RESUMO
O presente ensaio tem por objetivo apreciar a natureza da responsabilidade a ser imputada ao empregador nos danos causados a saúde do empregado. A sociedade contemporânea em conluio com o avanço tecnológico, ao contrário do que se imaginava, vem trazendo consigo um aumento considerável de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho. O ordenamento jurídico brasileiro dispõe sobre a responsabilidade de natureza objetiva e subjetiva do empregador nos sinistros sofridos pelo empregado decorrentes do trabalho. O alto risco ergonômico aos quais certos trabalhadores estão expostos, pela própria natureza da atividade do empregador, nos remete ao estudo de qual seria a mais correta teoria a ser aplicada pelo Julgador, a subjetiva onde há que se perquirir a culpa do empregador e a objetiva onde a responsabilidade pelo dano é imputada ao empregador independentemente da análise da culpa. Nesse diapasão, faz-se necessária a análise do caso concreto de forma não açodada, para a aplicação com parcimônia da teoria mais compatível, sem esquecer dos casos de exclusão da responsabilidade civil sobre o evento danoso.
PALAVRAS-CHAVE: RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR – DANOS À SAÚDE.
ABSTRACT
This essay aims to assess the nature of liability to be imputed to the employer in damages to employee health. The Contemporary society in collusion with the technological progress, contrary to all expectations, has brought with it a considerable increase of accidents and work-related diseases. The Brazilian legal system provides for the responsibility of objective and subjective nature of the employer in accidents suffered by the employee working. The high ergonomic risk to which certain workers are exposed by the very nature of the employer's business, take us to study which would be the most correct theory to be applied by the judge, the subjective to where it is necessary to assert the fault of the employer and where the objective liability for damage is imputed to the employer regardless of fault analysis. In this vein, it is necessary to analyze the case of a non-hasty, to apply sparingly theory more compatible, without forget the cases of exclusion of civil liability about the damaging event.
KEYWORDS: EMPLOYER'S CIVIL LIABILITY - DAMAGE HEALTH.
SUMÁRIO: Introdução; 1 A realidade do pacto laboral. As medidas protetivas de segurança e medicina do trabalho; 2 Ato ilícito; 3 Responsabilidade civil subjetiva e objetiva; 3.1 Responsabilidade civil do empregador por ato do empregado; 3.2 Responsabilidade civil do empregado por ato do empregador; 4 Causas de exclusão da responsabilidade por danos decorrentes do acidente do trabalho; Conclusão; Referências bibliográficas.
INTRODUÇÃO
O presente estudo visa demonstrar a coexistência pacífica, o que vem sendo consolidado nas decisões dos tribunais trabalhistas, do implemento das teorias de responsabilidade objetiva e subjetiva do empregador nos infortúnios sofridos pelo empregado, com prévia análise minuciosa do caso concreto. Isto significa dizer que a adoção de forma indiscriminada tão somente da teoria da responsabilidade civil objetiva ou, da teoria de responsabilidade civil subjetiva do empregador acarreta temerosa insegurança jurídica tanto à parte hipossuficiente que continua sendo o empregado, quanto para o empregador, ainda figurando como menos vulnerável.
Prescinde de análise ao caso concreto a natureza da responsabilidade do empregador, o que nos remete, primeiramente ao estudo da atividade desenvolvida como a verificação dos riscos ergonômicos inerentes a esta, às circunstâncias que envolveram o sinistro, a conduta do empregado, as medidas protetivas de segurança e medicina do trabalho adotadas pelo empregador entre outros.
Propõe-se então perquirir acerca da realidade laboral com a abordagem dos questionamentos expostos a fim de que possamos com maior segurança imputar ou não ao empregador a responsabilidade pelos danos causados à saúde do empregado.
O trabalho em comento traz ainda as causas que excluem a responsabilidade civil do empregador sobre o evento danoso, bem como aborda responsabilidade do empregador face ilícito cometido por seus empregados e a responsabilidade do empregado para com o empregador no desempenho do pacto laboral.
1 A REALIDADE DO PACTO LABORAL. AS MEDIDAS PROTETIVAS DE SEGURANÇA E MEDICINA DO TRABALHO
A análise da natureza da atividade desenvolvida pelo empregador em concomitância com às medidas de segurança e medicina do trabalho por ele implementadas é, sem dúvida, um dos principais tópicos a ser perquirido. O artigo 2 da Consolidação das Leis do Trabalho define empregador como "a empresa, individual ou coletiva, que assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços".
Com efeito, ao abordarmos os riscos da atividade econômica inerentes ao empregador, constatamos que a evolução tecnológica se fez acompanhar de novos ambientes de trabalho e de riscos profissionais a eles associados. Muitos desses novos riscos são pouco ou nada conhecidos e demandam pesquisas cujos resultados só se apresentam após a exposição prolongada dos trabalhadores a ambientes nocivos à sua saúde e integridade física.
Hoje, o setor de segurança e saúde no trabalho é multidisciplinar e tem como objetivo principal a prevenção dos riscos profissionais originados pela atividade econômica. O avanço tecnológico em si, muito embora tenha surgido como um avassalador substituto da mão de obra humana conseguiu reduzir em muito pouco os riscos ergonômicos aos quais os trabalhadores ficam expostos em certas atividades, principalmente industriais, isto porque o mundo capitalizado fez aumentar a jornada de trabalho, que por se tornar excessiva para atender a demandada cada vez maior do mercado, submete os trabalhadores a danos à saúde física e mental.
Naturalmente, toda a atividade humana está sujeita a sinistros; entretanto, os resultados danosos acentuam-se ante a carência de prevenção.
O risco de acidente de trabalho muitas vezes é inevitável; entretanto, ele deverá ser prevenido. Aí é que reside a responsabilidade do empregador: proteger o empregado a fim de prevenir situações de perigo. É seu dever legal observar as normas de segurança, higiene e saúde do trabalho, instruindo seus empregados quanto aos cuidados a serem observados no desempenho de suas tarefas. A inobservância de norma de conduta, com resultado danoso ao empregado, cujo o empregador tem o dever de conhecer e observar, traz conseqüências no âmbito da responsabilidade civil. [01]
Quando falamos em sinistros, infortúnios oriundos da atividade laboral, estamos nos referindo a acidentes e doenças do trabalho. Lembramos assim o conceito elaborado por Maria Helena Diniz: "Acidente do trabalho é o que resulta no exercício do trabalho, provocando direta ou indiretamente , lesão corporal, perturbação funcional ou doença, que determine morte, perda total ou parcial , permanente ou temporária da capacidade para o trabalho". [02]
De acordo com o art. 20 da Lei 8.213/91, consideram-se acidente do trabalho as seguintes entidades mórbidas:
I – doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada elo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social;
II – doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I.
No intuito de evitar acidentes de trabalho e doenças a este equiparáveis, bem como de propiciar ao trabalhador melhores condições de trabalho, a Consolidação das Leis do Trabalho impõe coercitivamente ao empregador a observância aos preceitos exarados em seu Capítulo V, sob o título da Segurança e Medicina do Trabalho, artigos 154 a 201, entre outros encontrados na legislação esparsa.
Nesta senda, sabemos que o contrato de trabalho por ser bilateral, origina uma série de obrigações tanto para o empregado quanto para o empregador. Em relação ao primeiro, a obrigação principal consiste em prestar serviços, e, quanto ao segundo, no pagamento de salário.
Além dessas obrigações o contrato de trabalho é constituído por outras de natureza acessória, sendo estas últimas definidas por lei, convenções coletivas, acordos coletivos, sentença normativa ou pelo contrato, desde que não contrarie os princípios reguladores do Direito do Trabalho, em face do princípio protetivo que lhe é peculiar.
Dentro deste contexto assim se posiciona José Cairo Júnior:
Dentre as cláusulas acessórias, existe uma implícita, mas importante, que dispõe ao empregador o dever de proporcionar segurança, higiene e saúde para seus empregados, também denominada obrigação de custódia, dever de segurança ou cláusula de incolumidade. [03]
Bento Faria também faz referência expressa ao dever de segurança, quando analisa a questão do acidente de trabalho, ao afirmar que "o patrão devia aos trabalhadores que assalariava a garantia da devida segurança". [04]
Com efeito, vislumbramos que sendo o ônus do negócio de responsabilidade do empregador, é também dele o dever de zelar pela incolumidade dos seus empregados, o que não significa dizer que a responsabilidade civil do empregador pelos danos ä saúde do empregado independe da verificação de culpa deste último no evento danoso, o que veremos melhor no decorrer deste estudo.
2 ATO ILÍCITO
Sabemos que a responsabilidade por um evento danoso decorre de um ato ilícito. Assim, no dizer de Washington de Barros Monteiro, ato ilícito "também é ato da vontade, mas que produz efeitos jurídicos independentemente da vontade do agente". [05]
O conceito de ilicitude é estudado por Aparecida Amarante, que apresenta duas teorias para explicá-lo.
A teoria subjetiva, a primeira, que vem a ser "aquela que considera ilícita a provocação, a menos que seu autor tenha agido com direito, ou seja, em virtude de autorização jurídica expressa. Tal teoria considera a ilicitude do ponto de vista do agente, gizando que tudo quanto não lhe é expressamente permitido é considerado ilícito." [06]
Portanto, segundo a autora, age ilicitamente quem age sem direito.
A segunda, chamada teoria objetiva, segundo Amarante "aprecia a ilicitude do ponto de vista da vítima, pregando que tudo o que não é proibido é lícito, sendo ilícito só o que é proibido pelo Direito. Por tal teoria, o ilícito consiste no atentado a um direito, na violação das obrigações, que se tem em relação aos outros, e, por conseqüência, à esfera jurídica de outrem." [07]
Tais opiniões precedem o Código Civil de 2002, mas já acenavam para a necessidade de elastecimento dos contornos do ato ilícito, para abarcar outras formas de conduta que, apesar de permitidas pela lei, mereciam reprovação frente aos critérios inspiradores que moldaram a nova lei.
No caso específico do presente estudo, não há como responsabilizar civilmente o empregador sem a existência de um ato ilícito que posse ser a ele imputado, sendo posterior a apreciação da existência da culpa.
3 RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA E OBJETIVA
A responsabilidade civil surge em face do direito obrigacional, pela desobediência de uma regra estabelecida em um contrato, ou por deixar-se de observar um preceito normativo que regule a vida em sociedade.
Sobre o tema Gagliano e Pamplona Filho assim argumentam:
[...]a noção jurídica de responsabilidade pressupõe atividade danosa de alguém que, atuando a priori ilicitamente, l viola uma norma jurídica preexistente (legal ou contratual), subordinando-se, dessa forma, às conseqüências do seu ato (obrigação de reparar). [08]
Segundo Maria Helena Diniz,a responsabilidade civil está relacionada com:
[...] a aplicação das medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato próprio imputado, de pessoas por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda (responsabilidade subjetiva) ou, ainda, de simples imposição legal (responsabilidade objetiva).
A teoria da responsabilidade subjetiva prescreve que a responsabilidade do empregador pelos danos decorrentes de infortúnio laboral pressupõe ação culposa ou dolosa deste, cujo ônus da prova cabe ao empregado.
Nesse sentido, o artigo 7°, inciso XXVIII, da Constituição Federal, esclarece que: "seguro contra acidentes do trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa". (sublinhamos)
Com efeito, o artigo 186 do Código Civil dispõe: "Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito". (sublinhamos).
Desta feita, seguindo-se o ordenamento constitucional, a responsabilidade civil de direito comum do empregador pode ter fundamento na conduta negligente, imprudente ou destituída da perícia necessária por parte deste, que pode configurar-se tanto por conduta comissiva ou omissiva das medidas elementares na segurança do trabalhador, seguindo assim a regra da responsabilidade subjetiva, prevista no artigo 186 do CC, isto porque para o direito civil não importa a qualificação da culpa.
Nesta senda dispõe Helder Martinez Dal Col:
A responsabilidade subjetiva lastreia-se na idéia da culpa. Para a teoria clássica, ou teoria da culpa, não há responsabilidade sem a presença desse elemento subjetivo. A prova da culpa (assim entendida em sentido lato, abrangendo o dolo e a culpa em suas diversas modalidades), torna-se pressuposto da pretensão indenizatória. [09]
Já para Pamplona Filho a responsabilidade civil subjetiva configura-se como:
É a decorrente de dano causado diretamente pela pessoa obrigada a reparar, em função de ato doloso ou culposo. Em outras palavras, a responsabilidade civil subjetiva implica necessariamente a inclusão de um quarto pressuposto caracterizador, decorrendo, portanto, da conjunção dos seguintes elementos: a) ação ou omissão; b) dano; c) elo de causalidade entre ação/omissão e dano; d) o dolo ou culpa do agente causador. [10]
Depreende-se pelos ensinamentos da doutrina que a responsabilidade na ausência do ilícito é afastada completamente, eis que, se não houver ato ilícito, não há nenhuma possibilidade de se pensar em responsabilização civil, quer por responsabilização objetiva, quer por subjetiva, ainda que haja dano.
Pelo exposto, a teoria da responsabilidade subjetiva pressupõe a existência de culpa ou dolo, na eclosão do evento danoso, sendo fato impeditivo de eventuais pretensões indenizatórias a inexistência de culpa ou dolo por parte do empregador.
Rui Stoco, in ‘Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial’, ed. RT, p. 43, desdobra o conceito de culpa, na esfera civil:
A culpa é a inexecução de um dever que o agente podia conhecer e observar. Se conhecia efetivamente e o violou deliberadamente, há delito civil, ou em matéria de contrato, dolo contratual. Se a violação do dever foi involuntária, podendo conhecê-la e evitá-la, há culpa simples; Fora destas matérias contratuais denomina-se "quase delito". [11]
Com efeito, os danos decorrentes de eventual infortúnio laboral devem ser imputados a quem tenha dado causa ao acontecimento. Nesse sentido, o dever de indenizar por parte do empregador surge somente na hipótese do mesmo não ter utilizado os meios necessários e possíveis no sentido de evitar qualquer dano a saúde dos seus trabalhadores.
Resta, portanto, imprescindível a comprovação do nexo de causalidade para fazer valer o direito de indenização da vítima com o correspondente dever de indenizar do agente.
O nexo de causalidade ou, mais precisamente, o nexo técnico epidemiológico foi instituído pela Lei 11.430/2006, a qual acrescentou a Lei 8.213/91 a seguinte previsão:
Art. 21-A. A perícia médica do INSS considerará caracterizada a natureza acidentária da incapacidade quando constatar ocorrência de nexo técnico epidemiológico entre o trabalho e o agravo, decorrente da relação entre a atividade da empresa e a entidade mórbida motivadora da incapacidade elencada na Classificação Internacional de Doenças - CID, em conformidade com o que dispuser o regulamento.
Com efeito, Maria Helena Diniz, discorre de forma impecável acerca da matéria:
(...) entendemos que a responsabilidade civil requer: a) existência de uma ação: (...) b) ocorrência de dano moral ou patrimonial causado à vítima: (...) c) nexo de causalidade entre o dano e a ação (fato gerador da responsabilidade), pois a responsabilidade civil não poderá existir sem o vínculo entre a ação e o dano. Se o lesado experimentar um dano, mas este não resultou da conduta do réu, o pedido de indenização será improcedente. [12]
Já a responsabilidade civil objetiva funda-se na ausência de culpa. Em se tratando de responsabilidade objetiva, necessária a demonstração do fato, dano e nexo de causalidade.
A teoria da responsabilidade objetiva pelo Código Civil vigente é baseada na teoria do risco, decorrente da própria atividade do empregador ou da empresa, quando coloca o patrimônio material ou extrapatrimonial de terceiros, entre eles os seus empregados em risco potencial. Neste caso basta a prova do prejuízo e o nexo de causalidade para que o perpetrador do ato seja obrigado à reparação ou indenização.
Afirma Sebastião Geraldo de Oliveira que a teoria do risco criado "não indaga se houve ou não proveito para o responsável; a reparação do dano é devida pela simples criação do risco". [13] Já para Dellegrave Neto, na teoria do risco criado "a obrigação de indenizar está atrelada ao risco criado por atividades lícitas, contudo perigosas" [14] Complementa o pensamento pontuando que, "Quem tem por objeto negocial uma atividade que enseja perigo, deve assumir os riscos à sociedade".
Com efeito, com base na redação do parágrafo único do artigo 927 do Código Civil de 2002, muitas vozes se levantaram afirmativamente quanto a responsabilização objetiva do empregador quando, em razão da atividade desenvolvida, impuser seus colaboradores a risco. Para fundamentar tal entendimento Gagliano faz a seguinte ponderação:
Todavia, não podemos descurar da nova regra da parte final do parágrafo único do art. 927 do CC-02, que estabelece uma responsabilidade civil objetiva, quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, riscos para os direitos de outrem. A regra parece ser feita sob medida para as relações empregatícias, pois, como já exposto, é o empregador que deve assumir os riscos da atividade econômica. É lógico que o risco a que se refere a disposição celetista é o risco/proveito, ou seja, a potencial ruína pelo insucesso da atividade econômica com que se pretendeu obter lucro. [15]
Dellegrave Neto refere-se à teoria do risco criado para justificar a aplicação do dispositivo citado às atividades periculosas por sua própria natureza, a exemplo do trabalho nas minas subterrâneas e atividades nucleares. Entende o doutrinador citado que: "A teoria do risco criado, além de ser mais equitativa, ampliou o conceito de risco proveito, na medida em que a vítima sequer terá que provar que o dano resultou de uma vantagem ou de um proveito obtido pelo agente" [16]. Lisboa vai além, afirmando que:
Realmente não se deve manter a responsabilidade subjetiva por acidentes de trabalho quando a indenização for de natureza civil. Deve-se propugnar pela modificação do texto constitucional, não se podendo admitir a escusa de que ele trata de cláusula pétrea porque a norma é de direito social cuja proteção pode ser aperfeiçoada, jamais vilipendiada ou suprimida. [17]
Vislumbramos que a doutrina se divide entre a aplicação indiscriminada da teoria da responsabilidade subjetiva do empregador e da responsabilidade objetiva, calcada no risco criado pelo empregador devido a natureza da atividade desenvolvida. Contudo, há aqueles, hoje em sua grande maioria, que consideram a aplicação de ambas, o que se denota pelas recentes decisões prolatadas pelo Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, posicionamento este do qual também comungamos, vejamos algumas delas, "in verbis":
ACIDENTE DO TRABALHO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR. MODO DE IMPUTAÇÃO DO AGENTE. A regra geral de responsabilidade civil do empregador quanto a acidentes do trabalho é a responsabilidade subjetiva, baseada no princípio da culpa. Pode o empregador ser responsabilizado objetivamente nas hipóteses previstas em lei, ou quando, pela natureza da atividade desenvolvida pelo empregado, houver risco de lesão. É do julgador a prerrogativa de estabelecer qual o modo de imputação de responsabilidade do empregador, se pela forma subjetiva, com base na culpa, ou pela forma objetiva, com base no risco. (Ac. processo 0168800-85.2008.5.04.0741 (RO).Redator: RICARDO HOFMEISTER DE ALMEIDA MARTINS COSTA.Participam: VANIA MATTOS, TÂNIA MACIEL DE SOUZA. Data: 29/04/2010 Origem: Vara do Trabalho de Santo Ângelo). (sublinhamos)
ACIDENTE DO TRABALHO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DO EMPREGADOR. NÃO-CONFIGURAÇÃO. A pretensão do autor de perceber indenização por danos materiais, morais e estéticos a ele causados em decorrência de acidente do trabalho depende, necessariamente, da comprovação de culpa do empregador, nos termos dos artigos 186 e 927 do Código Civil, haja vista que as atividades desempenhadas não implicavam risco excessivo ou superior a que estão sujeitas as demais atividade laborativas. Considerando que o contexto dos autos aponta para a culpa exclusiva da vítima pelo acidente sofrido e para a observância, por parte da empresa, das condições adequadas à segurança do trabalho, impõe-se a confirmação da sentença que afastou a responsabilidade da reclamada, por não preenchidos os requisitos do artigo 927 do CC, pelo que indevidas as indenizações postuladas na inicial. (Ac. processo 0040500-83.2008.5.04.0231 (RO) Redator: FABIANO DE CASTILHOS BERTOLUCCI. Data: 29/10/2009. Origem: 1ª Vara do Trabalho de Gravataí) (sublinhamos)
Desta feita, a teoria da responsabilidade civil subjetiva não se revela adequada para abarcar todas as hipóteses de dano decorrente de acidente do trabalho ou doença a este equiparável, assim como não se pode impor à teoria da responsabilidade civil objetiva a todos os casos, o que prescinda de análise detalhada do caso concreto.
3.1 Responsabilidade civil do empregador por ato do empregado
A responsabilidade civil do empregador pelos atos de seus empregados, no exercício do trabalho ou em razão dele é uma hipótese de responsabilidade civil objetiva, o que se infere quer pela redação da Súmula 341 do STF que diz "ser presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto", quer pelo artigo 932, III, do Código Civil brasileiro, que dispõe:
Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:
(...)
III - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele;
Pamplona Filho e Gagliano, sobre o tema, argumentam que "a idéia de culpa, na modalidade in eligendo, tornou-se legalmente irrelevante para se aferir a responsabilização civil do empregador, propugnando-se pela mais ampla ressarcibilidade da vítima, o que se mostra perfeitamente compatível coma vocação, aqui já demonstrada, de que o empregador deve responder pelos riscos econômicos da atividade exercida. E essa responsabilidade é objetiva, independentemente de que m seja o sujeito vitimado pela conduta do empregado ou um terceiro ao ambiente laboral (fornecedor, cliente, transeunte, etc.)" [18].
Por fim, cabe salientar que, para que seja atribuída responsabilidade ao empregador, o empregado deve ter agido no exercício de suas funções ou em razão delas. Assim explica Gustavo Tepedino: "De fato, não se impõe uma responsabilidade universal pelos atos do empregado, mas tão-somente por aqueles praticados no desempenho de suas tarefas." [19]
3.2 Responsabilidade civil do empregado por ato do empregador
A responsabilidade civil do empregado por dano causado ao empregador é subjetiva, encontrando limites específicos no artigo 462, §1º, da CLT:
Art. 462 - Ao empregador é vedado efetuar qualquer desconto nos salários do empregado, salvo quando este resultar de adiantamentos, de dispositivos de lei ou de contrato coletivo.
(...)
§ 1º - Em caso de dano causado pelo empregado, o desconto será lícito, desde que esta possibilidade tenha sido acordada ou na ocorrência de dolo do empregado (...).
De acordo com o referido dispositivo, só será permitido desconto nas verbas salariais do empregado em caso de dolo. Havendo culpa, o desconto só será possível se houver sido acordado entre as partes ou se houver instrumento coletivo tratando sobre a questão do pactuado entre as partes argumenta ainda Pamplona Filho e Gagliano que "é óbvio que tal avença poderá ser objeto de controle judicial, em caso de ocorrência de qualquer vício que leve à invalidade do negócio jurídico, como a coação psicológica para a obtenção de tal documento. Da mesma forma, o elemento anímico deverá ser comprovado pelo empregador, evitando abusos que importariam na transferência do risco da atividade econômica para o empregado." [20]