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O meio ambiente e a atuação da Administração Pública no Brasil

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Agenda 28/01/2012 às 10:26

Os municípios brasileiros devem buscar meios para exercer sua competência quanto ao licenciamento ambiental, independentemente de habilitação junto ao órgão estadual.

Resumo

O presente artigo destaca algumas formas de atuação da administração pública como promotora da proteção ambiental no Brasil. Nesse sentido foi realizado um resgate histórico da legislação com vistas a entender o processo gradual até a Constituição Federal de 1988. Analisou-se a estrutura da Administração Pública no tocante às questões ambientais, em especial à sua manifestação com os administrados, de forma direta ou indireta. Visando esclarecer o foco da temática, foram discutidos alguns atos e processos administrativo-ambientais, bem como contrapontos entre doutrinadores e legisladores. Em segundo plano se trouxe a baila a discussão interpretativa das normas ambientais e sua visão sistêmica quando da análise da realidade legal do Estado do Rio Grande do Sul e do Município do Rio Grande no que tange o SISNAMA. Para tanto foram utilizados o método descritivo, em pesquisa qualitativa, com abordagem bibliográfica e documental.

Palavras-chaves: Meio Ambiente; Administração Pública; Proteção Ambiental.


1 – Introdução

Nas últimas décadas são crescentes as discussões acerca da proteção, prevenção e conservação do Meio Ambiente no Brasil. Diversas legislações foram se somando ao ordenamento jurídico pátrio com finalidades, em períodos, distintas daquela que os debates modernos encaminham, qual seja, a proteção ao meio ambiente como marco referencial na tomada de decisão.

Todavia, muitas são as interpretações que acaloram os debates em torno da temática, que por vezes, excluem de toda sorte a participação salutar do Estado neste contexto. Dessa forma, a Administração Pública, como corpo funcional representativo do Estado em face do cidadão, deve suprir a necessidade do seu próprio administrado, quando em relação a proteção eficiente e eficaz do que a Constituição Federal 1988 tão bem elenca em magnífica redação do art. 225.

O sistema brasileiro de proteção ao meio ambiente é um dos mais dotados de significado do mundo, pois foi construído em diversos momentos históricos e por lutas de muitos setores, por conseguinte de pensamentos até mesmo antagônicos. Os instrumentos a disposição da Administração Pública são diversos, porém, encontra-se em alguns momentos sobreposições e distonias entre as esferas de poder e os entes direta e indiretamente envolvidos na questão em tela.

Assim o debate em torno da atuação da Administração Pública na seara ambiental é um dos mais ricos na introspecção do sistema jurídico brasileiro, pois as divergências, seja ideológica ou hermenêutica, fazem com que a discussão erga-se em níveis altamente relevantes ao cidadão. Isto, pois, a cidadania plena como edifica a Carta Magna só poderá ser alcançada quando a sociedade estiver diante de um meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado, não apenas para esta, mas para as demais gerações da vida na terra.


2 – Breve histórico da legislação ambiental no Brasil

As primeiras legislações que expressavam a preocupação em disciplinar as relações entre os indivíduos e a proteção do Meio Ambiente de caráter eminentemente brasileiro, surgiram na década de 1930, período conhecido como início da Era Vargas. O então governante provisório editou o Decreto n.º 23.793/34, Código Florestal, onde regulava o uso dos recursos e a proteção das florestas. (SIRVINKAS, 2003)

Visando ampliar essas regulamentações foram editadas outras normas, como o Decreto n.º 24.643/34, conhecido como o Código de Águas, que regrava o uso das águas, álveos e margens; Decreto-Lei n.º 25/37, que regrava a organização e proteção do patrimônio histórico e artístico nacional; o Código da Pesca, Decreto-Lei n.º 794/38; o 1º Código de Minas, Decreto-Lei 1.985/43. (SIRVINKAS, 2003; FIORILLO, 2003)

Na década de 1960, não mais sob regime democrático, uma ampla reformulação das normas ambientais foi promovida, com a exceção do Código de Águas. Essas mudanças almejadas pelos movimentos ecológicos tinham o condão de influir precisamente na proteção do meio ambiente. Assim foi promulgada a Lei 4.504/64, o Estatuto da Terra; o novo Código Florestal Lei n.º 4.771/65; a Lei n.º 5.197/67, Proteção à Fauna. (SIRVINKAS, 2003; FIORILLO, 2003)

Outras mudanças legislativas foram implementadas no decorrer do regime, como a edição dos Decretos-Lei n.º 221/67, Código de Pesca e n.º 227/67, Código de Mineração. Asseverando o propósito da proteção ambiental, o Decreto-Lei n.º 1.413/75, dispunha acerca do controle da poluição do meio ambiente provocada por atividades industriais. (SIRVINKAS, 2003; FIORILLO, 2003)

Embora rica em quantidade, a legislação deste período não previa uma atuação sistematizada do Estado, agindo esse de forma prolixa e incidental. Porém sob a influência da Conferência de Estocolmo em 1972, o cenário de atuação estatal começou a mudar, os diplomas legais passaram a prever uma proteção ambiental mais sistemática, todas as esferas legislativas participavam ativamente desta mudança de postura, principalmente após a criação da Secretaria Especial do Meio Ambiente, ligada ao Governo Federal. (SIRVINKAS, 2003; FIORILLO, 2003)

O processo em tela culminou na publicação da Lei n.º 6.938 em 31 de agosto de 1981 [01], já na faceta mais suave do regime ditatorial. Deve-se reconhecer esse fato como um marco na legislação ambiental brasileira, quiçá mundial. A lei de Política Nacional do Meio Ambiente, como ficou conhecida, além de diversos conceitos ambientais importantes, instituiu o Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA –, e os Instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente, os quais serão abordados a seguir.

Certo é que uma lacuna legislativa estava devidamente preenchida com a edição dessa lei. Uma atuação sistematizada entre os entes públicos tinha previsão, era possível assim, planejar ações nos diversos níveis federativos, agregando-se, ainda, o Ministério Público, o qual por sua vez com a edição da Lei n.º 7.347/85 – Ação Civil Pública –, viu sua participação aumentar na proteção ao meio ambiente. (FIORILLO, 2003)

Com o início da redemocratização e a convocação da Assembléia Nacional Constituinte um tema como proteção ao meio ambiente não restaria esquecido. Foi trilhando este caminho que andou bem o legislador constituinte, dedicando um capítulo exclusivamente ao Meio Ambiente, passando a Constituição de 1988 a ser considerada uma das mais avançadas neste aspecto, dentre tantos outros, que a Carta Magna inovou beneficamente.

No tocante a esses avanços, Édis Milaré (2000, p. 211) tece considerações importantes afirmando que a "Constituição de 1988 pode muito bem ser denominada ‘verde’, tal o destaque (em boa hora) que dá a proteção do meio ambiente". Outrossim, por ser considerada uma Constituição Verde, por anos provavelmente servirá de suporte a legislações de todo o mundo, dado o avanço e a intelectualização do legislador constituinte nesta seara.

In verbis, o artigo 225, e § 1º que explicitou os deveres do Poder Público:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. § 1.º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder público: I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente; VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade. (Grifo nosso)

Seguindo a orientação da Carta Magna Federal, os Estados e os Municípios promulgaram suas Constituições e Leis Orgânicas, sucessivamente, com a observância desta preocupação com o meio ambiente. Foram estabelecidas redes de "agências" com vistas à proteção do meio ambiente, órgãos capazes de atuar em áreas tão específicas, bem como sistemas regionais que espelham o SISNAMA, como Sistema Estadual de Proteção Ambiental, no Estado do Rio Grande do Sul.

A atuação da Administração Publica, na proteção do meio ambiente, tema que será abordado na seqüência, será estudada com base na Lei de Política Nacional do Meio Ambiente e sob a ótica da Constituição Federal. Todavia como forma de delimitar o presente estudo às realidades regionais, será analisado o Estado do Rio Grande do Sul, no que tange a atividade estadual, e ao Município do Rio Grande nas questões locais, assim completando o caráter de uma análise sistêmica da atuação do Estado.


3 – A proteção ambiental e a atuação dos órgãos estatais

A Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, que na opinião da doutrina majoritária é a mais importante de nossa legislação infraconstitucional, e que instituiu o Sistema Nacional do Meio Ambiente, é objeto de análise no decorrer do capítulo. Vale salientar que a analise proposta deve ser dúplice conforme assevera o doutrinador Édis Milaré (2000, p. 272), sendo necessário o contraponto do que faz parte da estrutura real – de facto – e o que só consta na estrutura formal – de jure – definida pela lei.

O SISNAMA, como é conhecido, é formatado em uma estrutura de cunho governamental, estendendo-se sob o braço político-administrativo do Estado e dos diversos entes federativos. Participam os órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, e das fundações instituídas pelo Poder Público para os fins de proteção e melhoria da qualidade ambiental.

A estrutura prevista na Lei n.º 6.938/81 e no Decreto n.º 99.274/90 que regulamento a essa, é constituída de: um Órgão Superior, denominado Conselho de Governo [02], que possui a função de assessorar o Presidente da República na elaboração de políticas voltadas ao meio ambiente e recursos naturais; um Órgão Consultivo e Deliberativo, o Conselho Nacional do Meio Ambiente, conhecido como CONAMA.

O CONAMA é o maior colegiado ambiental da América Latina, dentro da estrutura do SISNAMA representa papel fundamental, tendo participação efetiva de todos os entes envolvidos, das organizações não-governamentais e da sociedade civil em seus diversos setores. Sua função primordial é propor diretrizes às políticas governamentais do setor, deliberar no âmbito de sua competência.

O Órgão Central é o Ministério do Meio Ambiente, sucessor da Secretaria do Meio Ambiente da Presidência da República. São funções precípuas deste órgão a coordenação e planejamento, além da supervisão e do controle das políticas nacionais e diretrizes para o setor. Deve, também, propositar "estratégias, mecanismos e instrumentos econômicos e sociais para a melhoria da qualidade ambiental e do uso sustentável dos recursos naturais [...]." (SILVA, 2000, p. 206)

Ainda estão previstos na estrutura do SISNAMA: o Órgão Executor, com referência expressa ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis – IBAMA que tem o condão de executar e fazer executar as políticas dos órgãos anteriores, principalmente as deliberações do CONAMA; os Órgãos Seccionais, que apresentam de plano, divergências quanto seus integrantes.

O inciso V do artigo 6º, da Lei 6938/81, fala em órgãos ou entidades estaduais, somente. Já no Decreto 99.274/90, artigo 3º, mesmo inciso, pode-se perceber que é ampliada esta participação, in verbis:

V - Órgãos Seccionais: os órgãos ou entidades da Administração Pública Federal direta e indireta, as fundações instituídas pelo Poder Público cujas atividades estejam associadas às de proteção da qualidade ambiental ou àquelas de disciplinamento do uso de recursos ambientais, bem assim os órgãos e entidades estaduais responsáveis pela execução de programas e projetos e pelo controle e fiscalização de atividades capazes de provocar a degradação ambiental; (Grifo nosso)

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O Professor Édis Milaré (2000, pp. 273-274) faz distinção existente entre tais órgãos afirmando que se tratam de duas estruturas diferenciadas, e que o decreto regulamentar fundiu. Sendo os primeiros órgãos setoriais, onde a Administração Pública Federal direta, indireta e fundacional atua, e outros, órgãos seccionais, onde as entidades estaduais são dotadas com o poder de atuação dentro do sistema.

Por fim têm-se os Órgãos Locais sob os quais não paira dúvida alguma no que tange sua composição. Fazem parte os órgãos e entidades municipais responsáveis pela fiscalização e controle das atividades capazes de provocar degradação ao meio ambiente, nas respectivas circunscrições territoriais. Realizada explanação inicial sobre a estrutura do sistema, alguns órgãos serão referidos no decorrer do estudo.

O Professor Andreas J. Krell, em obra monográfica, onde critica a configuração deficiente sob aspecto legal, e o funcionamento precário do SISNAMA, afirma que:

O sistema procura também integrar os órgãos regionais e locais na execução das regras estabelecidas pelo CONAMA, sendo que a fiscalização e o controle da aplicação das normas e padrões de qualidade ambiental devem ser executados pelo IBAMA apenas supletivamente em relação aos órgãos estaduais e municipais (art. 11, § 1º, da Lei nº 6938/81). No entanto, representantes do próprio IBAMA criticam que, até hoje, não houve uma definição mais clara dos papéis dos órgãos estaduais e municipais dentro do SISNAMA. A própria expressão "sistema nacional" leva a crer que exista uma certa homogeneidade na atuação desse organismo, o que, na realidade, nunca tem acontecido, visto que não houve atuação expressiva, por parte da União, para integrar os níveis governamentais inferiores na implementação de (sic) suas políticas na área da proteção ambiental. (2004, pp. 107-108)

Essa importante consideração realizada pelo doutrinador acerca das deficiências do sistema pode ser sentida, principalmente, nas questões de licenciamento e de exercício do Poder de Polícia, os quais serão abordados em momento oportuno. A diversidade de órgãos da Administração Pública nas três esferas governamentais sejam elas oriundas das administrações diretas, indiretas ou das fundações criadas para esse fim, dificultam a coordenação e realização das políticas para o setor. Observe-se a esfera estadual a seguir.

O Estado do Rio Grande do Sul, justificando sua posição de pioneirismo no cenário nacional, berço de Henrique Luis Roessler e José Lutzemberger, que em décadas remotas deram início ao ambientalismo gaúcho e nacional, instituiu em 4 de junho de 1990, pela Lei Estadual n.º 9.077 à Fundação Estadual de Proteção Ambiental, recebendo o nome do primeiro.

A FEPAM, como é conhecida tem suas origens na Coordenadoria do Controle do Equilíbrio Ecológico, da década de 1970 e no Departamento de Meio Ambiente - DMA - da Secretaria de Saúde e Meio Ambiente. Trata-se de um dos órgãos executivos do Sistema Estadual de Proteção Ambiental - SISEPRA, criado pela Lei Estadual n.º 10.330/94.

Em julho de 1999 com a criação da Secretaria Estadual do Meio Ambiente – SEMA, o SISEPRA, passou a ser coordenado por esta, conforme a Lei Estadual n.º 11.362/99. O SISEPRA, assim como o SISNAMA, prevê a ação integrada dos órgãos ambientais só que em nível estadual, somando-se a necessária articulação ao âmbito municipal.

A atuação do órgão central na promoção das políticas para o meio ambiente é realizada em grande parte com auxílio de seus órgãos diretos: o Departamento de Florestas e Áreas Protegidas – DEFAP [03]; o Departamento de Recursos Hídricos – DRH e por intermédio dos conselhos com participação da sociedade como: Conselho Estadual do Meio Ambiente – CONSEMA [04]; o Conselho de Recursos Hídricos – CRH.

Além dos órgãos mencionados, a FEPAM também promove atuação indispensável na efetivação das políticas ambientais, fiscalizando a aplicação da legislação, coordenando projetos, mas é com licenciamento ambiental que o órgão presta maior serviço ao SISEPRA. Nas questões de fiscalização o exercício do poder de polícia ambiental, a constatar, é exercido também pela Brigada Militar com seus Batalhões de Polícia Ambiental e Florestal.

Visto as realidades estaduais, afirma-se que dotadas de uma organização razoável, abarcando diversos setores desde a fiscalização, o licenciamento até a constituição de um conselho de consultivo-deliberativo. Infelizmente essa não é a realidade de grande parte dos municípios, pois não possuem sequer uma Secretaria Municipal do Meio Ambiente ou pasta equivalente com incumbência de aplicar políticas para o setor.

Observada a realidade local, pode-se notar que em Rio Grande essa dura conjuntura felizmente não procede, pois conta com a Secretaria Municipal do Meio Ambiente – SMMA, criada pela Lei n.º 5.793 de 28 de julho de 2003, pelo desmembramento da Supervisão do Meio Ambiente da antiga Secretaria Municipal de Agricultura, Pesca e Meio Ambiente – SMAPMA, com as competências dispostas no artigo 4º da referida lei.

No contexto local identifica-se, ainda, o Conselho de Defesa do Meio Ambiente – CONDEMA instituído pela Lei Municipal n.º 3.832 de 26 de dezembro de 1983, com caráter consultivo e de assessoramento do executivo municipal. Em 29 de novembro de 2000 através da Lei n.º 5.463 o CONDEMA foi reestruturado, estendendo suas prerrogativas, e dotando-o de função deliberativa, normativa e fiscalizadora. Destarte, passou a condição de instância superior do Sistema Municipal de Política Ambiental.

Quanto ao licenciamento, objeto de estudo posterior, o qual é competência de todos os entes governamentais, é possível identificar poucos municípios licenciando. Isto muitas vezes não se dá somente pela imposição estadual do Código Ambiental do Rio Grande do Sul ou das Resoluções do CONSEMA, mas pela falta de recursos em alguns casos e de interesse em outros. De qualquer sorte, cabe consignar, sejam as imposições inconstitucionais ou não, dependa de habilitação junto ao órgão estadual para licenciar ou não, os municípios brasileiros têm o dever de buscar os meios legais para exercer essas competências.

3.1 – O Poder de Polícia (Administrativa)

Com vistas a compreender melhor a atuação das entidades jurídicas com capacidade política, no tocante a atividade fiscalizadora, preventiva e repressiva das condutas danosas ou potencialmente degradatórias do meio ambiente e dos recursos naturais é preciso entender em que consiste o Poder de Polícia. Este é mais um caso de poder-dever, de uma atribuição impositiva da Administração Pública, um poder interventor visando a efetivação do interesse público. O poder de polícia é orientado diretamente pelo Princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse particular, pois no cerne essa atividade se funda na imposição de limites aos direitos e liberdades particulares em face do bem comum.

O conceito de imposição de limites aos particulares em nome do interesse público é a versão mais moderna acerca do poder de polícia. Quando ligado à concepção do Estado liberal o cunho finalístico segundo a Professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2004, p. 111) era "em benefício da segurança". Na concepção atual de Estado, o poder supra, abrange uma gama superior de setores como patrimônio histórico, artístico e cultural, a segurança, o meio ambiente, dentre outros, conforme descreve o art. 78 [05] do Código Tributário Nacional.

Entretanto a imposição de limites não pode, mesmo tendo como características a discricionariedade, ser levada a efeito sem a prévia observância dos preceitos legais, sob pena de afastamento do princípio da legalidade. É por esta razão que o poder de polícia é exercido pelo Legislativo, quando elabora as normas com conteúdo limitador as liberdades públicas, e pelo Executivo que por intermédio da Administração Pública regulamenta as normas, controlando sua aplicação, preventiva ou repressivamente.

A atuação repressiva não se trata de pleno exercício da atividade de polícia judiciária, embora parte da doutrina diferencie ambas com base no caráter preventivo ou repressivo. No entanto, essa não subsiste de forma absoluta, devendo ser arraigada a análise, pois quando a Administração Pública exerce as funções de polícia administrativa com caráter repressivo, aplicando multas, está agindo com a finalidade de minimizar os prejuízos decorrentes de determinada atividade.

Razão assiste a Álvaro Lazzarini, citado por Di Pietro, o qual explica que:

[...] a linha de diferenciação está na ocorrência ou não de ilícito penal. Com efeito, quando atua na área do ilícito puramente administrativo (preventiva ou repressivamente), a polícia é administrativa. Quando o ilícito penal é praticado, é a polícia judiciária que age. (2004, p. 112)

Ampliando as diferenças, é salutar mencionar que a atuação da polícia judiciária é privativa de determinados órgãos ou corporações, enquanto a atuação da polícia administrativa por sua característica especializada é exercida pelos mais diversos órgãos da estrutura administrativa. Assim, em cada campo de atuação, um órgão específico terá competência, podendo inclusive valer-se das estruturas da Polícia Militar para tal atividade, como ocorria na fiscalização de trânsito e ainda ocorre nas questões ambientais.

No tocante a utilização das estruturas das polícias militares na atividade de proteção ambiental, está presente a possibilidade deste mesmo órgão administrativo ser "eclético no exercício do poder de polícia e passar, dentro de suas competências, da atividade policial preventiva para o exercício da atividade policial repressiva, quando ocorreu o ilícito que não conseguiu evitar" (KRELL, 2004, p. 125). Neste caso específico não importa se o ilícito é administrativo ou penal, pois daí decorre a vantagem da utilização das estruturas policiais tradicionais disponíveis.

Em síntese, refletindo sobre as considerações acima, a melhor definição dada a polícia administrativa é de Bandeira de Mello, afirmando que:

[...] pode-se definir a polícia administrativa como a atividade da Administração Pública, expressa em atos normativos ou concretos, de condicionar, com fundamentos em sua supremacia geral e na forma da lei, a liberdade e a propriedade dos indivíduos, mediante ação ora fiscalizadora, ora preventiva, ora repressiva, impondo coercitivamente aos particulares um dever de abstenção ("non facere") a fim de conformar-lhes os comportamentos aos interesses sociais consagrados no sistema normativo. (2005, p. 766) (Grifo do autor)

Na definição do honorário professor, aparecem translúcidos os atributos do poder de polícia, quais sejam: auto-executoriedade, coercibilidade e a já referida discricionariedade. De certo é possível verificar quanto ao último atributo, trata-se de aplicação do poder discricionário na atuação da polícia administrativa. Porém, nem todos os atos oriundos da atividade são discricionários, p. ex. a licença, em que sua concessão se dá apenas pelo atendimento das exigências, vinculando o agir do poder público.

É cogente, por fim, tecer breves notas sobre os limites desta atividade, mesmo diante de atividade predominantemente discricionárias. De toda sorte, o próprio fundamento do poder de polícia é o limitador, pois seu exercício está condicionado a satisfação do interesse público. Outros limites ao referido poder, são: "[...] as regras de competência, forma, motivo (sobretudo, existência dos fatos invocados e base legal) [...]" (MEDAUAR, 2000, p. 411), sua inobservância poderá caracterizar o desvio de poder ou finalidade do ato.

3.1.1 – Polícia Ambiental

Realizadas as considerações supra, passa-se a análise do poder de polícia sob a ótica da tutela do meio ambiente. O Poder Público se utiliza desse instrumento, o poder de polícia administrativa ambiental, para os fins objetivados pelo art. 225 da Constituição Federal. Essa atuação é chamada doutrinariamente de tutela administrativa do meio ambiente.

O jurista Édis Milaré, expõe o conceito do ilustre doutrinador Paulo Affonso Leme Machado acerca do poder de polícia ambiental, o qual aduz que o:

[...] poder de polícia ambiental é a atividade da Administração Pública que limita ou disciplina direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou a abstenção de fato em razão de interesse público concernente à saúde da população, à conservação dos ecossistemas, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividade econômica ou de outras atividades dependentes de concessão, autorização/permissão ou licença do Poder Público de cujas atividades possam decorrer poluição ou agressão à natureza. (2000, p. 260)

Em espécie as atuações da polícia administrativa ambiental mais comuns são em ações de fiscalização, mas o caráter buscado pela Administração Pública neste exercício vai além da prevenção/punição. Isso porque grande parte das condutas nocivas à natureza são historicamente derivadas de vícios culturais, daí a importância do processo educacional interligado ao sistema punitivo.

Outro aspecto interessante é a distribuição das competências entre os entes federativos, quiçá o aspecto que causa maior agitação sobre o tema. Possuem as três esferas de governo competência concorrente para legislar, sobre matéria ambiental, e por conseqüência são dotados de atribuição para o exercício do poder de polícia ambiental. Logo, surge divergência quanto sua atuação cumulativa, decorrente da interpretação do art. 225, o qual recebe críticas de parte da doutrina, no tocante as obrigações municipais de aplicar a legislação federal e/ou estadual.

Em bom termo, o doutrinador Andreas J. Krell expressa posicionamento, contrariando parte da doutrina, aduzindo que parece:

[...] duvidoso deduzir do preceito do poder de polícia administrativa a conclusão de que os municípios sempre sejam obrigados a executar qualquer lei federal ou estadual quando seu interesse local for atingido. No entendimento de alguns autores, os órgãos das prefeituras seriam obrigados – na base da teoria do poder-dever – a tomar imediatamente as suas medidas e executar todas as leis ambientais existentes, sejam elas locais, estaduais ou federais. [...] o município – em determinadas circunstâncias – pode ser obrigado a fiscalizar ("policiar") a área de atuação regulamentada pelo estado ou a União. É o caso da existência de um estado de necessidade, onde surgem situações de perigo grave dano ao meio ambiente (sic) de interesse local, desde que haja efetiva urgência e inércia, por negligência ou desaparelhamento da máquina estatal das Administrações superiores. Essa atuação, porém, certamente não representa regra, mas a exceção.(2004, pp. 125-126)

Deixando a discussão a cargo da doutrina, o estudo prossegue com ênfase aos atos decorrentes da atuação da Administração Pública, sejam oriundos do exercício da atividade de polícia administrativa ambiental ou de meras políticas públicas para o setor. Assim serão apresentados os atos administrativos ambientais, suas funções e características sejam estes de predominância discricionária ou vinculada.

3.2 – Dos Atos Administrativo-ambientais

Como manifestação da vontade administrativa os atos administrativo-ambientais são uma categoria especial de atos que se misturam aos instrumentos previstos na política nacional do meio ambiente. Dentre as atividades administrativas de natureza ambiental, por sua relevância, limita-se a presente pesquisa ao licenciamento ambiental, as avaliações de impacto ambiental, permissões, autorizações e licenças em matéria ambiental.

3.2.1 – Licenciamento Ambiental

As primeiras considerações acerca do licenciamento ambiental antecedem o conceito, por não estar diante de apenas um ato administrativo e sim de um procedimento administrativo, o qual visa à obtenção da licença ambiental, fase deste que será observada a posteori. Portanto, esbarra-se em conceitos diferentes que devem ser estudados com suas peculiaridades, vedada sua utilização, como sinônimos, conforme ocorre cotidianamente

A definição de licenciamento ambiental está prevista na Resolução 237/97 do CONAMA em sua art. 1º, inc. I:

I – Licenciamento Ambiental: procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais consideradas efetivamente ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso.

Conforme se depreende da definição legal, é através do licenciamento ambiental que o Poder Público exerce o devido controle sobre as atividades que de qualquer modo possam interferir no meio ambiente de forma danosa. Neste cenário, a Administração Pública tenta ajustar as questões econômicas, mormente envolvidas, com a manutenção do meio ambiente ecologicamente equilibrado.

O licenciamento em verdade notabiliza-se como a primeira fiscalização de conformidade com as normas ambientais, uma verificação de caráter preventivo de utilização dos recursos naturais (MORAES, 2002. p. 80). A doutrina não tece demais comentários sobre o tema reduzindo-se a apresentar as fases e as exigências necessárias para obtenção da licença ambiental.

Todavia, quando o assunto é a competência para o licenciamento, logo surgem críticas à Resolução CONAMA n.º 237/97. Devido às alterações propulsadas por essa nas regras de competência estabelecidas na Resolução CONAMA n.º 1/86, o qual atribuía aos órgãos estaduais e ao IBAMA permitindo ainda a atuação dos municípios nos casos necessários a condução dos procedimentos licenciadores.

De constitucionalidade questionada pela doutrina majoritária o dispositivo que modificou a competência para o licenciamento objetivava a racionalização dos procedimentos, evitando assim as duplicidades de análises, de certas atividades devido ao interesses de vários órgãos no licenciamento, frente ao caráter econômico ou mesmo político, em detrimento de outras sem esses atrativos que restariam sem "interessados".

Embora de intenção nobre, a via foi incompetente, pois somente com uma Emenda Constitucional seria capaz de promover a alteração. Assim sendo, os "três níveis de governo estão habilitados a licenciar empreendimentos com impactos ambientais, [...] função, que decorre, insista-se, diretamente da Constituição" (MILARÉ, 2000, p. 319). No entanto, essa habilitação não impede que se estabeleçam livremente convênios ou que discipline regras para o licenciamento pelos três níveis.

No mesmo sentido equivocado andou o legislador gaúcho na edição do Código Ambiental do Rio Grande do Sul – Lei Estadual n.º 11.520/00 – quando atribuiu à Fundação Estadual de Proteção Ambiental, órgão administrativo estadual a determinação das atividades que podem ser licenciadas pelos municípios (KRELL, 2004, p. 116). Bem como andou mal o Conselho Estadual do Meio Ambiente na Regulamentação do dispositivo. Extrapolando assim, as competências para legislar sobre matéria ambiental, o Estado não pode impor restrições ou condicionantes aos municípios, pois esta é prerrogativa constitucional.

Assegurada assim a competência para promover procedimentos de licenciamento ambiental pelos municípios desde que a atividade ou o empreendimento esteja compreendido dentro de sua base territorial, incluindo as áreas pertencentes à União ou ao estado membro. Cabe consignar que nem mesmo os empreendimentos que ultrapassem a delimitação física da unidade federativa, estão afastados do licenciamento ambiental pelo município.

Andreas Krell faz reflexões importantes sobre o tema, afirmando que:

[...] não se nega de forma alguma a utilidade econômica e administrativa da celebração de convênios entre os diferentes níveis governamentais para sintonizar a atuação dos seus órgãos ambientais "no espírito" da Resolução nº 237/97 do CONAMA. Somente deve ficar claro que este redimensionamento não pode ser imposto de cima para baixo, através de leis, decretos ou resoluções. Onde normas estaduais estabelecem que os municípios "devem se credenciar" junto ao órgão estadual para poderem exercer o licenciamento ambiental, isto significa – juridicamente – que o estado exorta os entes locais a tomar essa atitude e se obriga a não realizar licenciamento próprio dos respectivos empreendimentos autorizados pela prefeitura. (2004, p. 117)

Argumentos na doutrina não faltam para questionar a constitucionalidade do artigo 7º da Resolução 237 do CONAMA, o que provavelmente culminaria em outro trabalho de igual importância. No mesmo sentido outro questionamento importante seria a possibilidade do município negar a licença ambiental, contrariando o órgão estadual ou federal, como p. ex. na instalação de uma usina nuclear ou hidrelétrica.

Como seria resolvido tal impasse visto que remanesce margem de discricionariedade à decisão? Deixa-se a resposta para momento de síntese e, passa-se à apresentação das avaliações de impacto ambiental, instrumento da política nacional do meio ambiente o qual a decisão sobre sua exigência ou denegação enseja controvérsia, consoante se tratar de ato vinculado ou discricionário.

3.2.2 – Estudos de Impacto Ambiental

A espécie mais conhecida de estudo de impacto ambiental é Estudo Prévio de Impacto Ambiental – EPIA ou EIA e é considerado um dos mais importantes instrumentos de proteção ao meio ambiente, compatibilizando as questões econômicas, sociais com as geográficas e ambientais. Como referido é uma das etapas do item anterior, a ser elaborado previamente por uma equipe multidisciplinar.

O Estudo Prévio de Impacto Ambiental como qualquer estudo pressupõe que suas conclusões sejam apresentadas de algum modo, essa apresentação é dada através do Relatório de Impacto Ambiental – RIMA, e devem ser de forma transparente, e compreensível para população, alvo primordial do estudo, e ao órgão ambiental responsável pelo licenciamento. Por este motivo que encontram-se as expressões EIA/RIMA juntas, pois uma é conseqüência natural da outra.

A incorporação o EIA/RIMA no cenário jurídico nacional, ensejou a participação de forma mais ativa da sociedade, principalmente a comunidade diretamente atingida, nos processos de discussão sobre o projeto, mediante a realização de audiências públicas. Sua obrigatoriedade é visto pela doutrina como um marco positivo no Direito Ambiental brasileiro, sendo introduzido no sistema jurídico pátrio pela Lei 6.803/80, inspirado no modelo norte-americano.

Com a edição da Lei 6.938/81, o EIA/RIMA, ganha status de instrumento da política nacional do meio ambiente, sem as condicionantes outrora impostas pela lei supra. Após a promulgação de Constituição de 1988, passou a ser tratado como uma imposição ao Poder Público, consoante o que determina o § 1º, inciso IV do art. 225 da CF, citado.

O texto constitucional além admitir a necessidade do EIA/RIMA naquelas atividades potencialmente poluidoras ou de significativa degradação do meio ambiente, deu margem à interpretação de que existem situações que dispensam tal estudo. Novamente, a doutrina dá alardes de inconstitucionalidade da Resolução CONAMA n.º 237/97, visto o inciso citado dispor sobre a exigência na forma da lei.

Sem embargo, pelo que dispõe a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, recepcionada pela Constituição de 1988, a competência é do CONAMA para exigir o EIA/RIMA quando julgar necessário. Afastadas as críticas daqueles mais ferrenhos defensores do "kelsianismo", é mister referir o objetivo desse e qual sua justificativa em nosso sistema legal.

Essa, talvez seja uma das tarefas mais fáceis do presente estudo, pois o objetivo principal do EIA/RIMA é que os empreendimentos não sejam justificados apenas pelo prisma econômico, sem pesar as conseqüências ao meio ambiente. Que não sejam tomadas decisões casuísticas sem a certeza dos danos possíveis ou prováveis de uma opção equivocada. "Daí a necessidade de que o EIA/RIMA seja elaborado no momento certo: antes do início da execução, ou mesmo de atos preparatórios do projeto" (MILARÉ, 2000, p. 281).

Existem ainda, situações em que o órgão ambiental dispensa o EIA/RIMA. Para essas tem-se a aplicação do Relatório Ambiental Preliminar – RAP, com previsão no art. 1º, inciso III da Resolução 237/97 CONAMA. Objetivamente é um estudo mais sucinto atinente aos casos em que as atividades não ensejam significativa degradação ambiental.

Justamente a expressão "significativa degradação ambiental", advinda da Carta Magna é considerada por excelência um conceito jurídico indeterminado, necessitando assim da atuação intelectiva ou cognitiva de interpretação dá margem à controvérsia. Para os defensores da distinção não rígida entre a discricionariedade e a teoria dos conceitos jurídicos indeterminados a decisão da Administração de exigência ou não do EIA/RIMA é discricionária, volitiva (MILARÉ, 2000, pp. 119-120).

Todavia, a decisão administrativa pode estar baseada principalmente no rol estabelecido pela Resolução 01/86 CONAMA, note-se o rol exemplificativo, o que em primeiro momento parecer-nos-ia uma vinculação. Mas como não é possível afirmar sob qualquer circunstância que as atividades descritas nesse, aplicando as variáveis ao caso concreto, são significativamente impactantes, o que de qualquer sorte traria novamente o caráter discricionário do ato.

De certo é possível afirmar que o quando as situações no caso concreto autorizariam a dispensa do EIA/RIMA, a Administração Pública deve motivar sua decisão, mormente aos danos que possam ser expostos os administrados. No mesmo sentido a motivação deve acontecer também quando o Poder Público acolhe alternativa contrária à indicada como viável ambientalmente pelo estudo, e concede a licença ambiental ou a denega.

Corroborando com exposto, o Professor Andreas J. Krell sintetiza a relação da discricionariedade e do EIA/RIMA, explicando que:

Somente depois da decisão sobre a necessidade do EIA, a Administração exercerá a sua discricionariedade a respeito da aprovação do licenciamento. No caso da exigência do EIA, serão aguardados dos seus resultados, resumidos no seu respectivo Relatório (RIMA). No entanto, o órgão ambiental não está plenamente vinculado ao seu resultado, podendo negar a licença apesar da recomendação apesar da recomendação positiva do RIMA. Todavia, caso ele queira autorizar uma atividade cujo EIA terminou desaconselhando a sua realização, a autoridade administrativa será obrigada a expor, exaustivamente, as suas razões para, se for necessário, ordenar a elaboração de outro estudo. (KRELL, 2004, p. 121)

Essa motivação não é advinda do Direito Administrativo e sim dos Princípios de Direito Ambiental, o que de toda sorte tem causado estranheza e debates com maior envergadura entre doutrinadores renomados. Contudo, de momento é necessário, ainda, fazer referências a alguns atos administrativos ambientais em espécie: licença ambiental e suas subespécies, autorização e a permissão para edificar a síntese temática da atuação da Administração Pública na proteção do Meio Ambiente.

3.2.3 – Licenças, Autorizações e Permissões em matéria ambiental

Conforme pode se depreender, inclusive com o estudo do Poder de Polícia Administrativa Ambiental, é que as normas de Direito Ambiental, em grande parte, têm a característica de condicionar as atividades humanas. Porém a observância deste condicionamento nem sempre é espontâneo, e é por este motivo que as normas ambientais prevêem formas de controlar essas atividades (SILVA, 2000, p. 243).

Assim, as licenças, autorizações e permissões são caracterizadas como formas de controle prévio da administração, pois visam a assegurar que o futuro empreendimento ou atividade observe o disposto no regramento ambiental antes mesmo de sua instalação e funcionamento. Ocorre que invariavelmente as definições de ato administrativo ambiental serão submetidas ao contraponto àquelas oriundas do cânon Direito Administrativo, principalmente quanto seu caráter discricionário ou vinculado.

Inicia-se pela definição de licença ambiental dada pelo artigo 1º, inciso I da Resolução 237/97 CONAMA:

II - Licença Ambiental: ato administrativo pelo qual o órgão ambiental competente, estabelece as condições, restrições e medidas de controle ambiental que deverão ser obedecidas pelo empreendedor, pessoa física ou jurídica, para localizar, instalar, ampliar e operar empreendimentos ou atividades utilizadoras dos recursos ambientais consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou aquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental.

Ao contrário do que acontece na licença oriunda do Direito Administrativo, que é ato vinculado, o qual não pode ser negado preenchidos os requisitos legais do interessado, na esfera ambiental esses requisitos são praticamente impossíveis de serem atendidos. Isso decorre, invariavelmente, da imprecisão normativa da matéria.

É neste momento que a referida Discricionariedade Técnica se faz necessária. Mas o órgão ambiental não deve apenas guiar-se por esses critérios. Deve-se valer do EIA/RIMA mesmo esse não tendo o condão de vincular o gestor. Assim pode-se inferir que na licença ambiental predomina o caráter discricionário, exceto na subespécie licença prévia que o grau de vinculação é superior.

Salienta-se ainda que a licença em matéria ambiental, objetivo do processo de licenciamento, é composta de três subespécies. São elas: a licença prévia, a licença de instalação, e a licença de operação, consoante se depreende da leitura do artigo 8º, e incisos, Resolução 237/97 CONAMA [06]. No entanto quaisquer dessas podem ser obtidas isoladamente, forte parágrafo único do mesmo dispositivo.

Outra consideração importante é que, diversamente do ocorre com a licença tradicional, a licença ambiental possui prazo de validade previamente estipulado, devendo o interessado postular sua renovação. Essa característica enseja a fiscalização pelos órgãos ambientais, não podendo esta se cassada ou revogada sem justa fundamentação, que neste caso é o prejuízo ao meio ambiente em geral.

Com fundamento nessas diferenças, principalmente no fato de exigir renovação, alguns doutrinadores entendem que melhor seria chamar as licenças ambientais de autorizações. Em posicionamento contrário, Krell (2004, p. 58) entende que a "visão se baseia na equivocada idéia de que uma licença seja sempre vinculada, apenas reconhecendo direito prévio, e uma autorização sempre discricionária".

Considerando que a competência para licenciar foi analisada quando do procedimento de licenciamento ambiental, não é salutar retornar a discussão neste momento, restando apenas finalizar o presente capítulo com breves comentários as demais espécies de atos administrativos ambientais, as quais não expressam grande importância ao sistema jurídico ambiental.

Estas espécies de ato administrativo quando aplicadas às questões ambientais, por falta de cuidado do legislador ordinário, não expressam seu real significado. Embora sejam atos concedidos a título precário e com caráter discricionário, não podem ser promiscuamente utilizados como sinônimos. Pois, a autorização pressupõe um ato constitutivo, e a permissão é a possibilidade do Poder público facultar ao interessado, serviços de interesse público. (KRELL, 2004)

Apropriados os exemplos trazidos pela doutrina, quanto à permissão da caça e a autorização da lavra e pesquisas nas jazidas, as quais ilustram a classificação em questão. Destarte, diversas outras exposições pudessem fazer parte deste estudo, a finalidade de identificar a atuação da Administração Pública no Meio Ambiente e os atos decorrentes já foi satisfeita, cumprindo apenas tecer as considerações de cunho completivo e reflexivo da conjuntura jurídica da temática.

Sobre o autor
Carlos Alexandre Michaello Marques

Advogado. Graduado em Direito (2006) e Especialista em Gestão Ambiental em Municípios (2008) pela Universidade Federal do Rio Grande - FURG e em Didática e Metodologia do Ensino Superior (2010), MBA em Gestão de Pessoas (2011) e Metodologias e Gestão para Educação a distância (2012) pela Universidade Anhanguera - UNIDERP. Professor Colaborador da Faculdade de Direito - FADIR da Universidade Federal do Rio Grande - FURG. Pesquisador do Grupo Transdisciplinar de Pesquisa Jurídica para Sustentabilidade - GTJUS (CNPq) da Faculdade de Direito da FURG. Professor e Tutor EaD do Curso de Especialização em Educação em Direitos Humanos do Sistema Universidade Aberta do Brasil - UAB/CAPES/SEaD/FADIR/FURG.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARQUES, Carlos Alexandre Michaello. O meio ambiente e a atuação da Administração Pública no Brasil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3132, 28 jan. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20949. Acesso em: 25 dez. 2024.

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