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A viabilidade de aplicação do art. 285-A do CPC a todos os processos que não demandam dilação probatória

Agenda 18/07/2011 às 10:01

A Emenda Constitucional nº 45/2004 acrescentou o inciso LXXVIII ao art. 5º da Constituição, que passou prever a garantia da razoável duração dos processos administrativos e judiciais.

Sem questionar a validade de tal inovação, críticas são proferidas sobre a falta de mecanismos práticos para a devida implementação da celeridade, principalmente porque o custo do processo está diretamente relacionado com a duração deste.

Atendendo às demandas da sociedade e dos operadores do Direito, um conjunto de inovações nos principais diplomas processuais brasileiros foi iniciado.

Nesse ponto, merece destaque a lei nº 11.277/2006, que acresceu ao CPC o art. 285-A e cuja redação se transcreve abaixo:

Art. 285-A. Quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos, poderá ser dispensada a citação e proferida sentença, reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada.

§ 1º Se o autor apelar, é facultado ao juiz decidir, no prazo de 5 (cinco) dias, não manter a sentença e determinar o prosseguimento da ação.

§ 2º Caso seja mantida a sentença, será ordenada a citação do réu para responder ao recurso.

A nova norma surgiu como solução para as chamadas "demandas de massa", relacionadas a situações fáticas e jurídicas semelhantes que redundam na propositura de grande quantidade de ações judiciais com causa de pedir e pedidos idênticos.

O Poder Judiciário, nos últimos anos, tornou-se destinatário de grande parcela dessas demandas, principalmente propostas contra a Fazenda Pública, situação essa que gerou sobrecarga de trabalho de magistrados e servidores e a consequente demora na prestação jurisdicional. Por esse motivo, a inovação trazida pelo art. 285-A foi bastante salutar para a prestação adequada do serviço.

Nesse ponto, cabe destacar que o ordenamento jurídico, por ser um conjunto harmônico de normas, sempre deve ser trabalhado de maneira sistemática, de modo que não haja incoerência na interpretação dos vários dispositivos que o informam.

O mesmo desiderato que orientou a elaboração do art. 285-A do CPC pode ser observado em outras passagens do CPC. Veja-se:

Art. 330. O juiz conhecerá diretamente do pedido, proferindo sentença:

I - quando a questão de mérito for unicamente de direito, ou, sendo de direito e de fato, não houver necessidade de produzir prova em audiência;

(...)

Art. 515. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.

(...)

§ 3º Nos casos de extinção do processo sem julgamento do mérito (art. 267), o tribunal pode julgar desde logo a lide, se a causa versar questão exclusivamente de direito e estiver em condições de imediato julgamento.

Percebe-se que o legislador, orientado pelos princípios da celeridade, da economia processual e da efetividade, eliminou o prosseguimento injustificado do feito quando a causa já estivesse "madura" para o julgamento. Ou seja, quando o magistrado já tivesse subsídios suficientes para decidir, não se justificaria a realização de outros atos processuais dispendiosos e demorados.

Isso posto, é necessário analisar um ponto controvertido, qual seja, a possibilidade da extensão das normas que tratam da agilização dos julgamentos de demandas cuja questão de mérito é somente de direito àqueles casos em que há também questões de fato, mas que não demandam a produção de outras provas ou a realização de mais atos processuais.

Sobre a controvérsia, leciona o processualista Theotonio Negrão [01]:

"Tendo em vista os escopos que nortearam a inserção do §3º no art. 515 (celeridade, economia processual e efetividade do processo), sua aplicação prática não fica restrita às hipóteses de causas envolvendo unicamente questões de direito. Desde que tenha havido o exaurimento da fase instrutória na instância inferior, o julgamento do mérito diretamente pelo Tribunal fica autorizado, mesmo que existam questões de fato. Assim ‘estando a matéria fática já esclarecida pela prova coletada, pode o Tribunal julgar o mérito da apelação mesmo que o processo tenha sido extinto sem julgamento do mérito, por ilegitimidade passiva do apelado. (STJ-4ª Turma, REsp 533.980-MG, rel. Min. César Rocha, j. 21.8.03)’. Logo, o pressuposto para a incidência do art. 515, §3º é o de que a causa esteja madura para o julgamento. No mesmo sentido: RT 829/219."

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Ora, é conhecida a regra de hermenêutica segundo a qual, presentes os mesmos fatos, aplica-se o mesmo direito. Sendo assim, em todas as hipóteses em que o legislador previu a abreviação do procedimento quando a causa estivesse "madura" para julgamento, devem ser contemplados não só os casos em que a questão é unicamente jurídica, mas também aqueles em que a matéria de fato não demanda mais a produção de outra prova ou diligência.

Para exemplificar, imagine-se um pedido administrativo de concessão de aposentadoria por invalidez formulado perante o INSS e negado em razão da falta da qualidade de segurado ou da falta de carência. Ao propor a ação judicial a parte autora poderá juntar cópias de suas carteiras de trabalho e do extrato do cadastro nacional de informações sociais (CNIS), não requerendo mais a produção de qualquer prova, por reputá-las suficientes.

Não há dúvidas de que o magistrado ao analisar as alegações, as provas juntadas aos autos pelo autor e o fato de já haver proferido sentença de total improcedência em outros casos idênticos, pode se convencer que o demandante não possui a qualidade de segurado ou não completou o período de carência para a concessão do benefício.

Nesse caso, seja pela obediência ao princípio da efetividade, da economicidade ou da celeridade processual, não se justifica a citação do INSS, ou a prática de qualquer ato processual, senão a prolação da sentença de improcedência nos termos do art. 285-A do CPC.

Em relação a isso, ressalte-se que não há qualquer violação ao princípio do contraditório e ao da ampla defesa, porque não se estaria criando dever jurídico em detrimento da parte ré.

Ademais, é improvável que, em sua resposta, a parte ré trouxesse aos autos prova não requerida pelo autor ou determinada pelo juízo em prejuízo de sua defesa. No exemplo dado, inexistiria qualquer dado a ser apresentado pelo INSS que aproveitasse ao demandante, principalmente em face da prévia negativa do pedido na seara administrativa.

Igualmente, o interesse da parte autora permanece incólume, porque os atos processuais que se dispensam estão relacionados à defesa do réu e, portanto, não lhe aproveitariam, aplicando-se, assim, o princípio resumido pela máxima de que "não há nulidade sem prejuízo".

Infere-se, portanto, que, além de não existir óbice legal ou prático nem prejuízo ao Poder Judiciário ou às partes, dar uma interpretação expansiva à norma contida no art. 285-A significa caminhar mais um passo na concretização da novel garantia prevista no art. 5º, LXXVIII, da Constituição.


Notas

1 Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor. Ed. Saraiva. 40ª ed. Pgs. 685/686.

Sobre a autora
Marina dos Anjos Pontual

Procuradora federal. Pós graduada em Direito Processual. Bacharel em Direito pela UFPE. Pós graduanda em Direito do Trabalho

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PONTUAL, Marina Anjos. A viabilidade de aplicação do art. 285-A do CPC a todos os processos que não demandam dilação probatória. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2938, 18 jul. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19560. Acesso em: 22 dez. 2024.

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