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Crime organizado e o tratamento legislativo brasileiro

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Agenda 25/05/2012 às 12:37

5. CONCLUSÃO

Primeira conclusão: as principais organizações Mafiosas surgiram em um momento histórico em que o Estado e suas instituições passaram por uma transição, seja entre regimes, formas de governo ou de organização social. Nesses determinados momentos históricos a ausência do poder Estatal atuante (como o poder de polícia e o jurisdicional) proporcionou que grupos de oportunistas se organizassem hierarquicamente para a obtenção de poder e lucro por meio da violência. Daí a validade da afirmação que o final do século XVI viu o nascimento de algumas das mais notáveis sociedades secretas criminosas da história: a Máfia, a Garduna, a Camorra, a Ndrangheta, e a Yakuza.

 Cada uma das Máfias analisadas possui características únicas, algumas de caráter social, outras que podem até ser definidas como étnicas, no entanto, todas elas tem muito em comum. De início podemos identificar um mito fundante na história de cada organização. Todas apresentam para a sociedade e para seus membros algum tipo de justificativa nobre para sua existência. Citamos como exemplo a Cosa Nostra, que tem como mito fundante a resistência patriótica contra a invasão espanhola e francesa.

Além de sustentarem essa versão idealizada e deformada da realidade sobre seu surgimento e função social a própria denominação das organizações mafiosas se colore de significados honrosos e bravios, a palavra Ndrangheta, por exemplo, significa heroísmo, virtude, valores que raramente se encontram na mesma frase que práticas como o tráfico de drogas ou a extorsão e o homicídio.

Conclusão n.° 2: a principal característica que diferencia as organizações criminosas de estrutura mafiosa das organizações criminosas não mafiosas é a filosofia organizacional.

A Máfia possui como tecido conjuntivo valores infraculturais, enquanto o crime organizado aplica uma visão empresarial monopolista. Ou seja, enquanto a Máfia valoriza a honra de que se reveste as ações do Capo, por exemplo, o crime organizado prima pela eficiência no gerenciamento das atividades criminais.

Esse elemento organizacional é o melhor critério para a verificação da espécie de estrutura pois, como constatamos, existe pouca, se não nenhuma diferença entre as atividades criminosas desempenhadas pelos grupos, dentre elas o tráfico de entorpecentes, pessoas e armas, o jogo ilícito, a extorsão, o seqüestro, e assim por diante.

Conclusão n.° 3: o crime organizado no Brasil tem um berço, única característica além do tipo de atividade desenvolvida pelos grupos, que pudemos identificar como comum a todas as facções criminosas.

Tudo começou na Ilha Grande, presídio que abrigou presos comuns e políticos entre os anos de 1969 e 1978. Foi um Decreto-Lei que visava a repreensão à guerrilha que propiciou essa desagradável reunião.

O convívio entre agentes da revolução comunista (especializados em terrorismo, assaltos a bancos, táticas de milícia e guerra cultural com formação em Cuba e contatos com a KGB) e criminosos ditos comuns foi o embrião de organizações como o Primeiro Comando da Capital e o Comando Vermelho.

Após uma série de lições apreendidas dos agentes da revolução os primeiros líderes do crime organizado passaram a construir um império de terror e destruição cujos pilares são o tráfico de entorpecentes, a corrupção dos agentes do Estado, a exploração dos jogos ilegais, o furto de veículos e cargas e os desmanches de veículos.

Conclusão n.° 4: tanto a Comissão Parlamentar de Inquérito que investigou a ligação entre os bingos e o crime organizado, quanto a CPI que investigou o tráfico de entorpecentes concluiu que a ameaça representada pelas organizações criminosas é muito maior do que se possa imaginar, e isso ocorre principalmente pela incapacidade perceptiva, que discutimos na introdução do presente trabalho, afinal, só aquilo que se conhece profundamente se teme, e, por fim, se combate.

Conclusão n.° 5: quanto ao conceito doutrinário de organização criminosa, barreira legal ao combate dessa ameaça, constatamos que do ponto de vista doutrinário, a melhor maneira de se conceituar organização criminosa é aquela trazida por Schelling, que constata que o crime organizado não é uma empresa, como muitos apontam, mas sim um monopólio, pois seriam aplicáveis adjetivos próprios da atividade monopolizadora para qualificar a atividade desenvolvida pela organização criminosa, ou seja, inescrupulosa, cruel, avarenta, exploradora e sem princípios.

Conclusão n.° 6: o conceito legislativo mais adequado não estaria na Lei n.° 9.034/95, que, conforme argumenta a doutrina majoritária, é vazio, e, portanto, imprestável. A melhor conceituação seria a utilizada pelo Superior Tribunal de Justiça, que permite a aplicação dos institutos previstos na Lei n.° 9034/95 sempre que se constatar, no caso concreto, a atuação de uma organização criminosa, assim compreendida aquela constante no art. 2°, caput, do Decreto n.° 5.015 de 12 de março de 2004, que introduziu na ordem jurídica interna a convenção das nações unidas contra o crime organizado internacional.

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Conclusão n.° 7: da análise dos projetos de lei que dizem respeito ao combate ao crime organizado pudemos observar que algumas das iniciativas padecem de inconstitucionalidades como, por exemplo, o Projeto de Emenda à Constituição n.° 43/2003, de autoria do Senador Renan Calheiros, que visa negar ao preso o direito de conhecer os responsáveis por sua prisão, quando se tratar de delito cometido por organização criminosa. Como já decidiu o Supremo Tribunal Federal a expedição da nota de culpa é direito do preso resguardado pela Constituição Federal, que, caso desrespeitado, importa em relaxamento da prisão, razão pela qual a emenda não seria de modo algum benéfica ao sistema processual brasileiro.

A análise dos Projetos de Lei também não foi muito animadora, as iniciativas padeciam de inconstitucionalidades e muitas vezes buscavam implementar institutos já existentes na ordem jurídica. Por fim, concluímos que o futuro do combate ao crime organizado não pode esperar muito dos projetos de leis que tramitam nas casas, o que nos trás, ao mesmo tempo, decepção, por não ver implementadas melhorias e, conseqüentemente um aumento da segurança pública, e uma certa tranqüilidade, por não ter de lidar com os famosos rompantes de velhas inovações, característicos do processo legislativo brasileiro.

Conclusão n.° 6: da análise pormenorizada dos institutos da Lei n.° 9.034/95 pudemos compreender a importância da infiltração de agentes, técnica cuja aplicação pode trazer benefícios muito expressivos ao combate ao crime organizado, mas que, infelizmente, não é suficientemente empregada.

Verificamos a relação de simbiose entre esse instituto e a ação controlada, que tem potencial muito maior do que simplesmente propiciar o adiamento do momento do flagrante, pois, se informações suficientes forem fornecidas pelo agente infiltrado, pode-se permitir um mapeamento total da organização e sua conseqüente implosão.

Em relação à interceptação ambiental, verificamos sua versatilidade e abrangência, e quanto ao acesso a dados fiscais, bancários, financeiros e eleitorais, visualizamos como outros dispositivos legais já regulam a matéria, limitando a aplicação do instituto. Por fim, foi possível analisar os requisitos legais para o desenvolvimento de cada uma das estratégias de investigação e obtenção de prova, o que permite a visualização dos limites de cada instituto e um panorama geral sobre a capacitação do aparato estatal para lidar com uma ameaça crescente e mutante que tende à dominância e destruição.


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BILYNSKYJ, Paulo Francisco Muniz. Crime organizado e o tratamento legislativo brasileiro . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3250, 25 mai. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21856. Acesso em: 23 nov. 2024.

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