4. Considerações finais
O Mercosul, enquanto união aduaneira imperfeita, está em processo de desenvolvimento e de consolidação de suas instituições. Para que o processo de integração avance e se consolide como união aduaneira e, posteriormente, como mercado comum, há necessidade de que suas instituições ampliem sua competência para atuar em outras áreas da integração e não apenas na área comercial, visto que seus tratados constitutivos vislumbram uma futura integração social, cultural e política.
A importância do Mercosul para a região é inegável. Seu alargamento e aprofundamento elevam o número de controvérsias, o que tornará necessário um sistema de solução de controvérsias que garanta estabilidade do processo de integração, a fim de que mantenha credibilidade e segurança jurídica para atrair investimentos e fomentar o intercâmbio comercial, social, cultural e político.
Neste sentido, deixou claro o Tribunal Permanente de Revisão no Laudo N. 1/2007, de 08 de junho de 2007, constituído para entender na solicitação de pronunciamento sobre excesso na aplicação de medidas compensatórias – controvérsia entre Uruguai e Argentina sobre proibição de importação de pneumáticos remodelados procedentes do Uruguai. A falta de observância de uma decisão do Tribunal, desfavorável ao Estado Parte, põe em causa a estabilidade e efetividade das instituições do Mercosul, provocando, assim mesmo, uma preocupante sensação de descrédito na sociedade em relação ao processo como um todo.
O sistema de solução de controvérsias no Mercosul no marco do Protocolo de Brasília se mostrou insuficiente e provisório. Mas foi importante não só para se criar as condições de se estabelecer um sistema permanente, mas também para a busca do processo de convergência da tarifa externa comum (TEC), o que não ocorreu até a presente data. Do Protocolo de Brasília, aprovado em 1991, ao Protocolo de Olivos, subscrito em fevereiro de 2002, o sistema tem sido paulatinamente aperfeiçoado, mas não sofreu grandes alterações, no sentido de fortalecer o processo de integração. Entretanto, é de se reconhecer uma inovação significativa, produzida no interior do procedimento arbitral, trazida pelo Protocolo de Olivos, que foi a criação de um Tribunal Permanente de Revisão, integrado por 5 árbitros, uma espécie de segunda instância, com competência para apreciar os laudos arbitrais prolatados pelo TAH. O Tribunal de Revisão talvez venha a representar um passo importante para se pensar em um Tribunal de Justiça para o Mercosul, a partir da experiência que aquele tribunal possa proporcionar à integração sub-regional.
Os meios de solução de controvérsias entre os Estados Partes do Mercosul, previstos pelos Protocolos, são os clássicos meios previstos no Direito internacional. Entretanto, quando da interpretação e da aplicação das regras da integração pelos TAH e TPR, nos casos julgados, a solução se revestiu de maior eficácia e especificidade do que tradicionalmente é visto por aquele sistema do Direito internacional.
Ao empreender uma visão pragmática para as decisões, na qual o processo de integração é visto como uma realidade dinâmica, e que o sistema do Tratado de Assunção e de seus Anexos mostram claramente uma combinação de normas próprias de um tratado quadro com outras de caráter operacional, os TAH e TPR produziram uma interpretação corajosa, na qual o Tratdo de Assunção vai além de um tratado quadro, constituindo um esquema normativo que flutua entre um "direito diretivo" – com bases jurídicas gerais – e "um direito operacional" – constituído por compromissos concretos, apontado para o futuro.
Por fim, é justo anotar que o método teleológico, empregado pelos primeiros Tribunais ad hoc, serviu de parâmetro para os demais. Segundo esse método, ao aplicar as normas, procura-se garantir sua eficácia em relação com seu fim último, que é o de dar satisfação às exigências da integração. Partindo do Protocolo de Brasília e do Protocolo de Olivos, os Tribunais buscaram sua base argumentativa, considerando os textos dos instrumentos internacionais, em seu sentido gramatical e sistemático; do contexto desses instrumentos e do conjunto normativo Mercosul. Nesta perspectiva, conforme expresso pelos Tribunais, a interpretação teleológica acha-se controlada por sua combinação operacional com os outros métodos e, em si mesma, ao associar as noções de objeto e de fim que equilibram seus conteúdos reais e ideais.
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