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A responsabilidade patrimonial do sócio-gerente na execução fiscal de créditos tributários e não-tributários

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Agenda 16/04/2012 às 09:10

5. Execução Fiscal

A execução fiscal apresenta-se como a ação de execução autônoma movida pela Fazenda Pública com o objetivo de cobrar créditos tributários e não-tributários inscritos em dívida ativa. É regulada pela Lei n° 6.830/80 e, subsidiariamente, pelo CPC.

Referida ação deve conter os mesmos pressupostos de um processo executivo qualquer, quais sejam título e inadimplemento. O título será a certidão de dívida ativa[99], que se reveste de certeza e liquidez, consoante art. 3° da Lei de Execução Fiscal[100], que é o instrumento que legitima a propositura da execução fiscal.

Os legitimados ativos são os descritos no art. 1° da LEF, quais sejam União, Estados, Distrito Federal, Municípios e respectivas autarquias, que, em outros termos, configurarão a denominada Fazenda Pública.

O legitimado passivo, por sua vez, será o devedor cujo nome constar na Certidão de Dívida Ativa, podendo a execução fiscal ser promovida, entretanto, contra as pessoas enumeradas no art. 4°, da Lei n° 6.830/80[101]. Frisa-se, mais uma vez, que esta disposição na obsta que o nome do responsável não conste na Certidão de Dívida de Ativa para que a execução possa ser redirecionada a ele, conforme já afirmado inúmeras vezes pelos tribunais superiores[102].

O art. 2° da LEF aduz que a dívida ativa da Fazenda Pública abrange créditos tributários e não-tributários, e faz remissão à Lei n° 4320/64, que conceitua, no art. 39, os referidos créditos. Assim, nas palavras do referido dispositivo, crédito tributário é o “proveniente de obrigação legal relativa a tributos e respectivos adicionais e multas”.

Em outros termos, podemos dizer que o crédito tributário é a soma do lançamento com a obrigação tributária, isto é, verificado o nascimento da obrigação tributária (ex: pagar um tributo), a autoridade administrativa realiza um procedimento que, dentre outras coisas, irá declarar que o fato gerador ocorreu, fazer o cálculo e identificar o sujeito passivo. Este é o lançamento. Assim, o crédito tributário é constituído através do narrado procedimento, que, por sua vez, só existe em razão do nascimento da obrigação tributária.

O CTN conceitua tributo no art. 3°, conforme se infere:

Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.

E arrola as modalidades de tributo no art. 5° como sendo impostos, taxas e contribuições de melhoria. Nada obstante os empréstimos compulsórios e as contribuições não estejam inseridos neste dispositivo, já se assentou doutrinária e jurisprudencialmente[103] que estes são tributos. Incluem-se, ainda, como créditos tributários, as multas tributárias, moratórias ou penais e os juros moratórios.

Os créditos não-tributários, por sua vez são enumerados, exemplificativamente, no mesmo artigo da lei 4.320/64:

Os demais créditos da Fazenda Pública, tais como os provenientes de empréstimos compulsórios, contribuições estabelecidas em lei, multa de qualquer origem ou natureza, exceto as tributárias, foros, laudêmios, alugueis ou taxas de ocupação, custas processuais, preços de serviços prestados por estabelecimentos públicos, indenizações, reposições, restituições, alcances dos responsáveis definitivamente julgados, bem assim os créditos decorrentes de obrigações em moeda estrangeira, de subrogação de hipoteca, fiança, aval ou outra garantia, de contratos em geral ou de outras obrigações legais.

Como visto, os empréstimos compulsórios e as contribuições são havidos como tributo. Os demais tipos de crédito presentes neste dispositivo são, de fato, não-tributários. Os mais recorrentes nos tribunais, entretanto, são as multas por infração à CLT, o FGTS, e as multas administrativas.

5.1. A responsabilidade na Lei de Execução Fiscal

A Lei de Execução Fiscal dispõe acerca da responsabilidade em dois dispositivos, quais sejam o art. 4°, V e §2°, os quais serão estudados aqui.

5.1.1. A previsão do art. 4°, V da LEF

Dispõe o art. 4°, I e V da Lei n° 6.830/80:

Art. 4º - A execução fiscal poderá ser promovida contra:

I – o devedor;

V – o responsável, nos termos da lei, por dívidas, tributárias ou não, de pessoas físicas ou pessoas jurídicas de direito privado.

O devedor aqui é o contribuinte (art. 121, parágrafo único, I, do CTN), enquanto o inciso V trata do responsável (art. 121, parágrafo único, II, do CTN). Não é outro o entendimento de Araken de Assis[104], senão vejamos:

Análise superficial do art. 4°, I, da Lei 6.830/80, induz à ideia de que o devedor, ali contemplado, é o contribuinte (...), traduzindo, pois, caso de responsabilidade primária. (...) O art. 4°, V da Lei 6.830/80 regula a legitimidade passiva e aspectos da responsabilidade executiva secundária.

Note-se então, que, neste ponto, a Lei de Execução Fiscal trata do responsável secundário, ou, em outros termos, aquele que não contraiu a obrigação, mas é responsável pelo pagamento em decorrência de previsão legislativa. Há correlação, então, com a mesma regra estatuída no CTN, que diferencia contribuinte de responsável. A diferença é que a Lei de Execução Fiscal fala em “devedor” ao invés de “contribuinte”, mesmo porque este é o obrigado por créditos tributários, e como visto no tópico 5, a execução fiscal é destinada não só à cobrança destes, mas também de créditos não-tributários.

5.1.2. A equiparação dos créditos tributários aos não-tributários

Há, além deste, outro dispositivo da Lei n°6.830/80, que prevê a responsabilidade, qual seja o art. 4°, §2°: “À Dívida Ativa da Fazenda Pública, de qualquer natureza, aplicam-se as normas relativas à responsabilidade prevista na legislação tributária, civil e comercial”.

Nota-se, então, que esta previsão, com a expressão “de qualquer natureza”, quis dizer créditos tributários e não-tributários, mesmo porque a dívida ativa engloba os créditos de ambas as naturezas. Quer parecer, então, que a LEF previu que aos créditos não-tributários são aplicadas as “normas relativas à responsabilidade prevista na legislação tributária, civil e comercial”. Como anteriormente visto (retro 3.2), o Código Civil dispõe acerca da responsabilidade do administrador da sociedade limitada no art. 1.016, em decorrência da remissão do art. 1053 do mesmo diploma legal, que afirma serem aplicáveis as normas da sociedade simples à sociedade limitada. Assim, responde o administrador que agir com culpa no exercício de suas funções. Não é diferente a regra da lei 6.404/76, que rege as sociedades anônimas, ao aduzir que o administrador responderá pelos prejuízos que causar no desempenho de suas funções ou se violar lei ou estatuto.

Desta feita, percebe-se que a legislação civil possui norma específica para as sociedades limitadas, enquanto a legislação comercial (lei 6.404/76) expõe acerca da responsabilidade do administrador nas sociedades anônimas. Outrossim, as normas de responsabilidade tributária são as disciplinadas entre os arts. 128 e 138 do CTN, incluída, pois, a previsão de responsabilidade pessoal do sócio-gerente (art. 135, III).

Dessa forma, seria legítimo o redirecionamento da execução fiscal de créditos não-tributários ao sócio-gerente que agiu com infração à lei, contrato ou estatuto, em decorrência das previsões do art. 135, III do CTN c/c art. 4°, §2° da Lei n° 6.830/80.

Não obstante tal previsão, o STJ se posiciona contra a aplicação do mesmo, aduzindo sempre que o CTN não se aplica aos créditos não-tributários, conforme se passa a expor[105]:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. MULTA POR INFRAÇÃO DA CLT. INAPLICABILIDADE DO CTN.

1. A orientação das Turmas que integram a Primeira Seção desta Corte firmou-se no sentido de que as regras previstas no CTN aplicam-se tão-somente aos créditos decorrentes de obrigações tributárias. Assim, tratando-se de cobrança de multa por infração da CLT, mostra-se inviável o pedido de redirecionamento fulcrado no art. 135 do CTN.

(...)[106]

TRIBUTÁRIO – AGRAVO REGIMENTAL – RECURSO ESPECIAL – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO (SÚMULA 282/STF) – EXECUÇÃO FISCAL PARA COBRANÇA DE MULTA POR INFRAÇÃO À CLT – REDIRECIONAMENTO CONTRA O SÓCIO DA EMPRESA: IMPOSSIBILIDADE – ART. 135 DO CTN: INAPLICABILIDADE.

(...)

2. Em se tratando de execução fiscal para cobrança de débito não-tributário, não tem aplicação o art. 135, III, do CTN.

(...)[107]

TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. MULTA ADMINISTRATIVA. INFRAÇÃO À CLT. IMPOSSIBILIDADE DE REDIRECIONAMENTO AO RESPONSÁVEL TRIBUTÁRIO.

1. O redirecionamento ao sócio-gerente inserto no artigo 135 do Código Tributário Nacional restringe-se às obrigações de natureza tributária.

2. Recurso especial improvido. [108]

"RECURSO ESPECIAL - EXECUÇÃO FISCAL. RESPONSABILIDADE DO SÓCIO-GERENTE - MULTA POR INFRAÇÃO DE DISPOSITIVO DA CLT - NATUREZA NÃO-TRIBUTÁRIA - NÃO-APLICAÇÃO DO ART. 135, III, DO CTN À ESPÉCIE - PRECEDENTE.

A Lei de Execução Fiscal dispõe, em seu artigo 4º, que a execução fiscal poderá ser promovida contra "o responsável, nos termos da lei, por dívidas, tributárias ou não, de pessoas físicas ou pessoas jurídicas de direito privado".

O artigo 135, III, do Código Tributário Nacional, porém, determina quais são os responsáveis pelos créditos correspondentes apenas a obrigações tributárias. Dessa forma, o aludido dispositivo legal não se aplica às execuções de dívidas decorrentes de multa por infração da Consolidação das Leis do Trabalho, pois referidos débitos não têm natureza tributária. Precedente. Recurso especial improvido.[109]

(grifou-se)

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Essas decisões ignoram a previsão do art. 4°, §2° da Lei n° 6.830/80, aduzindo que o CTN só se aplica a obrigações tributárias. Contudo, não fundamentam o motivo para tanto, apontando somente que é determinação do art. 135. Ora, se o Código é o Tributário, fato que ele não haveria de prever em uma redação que fosse incluída a palavra “não-tributária”.

Este também o entendimento de Leandro Paulsen, René Bergmann Ávila e Ingrid Schroeder Sliwka[110]:

O dispositivo em questão estende a aplicação dos dispositivos que dizem da responsabilidade por dívidas, seja na legislação tributária, civil ou comercial, a toda e qualquer dívida ativa, independentemente da sua natureza. Há muitas discussões sobre a aplicação, por exemplo, do art. 135 do CTN, que diz da responsabilidade dos sócios gerentes quando tenham atuado com excesso de poder, infringindo aos estatutos ou à lei. Cuida-se de dispositivo sobre responsabilidade tributária que, por força do parágrafo em questão, deve ser aplicado também à dívida ativa não-tributária. Não é fundamento para a sua não-aplicação, pois, dizer-se da natureza não-tributária do débito. A aplicação decorre da determinação expressa constante neste art. 4°, §2° da LEF, e não do recurso à analogia ou à interpretação extensiva. Os precedentes que dizem da inaplicabilidade de dispositivos do CTN à execução de dívidas não tributárias não nos parecem fundamentados de modo adequado, pois não abordam este §2° do art. 4° da LEF.

Em verdade, o que o legislador quis, com a equiparação dos créditos não-tributários aos tributários no art. 4°, §2° da LEF, foi atender às situações que carecem de previsão legal específica de responsabilidade, haja vista que os créditos tributários já dispõem de norma relativa à responsabilidade tributária. Os créditos não-tributários, contudo, não possuem, a seu favor, regra semelhante, dependendo, pois, da equivalência proposta pelo dispositivo em estudo.

Mauro Rodrigues Penteado[111], ao enfrentar o tema, sugere a aplicação do artigo 154 da Lei nº 6.404/76, em se tratando de sociedade anônima, e do art. 1016 do CC, se a sociedade for limitada.

Não há razão, contudo, de se poder aplicar apenas as normas de responsabilidade constantes nas legislações civil e comercial, se o art. 4°, §2° da LEF prevê também a aplicação das normas de direito tributário.

Devemos entender, portanto, que as decisões do STJ são equivocadas ao não equivalerem os créditos não-tributários aos tributários no tocante à responsabilidade. Elas estão não somente inobservando uma norma federal, como também favorecendo a prática de ilegalidades de sócios que se escondem por detrás da autonomia patrimonial da sociedade para o cometimento das mesmas, haja vista não haver outro dispositivo legal capaz de responsabilizar o sócio-gerente pelo pagamento do crédito não-tributário, no caso de infração à lei, contrato ou estatuto.

Não obstante o STJ negue aplicabilidade do CTN aos créditos não- tributários no tocante à responsabilidade do sócio-gerente, já houve outras decisões de Tribunais Regionais Federais com entendimento diverso, senão vejamos:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. MULTA ADMINISTRATIVA. REDIRECIONAMENTO. CITAÇÃO DE TITULAR DA EMPRESA. .

É possível a responsabilização do sócio administrador no caso de dissolução irregular da empresa, consoante precedentes do STJ e desta Corte. Isto porque é seu dever, diante da paralisação definitiva das atividades da pessoa jurídica, promover-lhe a regular liquidação, realizando o ativo, pagando o passivo e rateando o remanescente entre os sócios ou os acionistas (art. 1.103 do Código Civil e arts. [344] e [345] do Código Comercial). Não cumprido tal mister, nasce a presunção de apropriação indevida dos bens da sociedade (art. 10, Decreto nº 3.078/19).. Prequestionamento quanto à legislação invocada estabelecido pelas razões de decidir. Agravo de instrumento provido.[112]

Neste julgamento, o agravante pugnou pelo não redirecionamento requerido pela autarquia INMETRO, em virtude de se tratar de crédito não-tributário. O relator, contudo, justificou seu voto, aduzindo o que se segue:

Ainda que se trate execução desprovida de natureza fiscal, o redirecionamento da execução é possível quando não demonstrado que a sociedade encerrou suas atividades com as formalizações legais.

Entendimento sinônimo foi o proferido pela 8ª turma do TRT de Minas Gerais[113]:

De acordo com a regra do art. 2°, caput, da Lei 6.830/80, a dívida ativa da União é aquela definida como tributária ou não tributária, na forma da Lei 4.320/64, sendo assim considerado qualquer valor, cuja cobrança seja atribuída por lei à União e suas respectivas autarquias (art. 2°, § 1° e art. 1° da Lei 6.830/80). Este é, precisamente, o caso das multas administrativas, que, embora tenham natureza não tributária, têm a cobrança atribuída à Fazenda Nacional.

Constatada a impossibilidade de cobrança da penalidade administrativa em face da massa falida, deve a execução ser redirecionada contra o coobrigado, cujo nome consta, expressamente, da certidão da dívida ativa, eis que tal documento goza de presunção de liquidez e certeza e somente pode ser ilidido por prova em sentido contrário, a cargo do sujeito passivo, por ocasião de eventuais Embargos à Execução.

(grifou-se)

E também pelo TRF da 4ª região:

ADMINISTRATIVO. EXECUÇÃO FISCAL. CRÉDITO DECORRENTE DE MULTA ADMINISTRATIVA. REDIRECIONAMENTO A REPRESENTANTE LEGAL. A Lei n. 6.830/80, em seu art. 4º, inc. V, quando autoriza a promoção da execução fiscal contra "o responsável, nos termos da lei, por dívidas tributárias ou não, de pessoas físicas ou pessoas jurídicas de direito privado", encontra amparo tanto na legislação comercial como na tributária.[114]

Em se tratando de FGTS, também há decisões em idêntico sentido:

PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. CONTRIBUIÇÃO AO FGTS. INCLUSÃO DE SÓCIO DA EMPRESA NO PÓLO PASSIVO. POSSIBILIDADE.

I - A execução judicial para cobrança de contribuições ao FGTS, inscritas em Dívida Ativa, é regulada pelas regras da Lei nº 6.830/80.

II - À Dívida Ativa da Fazenda Pública, de qualquer natureza, aplicam-se as normas relativas à responsabilidade prevista na legislação tributária, civil e comercial (Lei 6.830/80, art. 4º, § 2º).

III - Portanto, não obstante não ter a contribuição ao FGTS natureza tributária, são aplicáveis as normas do Código Tributário Nacional tão somente no que tange à responsabilidade.

IV - Nos termos do art. [135] do CTN, são pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos.

V - A Lei nº 8.036/90 considera infração a lei o não-recolhimento mensal do percentual ao FGTS (artigo 23, parágrafo 1º). Em razão da presunção relativa da CDA, a empresa ora executada deixou de recolher as contribuições ao FGTS e, portanto, seus administradores, detentores do poderes de gerência, infringiram à lei.

VI - Agravo de Instrumento provido.[115] (grifou-se)

EXECUÇÃO FISCAL. FGTS. RESPONSABILIDADE PESSOAL DO SÓCIO PELOS ATOS PRATICADOS COM VIOLAÇÃO DA LEI. APLICAÇÃO DO CTN.

1. Este Tribunal orienta-se no sentido de que o sócio responde pessoalmente pelas obrigações da sociedade decorrentes de atos praticados com infração da lei, ex vi do artigo [135], do Código Tributário Nacional. (AC 1999.01.00.071844-5 /MG; DJ 23/05/2002 P.181; Rel. Juiz Evandro Reimão dos Reis, AC 1997.01.00.008766-7 /MG; DJ 06 /05 /2002 P.105; Rel. Juiz Leão Aparecido Alves, REO 1998.01.00.081997-7 /BA; DJ 08 /03 /1999 P.166; Rel. Juiz Hilton Queiroz; REO 95.01.12138-0 /DF; DJ 15 /12 /2000 P.33; Rel. JUIZ Reynaldo Soares da Fonseca (CONV.)). 2. O não-recolhimento das contribuições devidas ao FGTS caracteriza infração à lei. Precedentes desta Corte. 3. Nos termos do artigo 4º, inciso V, da Lei 6.830/80 a execução fiscal pode ser proposta contra "o responsável, nos termos da lei, por dívidas, tributárias, ou não, de pessoas físicas ou pessoas jurídicas de direito privado". 4. E o parágrafo 2º do referido artigo 4º determina que à "dívida ativa da Fazenda Pública, de qualquer natureza, aplicam-se as normas relativas responsabilidade prevista na legislação tributária, civil e comercial." 5. Conseqüentemente, os dispositivos do Código Tributário Nacional que se referem à responsabilidade tributária são aplicáveis à execução da dívida ativa não-tributária (CTN, art. [135], III). 6. Agravo de instrumento provido para determinar a inclusão do sócio gerente da empresa devedora no pólo passivo da lide.[116] (grifou-se)

Essas decisões foram exaradas no ano de 2007, no tocante ao FGTS, que tem natureza não-tributária.

No ano de 2008, o STJ editou a súmula 353, aduzindo que “as disposições do Código Tributário Nacional não se aplicam às contribuições para o FGTS”. Este entendimento surgiu baseado no fato de que a Lei n° 8.620/93 é ordinária, sendo, pois, hierarquicamente inferior ao CTN, que foi recepcionada pela CF/88 como lei complementar. Logo, a lei ordinária não teria força para alterar o art. 135 do CTN. Dispunha o art. 13 da lei n° 8.620/93 que

O titular da firma individual e os sócios das empresas por cotas de responsabilidade limitada respondem solidariamente, com seus bens pessoais, pelos débitos junto à Seguridade Social.

Parágrafo único. Os acionistas controladores, os administradores, os gerentes e os diretores respondem solidariamente e subsidiariamente, com seus bens pessoais, quanto ao inadimplemento das obrigações para com a Seguridade Social, por dolo ou culpa.

Verifica-se que pela redação do citado dispositivo, bastaria o inadimplemento para que o sócio-gerente fosse responsabilizado pelo débito da sociedade. O art. 135 do CTN, contudo, prevê o excesso de poder ou a infringência de lei, contrato ou estatuto e não somente o inadimplemento. Dessa forma, a Lei da Seguridade Social acabava por permitir a responsabilização do sócio-gerente em caso não permitido pelo CTN. Contudo, a primeira lei é ordinária e a segunda complementar, de tal modo que não haveria como permitir que uma lei ordinária modificasse uma lei complementar. Daí o motivo pelo qual o art. 13 da lei n° 8.620/93 foi revogado pela lei 11.941/09, posto que considerado inconstitucional[117]. Anteriormente à revogação, porém, o STF editou a súmula 353, de modo a impedir o redirecionamento aos sócios-gerentes no tocante ao FGTS.

Assim, em decorrência do conteúdo da súmula 353, não há mais que se falar em aplicação do CTN para cobrança do FGTS. Não obsta, porém, que o CTN seja aplicado para outros créditos não-tributários, embora esta súmula só tenha corroborado para que o STJ continuasse proferindo decisões no sentido de não aplicar o CTN aos créditos não-tributários no âmbito da responsabilidade.

Embora o STJ se negue a cumprir a norma do art. 4°, §2° da LEF, o CTN vem sendo aplicado aos créditos não-tributários pelos tribunais brasileiros, no tocante, por exemplo, à prescrição e decadência[118]. O próprio STJ consagrou este entendimento ao afirmar que “Inexistindo regra específica (...) deverá o operador jurídico valer-se da analogia e dos princípios gerais do direito”.[119]

É curioso, portanto, que o STJ valha-se da analogia e da interpretação extensiva para aplicar à prescrição e decadência de créditos não-tributários norma contida no CTN, mas não se valha da determinação legal insculpida na Lei 6.830/80 para dar o mesmo tratamento aos referidos créditos no que condiz à responsabilidade.

5.2. A aplicação da desconsideração da personalidade jurídica

Como visto, o STJ tem rechaçado a aplicação do art. 4°, §2°, de modo a não aplicar o CTN para responsabilizar o sócio-gerente pelo pagamento dos créditos não-tributários.

Há, contudo, decisões de outros tribunais fundamentadas não na responsabilidade, mas na desconsideração da personalidade jurídica.

Como bastante debatido aqui, a desconsideração da personalidade jurídica é forma subsidiária de responsabilização do sócio, devendo incidir tão-somente nos casos em que a lei não atribua a responsabilidade a uma pessoa que não o devedor. Ademais, são necessários os requisitos do desvio de finalidade ou confusão patrimonial.

Em tese, a teoria da desconsideração da personalidade jurídica não deveria ser aplicada para responsabilizar os sócios pelos créditos não-tributários, haja vista a existência de norma prevendo a responsabilização direta.

Entretanto, como a existência da norma é ignorada pelo Superior Tribunal de Justiça, os demais tribunais têm aplicado a desconsideração da personalidade jurídica para estes casos, de modo a responsabilizar os sócios que atuaram com excesso de poder ou infringiram lei ou contratos e estatutos, desde que presentes, por óbvio, os requisitos da desconsideração da personalidade jurídica. Este foi o entendimento do TRT da 14ª região[120], senão vejamos:

DESCONSIDERAÇAO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. DÍVIDA NAO TRIBUTÁRIA. POSSIBILIDADE. DESVIO DE FINALIDADE. PRÁTICA DE ATO ILÍCITO. ALEGAÇAO DA PRÓPRIA TORPEZA. Se uma determinada pessoa jurídica vem sendo executada por uma dívida de natureza não tributária - multa administrativa, cujo surgimento decorreu da violação à legislação social do trabalho, e não foram localizados bens sociais o bastante para assegurar a referida execução, tem-se como possível a aplicação do instituto da desconsideração da personalidade jurídica, a teor dos arts. [50] do CC c/c art. [28] do CDC, porque o fato donde nasceu o crédito exequendo redunda em desvio de finalidade - ato ilícito. É justamente por essa razão que seus sócios não poderão se eximir, livrando-se seus bens particulares, pois, caso contrário, a alegação da própria torpeza em juízo seria prestigiada. AGRAVO DE PETIÇAO. INOVAÇAO PROCESSUAL. PRECLUSAO. Não merece ser conhecido, tampouco provido o pedido relacionado com matéria não exposta perante o Juízo da execução, a qual foi fulminada pela preclusão, tendo em vista que o contrário certamente implicaria supressão de instância e evidente ofensa ao ordenamento jurídico pátrio. (grifou-se)

O TJSP também já exarou decisões no mesmo sentido:

DESCONSIDERAÇÃO PERSONALIDADE JURÍDICA - Agravo de Instrumento - Execução fiscal - Desconsideração da personalidade jurídica - Dívida não tributária - Admissibilidade, diante do fato de que a empresa devedora encerrou suas atividades de forma irregular. Recurso provido. (grifou-se)[121]

AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXECUÇÃO FISCAL E MEIO AMBIENTE – INCLUSÃO DOS SÓCIOS NO PÓLO PASSIVO DA EXECUÇÃO POR MULTA AMBIENTAL – DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURIDICA. Viável a desconsideração da personalidade jurídica da empresa, se caracterizadas as condições hábeis a tanto, existindo prova de dolo ou culpa do administrador na gestão dos negócios empresariais, configurada a infringência à lei, não se podendo admitir sejam legais ou legítimas.[122]

Verifica-se, portanto, que a execução de crédito não-tributário tem sido redirecionada ao sócio-gerente que age com infração à lei, baseada não na responsabilidade, mas na desconsideração da personalidade jurídica.

A conclusão a que se chega, apesar do nosso entendimento em contrário, é que não há como redirecionar a execução fiscal de créditos não-tributários ao sócio-gerente de uma empresa executada que age infringindo lei, contrato ou estatuto, aplicando-se o art. 4°, §2° da LEF c/c art. 135, III do CTN. Dessa forma, caso não seja constatado desvio de finalidade ou confusão patrimonial para desconsiderar a personalidade jurídica, os responsáveis pelo pagamento dos referidos créditos acabam ficando à margem da lei, que, diga-se de passagem, existe, só não é aplicada.

5.3. O projeto de lei n° 5.080/09

Há um projeto de lei em tramitação no Congresso Nacional que pretende alterar a lei 6.830/80, qual seja o de n° 5.080/09.

Referido projeto de lei surgiu com base em um estudo realizado pelo Ministério da Justiça[123], no ano de 2007, o qual constatou que em alguns estados brasileiros as execuções fiscais correspondem a mais de 50% dos processos em trâmite, além do valor da dívida ativa apenas da União ter saído da casa dos 100 milhões, no ano de 2000, para atingir um valor superior a 300 milhões de reais, no ano de 2005, o que representa metade da dívida líquida do governo federal e do Banco Central. No tocante à arrecadação, os números são ainda mais surpreendentes: nem 1% dos créditos regularmente inscritos em dívida ativa é arrecadado. Razão disto é a incapacidade do Fisco de alcançar o devedor de créditos tributários e não-tributários já constituídos, o que culmina na morosidade dos processos executivos fiscais, seja na esfera administrativa ou judicial.

Assim, este estudo pretendeu sugerir soluções para esta e outras questões que permeiam o processo executivo fiscal, dentre as quais se destacam: i) a desjudicialização da execução fiscal, que nada mais seria do que retirar a cobrança da esfera judicial, inserindo-a no âmbito administrativo, tendo a decisão caráter de definitividade, se o sujeito passivo não apresentar qualquer resistência; ii) a concessão de maiores poderes aos procuradores, sobretudo para transacionar com os devedores de créditos inscritos em dívida ativa; iii) maior utilização de meios que induzam os devedores a cumprir suas obrigações fiscais, na qual se encaixaria a restrição de credito público em caso de inadimplência do devedor; iv) penhora administrativa, que consistiria em dotar as procuradorias de poder para localizar bens passíveis de penhora, de tal forma que se estes não fossem encontrados, a ação nem sequer seria ajuizada; v) manutenção da atual lei com modificações pontuais, notadamente no sentido de consolidar entendimentos díspares dos tribunais acerca de determinados temas.

Algumas dessas sugestões foram incorporadas no Projeto de Lei n° 5080/09, dentre as quais podem ser citadas a autorização para instituição do Sistema Nacional de Informações Patrimoniais dos Contribuintes (SNIPC), que consistiria basicamente em um banco de dados com informações patrimoniais dos contribuintes, a fim de dar ensejo a uma possível penhora administrativa. Além desta, há também, no Projeto de Lei n° 5080/09, menção a uma fase administrativa, que antecederia a propositura da ação de execução fiscal, momento em que o executado será citado para pagar, parcelar ou oferecer garantia, no prazo de 60 dias. Ultrapassado este prazo, contudo, a Fazenda pode dar início à constrição preparatória, da qual o devedor será notificado para se manifestar em trinta dias. Não acatados os fundamentos do devedor, a execução fiscal terá prosseguimento, com a constrição, avaliação e penhora dos bens. No prazo de trinta dias, contados da data da constrição provisória, a Fazenda deve ajuizar a execução fiscal. Vale dizer que esta regra não se aplica se se tratar de dinheiro, caso em que o prazo será de três dias, sob pena de ineficácia da constrição.

Nota-se, então, que muito há de diferente entre o Projeto de Lei n° 5080/09 e a Lei de Execução Fiscal, mormente no tocante à fase pré-judicial, o que daria ensejo para a celeridade dos processos executivos fiscais. Mas não é só.

O Projeto de Lei n° 5080/09 traz a mesma redação do atual art. 4°, §2° da LEF, no art. 2°, §1°[124]. Entretanto, prevê expressamente no §2° do art. 2° que “À dívida ativa da Fazenda Pública, de natureza não-tributária, é aplicável o disposto nos arts. 121 a 135 e 184 a 192 da Lei n° 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional”.

Nota-se, pois, que se pretende prever expressamente a aplicação do CTN aos créditos não-tributários no tocante à responsabilidade, o que já é feito atualmente em relação às preferências[125].

Como visto anteriormente, uma das sugestões do estudo sobre a execução fiscal consistiria no fato de serem feitas modificações pontuais na legislação, notadamente no sentido de consolidar controvertidos entendimentos dos tribunais. Ora, sem dúvida este é um tema bastante controvertido nos tribunais que necessita ser uniformizado. Certamente, se o referido projeto de lei for aprovado sem modificações neste tocante, os tribunais devem, enfim, chegar a um consenso quanto ao tema aventado.

Destarte, espera-se que o projeto de lei seja aprovado o mais rápido possível, de modo que o sócio possa ser responsabilizado pela prática de atos contrários à lei, estatuto ou contrato cometidos na gerência da sociedade, quando esta for devedora de créditos não-tributários inscritos em dívida ativa.

Com a remissão específica e direta, talvez o Superior Tribunal de Justiça não se oponha à responsabilização pessoal do sócio-gerente pelos créditos não-tributários.

Sobre a autora
Elaine Xavier Teixeira

Advogada. Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Juiz de Fora (2011).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TEIXEIRA, Elaine Xavier. A responsabilidade patrimonial do sócio-gerente na execução fiscal de créditos tributários e não-tributários. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3211, 16 abr. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21513. Acesso em: 23 dez. 2024.

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