbidade. Recurso não provido (Apelação Cível nº. 1.0525.08.150243-3/001, rel. Des. Kildare Carvalho, DJ 01/10/2009).

Assim, a publicidade deve possuir caráter informativo, educativo e de orientação social, contendo informações sobre projetos educacionais e institucionais, no límpido intuito de conscientização da população da sua existência, de modo que a sua inclusão e abrangência não induza à tentativa de promoção pessoal. José Jairo Gomes, a respeito da publicidade dos resultados da Administração Pública, sustenta que:

Nesse quadro, a publicidade institucional deve ser realizada para divulgar de maneira honesta, verídica e objetiva os atos e feitos da Administração, sempre se tendo em foco o dever de bem informar a população [...] a Constituição estabeleceu em seu artigo 37, §1º: 'A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos'. Ao erigir essa regra, o Legislador Constituinte teve em mira finalidade ética, moralizadora, de alto significado [...] (GOMES, 2008, p.307-309).

Cabe investigar se a propaganda veiculada, no caso concreto, fere o princípio da moralidade e, por conseguinte, culmina em ofensa à lei 8.429/92, que assim dispõe:

Art. 10 - Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

[...]

Nesse sentido, a Constituição em vigor reserva um importante papel ao Ministério Público na proteção ao patrimônio público, e o órgão ministerial tem se mostrado comprometido no combate à corrupção, à ilegalidade e na defesa precípua de uma Administração Pública transparente e moralizada, quando atua em prol da ordem jurídica do Estado Democrático de Direito.

É salutar que o Ministério Público denuncie os casos de exorbitância promovidos pelos agentes políticos, com o fim de propugnar pela punição dos maus administradores e daqueles que de uma forma ou de outra se locupletem com o gasto indevido ou exorbitante de verbas públicas. E a ação civil pública, que pode ser manejada no âmbito da lei de improbidade visando à condenação do administrador público, é o instrumento processual adequado para reclamar ao Estado a tomada de providências contra o intuito deliberado de fazer propaganda pessoal com dinheiro público.

Para o agente ser passível de punição, na referida ação deve ficar demonstrado a existência da intenção de contrariar as disposições constitucionais e infra-constitucionais, sendo, portanto, insustentável a acusação de promoção pessoal em razão da atipicidade, principalmente quando houver a divulgação de boa-fé dos resultados obtidos pela Administração Pública.

Se em qualquer dos casos houver caráter educativo, informativo e de orientação social na publicidade, inclusive quando se tratar de obras e projetos, como ocorreu nos programas sociais e de infra-estrutura desenvolvidos pelo derradeiro governo federal, mas não se constatar o escopo de satisfação dos próprios interesses pessoais de forma deturpada, não existe motivos justificáveis para se punir alguém.


4 – Caracterização da improbidade administrativa pela auto-promoção do agente político: quais seriam os critérios para aplicação de sanção?

A rigor, é preciso ter cautela para evitar equívoco quanto ao entendimento de ato abusivo, já que a difusão pelos meios apropriados de obras e projetos é exercício do dever legal de conferir publicidade ao legítimo detentor do poder: o povo. A mesma situação ocorre quanto aos atos, campanhas e atividades da Administração Pública propaladas pelo agente político.

Com o objetivo de imprimir transparência, prestar informações, veicular campanhas educativas, de orientação social e, ainda, de cumprir o dever legal de dar publicidade aos atos administrativos, precisamente quanto ao que determina a lei de responsabilidade fiscal, o agente político obriga-se a prestar contas dos seus atos.

Não se vislumbra, em tese, qualquer tentativa de auto-promoção do administrador público quando este, no cumprimento de suas atribuições, levar ao conhecimento público através de informativos impressos, meios sonoros ou visuais e até mesmo virtuais, os resultados, sobretudo, os bem sucedidos de sua gestão administrativa.

Contudo, aventa-se a hipótese de abuso mediante a utilização de símbolos, nomes ou imagens que designem a vinculação dos agentes políticos de modo a causar prejuízos ao erário e, principalmente, que fique configurado no caso concreto o desígnio malicioso de enaltecimento pessoal.

A Constituição Republicana, por certo, não veda o uso de nenhuma palavra, símbolo, frase ou imagem na publicidade dos atos em relação a programas, obras, serviços e campanhas públicas. Então, para que se configure a conduta vedada é preciso lançá-los, na sua inteireza, com o intuito de promover uma ou algumas pessoas com identificação plena.

Deve-se tratar de uma situação em que fique incutida na opinião pública as características pessoais do agente político, e não as peculiaridades da obra, serviço, projeto ou evento, em função do dolo na conduta. O ato humano de gravar ou associar um objeto ou situação necessita ser consumado, e isso só pode ser comprovado no caso concreto. Caso realmente esteja evidente a associação da imagem ou nome do administrador público proporcionando-o vantagem pessoal significativa, entende-se ser cabível a ação civil pública por improbidade administrativa.

Diversamente, a mera informação pelo próprio agente, ainda que com sua aparição pública por meio de fotografias ou caricaturas nos meios informativos, demonstra ser muito superficial a tentativa de supervalorização da própria autoridade. Diversos órgãos da Administração Pública direita e indireta, Poder Legislativo, Poder Judiciário, Ministério Público, Tribunais de Conta, Polícia e tantos outros mencionam o nome de seus representantes máximos em documentos e atos oficiais das respectivas entidades.

A jurisprudência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais assinala que o animus do agente político de se promover ilicitamente tem que restar evidente na aferição do desvirtuamento do artigo 37 da Constituição, senão vejamos:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - CAMPANHAS PUBLICITÁRIAS - ART. 37, § 1º, DA CF. 1 - O art. 37, § 1º, da CF admite a "publicidade de atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos", desde que tenham "caráter educativo, informativo ou de orientação social", vedando, apenas, que se conste nomes, símbolos ou imagens que caracterizem a promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos. 2 - Não constitui ato de improbidade administrativa a aprovação de propagandas de ações e serviços implementados pelo Governo, sem conotação de autopromoção, podendo, em casos tais, ser utilizado os recursos públicos para custear a divulgação das realizações governamentais. (TJMG, Apelação cível nº.: 1.0024.00.059064-6/001, Rel.: Silas Vieira, DJ: 05/04/2006)

AÇÃO CIVIL PÚBLICA - REPARAÇÃO DE DANOS AO ERÁRIO PÚBLICO - PREFEITO E VICE - PUBLICIDADE - PROMOÇÃO PESSOAL - NÃO CONFIGURAÇÃO - A promoção pessoal do agente político fica indemonstrada, se não suficientemente evidenciada na publicação impugnada, mormente se nesta prepondera matéria de cunho informativo, de interesse dos munícipes. O propósito de informar à comunidade as obras realizadas na administração municipal descaracteriza a figura da promoção pessoal. (TJMG, Apelação cível nº. 1.0000.00.326496-7/000, Rel.: Des. Hyparco Immesi, DJ: 30/03/2004)

No mesmo sentido o Tribunal de Justiça de São Paulo apresenta entendimento jurisprudencial semelhante, senão vejamos:

Ação Civil Pública. Improbidade administrativa. Publicidade pessoal custeada com dinheiro do erário municipal. Fotos do prefeito inseridas em reportagem comemorativa de aniversário da cidade, com referência a obras públicas realizadas. A promoção de realizações governamentais, não proibida, embora deva ser impessoal, contém, em si mesma, a promoção pessoal do administrador público. Por isso, o fato de o Administrador aparecer fotografado, com outras pessoas, no ato de inauguração da obra, não comporta, só por isso, tipificação de improbidade administrativa e a exigência de ressarcimento ao erário municipal. Ação improcedente. Condenação do "Estado" ou o Ministério Público no pagamento de honorários de advogado em verbas de sucumbência. Inadmissibilidade. Inaplicabilidade do art. 20 do CPC. A regra é a da isenção absoluta de ônus para as partes, nos termos do art. 18 da Lei 7347/85. Recurso provido em parte. (TJSP,Apelação Cível nº.: 82.293.5/4-00, Rel.: Des. José Santana, DJ: 16/11/1999)

O Superior Tribunal de Justiça também tem acompanhado o entendimento dos Tribunais de Justiça dos Estados, verbis:

CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL. ADMINISTRAÇÃO PUBLICA. LIMITE DA PUBLICIDADE DOS ATOS, PROGRAMAS, OBRAS E SERVIÇOS.

SE NA AVALIAÇÃO DO CONTEUDO DA MATERIA PUBLICITARIA, QUANDO DEVE-SE VERIFICAR SE A ENFASE ESTA POSTA NA OBRA OU SERVIÇO, OU NA PESSOA QUE OS REALIZOU, E NÃO SE VISLUMBRA A EXISTENCIA DE INFORMES PUBLICITARIOS QUE EXTRAPOLEM OS LIMITES PERMITIDOS PELA CONSTITUIÇÃO, O INQUERITO DEVE SER ARQUIVADO. (STJ, Inquérito nº. 85-1/Bahia, Rel. Min. José de Jesus Filho, DJU: 30/08/1993)

A existência de ato danoso que enseje a declaração de improbidade disciplinada pela lei 8.429/92 e, consequentemente, a punição dos ilícitos de qualquer natureza deve atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, a amplitude das hipóteses infracionais, as diferenças de gravidade entre estas e as infinitas variações possíveis nas condutas contempladas como sanções previstas pelo artigo 12 da lei aludida.

Para tanto, cabe ao julgador na fixação das penas levar em conta a extensão do dano causado e o proveito patrimonial obtido pelo agente (parágrafo único do artigo 12), considerando, também, a gravidade da conduta e a intensidade do elemento subjetivo do agente. Da mesma forma, o parágrafo 4º, do artigo 37 da Constituição, prevê o estabelecimento da gradação das sanções relativas a tais atos, circunstância que impõe a observância de uma dosimetria coerente e razoável. [03]

Tem-se, assim, que as cominações previstas nos incisos do artigo 12 da lei nº. 8.429/1992 não determinam, necessariamente, a aplicação de sanções cumulativas, devendo ser observado o caso concreto em respeito aos princípios da razoabilidade, proporcionalidade, adequação e racionalidade na interpretação do dispositivo, a fim de que não haja injustiças flagrantes.

Sobre os autores
Luiz Márcio Siqueira Júnior

Mestrando em Direito Público pelo Programa de Pós-graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG).Advogado.

Rodrigo Alves Pinto Ruggio

Pós-graduado em Direito Processual pelo Instituto de Educação Continuada (IEC) da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Professor da Faculdade de Santa Luzia (FACSAL). Advogado.

Hugo Lázaro Marques Martins

Pós-graduado em Direito Internacional pelo Centro de Direito Internacional (CEDIN). Advogado.

Michelle Abras

Pós-graduada em Direito Público pelo Centro Universitário Newton Paiva. Professora da Faculdade Minas Gerais (FAMIG). Advogada.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SIQUEIRA JÚNIOR, Luiz Márcio; RUGGIO, Rodrigo Alves Pinto et al. Breves considerações sobre a punibilidade de agentes políticos em função da auto-promoção pessoal.: A violação dos princípios constitucionais relativos à Administração Pública pelo dolo na conduta. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2755, 16 jan. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18278. Acesso em: 18 dez. 2024.

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