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Responsabilidade contratual: a causalidade do dano (nexo de causalidade) é a mesma na responsabilidade contratual e na extracontratual?

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Agenda 25/09/2012 às 16:59

4. A causalidade do dano (nexo de causalidade) é a mesma na responsabilidade contratual e na extracontratual?

Como acima salientado, a jurisprudência pátria e, não raro, alguns doutrinadores, fazem uma certa confusão ao justificarem qual a teoria que serviu de base ao ordenamento jurídico brasileiro no que tange ao nexo de causalidade na responsabilidade civil.

Em âmbito geral, quer na jurisprudência, quer na doutrina, não há uma exata bipartição na análise e estudo do nexo causal para a responsabilidade contratual e para a extracontratual, sendo esse elemento tratado indistintamente para ambas as modalidades de responsabilidade.

De qualquer modo, é claro que o Código Civil de 2002, em seu artigo 403, vale-se da teoria do dano direto e imediato para as situações de inexecuções das obrigações em geral. Desse modo, poder-se-ia ponderar que para todas as fontes das obrigações – contratos, atos ilícitos e atos unilaterais – seria possível aplicar a dita teoria.

No entanto, não entendo seja essa a melhor posição, haja vista a diferença específica entre responsabilidade extracontratual e contratual, já previamente analisada.

Nesse sentido, acredito que, com respaldo no artigo 403 do Código Civil, pode-se afirmar que a teoria do dano direto e imediato deve se reportar à responsabilidade contratual, na medida em que da inexecução do contrato diretamente decorre o prejuízo para a parte contratante lesada. Por isso imagino que, nesta hipótese, dificilmente se ponderará a respeito de causas múltiplas, visto que com base no contrato se poderá dimensionar, com maior precisão, qual a causa imediata e necessária do dano ocasionado (o prejuízo decorre diretamente da inexecução de alguma ou algumas das obrigações pactuadas ou dispostas para aquela modalidade contratual, nos termos da legislação aplicável). O que pode haver são causas externas que nada tem a ver com a relação contratual (caso fortuito, força maior, ato de terceiro) que, nesse caso, servem como excludentes da responsabilidade.

Já no que tange à responsabilidade extracontratual, entendo que a teoria que melhor explicaria o nexo causal seria a da causalidade adequada, em que o fato mais adequado e idôneo a produzir o dano será a causa determinante da responsabilidade.

O próprio Sergio Cavalieri menciona que “o nosso Código Civil tem regra especificamente destinada à responsabilidade contratual”[117], consubstanciada no disposto no artigo 403 (correspondente ao artigo 1060 do Código Civil de 1916), fundamentando, em parte, o posicionamento acima adotado.

De qualquer modo, a problemática do nexo causal não encontra resposta única e simplista, haja vista a quantidade de teorias e a confusão terminológica encontrada na jurisprudência pátria. Isso, pois, cada caso de responsabilidade civil exigirá do julgador um exercício de adequação dos fatos[118], estabelecendo a possível relação de causa e efeito entre eles existentes, sem necessariamente pensar, antes, em qual das teorias irá aplicar. O que importa é que a causa encontrada seja apta a produzir o prejuízo a ser reparado (existência da relação imputacional) .

Como asseverou Gisela Sampaio[119], “nenhum código de princípios causais, entretanto, irá determinar as respostas para todos os problemas”, sendo certo que o nexo causal, sempre que possível, deverá ser apurado no exame do caso concreto, a partir de juízos de valor com base nas normas existentes.

Assim, sem adentrar na diferenciação feita pelas diversas teorias, entendo que se pode afirmar que a causalidade, quer para a responsabilidade extracontratual, quer para a contratual, deve ser determinada com base em critérios razoáveis, que atestem que uma dada causa é mesmo a determinante do evento danoso, sendo certo que no caso da responsabilidade contratual, pela própria base fática existente (o contrato vinculante entre as partes), é mais fácil se determinar aquela causa que, via de regra, encontra-se diretamente explicitada no pacto firmado entre as partes.

Apenas para evidenciar a dificuldade em se precisar uma resposta definitiva a respeito do tema, transcrevo extrato de texto do professor Gustavo Tepedino que conclui:

A despeito das teorias nominalmente adotadas pelos Tribunais brasileiros, prevalece amplamente a investigação do nexo causal necessário para a definição do dever de reparar. Em termos práticos, chegam a resultados substancialmente idênticos, na jurisprudência brasileira, os fautores da teoria da causalidade adequada e da teoria da interrupção do nexo causal, empenhados em identificar o liame de causalidade necessária entre uma causa remota ou imediata – desde que se trate de causa relativamente independente – e o resultado danoso.


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Notas

[1] José de Aguiar Dias, Da Responsabilidade Civil, p. 2.

[2] Sergio Cavalieri Filho, Programa de Responsabilidade Civil, p. 24.

[3] Caio Mário da Silva Pereira, Responsabilidade Civil, p. 263.

[4] “Artigo 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado”.

[5] O dever positivo representa “o próprio objeto da avença”, enquanto o dever negativo corresponde à “obrigação de não prejudicar”, não lesar terceiros, como ensina Sergio Cavalieri Filho, op.cit., p. 296.

[6] Silvio de Salvo Venosa, Direito Civil. Responsabilidade Civil, p. 21. Ver no mesmo sentido Caio Mário, op. cit., p. 265.

[7] Fernando Noronha, Desenvolvimentos Contemporâneos da Responsabilidade Civil, n. 761, p. 31-44, mar. 99, ensina que essa dualidade vem desde o século XIX. No entanto, o referido autor entende que seria “o mais correto designá-las de responsabilidade negocial e de responsabilidade civil em sentido estrito, ou geral”. (grifos no original). José Carlos Moreira Alves, A Responsabilidade Extracontratual e seu Fundamento – Culpa e Nexo de Causalidade, p. 1-22, também não concorda com a nomenclatura, “pois [a responsabilidade contratual] não se restringe apenas ao inadimplemento contratual”, abrangendo, ainda, o derivado de uma declaração unilateral de vontade. Sergio Cavalieri não concorda com a mudança na designação da responsabilidade contratual, uma vez que a mesma já está consolidada doutrinária e jurisprudencialmente (op. cit., p. 292). João de Matos Antunes Varela, Das obrigações em Geral, p. 351, também trata da divergência terminológica que grassa entre alguns doutrinadores a respeito da denominação da Responsabilidade Contratual, sendo certo que ele mesmo, apesar de não a considerar “inteiramente rigorosa, na medida em que ela nem sempre resulta da violação de um contrato”, ainda a aceita haja vista que sua aplicação já está há muito consagrada pelos tribunais e pela maioria da doutrina.

[8] Op. cit., p. 264.

[9] “Uma vez que o contrato traça a norma de conduta para os convenentes, incorre em culpa aquele que se desvia do pactuado: a norma convencional já define o comportamento dos contratantes que estão adstritos em sua observância a um dever específico”, Caio Mário, op. cit., p. 267.

[10] Saliente-se que mesmo na responsabilidade extracontratual fundada no risco existe, de qualquer modo, a violação a um dever jurídico, posto que ninguém pode ser responsabilizado sem a preexistência desse dever de conduta. No caso, o dever jurídico violado é o de segurança. Nos dizeres de Sergio Cavalieri, op. cit., p. 158: “há um direito subjetivo à segurança cuja violação justifica a obrigação de reparar o dano sem nenhum exame psíquico ou mental da conduta de seu autor”.

[11] Ibidem, p. 296.

[12] José de Aguiar Dias, op. cit., p. 126, deixa bem evidenciada essa diferença de deveres quando afirma que: “a primeira obrigação (contratual) tem origem na vontade comum das partes, ao passo que a obrigação que a substitui por efeito de inexecução, isto é, a obrigação de reparar o prejuízo, advém, muito ao contrário, contra a vontade do devedor: este não quis a obrigação nova, estabelecida com a inexecução da obrigação que contratuamente consentira”.

[13] Anteriormente ao Código Civil de 2002 (o caput do art. 736 dispõe que não se subordina às normas do contrato de transporte o feito gratuitamente, por amizade ou cortesia) , havia uma discussão a respeito de se saber se o transporte gratuito seria uma relação contratual ou não e, portanto, com repercussões na esfera da responsabilidade civil (contratual ou aquiliana). Saliente-se, contudo, que o novo Código Civil não entende gratuito o transporte quando, ainda que sem perceber remuneração, o transportador vier a auferir alguma vantagem indireta (§único do artigo 736). Nesse sentido, Sergio Cavalieri, op. cit., p. 333-338, entende que para se decidir se se trata de responsabilidade extracontratual ou contratual mister que se faça uma distinção entre transporte aparentemente gratuito e puramente gratuito de modo a avaliar se existe ou não em ambas as situações as características da comutatividade e onerosidade, essenciais ao contrato de transporte. Assim, para esse autor, na primeira modalidade existe um interesse patrimonial do transportador, ainda que indireto, vez que há uma contraprestação pelo serviço prestado, ainda que não seja, efetivamente, o pagamento direto do preço do transporte pelo transportado. Presente, portanto, aquelas características, haverá o contrato de transporte com a responsabilidade objetiva do transportador. Já no transporte puramente gratuito não há o dito contrato, posto que se trata de mera cortesia do transportador (ex. carona) e, muito menos, se configura um contrato benéfico, na medida em que não existe, de nenhuma das partes, intenção de emitir declaração de vontade vinculante. E já existe o dispositivo legal do artigo 736. Trata-se, então, de responsabilidade aquiliana. Nessa mesma linha ver Luiz Cláudio Silva, Responsabilidade Civil. Teoria e Prática das Ações, p. 40-42. José de Aguiar Dias discorda dessa corrente dominante de que quem presta o contrato puramente gratuito não pode ser acionado com base no contrato, posto que no seu entender nunca se chegou a demonstrar efetivamente a ausência do efetivo ânimo de obrigar-se no contrato gratuito. Além disso também discorda de que não haveria responsabilidade pela ausência de onerosidade, tomada esta pela dispensa no recebimento do preço, posto que o transportador não pode dispensar as responsabilidades que advêm do vínculo negocial firmado, vez que os acidentes constituem riscos inerentes ao transporte (álea). Para maiores detalhes sobre o tema ver op.cit., p. 144-159.. Para um panorama a respeito das divergências doutrinárias sobre o tema, ver Rui Stoco, Responsabilidade Civil e sua interpretação jurisprudencial, p. 141-143.

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[14] Saliente-se que Caio Mário, ainda que defendendo a tese da unicidade da culpa, sob o aspecto ontológico, aceita que há a distinção entre culpa extracontratual e contratual sob o aspecto do onus probandi, já que nesta última haverá a inversão desse ônus, tornando a posição do lesado mais vantajosa, posto que apenas terá que demonstar que houve o inadimplemento do avençado. Neste sentido, veja-se op. cit., p. 264-265.

[15] A responsabilidade contratual sempre estará fundada na culpa, entendida esta no seu sentido amplo, englobando tanto a intenção do devedor em não cumprir ou cumprir inadequadamente a obrigação, objetivando lesar o credor, quanto as situações onde agiu com negligência, imprudência ou imperícia, sendo certo que em qualquer dessas hipóteses o exame da existência da culpa será realizado caso a caso pelo juiz. Assim, em qualquer das situações é a conduta do agente que deverá ser avaliada, posto que a responsabilidade civil não tem mais o sentido de impor uma penalidade ao ofensor, mas, sim, ao seu patrimônio. Ressalve-se, apenas, que nos contratos unilaterais ou benéficos, o devedor responderá civilmente, pagando uma indenização tão somente se agiu com dolo (vide artigo 392 do Código Civil de 2002). Nos contratos ditos bilaterais basta a culpa.

[16] O contrato já traça os deveres de cada contratante (as normas de conduta, nos dizeres de Caio Mário, op.cit., p. 267), e, portanto, aquele que delas se afastar será tido como inadimplente e, para se eximir da responsabilidade, deverá provar que não fugiu ao pactuado ou que havia alguma excludente de responsabilidade, o que se verá mais à frente. Aqui mister ressalvar-se os casos de adimplemento substancial (substancial performance do Direito Inglês), onde restou inadimplida parcela ínfima do contrato que não justificaria um rompimento do vínculo contratual, mas que pode ensejar indenização proporcional à parte não cumprida de acordo com os danos sofridos, com base no princípio da boa-fé objetiva. Veremos este aspecto mais detalhadamente no item abaixo sobre a inexecução do contrato como pressuposto para a responsabilidade contratual.

[17] Assim, nas duas hipóteses de obrigações – de meio e de resultado – o ônus da prova para eximir-se de culpa é do devedor.

[18] Os artigos 402 e 403 nos trazem a noção do que sejam perdas e danos.

[19] Op. cit., p. 39.

[20] Op. cit., p. 491. Saliente-se que essa concepção unitária da responsabilidade civil é encontrada nas legislações mais modernas, que visualizam na falta de diligência quanto ao direito alheio o seu fundamento ordinário. Veja-se, para tanto, o Código Civil Português, em seu artigo 2393. Nessa mesma linha de pensamento, propugnando pelo estudo da responsabilidade civil de maneira unitária, ver Henri et Léon Mazeaud, Traité théorique et pratique de la responsabilité civile, délictuele et contractuelle, p. 111, para quem o fato das diferenças entre as duas modalidades de responsabilidade não serem fundamentais, posto que não visam aos seus princípios diretores, permite que ambas sejam agrupadas em um plano único.

[21] Op. cit., p. 53.

[22] Enéas Costa Garcia, Responsabilidade Pré e Pós-contratual à luz da boa-fé, p. 14. Ver nesse sentido Antônio Manuel da Rocha Menezes Cordeiro, Direitos das Obrigações, p. 436-437.

[23] Op. cit., p. 305.

[24] Ibidem, p. 306.

[25] Referido artigo dispõe que as partes são obrigadas a guardar os princípios da probidade e boa-fé (objetiva) apenas nas fases da conclusão e execução do contrato, nada mencionando sobre as fases pré e pós-contratual o que, nas palavras do professor Antônio Junqueira de Azevedo, demonstra a insuficiência de nosso Código (Antônio Junqueira de Azevedo, Direito dos Contratos. In: Seminário Novo Código Civil Brasileiro. O que muda na vida do cidadão, p. 75-83). Independentemente de estar expresso no Código Civil, tais princípios não só podem como devem ser aplicados a todas as fases do contrato (visto este como um processo, nos dizeres do próprio Antônio Junqueira), de modo a que o contrato consiga alcançar uma melhor justiça comutativa (ver Humberto Theodoro Júnior, O contrato e sua função social, p. 5). Ressalte-se que citado dispositivo guarda a função integrativa da boa-fé objetiva, na medida em que este princípio será usado para complementar a vontade das partes, sem modificá-la, posto que os deveres acessórios não pactuados expressamente devem ser observados em virtude dos usos e costumes adotados nos negócios desse tipo`, integrando-se às obrigações já convencionadas.

[26] Esses padrões não foram expressamente adotados no Código Civil de 2002. O artigo 422 funciona, assim, como uma cláusula geral que precisará ser “completada e definida casuisticamente pelo juiz”, conforme Humberto Theodoro Júnior, op. cit., p. 19, vez que existem “diferentes maneiras de a pessoa ser correta em determinadas situações”, como leciona Antônio Junqueira, op.cit., p. 78. Para esse jurista, essa ausência em nosso Código representa mais uma insuficiência, visto que não está claro se o legislador permite a aplicação de diferentes standards de comportamento, de acordo com o contrato a ser avençado pelas partes.

[27] Ibidem, p. 19.

[28] Ver Sergio Cavalieri, op. cit., p. 306, esclarecendo que “não se trata de instituto novo”.

[29] Op. cit., p. 18.

[30] Ver nesse sentido Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico. Existência, Validade e Eficácia, p. 74-116, no estudo comparativo das teorias da declaração/confiança (objetivas) e da vontade/responsabilidade (subjetivas). Sem adentrar as discussões a respeito das diferenças e qualificação de cada uma dessas teorias, apenas saliento, de acordo com aula ministrada pelo professor Antônio Junqueira de Azevedo, no curso de pós- graduação da Faculdade de Direito da USP, no 1º semestre de 2006, que as soluções apresentadas pelo Código Civil de 2002 tendem para a teoria da confiança calcada na ideia da prevalência da declaração sobre a vontade, mas que obriga o declarante a responder pelo ônus da confiança ou da justa expectativa que se criou ao declaratário no caso de rompimento das tratativas. Neste sentido, ver o artigo 138 do Código Civil que dispõe ser anulável o negócio quando a declaração de vontade emanar de erro substancial que poderia ser notado por pessoa de diligência normal, ante as circunstâncias do caso.

[31] Op. cit., p. 19.

[32] Enéas Costa ressalva que o termo negociações preliminares é usado de maneira indistinta, ora para conceituar a fase pré-contratual de maneira ampla, que compreende “todos os atos de negociação que antecedem a formação do contrato”, englobando aceitação, proposta e contraproposta, ora em um sentido mais restrito, compreendendo “apenas os atos preparatórios que se consubstanciam na proposta e na aceitação, excluindo estes últimos”(sic), onde aceitação e proposta têm um caráter de obrigatoriedade, portanto, gerando uma responsabilização clara e necessária caso haja o rompimento das negociações. De qualquer maneira, será na análise casual que o julgador poderá delimitar o nível de envolvimento das partes e, a partir daí, a prejudicialidade que a sua ruptura gerou ao contratante lesado e, consequentemente, a reparabilidade do pretenso dano. De qualquer modo, como já apresentado acima, será com base no princípio da boa-fé objetiva que se poderá avaliar, no caso concreto, qual deveria ter sido o comportamento dos contratantes ante o quadro que se apresentava a eles por época das tratativas e, desse modo, averiguar se houve efetivamente prejuízo decorrente da ruptura das negociações (entendendo-se estas em qualquer um dos termos acima) em grau a ser levado em consideração em uma demanda reparatória.

[33] Ibidem, p. 19.

[34] Pontes de Miranda, Tratado de Direito Civil, Vol. 4, p.90, esclarece que o interesse negativo “consiste no que teria sido a situação do indenizando se a manifestação de vontade do indenizante tivesse entrado no mundo jurídico tal como esperava o indenizando, ou tivesse entrado e tivesse sido válida, tendo-se cumprido, numa ou noutra espécie, as obrigações resultantes”. Assim, não se indenizaria se o que confiou pudesse, desde o início, reconhecer que se tratava de ato insuficiente ou deficiente. E mais à frente ele exemplifica com algumas hipóteses de interesse negativo, tais como “gastos para conclusão do contrato, ou para a prática do ato ao qual se referisse a promessa do indenizante; desembolsos devidos à crença em que o ato entrara no mundo jurídico, ou entrara e valia [salvo gastos efetuados na fase preliminar, de mera troca de minutas ou punctuações do ato], inclusive para formalidades registrárias ou quaisquer atos necessários à eficácia ou cumprimento, e os relativos a aquisições ou de posições que resultavam do ato em que se confiou, se justificados”. (p.90). E, de modo objetivo, esclarece que o interesse negativo “exclui positividades”, pois o que o indenizante deverá reparar é o que o indenizado perdeu em razão da confiança na “juridicidade ou juridicidade e validade do ato” e não aquilo que o indenizante “teria tido se o ato tivesse entrado no mundo jurídico” (p. 91).

[35]Assim, dependendo do tipo de obrigação e da forma de inadimplemento (absoluto ou relativo) poderá o lesado pleitear que a obrigação seja cumprida pelo lesante (compulsoriedade da obrigação pactuada), cumulando tal pedido ao de indenização por perdas e danos.

[36] O mesmo entendimento esposado na nota anterior serve para esta hipótese, isso porque não houve a reprodução do anterior artigo 1088 (Código Civil de 1916) que dispunha expressamente para essa situação a possibilidade da parte se arrepender antes da assinatura do contrato (que exigia a forma solene), indenizando a parte lesada, com base na mera responsabilidade aquiliana. O Código Civil de 1916 autorizava a não conclusão do contrato, mas mantinha o efeito vinculante da proposta.

[37] Esta posição é defendida por Enéas Costa, calcada na ideia de interesse positivo, trazida por Regis Fichtner Pereira, e com a qual concordo, na medida em que o interesse no cumprimento do contrato ou interesse positivo baseia-se no princípio da boa-fé objetiva (Regis Fichtner Pereira. A responsabilidade civil pré-contratual. Teoria Geral e responsabilidade pela ruptura das negociações contratuais. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, apud Enéas Costa Garcia, op. cit., p. 297).

[38] Enéas Costa Garcia, op. cit., p. 40.

[39] Os interesses negativos são aqueles assentados na idéia de confianca que as negociações pré-contratuais trazem às partes. Assim, na medida em que haja o rompimento dessas negociações não tendo ainda o contrato se formalizado, ou se formalizado invalidamente, a parte lesada não terá chances de ver o referido negócio concluído, portanto, há uma negativa de seus interesses. Já o interesse positivo representa a própria formalização do contrato. Portanto, rompimento muito às vésperas poderia ensejar danos a esse interesse e, dependendo da situação, ensejar o pleito de cumprimento/executoriedade do acordado entre as partes. Ver, nesse sentido, Enéas Costa, op. cit., p. 285-298.

[40] Ibidem, p. 70. Menezes Cordeiro prefere o termo pós-eficácia das obrigações.Ver Antônio Manuel da Rocha Menezes Cordeiro. Da pós-eficácia das obrigações. Lisboa: Associação Acadêmica da Faculdade de Direito de Lisboa, 1980, reimp. 1999, apud Enés Costa Garcia, op cit., p. 70, nota 270.

[41] Enéas Costa, op. cit., p. 71

[42] Para um estudo mais detalhado sobre o assunto, ver Antônio Manuel da Rocha Menezes Cordeiro. Da boa-fé no direito civil, p. 603-631, na qual o autor triparte os deveres acessórios, basicamente, entre os de proteção (relativos à não geração de danos mútuos), os de esclarecimento (ou informação) e os de lealdade (a não-adoção de atitudes que venham a frustrar o objetivo perseguido pelo contrato ou que diminuam as vantagens ou causem danos ao ex-parceiro), p. 628-629.

[43] Op.cit., p. 78.

[44] Caio Mário, op. cit. p. 266-267, traz interessante levantamento a respeito das diferenças doutrinárias no que tange à determinação de qual seria o fundamento da obrigatoriedade do contrato. Não obstante tais divergências, aponta o jurista que a unanimidade dos autores reconhece que o contrato devidamente formado (com observância do que o ordenamento jurídico dispõe como requisitos) é fonte formal de direito, impondo-se à vontade dos contraentes, e permitindo que qualquer das partes faça valer a força do pactuado mobilizando, se necessário, o poder cogente do Estado exercido através do Poder Judiciário, no caso de violação de suas cláusulas, implicando em responsabilização do inadimplente.

[45] Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico. Existência, Validade e Eficácia, p. 42.

[46] Apenas a título de referência, estudando o tema negócio jurídico, o professor Antônio Junqueira, op. cit. p. 42-43, faz uma distinção entre os seus elementos gerais intrínsecos ou constitutivos que correspondem à “declaração de vontade tresdobrada em objeto, forma e circunstâncias negociais”, e os elementos gerais extrínsecos representados pelo “a) o agente capaz e legitimado para o negócio; b) o tempo [se o ordenamento impuser tempo determinado]; e c) o lugar [lugar apropriado, de acordo com o ordenamento jurídico]”, classificação que serve de parâmetro para uma análise mais detalhada a respeito da validade do contrato, enquanto negócio jurídico, nos casos em que se deva apurar uma possível responsabilidade contratual de uma das partes.

[47] O professor Antônio Junqueira de Azevedo, Estudos e Pareceres de Direito Privado, p. 28-32, discorreu muito bem a respeito da diferença entre ato nulo e ato ilícito, evidenciando que a possível consequência para as situações em que o julgador se depara com o primeiro tipo de ato seria a de retorno ao status quo ante, para o quê deve ser examinada a equivalência objetiva entre prestação e contraprestação, de modo a manter um justo equilíbrio entre as partes. Não há que se falar em indenização, termo apropriado para as hipóteses de ocorrência de atos ilícitos (reprovados pelo ordenamento jurídico) em que a reparação do dano não configura a volta ao status quo ante, mas antes, um substituto à perda ocorrida.

[48] Op. cit., p. 297-298.

[49] O professor Antônio Junqueira, op. cit., p.49-54, ao tratar do plano da eficácia dos negócios jurídicos, tece comentários a respeito de duas situações excepcionais que bem demonstram a correta distinção que se deve fazer entre ato válido/ato eficaz e ato nulo/ato ineficaz. São elas a do ato nulo que produz efeitos (“efeitos do nulo”) e do ato válido ineficaz. Saliente-se que o professor Antônio Junqueira passou a preferir a denominação de relação contratual de fato para as situações em que o contrato originalmnete é nulo, mas veio a produzir efeitos. Nesse sentido, há para esse autor um sinalagma nessa relação e, portanto, deverá haver uma contraprestação (correspectivo), sob pena de enriquecimento sem causa da parte não prejudicada pela nulidade do contrato.

[50] Para esse autor, “A responsabilidade é pelo fato lícito, apenas se trata de dar solução eqüidosa à situação do réu da ação de anulação, que de modo nenhum teve culpa. Se nem autor nem réu teve culpa, a eqüidade impõe que sofra o prejuízo quem deu causa a ele”, p. 88, Tratado de Direito Civil, Tomo IV.

[51] Vide parágrafo único do artigo 395 do Código Civil. Neste dispositivo me parece ter o legislador cometido um equívoco conceitual, na medida em que mora implica em possibilidade de se ainda realizar a prestação por parte do devedor, já que a mesma ainda se mostra útil ao credor. Assim, entendo que o credor, ao declarar que a prestação não lhe tem mais utilidade em virtude da inexecução da obrigação por parte do devedor, está na verdade se referindo a um inadimplemento absoluto e não relativo (mora). Este pensamento é extraído da distinção feita pela doutrina entre inadimplemento absoluto e relativo que leva em consideração o aspecto da utilidade para o credor no cumprimento da obrigação, ainda que parcial, pelo devedor. Vide Silvio de Salvo Venosa, Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos, p. 242. Neste aspecto importante pensar-se na hipótese em que a prestação ainda se mostra útil ao credor, mas este não tem mais interesse em que a mesma lhe seja prestada. Seria possível que ele rejeitasse a prestação que ainda se mostrasse útil, apesar de não adimplida pelo devedor no tempo, lugar e/ou maneira pactuados? Refletindo-se sobre o tema, com fundamento em aula ministrada pelo Professor João Alberto Schutzer Del Nero, no curso de pós-graduação da Faculdade de Direito da USP, em 14 de junho de 2006, entendo que essa hipótese só poderia se configurar caso houvesse alguma ressalva ou determinação no contrato que permitisse o uso desse argumento (perda do interesse), calcada em alguma situação prevista e pactuada entre as partes. Caso contrário, o devedor poderia se valer de uma demanda consignatória para se desincumbir da sua obrigação, na medida em estar-se-ia configurada a mora do credor. De qualquer maneira, a situação deverá ser ponderada caso a caso, pois entendo que situações poderão vir a ocorrer em que, não obstante não terem as partes pactuado nada nesse sentido, em razão de algum motivo imprevisto (e imprevisível pelas partes à época) poderá o credor não ter mais interesse no cumprimento da prestação ainda útil. Nesta hipótese imprescindível que seja acuradamente analisada a motivação apresentada pelo credor, sob pena de se permitir que sua atitude macule o princípio da boa-fé objetiva.

[52] Esse é o ensinamento de José de Aguiar Dias, op. cit., p. 126: “Quando ocorre a inexecução, não é a obrigação contratual que movimenta o mundo da responsabilidade. O que se estabelece é uma obrigação nova que se substitui à obrigação preexistente no todo ou em parte: a obrigação de reparar o prejuízo consequente à inexecução da obrigação assumida”.

[53] O caput do artigo 393 do Código Civil de 2002 ressalva que o devedor poderá se responsabilizar nessas hipóteses desde que haja expressa determinação contratual a respeito (princípio da livre disposição), sendo que o parágrafo único trata da distinção entre caso fortuito e força maior que, na verdade, acaba sendo iníqua, na medida em que as consequências são as mesmas: a ausência de responsabilidade do devedor ante a ausência de cláusula contratual em sentido contrário. Ressalve-se apenas que, caso já esteja em mora quando da ocorrência do caso fortuito, o devedor responderá pelos danos.

[54] Silvio Venosa, Teoria das Obrigações e Teoria dos Contratos, p. 259, no entanto, entende ser inevitável falar-se, “ainda que à margem de nossa lei”, em culpa do credor, uma vez que ao se recusar a receber a prestação devida deverá repor patrimonialmente os prejuízos que vier a causar ao devedor. Como assevera o jurista, “sua culpa consiste na omissão das diligências necessárias para receber a prestação (...) simplesmente uma atitude passiva ou de negligência”.

[55] Teresa Negreiros, Teoria do Contrato.Novos Paradigmas, p. 145.

[56] Ver, neste sentido, Anelise Becker, A doutrina do adimplemento substancial no direito brasileiro e em perspectiva comparativista, p. 62.

[57] Ver neste sentido Anelise Becker, op. cit., p. 70.

[58] Judith Martins-Costa e Gerson Luiz Carlos Branco, Diretrizes Teóricas do Novo Código Civil Brasileiro, p. 216.

[59] RESp 272739/MG, 4a Turma, STJ, Relator Ministro Ruy Rosado de Aguiar Junior, j. 1.3.2001, v.u. não conheceram do recurso, Diário da Justiça de 02.04.2001, p. 299.

[60] PEREIRA, Regis Fichtner. A responsabilidade pré-contratual, teoria geral e responsabilidade pela ruptura das negociações contratuais. Tese de doutorado orientada pelo Professor Vicente Barreto. Rio de Janeiro: Faculdade de Direito da UERJ, ja. 2000, apud Teresa Negreiros, op. cit., p. 146.

[61] Saliente-se que referida cláusula distingue-se daquela limitativa em que a indenização não é eliminada, mas simplesmente diminuída por acordo entre as partes.

[62] Op. cit., p. 528. Nesse mesmo sentido, Antônio Junqueira de Azevedo, Estudos e Pareceres de Direito Privado, p. 201.

[63] Sergio Cavalieri traduz esse conceito como representando aquelas questões que “envolvem interesse indisponível, um interesse geral, ligado a valores de maior relevância, vinculado aos fins sociais e às exigências do bem comum” (Op. cit., p. 532).

[64] Ibidem, p. 530.

[65] Ibidem, p. 534.

[66]Estudos e Pareceres de Direito Privado, p. 201.

[67] Ver artigos 24, 25 e 51 do Código de Defesa do Consumidor.

[68] Vide o artigo 734 do Código Civil de 2002 que considera nula cláusula nesse sentido relacionada aos contratos de transporte de pessoas e o artigo 247 do Código Brasileiro da Aeronáutica que dispõe ser nula tal cláusula para os contratos de transporte aeronáutico. A Súmula 161 do Supremo Tribunal Federal, anterior ao Código Civil de 2002, já previa ser inoperante a cláusula de não indenizar no contrato de transporte, quer de pessoas, quer de bens.

[69] Op. cit., p. 96.

[70] Carlos Alberto Bittar, Responsabilidade Civil. Teoria & Prática, p. 17.

[71]  Silvio de Salvo Venosa, Responsabilidade Civil, op. cit., p. 198, acresce uma terceira modalidade a meio caminho entre o dano emergente e o lucro cessante. Trata-se da vulgarmente denominada perda da chance (perte d’une chance, do Direito Francês), melhor traduzida como perda de uma oportunidade, e que corresponde às hipóteses em que o ato ilícito retira do lesado a “oportunidade de obter uma situação futura melhor”, nos dizeres de Sergio Cavalieri, op. cit., p. 97-98. Assim, deve estar configurada uma oportunidade real e séria, uma probabilidade e não mera possibilidade de sua ocorrência, perdida em virtude do ato ilícito. O juiz deverá averiguar no caso concreto o grau de probabilidade daquela oportunidade se converter em certeza, ou seja, se a oportunidade perdida era provável ou possível de ocorrer. Ver, neste sentido, Caio Mário, op.cit., p. 47. De qualquer maneira, entendo que o correto é tomar-se a perda da chance como uma forma de cálculo da indenização e não como uma terceira espécie de dano, mesmo porque, os julgados que tratam do tema, por não haver disposição expressa a respeito dessa teoria em nosso ordenamento jurídico, acabam, ao conceder a indenização por lucros cessantes, utilizando-se de um juízo de probabilidade que, de uma maneira transversa, desemboca na avaliação da perda da oportunidade. Esse mecanismo é plenamente aplicável aos casos de responsabilidade civil contratual. Inclusive, saliente-se que no campo da responsabilidade contratual, ao contrário da substancial performance, a perda da oportunidade, uma vez aferida, permite a resolução do contrato pela parte lesada, cumulada com a indenização decorrente daquela perda. Veja-se, nesse sentido, julgado Ap. 0680655-1, 8ª Câmara, 1º TACSP, Rel. Costa Telles, j. 23.10.1996, v.u., onde o advogado foi condenado ao pagamento de um montante, a título de indenização, visto que o contrato de mandato não foi cumprido, na medida em que aquele tardou no ajuizamento da demanda para a qual fora contratado, gerando a perda da oportunidade do mandante ver seu pleito analisado pelo Poder Judiciário (dano negativo). Por esse julgado é possível entender-se que não se trata de uma terceira modalidade de indenização, mas, sim, de um meio usado pelo julgador para calcular o montante da indenização (pode-se dizer uma técnica de cálculo).

[72] Op. cit., p. 97.

[73] Ver Sergio Cavalieri, op. cit., p. 98.

[74] Ibidem, p. 303.

[75] Silvio de Salvo Venosa, Direito Civil. Responsabilidade Civil, p 205, ressalva que “danos não patrimoniais, que nem todos admitem como sinônimo de danos morais, são, portanto, aqueles cuja valoração não tem uma base de equivalência que caracteriza os danos patrimoniais” e, mais à frente, conceituando dano moral doutrina que o mesmo “não se caracteriza unicamente por um conceito de dor psíquica, mas por um desconforto comportamental na pessoa, que extrapola os limites do aceitável”.

[76] Sergio Cavalieri, op. cit., p. 106.

[77] Ibidem, p. 105-106.

[78] Aqui se pode lembrar da prática do overbooking  que corresponde à venda de passagens, através de reserva, por uma empresa de transporte aéreo, em quantidade superior à capacidade de suas aeronaves. Essa venda além da quantidade de assentos é justificada por essas empresas pelo simples motivo de que a legislação aeronáutica garante aos usuários que adquiriram passagens ou àqueles que tenham meras reservas confirmadas o direito de reaverem os preços pagos ou, então, de embarcarem em datas posteriores (reaproveitando os bilhetes). Por isso dizem que a simples venda do bilhete aéreo não significa renda auferida, posto que, dentro do prazo de 1 ano o passageiro tem assegurado o direito ao reaproveitamento do bilhete. O assento não ocupado em um transporte aéreo corresponde a um prejuízo concreto para a companhia aérea. Não obstante essa linha de defesa, muitas demandas reparatórias, ajuizadas com base no Código de Defesa do Consumidor, têm sido ganhas, apesar de não serem muitas as ações ajuizadas nesse sentido, comparativamente às situações de overbooking que ocorrem na prática. Contudo, o que se tem a salientar é que nessas hipóteses não há mais discussões sobre a possibilidade em se indenizar o dano extrapatrimonial (moral), mas, sim, sobre a exata medida em que o mesmo deve ser reparado. Julgados do Superior Tribunal de Justiça têm levado em consideração, para a estipulação do quantum indenizatório, o grau de zêlo no tratamento dispensado pelas empresas de transporte aéreo para com os passageiros atingidos pela prática do overbooking.

[79] O artigo 409 do Código Civil assim dispõe: “A cláusula penal estipulada conjuntamente com a obrigação, ou em ato posterior, pode referir-se à inexecução completa da obrigação, à de alguma cláusula especial ou simplesmente à mora”.

[80] Conforme caput do artigo 416 do Código Civil de 2002: “Para exigir a pena convencional, não é necessário que o credor alegue prejuízo”.

[81] Op. cit., p. 304. Nesse mesmo sentido ver Silvio Venosa, Teoria das Obrigações e Teoria dos Contratos, p. 173.

[82] Ver Silvio de Salvo Venosa, op. cit., p. 167.

[83] “Artigo 410. Quando se estipular a cláusula penal para o caso de total inadimplemento da obrigação, esta converter-se-á em alternativa a benefício do credor” (grifei). Sergio Cavalieri, op. cit., p. 304, afirma que esta disposição confere ao credor “a faculdade de optar entre o cumprimento da obrigação e a pena convencionada”. Entendo, contudo, que há um equívoco na interpretação, uma vez que ao se referir ao total inadimplemento o texto legal está a afirmar que não há mais viabilidade de cumprimento da obrigação por parte do devedor, na exata medida em que ao credor não existe mais utilidade naquele cumprimento (o critério da utilidade é que deverá ser levado em conta, como doutrina Silvio de Salvo Venosa, op. cit., p. 241). Assim, como se poderia dizer que há opção ao credor pelo adimplemento da obrigação, se para ele não há mais utilidade na sua execução? Há, na verdade, mera substitutividade da obrigação inadimplida (e que não o poderá mais ser) pela cláusula penal compensatória, não se podendo, na verdade, falar em cumulação desta com pedido paralelo de perdas e danos. O que costuma ocorrer na prática é o pleito de resolução (ou rescisão, como querem alguns) pela parte lesada, cumulado ao pedido do pagamento da multa compensatória.

[84] Op. cit., p. 168.

[85] Neste sentido ver Silvio Venosa, op. cit., p. 170. Ressalte-se o disposto no parágrafo único do artigo 416, como adiante explicitado.

[86] Ibidem, p. 171. Essa disposição, portanto, permite que, em certas situações e sob determinadas circunstâncias, haja a cumulação de multa com indenização, sendo de se ressalvar que o valor da multa nunca poderá superar o valor da obrigação principal, sob pena de caracterizar-se enriquecimento ilícito. Caso haja excesso, o juiz deverá (o Código, no artigo 413, é expresso nesse sentido) reduzir a multa. Essa disposição guarda conexão com o novo princípio social dos contratos que é o da boa-fé objetiva.

[87] Estudando sobre a questão da forma de se estabelecer parâmetros para o cálculo do valor da indenização por danos morais, Silvio Venosa, Responsabilidade Civil, p. 208-209, doutrina que “em princípio, a tarifação ou qualquer estudo matemático não é critério adequado para danos morais em geral, porque amordaça a distribuição da Justiça”. Os artigos 953 e 954 do Código Civil de 2002 permitem que o juiz, por eqüidade, decida o valor do montante do dano moral, quando o lesado não puder demonstrá-lo, o que denota a inviabilidade de tarifação quanto ao valor reparatório dessa modalidade de dano.

[88] É o que dispõe o artigo 411 do Código Civil de 2002: “Quando se estipular a cláusula penal para o caso de mora, ou em segurança especial de outra cláusula determinada, terá o credor o arbítrio de exigir a satisfação da pena cominada, juntamente com o desempenho da obrigação principal”.

[89] Em ambas as situações, somente do culpado exige-se a multa por inteiro. No caso da obrigação indivisível, os devedores não culpados poderão responder proporcionalmente, de acordo com sua quota, sendo certo que terão direito de regresso contra o devedor que deu causa (que for culpado, em sentido lato) à aplicação da pena.

[90]Responsabilidade Civil e Eticidade, p. 282.

[91] Ibidem, p. 281.

[92] Op. cit., p. 84.

[93] Gisela Sampaio da Cruz, O problema do Nexo Causal na Responsabilidade Civil, p. 27. Vide também Silvio de Salvo Venosa, Responsabilidade Civil, p. 39.

[94] Gisela  Sampaio da Cruz, op.cit., p. 261.

[95] Vide Othon de Azevedo Lopes, Responsabilidade Jurídica. Horizontes, Teoria e Linguagem, p. 307-310; Yussef Said Cahali, Responsabilidade Civil do Estado, p. 95.

[96] Idem, p. 283.

[97] Op. cit., p. 54.

[98] Gisela Sampaio da Cruz, op. cit., p. 58.

[99] Gisela Sampaio da Cruz, op. cit., p. 64.

[100] Op. cit., p. 73.

[101] O dano deve ser consequência necessária da inexecução. Assim, caso ocorra “alguma causa superveniente imputável a terceiro ou ao próprio credor, ou, ainda, decorrente de fato natural, interrompe-se o nexo causal e exonerado de responsabilidade ficará o autor da causa primeira”, como ensina Sergio Cavalieri Filho, op cit., p. 300. O aparecimento de outra causa apenas irá interromper o nexo causal.

[102] Ver Yussef Said Cahali, op. cit., p. 96, para quem “em nosso sistema jurídico, como resulta do disposto no art. 1060 do Código Civil [atual artigo 403], a teoria adotada quanto ao nexo de causalidade é a teoria do dano direto e imediato, também denominada teoria da interrupção do nexo causal”. O mesmo autor, citando Agostinho Alvim, Da Inexecução das Obrigações, 5ª ed., n. 226, p. 370, afirma que esta teoria “só admite o nexo de causalidade quando o dano é efeito necessário de uma causa, o que abarca o dano direto e imediato sempre e, por vezes, o dano indireto e remoto, quando, para a produção deste, não haja concausa sucessiva”, op. cit., p. 97. No Supremo Tribunal Federal “prevalece a teoria da causalidade direta ou imediata”, conforme ilustra o professor Gustavo Tepedino artigo seu entitulado Notas sobre o Nexo de Causalidade, publicadao na Revista Trimestral de Direito Civil, p.4-5.

[103] Op. cit., p. 90.

[104]“Art. 1223 Risarcimento del danno. Il risarcimento del danno per l'inadempimento o per il ritardo deve comprendere così la perdita subita dal creditore come il mancato guadagno, in quanto ne siano conseguenza immediata e diretta”. (tradução livre)

[105]R.D. 16 marzo 1942, n. 262 Approvazione del testo del Codice Civile. (Pubblicato nella edizione straordinaria della Gazzetta Ufficiale, n. 79 del 4 aprile 1942).

[106] Adriano De Cupis. Il danno: teoria generale della responsabilità civile. 2ª ed., vol. 1. Milano: Giffrè, 1966, apud Gisela Sampaio da Cruz, op.cit., p. 74.

[107] Ibidem, p. 77.

[108] Ibidem, nota 156, p. 85.

[109] E aqui, reiterando o acima exposto, concordo em parte com a maioria dos juristas que vêem no artigo 403 (antigo 1060) uma questão de causalidade, contudo, apenas superficial, haja vista que o ponto fulcral desse artigo, como já dito anteriormente, é o aspecto da limitação da indenização. De qualquer modo, não consigo localizar outro dispositivo que, de uma maneira direta ou transversa, indique que nas hipóteses de responsabilidade contratual o nexo de causalidade estabelece-se entre uma conduta do inadimplente e o dano daí advindo. Por isso, não obstante entender que o artigo 403 não tenha sido concebido para embasar qualquer teoria a respeito do nexo de causalidade, não deixo de observar que nesse dispositivo encontra-se fundamento a justificar tal elemento necessário à existência do dever secundário de reparabilidade.

[110] Este artigo baseou-se no artigo 1151 do Código Civil Francês de Napoleão o qual dispõe que os danos e interesses do credor devem compreender, relativamente à perda por ele provada e ao ganho do qual foi privado, aquilo que for conseqüência direta e imediata da inexecução do convencionado.

[111] Op. cit., p. 107, vide, em particular, nota 192, que menciona diversos autores nacionais.

[112] Criada por Tomaso Mosca que entende que se, numa complexidade de elementos naturais e voluntários, da qual decorre um evento danoso, existe um fato ilícito, este é juridicamente a causa daquele evento e os demais elementos meras condições. Havendo mais de um fato ilícito, deve-se considerar como causa relevante apenas o último.

[113] Essa escola visava às situações em que o devedor já se encontrava em mora e, nesse período, restava impossível o cumprimento da obrigação por caso fortuito ou força maior. Nesse caso, Coviello doutrinava que, afastando-se a conduta do agente ainda permanecia o dano, então rompido estaria o nexo de causalidade. O artigo 957 do Código Civil de 1916 continha dispositivo nese sentido, o qual foi reproduzido no artigo 399 do Código Civil de 2002.

[114] Esta escola “considera sinônimas e reforçativas as expressões dano direto e dano imediato, ambas identificadas com a ideia da necessariedade do liame entre causa e efeito”, nas palavras de Gustavo Tepedino, op.cit., citando Wilson Melo da Silva, Responsabilidade sem culpa, p. 131.

[115] Op. cit., p. 105-106.

[116] Ibidem, p. 122-150.

[117] Op. cit., p. 300.

[118] “Somente a valoração de todos e cada um dos aspectos que ofereça aquele que se encontra ‘sub judice’permitirá enfocá-lo com maior ou menor exatidão”, in Leonardo A. Colombo, Culpa Aquiliana, 2ª ed., Buenos Aires, 1947, n. 58, p. 162, apud Rui Stoco, op. cit., p. 59.

[119] Op.cit., p. 152-153.

Sobre a autora
Andréa Silva Rasga Ueda

Advogada desde 1994, com atuação por cerca de 12 anos em escritórios e 13 anos em corporações, com grande experiência no consultivo e contencioso civil, comercial, societário, M&A, operações de finanças estruturadas e de mercado de capitais, bem como em transações imobiliárias e questões envolvendo governança corporativa e compliance. De 2007 até hoje criei e gerenciei departamentos jurídicos de empresas nacionais e transnacionais. Forte experiência no regulatório de energia (de 2007 a 2012 e 2019 em diante), de mercado de capitais e de construção de torres para suporte às antenas de empresas de telecomunicações (desde 2013). Professora da Escola Superior da Advocacia (ESA-SP), entre 2001 e 2002, na matéria de Prática em Processo Civil, bem como assistente de professor na matéria Direito Privado I e II, na Faculdade de Direito da USP, durante o ano de 2006, e professora colunista no IBijus desde maio de 2019. Graduada (1993), Mestre em Direito Civil (2009) e Doutora em Direito Civil (2015) pela USP, e Especialização em Administração de Empresas pela FGV/SP (2011). Meu site é: deaalex.wordpress.com. CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/6450080476147839

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

UEDA, Andréa Silva Rasga. Responsabilidade contratual: a causalidade do dano (nexo de causalidade) é a mesma na responsabilidade contratual e na extracontratual?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3373, 25 set. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22673. Acesso em: 5 nov. 2024.

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