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O usuário e o traficante na Lei nº 11.343/2006.

Reflexões críticas sobre os aspectos diferenciadores

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Agenda 05/02/2011 às 09:56

4 A NOVA LEI DE DROGAS, O USUÁRIO E O TRAFICANTE: O QUE ACONTECEU?

4.1 CONHECENDO A PROPOSTA DE INOVAÇÃO

Os primeiros noticiários propagados nos principais meios de comunicação do Brasil foram favoráveis à Nova Lei de Drogas (Lei n. 11.343/06), tendo sido dado ênfase na mídia que "com a nova lei de drogas, usuário não poderia mais ser preso". Vale registrar, apesar disso, que foram duradouros e penosos os percursos pelos quais passaram os projetos de leis de drogas que tramitaram no Congresso Nacional até que se chegasse ao novo diploma, ora em vigor.

Inicialmente, o Poder Executivo, após a realização dos vetos, enviou ao Congresso um novo projeto de lei (nº. 6.108/02), que tramitou por dois anos na Câmara dos Deputados, e foi apensado ao Projeto de Lei nº. 7.134/02, originário do Senado Federal (PLS nº. 115/02). A Câmara ponderou sobre os dois conjuntamente e aprovou no Plenário, em 2004, o Substitutivo da Câmara de Deputados (PLS nº. 7.134-B). Devido às alterações feitas pela Câmara, o projeto retornou ao Senado, onde tramitou como SCD n. 115/02, que deu origem à nova lei de drogas (nº. 11.343/06).

Muito bem explanada e minuciosa é a narração acerca do percurso legislativo da Nova Lei de Drogas exposta por Mendonça e Carvalho (2008, p. 17-18), tendo como ponto de partida a entrada em vigor da "retalhada" Lei nº. 10.409, em 28 de fevereiro de 2002:

Ainda no ano de 2002, o Poder Executivo, responsável pelos vetos, encaminhou ao Congresso Nacional, em regime de urgência, o Projeto de Lei 6.108, que previa novas alterações à Lei 10.409/2002, recém-aprovada. Em tramitação na Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, Violência e Narcotráfico da Câmara dos Deputados, o Projeto foi alterado integralmente pela aprovação de uma nova versão consubstanciada em um substitutivo. Paralelamente, a Comissão Mista de Segurança Pública do Congresso Nacional, formada por parlamentares da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, elaborou novo anteprojeto de lei, disciplinando integralmente a matéria.

Ainda de acordo com os autores (2008, p. 17-18), esse anteprojeto foi apresentado diretamente no Senado Federal, "recebendo a designação de Projeto de Lei do Senado 115, de 2002. Aprovado naquela casa legislativa, o projeto foi encaminhado à Câmara dos Deputados, onde recebeu o número 7.134".

E prosseguem os autores para informar os encaminhamentos. Já agora na Câmara dos Deputados, em 2002, juntos e apensados todos os projetos e versões sobre a matéria, sob a rubrica de Projeto de Lei nº. 7.134/2002. No entanto, segundo esses autores (2008, p. 17-18),

A despeito da celeridade inicial na tramitação dos projetos que visavam a corrigir as imperfeições da legislação sobre tóxicos, o requerimento de urgência acabou por ser retirado e o Projeto de Lei nº. 7.134/2002 passou a tramitar sob o rito ordinário inexplicavelmente, a matéria foi novamente considerada urgente ao cabo do ano de 2003, sendo incluída na pauta da convocação extraordinária do Congresso Nacional, que iria ter lugar no mês de janeiro de 2004. Na ocasião, o então Projeto de Lei 7.134/2002 estava em trâmite na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados.

Na mesma esteira informativa, os autores se referem ao grupo de trabalho constituído por equipe multidisciplinar, com leituras diversas sobre a questão das drogas. Assim, técnicos de diversos setores do Poder Executivo e do Poder Legislativo se reuniram para elaboração do texto final da Lei, substitutivo do projeto de lei em tramitação. Não obstante os aplausos dos autores (2008, p 17-18), a complexidade do projeto exigia tempo maior de discussão e não apenas duas semanas "no curso de uma convocação extraordinária da Câmara dos Deputados". E continuam para dizer que a "urgência, mais uma vez, foi inimiga da perfeição" tanto assim que dois anos e meio foi o tempo para o Senado Federal aprovar o projeto que retornou à Câmara Federal por força das alterações ali efetivadas.

Poucas foram as alterações, mas alguns dispositivos tiveram redação diversa por incompatíveis com o "restante do substitutivo aprovado na Câmara dos Deputados". (2008, p. 17-18)

É o caso, por exemplo, dos parágrafos do art. 28, que versa sobre o crime de porte para consumo pessoal em que o Senado Federal acabou por misturar as disposições da proposta anterior com a aprovada pela Câmara, as quais divergiam em tudo. Trata-se de mais uma razão para as imperfeições da nova lei sobre drogas. Após vetos presidenciais que não alteraram a essência do projeto, acabou por ser sancionada a Lei 11.343/2006.

Como se percebeu, o Projeto de Lei n.º 7.134/02 teve um longo e tempestuoso caminho até tornar-se a Lei nº. 11.343/2006. Tal diploma, inovadoramente, ambicionava uma abordagem mais contemporânea e extensa a respeito da questão das drogas, constituindo políticas públicas modernas e apropriadas, a partir da coleta, análise e disseminação de informações sobre drogas.

Ademais, era nítida a preocupação com as diligências de atenção e reinserção de usuários e dependentes de drogas, estabelecendo notadamente a responsabilidade da rede pública de saúde – SUS – na criação e aperfeiçoamento de programas de cuidado ao usuário e ao dependente de drogas, consoante diretrizes a serem instituídas pelo Ministério da Saúde.

4.2 O QUE É SER USUÁRIO?

Uma indagação é importante formular, neste texto monográfico, porque se refere a um dos protagonistas importantes na discussão sobre drogas.

Qual o conceito de usuário, para a criminalização objeto deste estudo?

Denomina-se usuário, conforme o artigo 28 da nova Lei de Drogas, aquele que: "adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar".

Conceitualmente, adquirir é comprar, passar a ser proprietário, ou seja, dono do objeto. Já a conduta guardar é ocultar, esconder, não publicar a posse. A conduta de ter em depósito significa manter sob controle, à disposição. Agora, transportar traz a idéia de deslocamento, ou seja, de um local para outro. E, por último, o comportamento de trazer consigo é o mesmo que portar a droga, tendo total disponibilidade de acesso ao uso.

Cumpre destacar que as condutas descritas no artigo 28 do novo diploma legal, apenas contemplam a forma dolosa, ou seja, saber e querer ter a posse da droga. Não se admite a forma culposa, com isso, ignora as categorias da imprudência, imperícia e negligência na modalidade. Desse modo, o agente que tiver a posse da droga sem saber do que se trata, encontra-se em erro de tipo.

O tipo requer, ainda, outro elemento subjetivo, qual seja, a intenção especial do agente em ter a droga para consumo pessoal. Assim, se o sujeito tem a posse da droga para destinação a terceiros, outra será a infração, não incidindo mais o artigo 28. Nesse sentido, a partir dos ensinamentos de Guimarães (2007, p. 108), o elemento subjetivo do tipo é o dolo específico, isto é, consubstanciado com a intenção do agente de financiar ou custear o tráfico ou os crimes assemelhados.

Como elemento normativo, deve-se atentar para a expressão "sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar", cabendo ao julgador verificar a ocorrência ou não de tal componente no caso concreto.

A Nova Lei de Drogas veio dar tratamento diferenciado aos usuários de substâncias entorpecentes. Cuida-se de uma mudança benéfica àqueles que usufruem dos mencionados substratos que vem causando polêmica na comunidade jurídica por ter aberto uma série de questionamentos acerca da natureza jurídica da conduta descrita no art. 28. Afinal, a Lei 11.343/2006 procedeu à descriminalização (abolitio criminis), à modificação para uma infração penal sui generis, elaborou um tipo para uma modalidade de contravenção especial, promoveu a despenalização da posse para consumo próprioou a conduta do usuário continua sendo crime?

Registre-se, a propósito, que o artigo 28 da Lei de Drogas não prevê pena de reclusão nem de detenção, por isso há quem entenda que, na hipótese, não há crime ou contravenção cometida. Na lição de Thiago André Pierobom de Ávila (2006, p.159), tal inteligência fundamenta-se no art. 1º do Decreto 3.914/41 (Lei de Introdução ao Código Penal e à Lei de Contravenções Penais). Dispõe o referido regramento:

Art 1º. Considera-se crime a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente.

Desse modo, partindo de uma interpretação literal da norma transcrita, como a conduta prevista no art. 28 da nova Lei de Drogas não impõe nenhuma das penas mencionadas no dispositivo acima, o melhor entendimento é de que essa conduta não deve ser enquadrada na premissa de crime ou contravenção penal.

Em outra linha de entendimento, a ideia de que a conduta do usuário de drogas passou a ser uma infração penal sui generis édefendida por Gomes e e Sanches (2009) quando indagam se o legislador, no trato com o agente que tem a posse de drogas para consumo pessoal que teria contemplado um crime, uma infração penal sui generis ou uma infração administrativa. Para esses autores (2009),

Houve descriminalização formal (acabou o caráter criminoso do fato) e, ao mesmo tempo, despenalização (evitou-se a pena de prisão para o usuário de droga). O fato (posse de droga para consumo pessoal) deixou de ser crime (formalmente) porque já não é punido com reclusão ou detenção (art. 1º da LICP). Tampouco é uma infração administrativa (porque as sanções cominadas devem ser aplicadas pelo juiz dos juizados criminais). Se não se trata de um crime nem de uma contravenção penal (mesmo porque não há cominação de qualquer pena de prisão), se não se pode admitir tampouco uma infração administrativa, só resta concluir que estamos diante de infração penal sui generis.

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Nessa linha de intelecção é também o entendimento de Leal (2006, p. 61):

A Lei Antidrogas criou uma nova infração penal, que não se enquadra na classificação legal de crime, nem de contravenção penal. Criou, simplesmente, uma infração penal inominada, punida com novas alternativas penais e isto não contraria a diretiva genérica de classificação das infrações penais, emanada do referido dispositivo da Lei de Introdução ao Código Penal.

Há quem entenda, como Thiago André Pierobom de Ávila (2006, p.163), citado acima, de modo diferente e defendem que a posse drogas para consumo pessoal passou a ser uma modalidade de contravenção. Essa interpretação é justificada sob o argumento de que tal como ocorrem com as demais contravenções penais, a conduta sob análise não permite o tipo tentado. Além disso, a referida infração é passível de ação pública incondicionada, que deve observar o rito sumaríssimo estabelecido na Lei nº. 9.099/95 (Lei dos Juizados Especiais).

E, o mais importante, ao se confrontar o disposto no art. 28 da Lei nº. 11.343/2006 com os princípios da proporcionalidade e da lesividade, resulta cristalina a relação intrínseca entre a natureza da infração penal e a intensidade e natureza da pena.

De acordo com Ávila (2006, p.19),

Uma interpretação sistemática desse novo delito com os demais crimes e contravenções deve necessariamente classificá-lo ao lado das contravenções penais. Não é possível que haja uma contravenção com pena de prisão simples de até dois anos (LCP, art. 24) e exista um crime sem pena privativa de liberdade.

Vale comentar que as teses até aqui trazidas encontram oposição na doutrina majoritária e no Supremo Tribunal Federal. Para essa outra linha de entendimento, a hipótese em análise trata-se de caso de despenalização da conduta, e, portanto, a posse de drogas para consumo pessoal continua sendo crime.

É o que leciona Capez (2007, p. 60):

Entendemos, no entanto, que não houve descriminalização da conduta. O fato continua s ter a natureza de crime, na medida em que a própria Lei o inseriu no capítulo relativo aos crimes e às penas (Capítulo III); além do que as sanções só podem ser aplicadas por juiz criminal e não por autoridade administrativa, e mediante o devido processo legal (no caso, o procedimento criminal do Juizado Especial Criminal, conforme expressa determinação legal do art. 48, parágrafo 1º, da nova Lei.

E é nesse sentido que entendeu a Primeira Turma do STF, em 2007, quando tratou da questão no julgamento do RE 430105, de relatoria do Min. Sepúlveda Pertence. No referido recurso a Turma, resolvendo questão de ordem no sentido de que o art. 28 da Lei 11.343/2006 (Nova Lei de Tóxicos) não implicou abolitio criminis do delito de posse de drogas para consumo pessoal, então previsto no art. 16 da Lei 6.368/76, julgou prejudicado o apelo em que o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro alegava a incompetência dos juizados especiais para processar e julgar conduta capitulada no art. 16 da Lei 6.368/76.

Nele, considerou-se que a conduta descrita neste artigo continua sendo crime sob a égide da lei nova, tendo ocorrido uma despenalização, cuja característica marcante seria a exclusão de penas privativas de liberdade como sanção principal ou substitutiva da infração penal. Afastou-se, também, o entendimento de parte da doutrina de que o fato, agora, constituir-se-ia infração penal sui generis, pois essa posição acarretaria sérias consequências, tais como a impossibilidade de a conduta ser enquadrada como ato infracional, já que não seria crime nem contravenção penal, e haveria dificuldade na definição de seu regime jurídico.

Ademais, rejeitou-se o argumento de que o art. 1º do DL 3.914/41 (Lei de Introdução ao Código Penal e à Lei de Contravenções Penais) seria óbice a que a novel lei criasse crime sem a imposição de pena de reclusão ou de detenção, uma vez que esse dispositivo apenas estabelece critério para a distinção entre crime e contravenção, o que não impediria que lei ordinária superveniente adotasse outros requisitos gerais de diferenciação ou escolhesse para determinado delito pena diversa da privação ou restrição da liberdade.

Aduziu-se, ainda, que, embora os termos da Nova Lei de Tóxicos não sejam inequívocos, não se poderia partir da premissa de mero equívoco na colocação das infrações relativas ao usuário em capítulo chamado ‘Dos Crimes e das Penas’. Veja-se, nesse sentido, parte da ementa do julgado:

[...] Não se pode, na interpretação da Lei 11.343/06, partir de um pressuposto desapreço do legislador pelo ‘rigor técnico’, que o teria levado inadvertidamente a incluir as infrações relativas ao usuário de drogas em um capítulo denominado ‘Dos Crimes e das Penas’, só a ele referentes.

Salientou-se, outrossim, a previsão, como regra geral, do rito processual estabelecido pela Lei 9.099/95, possibilitando até mesmo a proposta de aplicação imediata da pena de que trata o art. 76 da Lei nº. 9.099/95 (art. 48, §§ 1º e 5º), bem como a disciplina da prescrição segundo as regras do art. 107 e seguintes do C. Penal.

Portanto, segundo a doutrina majoritária e o STF, ter-se-ia operado, com o advento do artigo 28 da Lei 11.343/06, uma despenalização, entendida como exclusão, para o tipo, das penas privativas de liberdade, mas não uma redução do tipo para contravenção, criação de uma infração sui generis ou descriminalização (abolitio criminis) do porte de drogas para consumo pessoal, que continua a ser crime.

4.3 E O TRAFICANTE?

No pensamento atual, denomina-se traficante o sujeito ativo do crime de tráfico ilícito de entorpecentes. Entretanto, ao discorrer sobre o mencionado delito, o Silva Franco (2006, p. 145) chega à conclusão que:

A exemplo da lei anterior, também a atual Lei Antidrogas não indica expressamente qual a conduta (ou condutas) portadora deste nomen juris. Nem o art. 33, seus parágrafos e incisos, nem nenhum outro dispositivo incriminador são assinalados com a rubrica ou a denominação legal de tráfico de drogas.

Comente-se, a propósito, que a doutrina penal e a jurisprudência têm utilizado, de forma corrente e sem divergência, a expressão tráfico ilícito de drogas para denominar o crime anteriormente descrito no art. 12, caput, da Lei 6.368/76 e agora tipificado no art. 33, caput, da Lei Antidrogas.

O dispositivo contido no diploma vigente estabelece,

Art. 33 - Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

Para melhor entendimento do tipo descrito no artigo, imprescindível se faz a análise de cada um dos elementos nele constantes. Nessa ótica, vale transcrito o que aduzem Mendonça e Carvalho (2008, p. 90-91), sobre esse tema:

Em relação ás condutas nucleares, importar significa introduzir a droga no território nacional, enquanto exportar significa a via inversa, de fazer a droga sair dos limites espaciais do território brasileiro. Remeter significa enviar, destinar, por qualquer meio e se consuma com a mera remessa, independentemente de ter chegado ao destinatário. Preparar, produzir e fabricar possuem sentidos semelhantes, mas o que diferencia as condutas é que, enquanto no preparar há composição ou decomposição química de substâncias, o verbo produzir maior atividade criativa, como a atividade extrativa. Por fim, fabricar traduz a utilização de meios mecânicos e industriais na criação da droga.

E prosseguem os autores,

Adquirir é obter, gratuita ou onerosamente, e se consuma com o ajuste, ou seja, no instante em que há o acordo de vontades sobre o objeto e o preço, independentemente da entrega efetiva. Vender significa alienar. Expor à venda consiste em deixar à mostra para a venda. Oferecer significa ofertar, colocar à disposição de terceiro para a sua aceitação. Ter em depósito significa [...] principalmente a retenção provisória e a possibilidade de deslocamento rápido da droga de um lugar para outro, enquanto guardar se conceituaria como a mera ocultação da droga. Transportar, por sua vez, significa a conduta de levar de uma local a outro por intermédio de algum meio de locomoção que não pessoal, pois nesse caso configurar-se-ia o trazer consigo. O verbo trazer consigo se configura quando o agente traz a droga junto ao corpo ou em seu interior (dentro da cavidade abdominal, por exemplo). Prescrever significa receitar, enquanto ministrar significa inocular, introduzir no corpo de alguém.

E continuam esses autores (2008, p. 90-91)

Entregar consumo ou fornecer drogas ainda que gratuitamente são as normas de encerramento que visam abarcar as condutas não enquadráveis nos demais núcleos. Entregar consumo e fornecer trazem a idéia de tradição da droga, de dar a droga a terceiro. A distinção entre entregar e fornecer é a continuidade, pois enquanto entregar se aproxima mais da tradição única, esporádica, o fornecimento se liga à idéia de continuidade no tempo, de tradição contínua durante determinado lapso temporal.

Ainda referente a essa definição encontrada na Lei, Guimarães (2007, p. 59/60) ensina que:

A forma fundamental do crime de tráfico de drogas, descrito no caput do presente artigo, compreende dezoito verbos que indicam as condutas típicas que, prima facie, vão muito mais além do seu significado etimológico. Tráfico, portanto, ganha um sentido jurídico-penal muito mais amplo do que o comércio ilegal: a expressão abrangerá desde os atos preparatórios às condutas mais estreitamente vinculadas à noção lexical de tráfico. Isto indica que a intenção do legislador penal continua como sendo a de oferecer uma proteção penal mais ampla ao bem jurídico tutelado.

Busca clarificar o autor que a aplicação da Lei nº. 11.343/2006 visa a determinar que o narcotráfico não exige, em sua necessidade, atos de comércio. Confirma Guimarães (2007, p. 60), em jurisprudência:

Apelação criminal. Tráfico de entorpecentes. Substância apreendida na posse do acusado juntamente com instrumentos utilizados para esse fim.

O crime de tráfico de entorpecentes, previsto no artigo 12 da Lei 6.368/76, não exige à sua configuração a venda de substância tóxica a terceiros. Basta à sua consumação a posse, guarda ou depósito dessa mesma substância. In: AP. Crim. 00.0219-7, de Florianópolis, rel. Dês. Genésio Nolli (RJTJSP 70/371).

Não é unânime, todavia, esse entendimento, como se comprova na decisão contrária lembrada por Guimarães (2006, p. 60):

Tráfico de entorpecentes. Falta de provas da comercialização. Desclassificação do art. 12 para artigo 16 da Lei 6.368/76.

[...] a quantidade apreendida não basta, por si só, ao reconhecimento da traficância, e nem mesmo o fato de estar acondicionada em tabletes envoltos por invólucros plásticos.

A condenação por tráfico de substância entorpecente exige prova segura e concludente da comercialização não sendo suficiente a mera presunção. Havendo qualquer dúvida, deve prevalecer a solução mais favorável ao agente, ou seja, a desclassificação para a infração mais branda (Lei 6.368/76, artigo 16). TACRIM/PR – 3º Cerim. – AP. 131.169-9, Rel. Desig. Leonardo Lustosa, vencido relator originário Renato Neves Barcellos – j. em 22.06.1999, m.v.).

Ao cotejar o art. 33 da nova Lei com o seu precedente constante da Lei nº. 6.368/76, da Arruda (2007, p. 51/52) verificou existir praticamente uma equivalência entre as condutas encontradas nos dispositivos mencionados. Nesse sentido, ele concluiu que:

Entre os dois dispositivos há uma quase total identidade no que diz respeito à descrição das condutas. O legislador reformador limitou-se a modificar a ordem de alguns verbos e trouxe para o fim do rol a expressão "ainda que gratuitamente", a qual poderá ser considerada como se referindo também à conduta de entregar a droga a consumo. Embora a criação de alguns tipos penais novos vá permitir um enquadramento mais perfeito de condutas antes subsumidas genericamente ao revogado art. 12, o crime ora em análise tende a continuar sendo o mais relevante da Lei de Drogas.

A mais significativa inovação do atual regramento sobre drogas, todavia, foi prescrever o aumento das penas privativa de liberdade e pecuniária. A pena mínima cominada ao delito foi aumentada de 3 (três) para 5 (cinco) anos, enquanto a pena pecuniária foi elevada de 50 (cinquenta) a 360 (trezentos e sessenta) dias-multa para 500 (quinhentos) a 1500 (mil e quinhentos) dias-multa.

Ao debruçar-se sobre a elevação da pena privativa de liberdade incrementada pela vigenteLei de Drogas, cotejando-a com os antecessores diplomas que cuidavam desse tema, Greco Filho (2009, p. 162/163) dispôs que:

A pena privativa de liberdade que já havia sido exacerbada pela Lei nº 6.368, comparando-se os textos de 1940, do Decreto-Lei nº. 385, e da Lei nº 5.726, foi ainda mais recrudescida pela atual lei. O aumento da pena mínima para cinco anos foi para evitar a substituição por penas restritivas de direito, mens legis expressa no § 4º, possibilidade que causava grande divergência doutrinária e jurisprudencial em face da Lei nº. 6.368, cuja pena mínima prevista era de três anos. A justificativa da exacerbação, desde a Lei nº. 6.368, sempre foi em virtude da distinção feita entre aquele que traz consigo, adquire ou guarda para uso próprio (atualmente para "consumo pessoal"), agora punido com as penas não privativas de liberdade do art. 28, assim como a de outras condutas punidas de maneira diferenciada, como os §§ 2º e 3º, agora previstas.

Ademais, tendo em vista que a precípua finalidade do traficante é o lucro, entendeu por bem o legislador aumentar a sanção pecuniária para desestimular a prática delitiva (MENDONÇA e CARVALHO, 2008, p. 89).

Aplaudindo tal premissa, Arruda (2007, p. 52) asseverou que:

O legislador pretendeu certamente asfixiar o tráfico também por meio de sanções financeiras, o que obedece a lógica de apenar pecuniariamente as condutas criminosas que propiciam lucro elevado aos agentes.

Insta salientar, ainda, que de acordo com § 4º do art. 33 da Lei de Drogas, nos delitos descritos no dispositivo citado poderá haver redução de pena de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços), desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas, nem integre organização criminosa. Cria-se, desse modo, uma espécie de tráfico privilegiado, em benefício do infrator recém-ingressante na mercancia ilícita.

Ao exame da matéria Marcão (2007, p. 137) aduz que:

A previsão é saudável na medida em que permite uma individualização mais adequada e proporcional da pena; contudo, deverá ser analisada com redobrada cautela, impondo ao magistrado cuidadosa apuração dos requisitos legais no curso da instrução, visando evitar conceder ou negar o benefício fora das hipóteses pretendidas pelo legislador.

Constata-se, portanto, que o legislador buscou com a nova Lei aumentar a distância entre o usuário e o traficante, sobretudo, a partir da diferenciação das penas cominadas para cada uma dessas figuras.

4.4 O TRAFICANTE E O USUÁRIO NA NOVA LEI DE DROGAS: UMA INTERPRETAÇÃO CRÍTICA DOS ASPECTOS DIFERENCIADORES

O contexto vivenciado no Brasil deixa evidente que o legislador buscou inovar no tratamento dado ao usuário e ao traficante com o advento da nova lei de drogas, não faltam críticas doutrinárias ao novel diploma, especialmente no que se refere aos critérios e à forma de utilização destes pelos agentes que atuam no enquadramento da conduta praticada por cada indivíduo.

Ao debruçar-se sobre os critérios utilizados, em âmbito mundial, no momento de definir-se estar diante de conduta de tráfico ou conduta de usuário, Gomes (2007, p. 161) doutrina que:

Há dois sistemas legais para se decidir sobre se o agente (que está envolvido com a posse ou porte de droga) é usuário ou traficante: (a) sistema da quantificação legal (fixa-se, nesse caso, um quantum diário para o consumo pessoal; até esse limite legal não há que se falar em tráfico); (b) sistema do reconhecimento judicial ou policial (cabe ao juiz ou à autoridade policial analisar cada caso concreto e decidir sobre o correto enquadramento típico). A última palavra é a judicial, de qualquer modo, é certo que a autoridade policial (quando o fato chega ao seu conhecimento) deve fazer a distinção entre o usuário e o traficante.

Destaca, ainda, o referido doutrinador que é da tradição da lei brasileira a adoção do sistema de reconhecimento judicial ou policial, o que ainda ocorre com o atual regramento sobre drogas.

Fato a registrar é que o artigo 28, § 2º, da Lei nº. 11.343/2006, não trouxe qualquer inovação à questão dos critérios diferenciadores entre o usuário e o traficante, perdendo a oportunidade de definir a conduta do dependente de substâncias psicoativas de uso proscrito no país. Certo é que a nova lei conservou a mesma redação dada ao artigo 37 da lei anterior, ou seja, omitiu-se sobre o tema abordado, promovendo divergências judiciais causadoras de graves consequências para os destinatários da lei.

À guisa de análise, faz-se essencial, nesse momento, transcrever o que prescreve o citado artigo 28, § 2º:

§ 2º Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente.

Olinger (2009, p. 11), informa que o fato do dispositivo legal não especificar quantidades determinadas para diferenciar o consumidor do traficante, expondo tão somente que deverá o juiz analisar as circunstancias da infração, perfil do infrator, entre outros, vem sendo discutido nos diversos eventos produzidos após a promulgação do referido diploma. E aduz a autora (2009, p. 12):

Dessa forma existe uma tendência a continuar prendendo negros e pobres como traficantes, já que mesmo que sejam encontrados com uma quantidade muito pequena de droga, tem grande probabilidade de ser acusados, pelas circunstâncias e perfil social, de estar servindo de atravessador/avião, enquanto o menino de classe média vai ter um bom advogado e mostrar que, com seu perfil e condição social, não é traficante.

Seguindo a mesma linha crítica de intelecção perfilhada por Olinger, Rodrigues (2009, p. 10) adverte que,

Ao flexibilizar os critérios de definição de que quantidade da substância poderia ser para consumo próprio e o que caracterizaria tráfico, o Sisnad coloca a cargo da polícia ostensiva a decisão de abrir ou não um processo judicial, permitindo que o policial escolha quem será liberado e quem será encaminhado à Justiça. A nova lei de drogas legaliza a seletividade de sua aplicação. Quem define inicialmente se o indivíduo é traficante ou usuário ainda é o policial.

Desse modo, Rodrigues (2009, p. 10) advoga o entendimento segundo o qual far-se-ia necessário modificar-se o dispositivo contido no § 2º do art. 28 da nova Lei de Drogas, inserindo quantidades determinadas de cada substância entorpecente, de maneira que se pudesse objetivamente enquadrar o indivíduo como usuário ou traficante a partir da quantidade de drogas que possuísse. Essa mudança legislativa decerto contribuiria para a redução de equívocos cometidos pelas autoridades policiais no momento de classificar o agente como traficante ou usuário.

Autores ainda defendem a necessidade de critérios quantitativos específicos na legislação de drogas, destacando sua imperiosidade até mesmo em razão da atuação do magistrado, objetivando salvaguardar a sociedade de eventuais arbitrariedades.

Nesse sentido Pedrinha (2009, p. 5486) ao asseverar que:

A Lei silencia quanto à quantidade específica de droga para classificar o usuário e o traficante, ficando a seleção ao arbítrio dos representantes do Estado. Dessa forma, a condição social, a cor, a raça de certos indivíduos serão fatores determinantes na aptidão à captura seletiva da polícia e dos magistrados

Na esteira do raciocínio de Pedrinha, soma-se o comentário de Nucci (2007, p. 308) quando aduz,

Naturalmente, espera-se que, com isso, não se faça uma juízo de valoração ligado às condições econômicas de alguém. Ex.: Se um rico traz consigo cinco cigarros de maconha, seria usuário porque pode pagar pela drogas. Entretanto, sendo o portador pessoa pobre, a mesma quantidade seria considerada tráfico. [...] Ilustrando, de modo mais razoável: aquele que traz consigo quantidade elevada de substância entorpecente e já possui anterior condenação por tráfico evidencia, como regra, a correta tipificação no art. 33 desta Lei.[...] o agente que traz consigo pequena quantidade de droga, sendo primário e sem qualquer antecedente, permite a conclusão de se tratar de mero usuário [...]. Não há entre os critérios o predomínio de uns sobre os outros, tudo a depender do caso concreto.

Assim, versando por um alinhamento da teoria mais crítica, Nucci entende que o magistrado, para distinguir o usuário do traficante, analisa apenas as circunstâncias sociais e pessoais, bem como os antecedentes do agente, ou seja, se for pobre será traficante, sendo rico será usuário.

Diferentemente dos posicionamentos anteriores que iam de encontro à própria norma contida no § 2º do art. 28, Vilar Lins (2007, p. 250), nas suas observações tão-somente quanto ao modo como os critérios ali estabelecidos devem ser aplicados, assegura que a mera quantidade não seria motivo suficiente para enquadrar a conduta nas hipóteses do art. 28, fazendo-se necessário identificar outros elementos. Nesse sentido:

Impõe-se ao magistrado buscar informações sobre a quantidade máxima de uso de determinada substância, ou seja, o limite de tolerância do organismo, para avaliar se o numerário apreendido poderia ou não ser desarrazoado para o consumo de um único indivíduo. [...] Registra-se, entretanto, que o limite é variável de sujeito para sujeito, bem como, em muitas circunstâncias, a exemplo dos casos de vício, ou seja, de uso habitual, o usuário prefere adquirir em grande quantidade para não se ver compelido a retornar ao mundo do tráfico em um espaço curto de tempo. Verifica-se, ainda, que em diversas oportunidades, um indivíduo está a portar drogas cuja efetiva propriedade é de outrem, que pode ter conferido àquele a incumbência de adquirir ou guardar, temporariamente a droga.

No que se refere à natureza da droga, essa autora (2007, p. 251) parte da premissa de que esse critério não deve ser analisado isoladamente, fazendo-se imprescindível a apreciação juntamente com a quantidade de substância apreendida. Nessa acepção, a mencionada autora dispõe que:

A natureza e a quantidade são critérios que devem ser pontuados conjuntamente, pois, a segunda está, essencialmente, atrelada à especificidade de cada substância. Assim, por exemplo, 100 gramas de cannabis (maconha) poderá ser considerado uma quantidade razoável para um usuário diário desta substância, o mesmo não podendo ser dito em face da cocaína ou heroína, cuja quantidade necessária para se obter o resultado esperado, bem como o seu nível de tolerância, é muito menor do que o da cannabis. A quantidade só será exorbitante, portanto, em face da natureza da substância em particular.

Ainda com fundamento no que entende Vilar Lins (2007, p. 251), em seus estudos sobre os critérios constantes do § 2º do art. 28 da Lei de Drogas, ao discorrer sobre o local e a condição em que desenvolve a ação de confisco da substância ilegal, assevera que:

O local e a condição em que ocorreu a apreensão formarão o cenário e o enredo em que estava inserido o usuário no momento em que foi flagrado. A doutrina fala, por exemplo, em locais em que, normalmente, são vendidas drogas, zona típica de tráfico. É conveniente ressaltar, entretanto, que, se existem essas zonas é porque também existem os usuários que lá transitam; assim, a presença de indivíduos neste loco não é razão suficientemente para enquadrá-lo no tráfico.

A autora verbera ainda sobre as características pessoais e sociais do agente, sua conduta e antecedentes, quando explicita ( 2007, p. 251) que:

As características pessoais e sociais do agente, segundo a lei, também devem ser analisadas pelas autoridades. Dessa maneira, a atividade que o sujeito desenvolve, seu processo histórico, como se dão suas relações, qual sua fonte de renda e patrimônio são características que, em conjunto, formam o que Luiz Flávio Gomes (2006) denominou de modus vivendi do agente.

Esse critério é um dos mais criticados pela doutrina, pois, nesse momento, entra em cena o princípio da seletividade, isto é, na maioria das vezes, apenas as pessoas marginalizadas é que terminam sendo punidas pelo sistema penal. Nessa esteira, Vilar Lins (2007, p. 251) faz sua crítica, expondo que:

A investigação desse ponto deflagra um série de preocupações quanto à sua aplicabilidade e efetividade, em razão da quase iminente e cristalina possibilidade de se acabar atingindo apenas aqueles indivíduos pertencentes a população carente, residentes em favelas e subúrbios.

Na mesma linha de pensamento delineada acima é o entendimento de Arruda (2007, p. 31), segundo o qual:

Tais critérios precisam ser aplicados com especial atenção. Não nos parece adequado que sejam levados em consideração os ‘antecedentes’ ou a ‘conduta social’ do agente como elementos idôneos à verificação da ocorrência de um ou outro delito. Tomando-se essa orientação ao pé da letra serão condenados e presos por tráfico os ‘suspeitos de sempre’, não sendo lícito partir de uma posição pré-concebida de que havendo praticado um delito de tráfico, aquele agente forçosamente voltará a cometê-lo, ou mesmo que tenha mais propensão ao ilícito do que qualquer outra pessoa. Cria-se assim uma rotulação perigosa dos indivíduos. Deixa-se de analisar o fato criminoso objetivamente para realizar uma apreciação subjetiva do agente.

Após discutir sobre os critérios elencados no § 2º do art. 28 da Nova Lei de Drogas, Vilar Lins (2007, p. 252/253) faz uma análise em relação à aplicação da lei para as pessoas que estão à margem da sociedade.

Nesse sentido, segundo a autora,

A atenção, no momento de averiguação destes critérios, quando a autoridade estiver diante de um sujeito miserável, é imperiosa. A análise deverá ser sopesada levando em consideração, sim, a sua realidade e problemática social, mas não para imputar ainda maior lesão ao cidadão, fazendo com que a sua condição social sirva não só de mola propulsora ao encaminhamento ao uso de drogas, bem como seja a própria navalha, apta a lhe proferir novo golpe. A miserabilidade econômica e social de um indivíduo não pode se tornar, ao mesmo tempo, o motivo de seu sofrimento diário e o argumento para concebê-lo como criminoso, sob pena de estar-se a violar a própria política de prevenção trazida pela Nova Lei de Drogas que resguarda uma proteção acrescida aos vulneráveis.

O entendimento da autora, esclareça-se, não se opõe à norma e sim, em à aplicabilidade dos referidos critérios. Desse modo, seu posicionamento, defendendo que:

O estabelecimento de exemplos de situações que deverão ser investigadas para defrontar em qual delito está a incidir o agente é a solução menos arbitrária, pois, de alguma forma, a decisão deverá partir de critérios pré-estabelecidos pelos quais as autoridades, obrigatoriamente, deverão caminhar, na fundamentação de sua decisão. Apenas, aqui se alerta para a aplicabilidade destes critérios, em razão das profundas e abismais diferenças de padrão social e econômico dos indivíduos no Brasil.

As diversas opiniões da doutrina aqui debatidas em redor dos critérios diferenciadores entre o traficante e o usuário na Nova Lei de Drogas, levam à percepção, ainda que inconclusiva, de que a análise desarrazoada desses dispositivos, pelos aplicadores do direito, pode levar a uma série de consequências penosas aos seus destinatários. Isso porque, a partir desses protagonistas e de suas histórias de vida, da forma como fazem a leitura do mundo e das pessoas, das ideologias que adotam nas suas manifestações, pode ocorrer uma penalização onde o alvo principal será apenas a população marginalizada, vista pela sociedade como costumeira infringidora da lei.

Sobre a autora
Daniela Araújo dos Santos Nascimento

Advogada em Feira de Santana (BA).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NASCIMENTO, Daniela Araújo Santos. O usuário e o traficante na Lei nº 11.343/2006.: Reflexões críticas sobre os aspectos diferenciadores. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2775, 5 fev. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18435. Acesso em: 23 dez. 2024.

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