Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

Justiça restaurativa: os modelos e as práticas

Exibindo página 2 de 4

3. OS MOMENTOS DE ENTRADA DA JUSTIÇA RESTAURATIVA NO PROCESSO.

É necessário, ainda, analisar os momentos em que as práticas restaurativas podem ser – e vêm sendo – aplicadas no âmbito criminal, isso porque ainda não há nenhum sistema de justiça inteiramente restaurativos. [08]

Os momentos de encaminhamento dos casos para os programas restaurativos variam dentro e entre países. Em muitos países, o caso pode ser encaminhado a diversos programas restaurativos, e em diversos momentos, dependendo da analise caso a caso. Por exemplo, no caso da Bélgica e da Holanda, aonde há quatro tipos de intervenções possíveis (MIERS, 2003).

Dos conceitos e das perspectivas propostas mostram-se possíveis cinco momentos de entrada para que seja requerida a utilização da justiça restaurativa no âmbito do conflito de interesses, mostrando a aplicabilidade do procedimento para a obtenção da solução ao conflito. São esses:

I)Um momento pré-acusatório, com encaminhamento do caso pela polícia. Muitas críticas são feitas quando o ato de encaminhamento é uma poder discricionário da policia que podem representar um aumento do controle social e um perigoso aumento dos poderes da policia, como é também o caso da Austrália, Inglaterra, País de Gales e Estados Unidos. Diferentemente como ocorre na Nova Zelândia aonde a Policia deve encaminhar para uma reunião do Family Group Conference realizada junto ao Departamento de Bem Estar social – Serviços de Crianças, Jovens e Famílias (Child Youth and Family Services - CYFS) sem que exerça qualquer poder discricionário (Maxwell, 2005, p. 281).

II)Num momento pré-acusatório, com encaminhamento, pelo juiz ou pelo ministério público (caso da legislação Portuguesa), após o recebimento da notitia criminis e da verificação dos requisitos mínimos, que, ausentes, impõem o arquivamento do caso e devem ser estabelecidos conforme as particularidades de cada ordenamento;

III)Num momento pós-acusação e pré-instrução, com encaminhamento imediato, após o oferecimento da denúncia;

IV)Num momento pré-sentença, encaminhamento pelo juiz, após encerramento da instrução, como forma de viabilizar a aplicação de pena alternativa na forma de reparação de dano, ressarcimento etc.;

V)Num momento pós-sentença, encaminhamento pelo Tribunal, com a finalidade de inserir elementos restaurativos durante a fase de execução.

É certo que parte da doutrina não aceita esse momento pós-sentença como uma das possibilidades de se realizar a Justiça Restaurativa, isso porque o ofensor (agora réu) já terá sofrido a persecução penal do Estado e já estará cumprindo pena, possivelmente uma pena restritiva de liberdade. Caso ocorra, não mais será possível alcançar os ideais restaurativos objetivados por essa forma de Justiça, somente se terá uma completude da pena com outras medidas, possivelmente reintegradoras.

Há ainda, por parte dos mais puristas, quem diga que até no momento pré-sentença não mais será possível alcançar o ideal restaurativo, isso porque o ofensor já sofre com a persecução penal de tal forma que não apresentaria o requisito da voluntariedade de forma pura, realizando o procedimento como uma forma de se escusar da imposição de futura pena.

Conforme alerta, ainda, Sica deve-se observar o problema da sobreposição e acumulação dos modelos restaurativo e retributivo, que ocasiona bis in idem para o ofensor (pois este será sobrecarregado com a pena advinda do processo penal e a medida restaurativa), uma revitimização e incongruência sistemática, já que as diferentes lógicas do modelo restaurador e retributivo não permitem uma coexistência pacifica (SICA, 2007, p. 30).


4. OS MODELOS DE UMA PRÁTICA RESTAURATIVA (Mediação, Conciliação, Reunião de Grupo Familiar, Círculos Decisórios).

Passadas as perspectivas e o momento de inclusão do procedimento restaurativo como forma de obtenção para a resolução do litígio, nos deparamos com uma importante questão prática. Qual será o modelo ideal para a utilização?

Conforme se observa da própria resolução da ONU, acima citada, e dos desenvolvimentos teóricos observados, podemos dizer que é possível delimitar 04 modelos práticos principais da Justiça restaurativa, quais sejam: a Mediação (modelo de utilização majoritária), a Conciliação, a Reunião de Grupo Familiar ou Comunitária (Family Group Conferences ou Conferencing) e os Círculos Decisórios ou Grupos de Sentença (Sentencing Circles).

Aqui, abordamos uma questão prática e de grande importância. Isso porque, um modelo que não tenha a aceitabilidade social desejada não terá uma utilização usual dos envolvidos no conflito, até porque não sofreram o apoio de seus amigos e familiares na hora de optar pela prática restaurativa.

Frisa-se que apesar de termos ciência do diverso número de práticas e dos modelos práticos relacionados pela Resolução da ONU, deixaremos de abordar a Conciliação e outras práticas, não se desconsiderando a existência e importância delas, tendo como exemplo as citizen panels, nas quais comissões de vizinhos se encarregam de solucionar delitos de pequena gravidade sem vitimas ou que tenham atingido a qualidade de vida da comunidade (Pallamolla, 2009, pp. 105-106).

MEDIAÇÃO ENTRE VÍTIMA E OFENSOR (VOM – victim-offender mediation).

Como primeiro modelo apresentado, temos a Mediação. A mediação é a prática mais adotada entre os Países que receberam a Justiça Restaurativa. Há mais de 300 programas nos Estados Unidos e mais de 500 na Europa. As análises destes programas vêm demonstrando um aprimoramento na relação vítima-infrator, a redução do medo na vítima e maior probabilidade do cumprimento do acordo por parte do infrator. É uma das práticas com mais tempo de aplicação, excedendo em alguns países vinte anos de utilização (a exemplo dos Estados Unidos e Canadá), tendo o primeiro programa noticiado de mediação vitima-ofensor o estabelecido em 1974 em Kitchener, Ontario – Canadá, pela comunidade Mennonite.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

A mediação e as outras práticas não exigem, a priori, previsão legal específica para serem utilizadas no âmbito penal. Requerem-se, apenas, dispositivos legais que recepcionem as medidas a serem utilizadas como a reparação-conciliação ou soluções consensuais, afastando a possibilidade de pena ou atenuando-a.

Neste tocante, é interessante a crítica formulada por Leonardo Sica que diz que "para que a justiça restaurativa e a mediação não sejam meros paliativos para a crise do sistema de justiça, nem entendidas apenas como instrumentos de alívio dos tribunais, de extensão da burocracia judiciária ou de indulgência, devem ser implementadas sobre dois fundamentos bastante claros: ampliação dos espaços democráticos e construção de novas modalidades de regulação social. Sem isso, acredito, em poucos anos o "novo modelo" padecerá dos mesmos defeitos apresentados pelo "velho". Vejamos, sempre, o exemplo dos Juizados Especiais Criminais." (Sica, 2006, p. 26)

A mediação entre vítima e infrator consiste em oferecer uma oportunidade à vítima de reunir-se com o infrator num ambiente seguro e estruturado. Acompanhados por um mediador, ambos têm a possibilidade de construir um plano de ação para abordar o conflito e resolvê-lo.

Ora como se percebe, a mediação consiste num encontro vítima-infrator, com a finalidade de construir um acordo reparador, utilizando da mediação de um terceiro (mediador). Mais recentemente, entretanto, têm-se observado a permissão da participação de familiares e amigos da vítima ou do infrator de modo a proporcionar maior apoio emocional aos implicados.

"Existe, ainda, outra variação do processo chamada de shuttle diplomacy. Nesta variante, o mediador encontra-se com a vítima e o ofensor separadamente, sem que estes venham depois encontrar-se. Esta prática, portanto, consiste numa mediação indireta, já que a comunicação entre vítima e ofensor é feita somente por intermédio do mediador" (Pallamolla, 2009, p. 108).

Os casos podem ser submetidos para o processo de mediação por Juízes, oficiais de probation, advogados das partes envolvidas, polícia e até mesmo as partes (em alguns casos) o que possibilita que a mediação seja aplicada em diversos estágios do processo criminal.

O processo de mediação entre vítima-ofensor visa possibilitar o encontro entre ambos, em um ambiente seguro, estruturado e capaz de facilitar o diálogo. Antes de encontrarem-se, vítima e ofensor passam por conferências separadas com um mediador treinado que explica e avalia se ambos encontram-se preparados para o processo. Segue-se o encontro entre ambos, no qual o mediador comunica ao ofensor os impactos (físicos, emocionais e financeiros) sofridos pela vítima em razão do delito e o ofensor tem então a possibilidade de assumir sua responsabilidade no evento, enquanto a vítima recebe diretamente dele respostas sobre por que e como o delito ocorreu. Depois desta troca de experiências, ambos acordam uma forma de reparar a vítima (material ou simbolicamente) (SCHIFF, 2003, p. 318).

A mediação representa, portanto, uma exigência daqueles que participam dela,

"(...) exige que os indivíduos (quer isoladamente ou como membros da sociedade) encarem e reconheçam os interesses dos outros como condicionantes das suas próprias acções ou omissões. Pensar activamente e respeitar os interesses dos outros e ajustar o comportamento em conformidade não é somente um meio para atingir um fim, mas o objectivo em si mesmo" (MIERS, 2003, p. 51).

Os requisitos para qualificar a mediação penal são bem próximos dos requisitos da Justiça Restaurativa, sendo aqueles:

i)voluntariedade;

ii)confidencialidade e oralidade,

iii) informalidade;

iv) neutralidade do mediador;

v) ativo envolvimento comunitário;

vi) autonomia em relação ao sistema de justiça.

Sem referir-se a uma classe específica de delitos, há outros contextos indicados para a mediação: as chamadas "vizinhanças problemáticas", bairros ou regiões particularmente conflitivas, nos quais a presença do Estado é nula ou ineficiente. Localidades em que há uma carência por alguma forma de regulação social que estabilize as relações e a convivência entre os moradores a partir dos códigos de comunicação próprios àquela comunidade. Essas localidades têm sido objeto de várias iniciativas de justiça alternativa ou comunitária, dentre as quais se incluem os centros de mediação. Aqui, registram-se os exemplos das Boutiques de Droit na França, os Family Group Conference na Nova Zelândia e o programa Community Youth Conferences, implementado na Austrália com base no modelo Wagga Wagga de justiça, inspirado em compreensões comunitárias acerca da justiça e da vida social. Mais remotamente, a experiência marcante neste contexto foram os Community Boards, organizados no final da década de setenta, em São Francisco (EUA). Todos esses projetos foram fruto não só da crise do formalismo, mas surgiram principalmente por força de outra razão: numa sociedade fragmentária e anômica, os cidadãos não têm quase mais nada em comum, a não ser um determinado conflito que os opõe. Assim, cada conflito é visto como uma oportunidade a ser aproveitada, até porque inevitável, de estabelecer laços sociais e de evidenciar relações de cidadania que só emergem da ocorrência de um conflito. (SICA, 2007)

Outro contexto, da maior gravidade, é representado por fatos cuja importância histórica e os reflexos para a democracia são tais que requerem uma resposta distinta da repressão. Grandes conflagrações, conflitos étnicos, raciais ou mesmo sociais, podem ser enfrentados pela via da conciliação e do perdão. Remete-se ao exemplo da Comissão para Verdade e Conciliação, utilizada com mais destaque na África do Sul, mas também em outras situações, como em Greensboro (EUA), onde no final da década de setenta diversos homicídios sucederam-se em razão do racismo e, notando que a resposta punitiva só fomentaria a espiral de violência, a comunidade e as autoridades optaram pelo enfrentamento pacífico da situação e, então, conseguiram conter a onda de crimes.

Em síntese, qualquer proposta de regulação legal deve enfrentar três aspectos principais: (i) os critérios de envio do caso para mediação; (ii) as formas jurídicas para recepção da mediação pela justiça penal; e (iii) a definição de um modelo organizativo implementável. (Sica, 2006, p. 22)

O que é certo, é que as pesquisas realizadas demonstram de forma geral uma satisfação grande entre os envolvidos, tanto ofensores quanto vítimas, diminuindo o número de reincidentes e diminuindo a vitimização dos ofendidos. A possibilidade de reparação e a democratização do diálogo existente na mediação melhoram a auto-estima e diminuem o impacto da atividade delituosa existente.

REUNIÃO DE GRUPO FAMILIAR (Family Group Conferencing – FGC).

Este modelo foi desenvolvido com base nas observações indígenas de solução de conflitos. Na Nova Zelândia, na Austrália e em partes do Canadá, os desenvolvimentos da justiça restaurativa se relacionaram a uma revivificação de práticas de resolução de conflitos indígenas. Na Nova Zelândia, as reformas judiciárias efetivadas na segunda metade da década de 80, levantaram a questão da violência praticada contra e dentro do povo Maori, bem como a importância de uma resposta da justiça criminal apropriada para os jovens Maoris, tendo como solução a proposta dos encontros restaurativos com grupos de familiares, que foram introduzidas como parte do programa nacional. A intenção era evocar e utilizar as tradições dos Maoris de resolução de problemas que incluíam as famílias estendidas. (Maxwell, 2005) Essas reuniões foram introduzidas tanto como uma alternativa aos tribunais, como na forma de um guia para as sentenças. A elas geralmente comparecem os infratores, sua família estendida, as vítimas, seus partidários, a polícia, um assistente social e outras pessoas importantes da comunidade. Aos jovens se proporciona um advogado. As vítimas comparecem a cerca de metade das reuniões e os procedimentos foram modificados para encorajar sua participação (McCOLD, 2001, pp. 45-46). As reuniões são informais e espera-se que a tomada de decisão seja aberta e consensual. Os encontros restaurativos na Nova Zelândia são usados principalmente para infratores que cometeram infrações mais graves e reincidentes. Os acordos, freqüentemente, incluem sanções reparadoras como desculpas, restituição ou serviços comunitários. Uma característica significativa dos procedimentos é o "tempo de planejamento privado" oferecido ao infrator e à sua família durante o processo para considerar e sugerir um plano de ação para o infrator assumir a responsabilidade pelo crime e fazer indenizações à vítima (FROESTAD & SHEARING, 2005, p. 83).

A respeito do desenvolvimento na Nova Zelândia Froestad & Shearing promovem uma boa síntese, qual seja:

Na Nova Zelândia, as reuniões de grupos familiares foram introduzidas essencialmente como uma alternativa ao processo formal do tribunal. Os modos como os modelos inovadores são difundidos para outros lugares, porém, geralmente, atuam sobre a formulação da nova prática. Na Austrália, os encontros restaurativos como modelo ganharam espaço na política e na legislação por iniciativas de administradores de nível médio e profissionais, e não como conseqüência de um desejo de se engajar em políticas raciais construtivas (Crawford e Newburn 2003: 29) [09]. Em Wagga Wagga, em New South Wales, o modelo foi reformulado para processos de encontros restaurativos conduzidos pela polícia para casos de menor gravidade como uma forma de "advertência restaurativa". O modelo de Wagga Wagga tem sido motivo de crítica devido a seu potencial para "ampliar a rede" (Umbreit e Zehr 2003: 74) [10] e a probabilidade de uma extensão dos poderes da polícia sobre os jovens (Blagg, 1997) [11]. Também é controverso devido a sua ênfase na teoria da "vergonha reintegradora" (Braithwaite, 1989) [12] Enquanto alguns vêem a vergonha reintegradora como um elemento central da justiça restaurativa (Retzinger e Scheff 2002: 278) [13], outros a consideram oposta à filosofia básica de restauração (Morris e Maxwell 2000: 216-17) [14]. O modelo de Wagga Wagga foi abandonado em New South Wales em 1995. Porém, reuniões conduzidas pela polícia foram introduzidas na capital australiana em 1993. Desde então, foram exportadas tanto para os EUA como para o Reino Unido na forma de novos programas de advertência restaurativa conduzidos pela polícia (McLaughlin 2003:10-11) [15]. As autoridades da justiça administram a maioria dos outros esquemas de encontros restaurativos australianos. Na Tasmânia eles são administrados pelo Departamento de Saúde e Serviços Humanos (Department of Health and Human Services). Os programas variam em termos do tipo de crime e dos infratores elegíveis para as reuniões. Eles também variam em função de sua base legal (Strang 2002: 47) [16]. (FROESTAD & SHEARING, 2005, p. 84)

Existem dois modelos básicos dessa prática restaurativa: o primeiro chamado de court-referred – modelo no qual os casos são desviados (diverted) do sistema de justiça sempre que possível (caso neozelandês); e o segundo chamado Police-based – a polícia ou a escola facilitam o encontro entre as partes e familiares (caso da Austrália e da maioria dos Estados norte-americanos) (Pallamolla, 2009, p. 117).

Interessante ressaltar, como dito acima, que este modelo surgiu para enfrentar questões relativas à jovens infratores, contudo na Austrália seu uso foi estendido para incluir casos de adultos, sendo esses encaminhados pelo sistema judicial – diversion.

A RGF (reunião de grupo familiar) normalmente tem aplicabilidade para os delitos de pouca gravidade, na maioria dos casos ligados à furtos, roubos, delitos relacionados à entorpecentes(drogas), e crimes relacionados à infância e contra o bem estar das crianças, tendo exceção à essa regra na Nova Zelândia, que também utiliza as conferências para crimes severos e reiterados (Pallamolla, 2009).

Assim como na mediação os casos podem ser submetidos para o processo de RGF por Juízes, oficiais de probation, advogados das partes envolvidas, polícia e até mesmo as partes (em alguns casos) o que possibilita que o procedimento seja aplicado em diversos estágios do processo criminal.

Além da vítima e do infrator, nas reuniões participam a família, amigos e pessoas importantes para ambos, de forma a decidir como administrar e superar as conseqüências do delito.

O procedimento da reunião é similar ao da mediação vitima-ofensor e tem como objetivos do encontro: envolver a vítima na construção da resposta ao delito; conscientizar o infrator a respeito da maldade de seus atos e vincular a vítima e o infrator à comunidade.

CIRCULOS DECISÓRIO (sentencing circles / peacemaking circles / community circles).

Os círculos decisórios começaram a ser utilizados em 1991, por juízes no Canadá, e em 1995 já tinha utilização em um projeto piloto nos EUA. O procedimento é utilizado em delitos cometidos tanto por jovens quanto por adultos, sendo também empregado para: delitos graves, disputas da comunidade, em escolas e em casos envolvendo o bem-estar e proteção da criança (SCHIFF, 2003, p. 322).

Os círculos têm utilização mais abrangente, não sendo utilizado somente para o fim restaurador, podendo ter sua utilização em problemas da comunidade, na promoção de suporte e cuidado para as vítimas e famílias e para a reintegração na comunidade de ex-detentos.

A sua promoção é admitida em todas as fases de entrada do processo restaurativo acima tratado, podendo a decisão ser aplicada como sentença, sendo ainda, admitido nesse processo que a implementação pré e pós sentencial tenha o caráter restaurador necessário, uma vez que poderá dar suporte não só às vítimas e ofensores bem como a seus familiares que são diretamente envolvidos quando há a cominação de pena restritiva de liberdade, no caso do ofensor, e desvios psicológicos ou mesmo problemas relacionados ao delito sofrido, no caso da vítima.

Nos círculos participam as partes envolvidas no conflito (infrator/vítima), suas respectivas famílias, pessoas ligadas à vítima e ao infrator que queiram apoiá-los, qualquer pessoa que represente a comunidade e que tenha interesse em participar, vem como pessoas vinculadas ao sistema de justiça criminal (Promotores de Justiça, Juízes, Conselheiros, Polícia, etc.) (Pallamolla, 2009, p. 120). Sendo um processo estruturado para gerar um consenso compartilhado entre as pessoas que figuram no processo.

É interessante frisar que se trata de um procedimento restaurativo novo, sem que hajam muitos estudos formulados com métodos satisfatórios. Pela escassa pesquisa realizada, mostra-se uma satisfação comunitária com o procedimento e uma insatisfação não corriqueira dos ofensores, que por vezes se vêem em número desigual, diante da tantos representantes da comunidade e poucos ao seu lado. A experiência restaurativa, contudo, é válida e apresenta bons índices, como baixa re-incidência dos ofensores. Pallamolla apresenta um estudo de caso com esses resultados, com base em pesquisa de Raye e Roberts, vejamos:

"Por serem uma forma mais recente de procedimento restaurativo, não existem muitos estudos a seu respeito. Todavia, vale referir uma pequena investigação feita por meio de entrevistas com participantes de círculo de sentença em Milaca e Princeton (Minesota). O estudo refere que cinco entre seis ofensores sentiram-se satisfeitos com a experiência, tendo sido apoiados pela comunidade e recebido sua confiança. Alguns ofensores, contudo, contestaram a equidade do círculo, alegando que não puderam se expressar livremente. Já a comunidade parece ter percebido efeitos mais positivos, pois muitos referiram ter experimentado forte impacto com o processo." (Pallamolla, 2009, p. 120)

Um dos importantes programas de Justiça restaurativa que utilizam o Círculos como forma de uma abordagem restaurativa, é o programa de São Caetano do Sul (São Paulo, Brasil). O programa em atividade desde 2005 tem como publico alvo adolescentes autores de atos infracionais. Trata de um trabalho conjunto da Justiça Paulista com a Promotoria da Infância e Juventude, sendo essa que seleciona os casos, encaminha ao círculo restaurativo, fiscaliza os termos de acordo e o seu cumprimento, bem como a eventual aplicação de medida sócio-educativa. (RAUPP & BENEDETTI, 2007)

Sobre os autores
Daniel Baliza Dias

Advogado, Graduado em Direito pela Centro Universitário de Belo Horizonte - UNI-BH, Mestrando em Direito, na área de Ciências Jurídico-Forenses pela Universidade de Coimbra - PT.

Fabio Antônio Martins

Advogado, Graduado em Direito pela Faculdades Metropolitanas Unidas - FMU, Pós- Graduando em Direito dos Contratos e do Consumo pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra - PT, Mestrando em Direito, na área de Ciências Jurídico-Forenses pela Universidade de Coimbra - PT

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DIAS, Daniel Baliza; MARTINS, Fabio Antônio. Justiça restaurativa: os modelos e as práticas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2939, 19 jul. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19582. Acesso em: 18 mai. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!