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A tutela inibitória nas ações coletivas

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A tutela inibitória coletiva será abordada especialmente no que diz respeito às tutelas do meio ambiente e defesa do consumidor.

RESUMO: O advento das tutelas preventivas no ordenamento jurídico brasileiro trouxe uma nova concepção de tutela jurisdicional. De fato, a tutela ressarcitória, especialmente no que concerne à defesa dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, não atende satisfatoriamente os escopos das ações coletivas. A tutela inibitória coletiva, ponto nodal do presente trabalho, será abordada especialmente no que diz respeito às tutelas do meio ambiente e defesa do consumidor. Em conclusão, verificar-se-á que a tutela inibitória melhor atende aos interesses coletivos, visto que os tutela antes de configurado qualquer dano, já que atua contra o ilícito, prescindindo a prévia configuração de dano para que surja o interesse de agir.

PALAVRAS-CHAVE: 1. Tutela inibitória. 2. Direitos difusos. 3. Ação civil pública.


INTRODUÇÃO

De tempos em tempos, o Direito se depara com novos desafios que parecem conferir-lhe ainda mais importância em seu trabalho de pacificação social. Se outrora a defesa das liberdades individuais – que hoje nos são tão caras – era o bastião dos grandes constitucionalistas, hoje a realidade nos mostra que interesses outros estão em pauta, quiçá mais ameaçados, pois carecem de instrumentos adequados à sua tutela. Os direitos difusos, ante as suas peculiaridades, não são particulares, tampouco públicos. Habitam, pois, a região pantanosa de direitos que concernem tanto ao particular individualmente considerado, quanto à coletividade propriamente dita.

De fato, as tutelas processuais sempre se preocuparam em defender direitos quando houvesse efetivas lesões. Com a evolução da doutrina processualista surgiu a tutela inibitória como uma antítese à tutela ressarcitória. Como este estudo mostra, a tutela inibitória é uma tutela de prevenção, a qual busca tutelar um direito antes mesmo de que sua lesão seja levada a cabo pelo ofensor. Essa possibilidade ganha relevo principalmente no que tange aos direitos extrapatrimoniais, aos quais não interessa tão somente a reparação, que será sempre insatisfatória, mas sim um instrumento realmente eficaz que os proteja de ofensivas quase sempre irreparáveis.

Como fácil é ver, o tema deste trabalho e justamente alinhar estes dois grandes institutos de efetivação da tutela jurisdicional: as ações coletivas e a tutela inibitória. Para alcançar aludido objetivo adotou-se como linha teórica o método dedutivo, baseado nos procedimentos da pesquisa bibliográfica e da compilação.


1.A DEFESA DOS INTERESSES COLETIVOS EM JUÍZO

Os interesses coletivos, espécie de interesses que ultrapassam a esfera individual de proteção, apesar de suscetíveis de postulação individual, são efetivamente concretizados quando postulados em benefícios de todos seus titulares. Nesse diapasão, desenvolveu-se no ordenamento jurídico brasileiro o denominado microssitema processual coletivo o qual, precipuamente, objetiva efetivar a proteção dos interesses da coletividade de modo célere e eficaz.

No presente capítulo, abordam-se, sem intuito de esgotar o tema, as principais questões atinentes aos interesses metaindividuais, suas espécies e conceitos, bem como o tema da legitimidade ativa para sua defesa.

1.1.INTERESSES METAINDIVIDUAIS

Primariamente os direitos subjetivos dos indivíduos eram divididos em públicos e privados. Essa dicotomia, contudo, não resiste a uma análise mais aprofundada sobre o tema. De fato, como nos ensina Hugo Nigro Mazzilli, foi a partir de 1974 que essa dicotomia entre interesse público e interesse privado sofreu grande crítica.

Sobre a superação da divisão simplista no tema atinente aos direitos individuais, Waldemar Mariz de Oliveira afirma:

A summa divisio encontra-se irremediavelmente superada na realidade social de nossa época, a qual é infinitamente mais complexa, mais articulada e mais sofisticada do que a expressa pela simplista dicotomia tradicional. Novos direitos e novos deveres aparecem, os quais, sem ser públicos no sentido tradicional da palavra, são todos coletivos. Pertencem eles, ao mesmo tempo a todos e a ninguém. Com efeito, tendo-se em conta que pertencem a grupos, classes ou categoria de pessoas, deles ninguém, é titular exclusivo, mas, ao mesmo tempo, todos os membros daqueles são seus titulares. [01]

Demonstrou-se, inicialmente, a existência de uma categoria intermediária, na qual se compreendiam interesses coletivos, ou seja, aqueles referentes a toda uma categoria de pessoas (como os condôminos de um edifício de apartamentos, os sócios de uma empresa, os membros de uma equipe esportiva, ou empregados do mesmo patrão). São interesses metaindividuais, porque atingem grupos de pessoas que têm algo em comum. Ora, o que as une é estarem na mesma situação de fato (por exemplo, as pessoas lesadas pela explosão da mesma usina nuclear), ora é a circunstância de compartilharem a mesma relação jurídica (como os consorciados que sofrem o mesmo aumento ilegal das prestações). [02]

Mesmo dentro dessa categoria intermediária, contudo, foi possível estabelecer uma distinção entre os interesses que atingem uma categoria determinada de pessoas (ou, pelo menos, determinável) e os que atingem um grupo indeterminado de indivíduos (ou de difícil determinação). [03]

Os condôminos, os sócios, os atletas e os empregados que foram acima mencionados, são todos determinados ou possíveis de determinar, à vista da certidão imobiliária, dos estatutos, dos registros cabíveis. O mesmo grupo de pessoas compartilha interesses, pouco importa se encontrem reunidas pela mesma relação jurídica (como os sócios e os condôminos invocados no exemplo) ou pela mesma relação de fato (como os compradores concretamente lesados na compra do mesmo produto). Convencionou-se a chamar estes interesses de coletivos (quando indivisíveis, fundados na mesma relação jurídica) ou individuais homogêneos (quando divisíveis, fundados na origem de fato comum). [04]

Os interesses difusos, por sua vez, se diferenciam dos interesses coletivos e individuais homogêneos pelo fato de que são interesses que, embora pertençam a uma categoria de pessoas, não se pode precisar com exatidão quais os indivíduos que se encontram concretamente por eles unidos. São interesses cujos titulares são indetermináveis, dispersos na coletividade. São, portanto, indivisíveis, porque não se pode determinar ou quantificar com exatidão o prejuízo de cada um dos lesados. É o que ocorre, por exemplo, quando há a veiculação de propaganda enganosa em um determinado canal de televisão. O dano, inegavelmente, existe, mas não se pode afirmar com precisão quais os consumidores em potencial que foram efetivamente lesados.

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Segundo o Código de Defesa do Consumidor, são direitos ou interesses difusos transindividuais, de natureza indivisível, cujos titulares são pessoas indeterminadas e ligadas por circunstância de fato. Difusos são, pois, interesses indivisíveis, de grupos menos determinado de pessoas, entre as quais inexiste vínculo jurídico ou fático muito preciso. São como um feixe de interesses individuais, com pontos em comum. [05]

Alguns interesses difusos, pela sua abrangência, podem ser classificados como verdadeiro interesse púbico. A pretensão a um meio ambiente equilibrado e hígido, embora seja de interesse indeterminável e indivisível de pessoas (interesses difusos), é de interesse de toda a coletividade. Todavia, faz-se mister a necessária cautela, pois as duas classificações doutrinárias nem sempre se confundem, já que é possível haver interesses difusos de menos abrangência que o interesse público, com eventuais conflitos entre os interesses difusos de um determinado grupo e da coletividade como um todo.

Um exemplo desses interesses difusos pode ser a veiculação na mídia audiovisual, por determinada empresa, de propaganda enganosa ou que induza o consumidor a erro. A lesão é evidente, contudo, a determinação de quais seriam os potenciais lesados é incerta.

Os interesses coletivos são, em sentido lato, os interesses ou direitos transindividuais indivisíveis (assim como os interesses difusos) que, ao seu passo, pertençam a um grupo, classe ou categoria de pessoas determinadas, ou ao menos, determináveis.

Como exemplo, o aumento ilegal de prestações de um consórcio pode ser citado. Ora, o interesse de se ter reconhecido a ilegalidade de um aumento abusivo das prestações de um consórcio é partilhado indivisivelmente por todos os consorciados de forma não quantificável. A ilegalidade do aumento não será maior para o consorciado que possui inúmeras cotas, tampouco será menor para aquele que apenas uma possui. A ilegalidade será a mesma para todos, de forma indivisível. Evidentemente, se os eventuais prejuízos sofridos pelo grupo forem individualizáveis, e seu ressarcimento seja justamente o escopo da tutela jurisdicional pretendida, estar-se-ia diante de interesses individuais homogêneos, e não propriamente de interesses coletivos de um determinado grupo.

Os interesses individuais homogêneos não deixam de ser também interesses coletivos. Encontram-se reunidos nessa categoria de interesses as pessoas ou grupo de pessoas determinadas ou determináveis que são titulares de interesses oriundos de uma mesma relação de fato. Ocorre que os prejuízos compartilhados por essas determinadas pessoas são divisíveis.

Exemplificativamente, pode-se citar como hipótese de interesses individuais homogêneos envolvidos a compra por inúmeros consumidores de veículos de uma mesma marca com o mesmo defeito de série.

1.2 .A LEGITIMAÇÃO PARA AGIR EM TEMA DE INTERESSES DIFUSOS

Seguindo a vetusta dicotomia tradicional entre os interesses individuais e coletivos, a clássica maneira de defender interesses em juízo dá-se por meio da legitimação ordinária. Ou seja, o próprio lesado defende os seus interesses que foram afetados.

No ordenamento jurídico pátrio, a chamada legitimação extraordinária, isto é, a possibilidade de alguém, em nome próprio, defender interesse alheio, é limitada a hipóteses excepcionais. Não se confunde, no entanto, com representação, que consiste na defesa, em nome alheio,de interesse alheio.

Nas hipóteses de legitimação extraordinária configura-se verdadeira substituição processual, que ocorre, por exemplo, quando o gestor de negócios defende interesses de terceiros; quando o Ministério Público propõe ação reparatória ex delicto em favor de vítimas pobres; ou quando o curador do ofendido oferece representação contra o ofensor.

A legitimação extraordinária na defesa em juízo de interesses alheios são hipóteses excepcionais, taxativamente previstas na legislação. Isso porque, até bem pouco tempo, em regra a substituição processual destinava-se tão somente à defesa de interesses individuais, não à tutela de interesses difusos ou coletivos. Ora, acertou o legislador em restringir a legitimação extraordinária para a defesa em juízo dos interesses individuais, pois, se assim não fosse, verdadeira balbúrdia se instalaria nas demandas judiciais, posto a incerteza da legitimidade ad causam.

Com a evolução legislativa, especialmente com o advento da Lei nº. 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública), passou-se a admitir a defesa dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos por meio da legitimação extraordinária. Nessa seara, a doutrina divide-se. Há a tendência de realçar a legitimação ordinária quando alguém, ainda que legitimado extraordinariamente, a par de defender em juízo interesses de terceiros, também defende direito próprio. Mazzilli cita Trocker e Humberto Theodoro Júnior, que defendem que "o grupo juridicamente organizado, mesmo quando deduz em juízo um direito cuja titularidade pertence a outrem, está fazendo atuar, na realidade, um interesse próprio que é o de reintegração da situação garantida". [06]

Segundo esse argumento, a defesa em juízo dos interesses coletivos de uma entidade de classe, por exemplo, coincide com a defesa de interesse próprio da entidade, conforme seus fins sociais. Desta forma, ao defender, em extensão, os seus próprios interesses quando defende os interesses dos seus membros, a associação de classe teria legitimação ordinária, e não extraordinária.

Hugo Mazzilli, porém, defende posição diversa:

Ainda que reconheçamos a procedência em parte dessa argumentação, mesmo assim na defesa judicial de interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, preferimos denominar o fenômeno de legitimação extraordinária ou substituição processual, para distingui-lo das hipóteses em que o titular da pretensão age apenas na defesa do interesse de que é titular. Nos casos de ação civil pública, de ação coletiva ou de ação popular, o autor (o Estado, a associação ou o cidadão) não está pedindo apenas dentro do campo de seu direito próprio, e sim busca um benefício coletivo (nem sempre público, mas ao menos transindividual), que ele, por si só, não estaria legitimado a defender a não ser por expressa autorização legal. Daí tratar-se de legitimação extraordinária. [07]

De fato, a celeuma doutrinária que cerca a questão da legitimação (ordinária e extraordinária) para a defesa dos interesses difusos e coletivos tinha grande relevância antes do advento da Lei nº. 7.347/85. , de 24 de Julho de 1985. Afinal, a legitimação extraordinária era a exceção, e não a regra. Com o advento da citada lei, o legislador tratou de ampliar significativamente o rol de legitimados ativos para a defesa dos interesses transindividuais.

Todos esses fatores somados contribuíram, indubitavelmente, para a maior proteção de interesses de toda a coletividade, (coletivos, difusos ou individuais homogêneos), seja pela maior legitimação do Ministério Público para atuação neste particular, seja pela significativa ampliação do rol de legitimados extraordinariamente conferida pela Lei nº. 7.347/85 e pela Constituição Federal de 1988.


2.AÇÃO CIVIL PÚBLICA

A ação civil pública é o instrumento adequado para a defesa de interesses que envolvam o meio ambiente, os consumidores, dentre outros interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos em juízo.

A lei que disciplina a ação civil pública não a restringiu somente à iniciativa do Ministério Público, tendência correta esta confirmada pelo legislador constituinte, que impediu que esta instituição detivesse qualquer monopólio na propositura de ações cíveis, ao contrário do que ocorre com a ação penal pública.

A rigor de terminologia a expressão ação coletiva é mais adequada para as ações cíveis propostas por quaisquer dos co-legitimados em defesa de interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, enquanto ação civil pública,ao seu turno, é somente a ação promovida pelo Ministério Público.

2.1 O MINISTÉRIO PÚBLICO E A AÇÃO CIVIL PÚBLICA

O Ministério Público, antes de direito, possui o dever de agir quando se trata da propositura de ação cuja titularidade o Parquet detenha. Por corolário, pode-se afirmar, portanto, a obrigatoriedade e a conseqüente indisponibilidade da ação pelo Ministério Público. Todavia, se não tem discricionariedade para agir ou deixar de agir quando identifica a hipótese de atuação, ao contrário, tem liberdade para apreciar se ocorre hipótese em que sua ação se torna obrigatória.

O artigo 9º da Lei da Ação Civil Pública prescreve que "se o órgão do Ministério Público, esgotadas todas as diligências, se convencer da inexistência de fundamento para a propositura da ação civil, promoverá o arquivamento dos autos do inquérito civil ou das peças informativas, fazendo-o fundamentadamente". [08] Há, portanto, todo um mecanismo de controle da não-propositura da ação civil pública pelo Ministério Público, sem quebra alguma do princípio da obrigatoriedade.

Promovido o arquivamento, deverá o órgão ministerial, sob pena de incorrer em falta grave, remeter os autos ou peças de informação ao Conselho Superior do Ministério Público. Ademais, o fato de inexistir legitimação exclusiva do Ministério Público para propor a ação civil pública, por si só, constitui outro mecanismo de controle da não-propositura da ação civil pública.

No que se refere à indisponibilidade da ação civil pública o §3º do Art. 5º da Lei nº. 7.347/85 aduz, também, que cabe ao Ministério Público "assumir" a titularidade ativa, em caso de desistência ou abandono da ação por associação legitimada.

2.2 INQUÉRITO CIVIL

Criado pela Lei nº. 7.347/85 [09] e depois consagrado pela Constituição Federal [10], o inquérito civil é um procedimento investigativo promovido pelo Ministério Público para colher elementos de convicção do órgão ministerial para a propositura de eventual ação civil pública ou, fundamentadamente, promover seu arquivamento.

Embora co-legitimados para promover a ação civil pública, as associações civis e demais entidades elencadas na Lei da Ação Civil Púbica não podem instaurar, tampouco presidir o inquérito civil.

O inquérito civil não é pressuposto processual obrigatório para que o Ministério Público compareça a juízo. É instrumento extremamente útil, porém, nem sempre necessário, pois pode ser dispensado quando o órgão ministerial já disponha de elementos de convicção suficientes para a propositura da ação principal.

Quanto à publicidade, o inquérito civil deve obedecer aos mesmos princípios norteadores de todos os atos da administração pública. No mais, o inquérito civil será instaurado por portaria ou despacho do membro do Ministério Público, aplicando-se na disciplina da sua tramitação, subsidiariamente, as normas do Código de Processo penal concernentes ao inquérito policial, sempre com as devidas cautelas de conformidade com a Lei da Ação Civil Pública. Já no que tange ao seu arquivamento, o Ministério o promove, não se exigindo manifestação judicial a propósito.

O inquérito civil deve sempre terminar com a propositura da ação civil pública, ou, noutra hipótese, com o seu arquivamento pelo Promotor de Justiça; neste último caso, com a revisão do ato de arquivamento pelo Conselho Superior do Ministério Público.

Mas pode ocorrer que o inquérito civil investigue mais de um evento danoso (pluralidade de objeto) ou mais de um envolvido (pluralidade de sujeitos)e o órgão ministerial promova a ação civil pública em relação a apenas um dos objetos ou tão-somente a um ou alguns dos envolvidos. Neste caso, a restrição quanto aos limites objetivos e subjetivos da lide, sem fundamentação em relação aos outros possíveis ilícitos ou seus autores nos leva à conclusão de que houve um "arquivamento implícito".

O Ministério Público tem sua ação vinculada ao princípio da obrigatoriedade, desse modo, o arquivamento do inquérito civil deverá ser sempre expresso. Assim sendo, quando o órgão ministerial verificar a hipótese de proposição da ação em face de somente alguns dos indiciados, ou se o objeto da ação a ser proposta for menor dos que a totalidade dos fatos investigados no inquérito civil, deverá o Ministério Público promover em separado o arquivamento do inquérito ou das peças de informação em relação às pessoas investigadas que não incluiu no pólo passivo da relação processual, ou em relação aos fatos que excluiu da causa de pedir ou aos pedidos que entendeu de não fazer.

No que tange ao controle do arquivamento do inquérito civil, tem-se que esse é feito, in casu, pelo Conselho Superior do Ministério Público. Sob pena de falta funcional grave, deverá o membro do Ministério Público que promoveu o arquivamento do inquérito civil encaminhar suas peças ao Conselho Superior do Ministério Público, para que este órgão as aprecie. Neste caso, poderá o referido órgão colegiado, na forma de seu regimento: a) homologar a promoção de arquivamento; b) reformar a promoção de arquivamento, determinando que seja proposta a ação civil pública cabível; c) determinar novas diligências. Em caso de reforma da promoção de arquivamento, novo membro do Ministério Público será designado para o ajuizamento da ação.

2.3 COMPROMISSO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA

O compromisso de ajustamento de conduta foi introduzido na Lei nº. 7.347/85, pelo Código de Defesa do Consumidor. A rigor, tratando-se de direitos indisponíveis difusos na coletividade, coletivos ou individuais homogêneos, não se permite a hipótese de transação de quaisquer de seus co-legitimados. Afinal, a defesa de tais direitos se faz por meio da legitimação extraordinária. Contudo, o legislador, sensível aos aspectos práticos que tal instituto traria ao interesse público, bem fez em positivá-lo em nosso ordenamento jurídico, com benesses indiscutíveis para a melhor solução dos litígios que versam sobre interesses metaindividuais.

Como se infere claramente na Lei nº. 7.347/85, nem todos os legitimados ativos à ação civil pública ou coletiva podem tomar compromissos de ajustamento de conduta, mas tão-somente os órgãos públicos legitimados. Ou seja, para os fins do Art. 5º, § 6º, da Lei da Ação Civil Pública, estão autorizadas a tomar compromissos de ajustamento as pessoas jurídicas de direito público interno e seus órgãos, excluídas as demais entidades da Administração indireta ou que tenham regime jurídico próprio das empresas privadas.

Em face da transação obtida, questão interessante que se impõe é a sua eficácia perante terceiros titulares dos interesses em litígio, que não participaram efetivamente da lide, mas que se viram substituídos processualmente. Em caso de discordância dos co-legitimados quanto aos termos do compromisso de ajustamento celebrado entre o órgão público e o autor do dano, ensina Hugo Nigro Mazzilli:

Versando interesses metaindividuais, o compromisso terá o valor de garantia mínima em prol do grupo, classe ou categoria de pessoas atingidas; não pode ser considerado como garantia máxima de responsabilidade do causador do dano, sob pena de admitirmos que lesados, fragmentariamente dispersos na comunidade, fiquem sem acesso jurisdicional. Entender-se o contrário seria dar ao compromisso extrajudicial que versa interesses difusos ou coletivos a mesma concepção privatista que tem a transação no direito civil, campo em que a disponibilidade é a característica principal. A admitir esse entendimento, graves prejuízos adviriam à defesa social. Não sendo os órgãos públicos referidos no dispositivo os verdadeiros titulares do interesse material lesado, o compromisso de ajustamento que tomam passa a ter o valor de determinação de responsabilidade mínima; não pode constituir limite máximo para a reparação de uma lesão ao meio ambiente ou a qualquer outro interesse difuso, coletivo ou individual homogêneo. [11]

O compromisso de ajustamento tomado extrajudicialmente não impede que quaisquer dos co-legitimados possam ingressar em juízo para discutir seu mérito e defender eventuais interesses individualmente considerados.

Quanto à necessidade de manifestação do Conselho Superior do Ministério Público em face de uma transação realizada pelo promotor de justiça e o causador do dano, a Lei da Ação Civil Pública é omissa, levando-nos a crer, em uma rápida leitura, que sua homologação seria dispensável. Todavia, tal interpretação não merece prosperar. Afinal, se até mesmo para não propora ação civil pública, o órgão ministerial é obrigado a remeter os autos de inquérito civil para que o seu Conselho Superior homologue o arquivamento, parece-nos natural que semelhantes cautelas sejam tomadas pelo promotor de justiça quando este propõe um compromisso de ajustamento.

Ora, se o órgão ministerial não pode, sem homologação do Conselho Superior, "sequer promover o arquivamento do inquérito civil, com maior razão não poderá, de forma incontrastável, concordar com a disposição do próprio conteúdo material do litígio". [12]

Sobre os autores
Gabriela Luciano Borri

Bacharel em Direito pela Universidade Estadual de Londrina. Pós graduada em Direito Público pela UNIDERP. Pós graduada em Direito Civil e Direito Processual Civil pela UCDB.

Heitor Romero Marques

Graduado em Ciências e Pedagogia, especialista em Filosofia e Historia, Mestre em Educação (UCDB) e Doutor em Desarrollo Local y PlanteamientoTerritorial pela Universidade Complutense de Madrid. Orientador do Trabalho de Conclusão de Curso de pós-graduação lato sensu da UCDB/CPC Marcato.

Raphael Sergio Rios Chaia Jacob

Possui graduação em Direito pela Universidade Católica Dom Bosco (2002). Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Penal e Processual Penal, Direito Ambiental, Direito Eletrônico e Linguagem Forense. Pós-Graduado em Direito Ambiental pela Universidade para o Desenvolvimento do Estado e da Região do Pantanal - UNIDERP (2008). Pós-Graduando em Direito Eletrônico. Mestre em Desenvolvimento Local pela Universidade Católica Dom Bosco (2010).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BORRI, Gabriela Luciano; MARQUES, Heitor Romero et al. A tutela inibitória nas ações coletivas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2984, 2 set. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19921. Acesso em: 22 nov. 2024.

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