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Doenças infecciosas: a solução doutrinária e o Direito Internacional

Agenda 01/02/2000 às 01:00

Poucas obras literárias estão disponíveis, em todo o mundo, com objetivos de chamar a atenção dos advogados militantes na área do Direito Internacional Público, e consequentemente oferecer melhor interpretação, acerca da realidade das doenças infecciosas emergentes e re-emergentes.

Finalmente, neste ano de 1999, nós, entusiastas do Direito Internacional, fomos premiados, com a brilhante obra de David P. Fidler – International Law and Infectious Diseases – (Clarendon Press – Oxford). Tal obra traça um paralelo sobre esta realidade que por vezes coloca países em desenvolvimento num confronto com países desenvolvidos, cuja tecnologia farmacêutica e situação socio-economica, são fatores determinantes para o dever de se comprometerem com a cooperação na erradicação de epidemias, conforme os objetivos do regulamento da WHO, em todos seus artigos.

Mas o mais importante, é que esta obra, desafia os profissionais de Direito Internacional, advogados; pesquisadores; professores e estudantes; a defenderem uma política mundial para o combate das doenças infecciosas, e sobretudo, defender os Direitos Humanos daqueles que necessitam de cooperação internacional para manutenção dos níveis mínimos de qualidade sanitária.

Com este intuito, a obra de David Fidler, busca na sua origem, a historia do maior problema que a humanidade sempre enfrentou, e que certamente ainda enfrentará até que a consciência mundial tenha compreendido a verdadeira extensão da ameaça que constituem as doenças infecciosas, emergentes e re-emergentes. E com a mesma intenção, tratarei de completar meus comentários a respeito do assunto.

As doenças infecciosas, desenvolveram um papel dramático na história humana. A descrição da praga de Atenas e seus efeitos sobre os Atenienses, e seu poder, é um dos mais famosos e antigos registros de um devastadora doença infecciosa.(1) A "Peste Negra", na idade média, matou um significante proporção da população em muitas regiões Européias.(2)

A disseminação dos Nativos Americanos por epidemias Européias durante a conquista Européia das Américas do Norte e do Sul, permanece como clara evidencia do poder do mundo microbiológico(3). A epidemia da Cólera no século XIX implantou o medo entre os Europeus e levou seus governos à um pacto de cooperação internacional na área de saúde(4). Uma febre virótica circum-navegou o globo em 1918 – 1919, matando mais de vinte milhões de pessoas.(5)

Mais recentemente, a epidemia da AIDS se tornou a grande praga do século XX(6). Enfim, a epidemia da AIDS trouxe grandes preocupações, a nível global, sobre doenças emergentes e re-emergentes(7).

A historia das doenças infecciosas, conforme bem destacado por David Fidler, não atraiu, todavia, o interesse dos advogados Internacionais. Enquanto algumas atenções estavam voltadas para as leis sanitárias internacionais, esta parte do Direito Internacional não tem sido um tópico discutido, no extenso interesse legal internacional. Dentro da pequena disponibilidade literária sobre o Direito Sanitário Internacional, as doenças infecciosas tem, infelizmente, recebido limitada atenção. Esta falta de interesse, é surpreendente, dado aos extensos esforços Diplomáticos no assunto. Além do mais, as doenças infecciosas afetam tantas áreas do Direito Internacional, que chega a ser curioso porque os advogados internacionais não demonstraram interesses, no confronto entre o Mundo Microbiológico e o Direito Internacional.

A citada obra tem, felizmente, sua atenção voltada para as questões legais internacionais criadas pelas tentativas da humanidade em lidar com as doenças infecciosas.

No capitulo I, analisa porque as doenças infecciosas retornaram ao "front" das questões globais da saúde Pública, nas duas ultimas décadas do Século XX. A volta das doenças infecciosas à globalização da saúde pública, está diretamente ligada ao tema desta obra. Entendendo a globalização da saúde publica, torna claro a importância do Direito Internacional, no esforço em lidar com as doenças infecciosas. Muitos fatores contribuem para o aparecimento e o reaparecimento de doenças infecciosas, referem-se a áreas em que o Direito Internacional está diretamente ligado – viagens, comércio, guerra, tratamentos à indivíduos, a qualidade dos sistemas de saúde publica, e a degradação do ambiente.

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No capitulo I apresenta também um conceito usado no discorrer de sua obra, a "politicamicrobiologica", ou seja, políticas internacionais na tentativa de controlar as doenças infecciosas. Uma vez que o Direito Internacional trata das questões dentro de um contexto especificamente político, a obra examina as políticas internacionais que as doenças infecciosas resultam. O Direito internacional examinado neste estudo, é um produto da politicamicrobiologica. Entendendo a politicamicrobiologica, ajuda a dar um contexto ao Direito Internacional sobre as doenças infecciosas.

Uma vez que os advogados internacionais não tem estudado com freqüência o Direito Internacional em relação as doenças infecciosas, neste capitulo, o livro de David Fidler faz um resumo sobre o Direito Internacional no controle das doenças infecciosas.(8) Esta histórica análise trata do desenvolvimento do Direito Internacional sobre doenças infecciosas desde a metade do século XIX até a criação da OMS. No capitulo II, ainda examina a atenção dos objetivos diplomáticos, neste século, e do Direito Internacional, sobre doenças infecciosas: a) A proteção da Europa contra as epidemias Asiáticas; b) a harmonização e a regulamentação das quarentenas; c) a criação de um sistema de vigilância internacional contra doenças infecciosas, e; d) a criação de organizações internacionais voltadas para a saúde.

No capitulo III analisa ainda o Regulamento Internacional de Saúde (RIS) adotado e implementado pela Organização Mundial de Saúde. O RIS, representa a única regra obrigatória de Direito Internacional sobre doenças infecciosas criada pela OMS, sendo então a principal preocupação desta monografia. Este capitulo, examina ainda os fundamentos do RIS na constituição da OMS, a historia do RIS, e os atuais esforços da OMS em revisar o RIS à luz das crises globais sobre doenças infecciosas emergentes e re-emergentes.

Já o capitulo IV, discute as fontes de Direito Internacional em conecção com os esforços internacionais legais no controle das doenças infecciosas. Analisa as fontes de Direito Internacional contra o que a diplomacia produziu no controle das doenças infecciosas antes e depois da II grande guerra.

Os quatro próximos capítulos analisam ainda as áreas do Direito Internacional em que as doenças infecciosas causam preocupações e problemas – comercio internacional; direitos humanos; conflitos armados; e proteção ambiental. E observam como as leis de comercio internacional lida com medidas comerciais-restritivas, que os Estados justificam com base em saúde publica. Importante para essa analise é o acordo da OMS na aplicação de medidas sanitárias e fitosanitárias em suas decisões sobre disputas referentes à este acordo. Explora ainda, quando as medidas de controle das doenças infecciosas restringem os direitos humanos bem como as controvérsias sobre o "direito à saúde". Também focaliza os problemas dos direitos humanos criados pela epidemia da AIDS, que estimulou extensa literatura nas questões de direitos humanos.

Uma vez que as pragas de doenças infecciosas tem ao longo dos tempos sacrificado soldados e populações civis durante as guerras, o Capitulo VII explora como o Direito Internacional regulamenta os armamentos e os conflitos armados para controlar as doenças infecciosas. O Direito Humanitário Internacional constitui a maior fonte material neste capitulo. As crescentes preocupações sobre armas biológicas e terrorismos biológicos são também fatores discutidos neste capitulo.

Experts em saúde publica freqüentemente citam a degradação ambiental como fator preponderante das doenças infecciosas , emergentes e re-emergentes . Dentre eles alguns temem que uma mudança global do ambiente, particularmente um aquecimento global, poderia produzir conseqüências desagradáveis com doenças infecciosas. No capitulo VIII analisa David Fidler, como o direito ambiental internacional é relevante para intender os problemas globais criados pelos micróbios patogênicos . Este capitulo examina o direito internacional sobre a poluição do ar, da água, do mar, o desmatamento, a diminuição da camada de ozônio e as mudanças climáticas pertinentes as preocupações globais sobre doenças infecciosas.

E finalmente o capitulo IX possibilita um trabalho teórico para o entendimento do papel central do direito internacional na politicamicrobiologica. Esta analise feita sobre o conceito da teoria de relações internacionais, bem como o processo legislativo internacional em outros regimes tais quais comercio internacional, navegação, aviação civil, trabalho e o ambiente. E apresenta mais adiante o conceito de jurisprudência global sobre saúde como uma forma de organizar futuras ações legais sobre doenças infecciosas.

A conclusão re-interpreta a relação histórica entre os seres humanos e os micróbios patológicos pelo desgastante impacto da estrutura e dinâmica do sistema político internacional. Este confronto divide a relação humano-microbio em quatro períodos e discute o quanto importante o sistema internacional tem sido em modular três destes quatro períodos. Esta reinterpretação põe o papel do direito internacional na luta da humanidade com as doenças infecciosas numa perspectiva histórica e desafiadora que a humanidade enfrenta no período de desenvolvimento da politicamicrobiologica.

Embora a monografia dê uma analise compreensiva do direito internacional em questões de doenças infecciosas, não esgota este assunto. Cada área do direito internacional analisada esta em permanente evolução, tornando impossível uma analise definitiva. Alem do mais o espaço constrito faz-se necessário evitar analisar todas as questões em profundidade.(9) Outro desafio será escrever não somente para especialistas em direito internacional mas também para os profissionais da saúde publica que geralmente desconhecem o direito internacional.

Apesar destes problemas, esta brilhante obra contribui para as questões de litígio internacional, saúde publica e relações internacionais a nível escolar, para encorajar a outros entusiastas do Direito Internacional, a explorar esta crescente questão critica global.


NOTAS

  1. Tucidides, historia da guerra Peloponesiana.
  2. Epidemias e historia, Cartwright, 1972.
  3. Ver, Crosby, Jr. Conseqüências Culturais e Biológicas de 1492.
  4. OMS e seus esforços no campo sanitário internacional.
  5. Ver, Crosby, Jr. A epidemia esquecida pela América: A febre de 1918.
  6. A OMS e UNAIDS, estimam que 11,7 milhões de pessoas, em todo o mundo, morreram de AIDS, desde o começo da epidemia, até Dezembro de 1997, e 30,6 milhões de pessoas estavam infectadas com seu vírus, conforme relatório da OMS/UNAIDS sobre a epidemia global HIV/AIDS.
  7. Olshansky, em "Doenças infecciosas – Novas e Antigas ameaças ao Mundo da Saúde.
  8. Este resumo é fruto de um estudo realizado para proveito dos advogados internacionais.
  9. Por exemplo análises de doenças da fauna e flora, a cooperação internacional e as leis que desenvolvem seu controle não botem analises detalhadas da mesma forma que as doenças humanas.
Sobre o autor
Luís Carlos Faria

acadêmico da Faculdade de Direito do Oeste de Minas (FADOM), em Divinópolis (MG)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FARIA, Luís Carlos. Doenças infecciosas: a solução doutrinária e o Direito Internacional. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 39, 1 fev. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1876. Acesso em: 7 nov. 2024.

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