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A regra da preclusividade das decisões judiciais frente à situação anômala da revogação de liminares e da utilização do atípico pedido de reconsideração

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Agenda 04/11/2012 às 07:44

A revogação de ofício da ordem liminar e o pedido de reconsideração contrariam a regra da preclusão das questões já decididas pelo julgador?

Resumo: O presente trabalho se propõe a discorrer a respeito do fenômeno da preclusão dirigido ao Estado-juiz, com o foco na análise do fenômeno sob duas peculiares bases: a problemática da revogação de ofício da ordem liminar e a problemática da utilização do atípico pedido de reconsideração em contradição à determinação da preclusão das questões já decididas pelo julgador.

Palavras-chave: Preclusões de questões para o Estado-juiz. Revogação de liminares. Preclusão, tutela antecipada e tutela cautelar. Pedido de reconsideração.

Sumário: I. Introdução. II. Regra da preclusividade das decisões judiciais e a situação anômala de revogação das liminares: tutela antecipada de mérito e tutela cautelar. III. Preclusão das questões para o Estado-juiz e a possibilidade de excepcional utilização do atípico pedido de reconsideração. IV. Conclusão. Referências doutrinárias.


I – INTRODUÇÃO

Avançando nos estudos do processo civil e do instituto da preclusão, chega-se a oportunidade de investigarmos as preclusões dos atos para o Estado-juiz no âmbito das temáticas (a) da revogação da ordem liminar, de antecipação do mérito ou cautelar, e (b) da utilização razoável do pedido de reconsideração no atual ordenamento processual pátrio[1].

A preclusão deve ser compreendida como um instituto que envolve a impossibilidade, por regra, de, a partir de determinado momento, serem suscitadas matérias no processo, tanto pelas partes como pelo próprio juiz, visando-se precipuamente à aceleração e à simplificação do procedimento. Integra sempre o objeto da preclusão, portanto, um ônus processual das partes ou um poder do juiz; ou seja, a preclusão é um fenômeno que se relaciona com as decisões judiciais (tanto interlocutória como final) e as faculdades conferidas às partes com prazo definido de exercício, atuando nos limites do processo em que se verificou.

A preclusão é, pois, instituto complexo que se manifesta em diversas vertentes, seja para as partes seja para o Estado-juiz. Pode-se melhor desenvolver essa assertiva reconhecendo que, pelo menos, em cinco momentos típicos é destacada a participação da técnica: a) preclusão para a parte referente ao ato de recorrer de sentença; b) preclusão para a parte referente ao ato de recorrer de decisão interlocutória de maior gravidade; c) preclusão para a parte referente ao ato de recorrer de decisão de menor gravidade; d) preclusão para a parte referente aos atos para o desenvolvimento do procedimento; e) preclusões para o Estado-juiz.

Em relação à preclusão atuante sobre o Estado-juiz, vige a regra, prevista no art. 471 e também no art. 463, de que não pode o magistrado decidir novamente as questões já decididas no processo; cabendo, pois, nesse momento, investigarmos se não contraria indevidamente essa atuação tradicional e justificada do instituto, a revogação oficiosa de uma ordem liminar e a reconsideração de um despacho em razão de pedido da parte desprovido de formalidades previstas no Código Processual.


II – REGRA DA PRECLUSIVIDADE DAS DECISÕES JUDICIAIS E A SITUAÇÃO ANÔMALA DAS LIMINARES: TUTELA ANTECIPADA DE MÉRITO E TUTELA CAUTELAR

A noticiada regra da preclusividade das decisões judiciais vale para a hipótese de revogação da tutela antecipada, mas com algumas peculiaridades (situação anômala das liminares).

Uma vez concedida a medida liminar, em face de pedido fundamentado da parte suplicante, e não existindo interposição de recurso tempestivo, parece-nos que o magistrado está impedido de revisitar o tema, sem que haja alteração fática e/ou probatória nos autos – mesmo que passe a entender nesse momento de maneira diversa do anterior entendimento firmado sobre a presença dos requisitos autorizadores da tutela de urgência.[2]

Agora, avançando um pouco mais na problemática, poder-se-ia perquerir se nos casos de efetiva alteração fática e/ou probatória nos autos, após melhor instrução do feito, poderia o magistrado vir a, de ofício, revisitar o tema, passando a imediatamente revogar ordem liminar antes concedida; ou se seria necessário o pedido da parte prejudicada para que nova decisão fosse tomada.[3]

Temos que merece maior consideração a segunda corrente, embora haja ressalvas mais contundentes no que toca especialmente à liminar cautelar.

A teoria encampada pela primeira corrente de que pode haver revogação ex officio da antecipação de tutela em benefício do réu, diante de modificação de situação fática/probatória, foi assumida, por maioria, pelo STJ, no REsp n° 193.298/MS.[4] A favor da tese capitaneada pelo Min. Teori Zavascki,[5] colocaram-se os Min. Ari Pargendler, Menezes Direito e Nancy Andrighi; restando como votos vencidos, que mantinham o entendimento da origem, os dos Min. Waldemar Zveiter e Pádua Ribeiro.

Interessante que o relator vencido Min. Waldemar Zveiter, no corpo do voto, indica o que seria a correta exegese do art. 273, § 4°, do CPC, mas sugere que para o caso de cautelares a solução seria outra, podendo o julgador, daí sim, revogar a liminar de ofício. No nosso sentir, não parece precisa a posição do relator nesse item: o art. 805 do CPC permite a substituição da liminar de ofício por medida menos gravosa, mas não há referência expressa no art. 807 do CPC sobre o poder de, independente de postulado pela parte interessada, vir o magistrado a revogar ou modificar a liminar, razão pela qual nos parece realmente que o mesmo raciocínio desenvolvido para a tutela antecipada aqui deve prevalecer, no sentido da vedação da revogação ex officio. Em consonância com a tese aqui encampada, Humberto Theodoro Jr. explica que surgidas as medidas liminares, gera situação jurídica definida e estável para as partes, de modo que “podem ser revogadas ou modificadas, não ex officio, mas com obediência ao procedimento cautelar comum, cabendo a quem sofreu a medida alegar e provas que as coisas e as circunstâncias mudaram”.[6]

Estabelece-se assim uma identidade entre o que dispõem os arts. 273, § 4° (tutela antecipada), e o 807 (tutela cautelar), ambos do CPC, tendo os mesmos, inclusive, semelhante redação. Esse também é o posicionamento adotado por Teresa Arruda Alvim Wambier, a qual sustenta que somente no excepcional caso de mandado de segurança, poder-se-ia cogitar de revogação de ofício da liminar concedida[7] – hipótese essa, devemos observar, que muito dificilmente iria realmente se suceder, especialmente em razão da brevidade do rito no mandado de segurança (em que não há espaço para a instrução processual), razão pela qual entendemos que a liminar concedida inicialmente na segurança deveria novamente ser analisada tão somente no momento da prolação da sentença, quando em sede de cognição exauriente a medida inaudita altera pars poderia ser ratificada ou retificada.

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Temos que reconhecer, de qualquer forma, que a polêmica quanto à possibilidade de revogação de ofício da liminar é mais intensa ao se debater o tema em sede cautelar, especialmente tendo em conta o condensado poder geral de cautela, referido no art. 797 do CPC, a autorizar, segundo alguns juristas (como Galeno Lacerda e João Batista Lopes[8]), que pudesse o julgador excepcionalmente conceder a tutela de urgência mesmo sem requerimento expresso da parte demandante. Levando em consideração essa premissa, se poderia o juiz conceder de ofício a liminar cautelar, bem poderia revogá-la da mesma forma, sem requerimento expresso da parte demandada. Ademais, é corrente o raciocínio de que a partir do momento em que a cautela se mostra indevida, não se poderia tolerar que a mesma, diante de sua natural temporariedade e instabilidade, possa continuar produzindo os efeitos e assumindo feição de antitutela, ainda que se trate de interesses disponíveis.[9]

Daí concluir Daniel Amorim Assumpção Neves, ao tratar da revogação (de ofício) da tutela de urgência em sede cautelar, que o juiz tem “maior liberdade no que tange a essa espécie peculiar de tutela, principalmente quando é concedida em sede liminar”; no entanto, em relação à sorte da tutela antecipada prevista no art. 273, § 4°, bem como no art. 461, § 3°, reconhece o autor que uma nova situação fática abre na verdade possibilidade para uma nova decisão, que somente poderia ocorrer por provocação da parte interessada e não seria propriamente uma revogação da anterior (liminar), mas se tiver conteúdo em sentido contrário, por certo faria com que a mesma perdesse seu objeto.[10]

Na mesma direção parece caminhar Elpídio Donizetti, ao passo que registra autorizar o art. 273, caput, do CPC, tão somente que a tutela antecipada seja pleiteada pela parte, não aludindo, concluímos, a respeito da possibilidade oficiosa da medida. Na verdade, salienta o jurista nominado, o dispositivo infraconstitucional fala em “parte” e não em “autor” (de qualquer forma, nunca em “Estado-juiz”): “assim, nas ações dúplices, nas processadas sob o rito sumário, bem como nos procedimentos que admitem reconvenção, pode o réu pleitear a tutela antecipada; também o opoente, o denunciado e o autor da ação declaratória incidental podem postular tutela antecipada”.[11]

Menos dúvidas há, portanto, quanto à impossibilidade de (concessão e consequentemente de) revogação ex officio determinada pelo juiz em sede de tutela antecipada (art. 273, § 4°, e art. 461, § 3°, ambos do CPC), onde inclusive não haveria espaço para a concessão de liminar de ofício, em face da aplicação inconteste do princípio dispositivo em sentido material ou próprio – a impedir que o julgador, em manifesta quebra de sua imparcialidade, antecipe o mérito sem pedido do autor e sem participação ativa do réu, ainda não angularizada a relação jurídica processual.[12]

Sob outro aspecto, ainda há de se privilegiar a tese mais conservadora, ora acolhida (inclusive, persistimos entendendo, para a revogação de liminar em sede cautelar): é que, como bem explica Marinoni, trazendo à baila lição de Ovídio Baptista, a antecipação de tutela, pode, em casos excepcionais, ser mantida ainda que o juiz se incline mais favoravelmente à tese da inexistência do direito afirmado, quando a revogação prematura do provimento liminar, ou mesmo da medida cautelar, representa prejuízo irremediável à parte que vem sendo favorecida e que merece consideração no caso concreto.[13]

Pensemos em um exemplo, em que se cogite de utilização do art. 273, § 4°, do CPC: tutela de urgência concedida a segurado para que permaneça em benefício (de caráter alimentar) junto ao órgão previdenciário, em face do conjunto documental-médico que autoriza se concluir pela sua incapacidade laborativa; mesmo vindo laudo oficial que coloque em dúvidas (ou até mesmo negue) a incapacidade, pode o julgador, atentando-se para as peculiaridades do caso concreto, ainda mais em não havendo pedido de revogação da liminar pela parte ré (INSS), vir a manter a ordem liminar até o encerramento da instrução, voltando a enfrentar o tema, de maneira daí exauriente, em sentença (até porque pode ao final, e não raro acontece, vir a ser relativizado o teor do laudo oficial, diante dos demais elementos de prova coligidos aos autos, antes e depois da realização da perícia oficial, conforme autoriza o art. 436 do CPC).[14]

De qualquer maneira, lembrando a teoria de Denti a respeito do contraditório prévio indispensável (mesmo em matérias reconhecíveis de ofício[15]), tem-se que uma adequada e precavida tomada de posição pelo diretor do processo, no sentido de intimar as partes antes de qualquer decisão para que se manifestem sobre a sorte da liminar em face do novo quadro (fático e/ou probatório) que supostamente estaria formado, evitaria maiores problemas – sobressaindo-se daí mais um fundamento para se repudiar a revogação açodada, de ofício, de uma ordem liminar.

Vê-se, aliás, que mesmo quem defende a posição de ser possível a revogação de ofício da ordem liminar, como Alcides Munhoz da Cunha, deixa expressamente consignado que “o progredir do contraditório pode ensejar uma avaliação mais madura sobre o fumus e o periculum”.[16] Nesse sentido, entendemos que após a intimação sugerida supra, não tendo a parte ré desenvolvido suas alegações no sentido de ser cassada imediatamente a liminar, notadamente sustentando tal pleito nos termos do debatido art. 273, § 4°, ou do art. 461, § 3°, ambos do CPC, deve o magistrado manter a medida provisória de urgência até ulterior momento de proferir sentença.


III. PRECLUSÃO DAS QUESTÕES PARA O ESTADO-JUIZ E A POSSIBILIDADE DE EXCEPCIONAL UTILIZAÇÃO DO ATÍPICO PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO

Já tendo sido tratado o primeiro aspecto mais denso em relação a eventual flexibilização da regra da preclusividade das questões para o órgão judicante, em razão da presença de tutela antecipada de mérito ou mesmo de tutela cautelar, passemos para as observações a serem lançadas no campo do denominado “pedido de reconsideração”.

Limitando-nos a debater a problemática da reconsideração de uma decisão judicial impulsionada por um pedido da parte (dita prejudicada), pensamos primeiramente que milita a favor da inviabilidade deste “pedido de reconsideração” o princípio da taxatividade recursal (que não admite a criação de qualquer espécie de recurso se a mesma não foi desenvolvida por força de lei federal), e a vedação da utilização de sucedâneos recursais (pregador da exclusiva utilização do recurso próprio, previsto em lei, para atacar o ato judicial).[17]

Há de se ter presente que o recurso típico previsto para desafiar uma decisão interlocutória (o agravo de instrumento, quando não seja o caso de agravo retido) prevê a possibilidade de retratação do julgador (art. 529 do CPC), daí por que é necessário comunicar a origem do manejo da irresignação à instância superior (art. 526 do CPC) – sendo certo que se inexistisse essa oportunidade de retratação prevista em lei, não se discutiria sobre a viabilidade de interposição de mero pedido de reconsideração, ao passo que o juiz estaria impedido de alterar a sua decisão, mesmo que mantivesse a função jurisdicional em direção à prolação de decisão final.[18]

Ainda falando em oportunidades tipificadas pelo ordenamento processual para a hipótese de decisão interlocutória gravosa, há possibilidade de a parte, em tese, poder optar pelos embargos de declaração, com efeitos infringentes, desde que atendidos os requisitos legais contemplados no art. 535 do CPC[19] – os quais, de acordo com a posição firme do Superior Tribunal de Justiça, têm a importância prática de, além de viabilizar a reconsideração pelo julgador, vir a interromper o prazo para a interposição de outros recursos, por qualquer das partes, conforme determina o art. 538 CPC.[20]

Nessa seara, a importância dos embargos ganha dimensão especial também porque caberia o recurso em comento contra toda decisão gravosa, inclusive a interlocutória, monocrática ou proferida por um Colegiado.[21] Além disso, conforme melhor orientação pretoriana, seria possível a apresentação dos aclaratórios não só diante das hipóteses restritivas constantes no art. 535 do CPC (obscuridade, contradição ou omissão), mas também em situação de equívoco evidente do julgador (onde estaria abarcado o erro material[22]) e até em casos de erro de fato[23] (questão material) ou erro de procedimento[24] (questão processual) facilmente verificáveis.

No entanto, fazendo o procurador da parte a opção pelo “pedido de reconsideração”, e não pelo agravo de instrumento ou retido ou até pelos embargos de declaração (repise-se: recursos previstos na legislação processual para desafiar decisão incidental gravosa à parte), pensamos que poderia ser apreciada pelo julgador a irresignação desde que apresentado o pedido dentro do limite do prazo do recurso tipificado em lei e desde que pudesse aquele fazer as vias deste – mantendo o prolator da decisão gravosa a função jurisdicional, e não estando excluída pelo ordenamento a possibilidade de reexame por ele.

Se “é fato corriqueiro no meio forense, a utilização do instituto da reconsideração de maneira indiscriminada, apesar de inexistir previsão no nosso código de ritos sobre o assunto”,[25] na nossa concepção, como posto em destaque acima, não seria, pois, em qualquer ocasião, admitido o pedido de reconsideração.

Visando a parte autora a ver rapidamente suprido um mau encaminhamento pelo julgador em sede de decisão interlocutória, é comum na prática forense a apresentação de pedido de reconsideração, e não de recurso típico devido – em geral o agravo de instrumento, com todas as suas formalidades (inclusive preparo) a ser julgado por órgão jurisdicional diverso. Daí, entendemos, possa criteriosamente se dar vazão a esse espontâneo encaminhamento processual, figurando-se a questão temporal de substancial relevo, já que pedido fora do âmbito temporal dos recursos não poderia ser acolhido sob qualquer circunstância, em face do fenômeno preclusivo.

Nesse sentir, não se optando pelos recursos previstos no sistema processual, aconselhável então a apresentação do pedido de reconsideração dentro do prazo legal do recurso típico mais exíguo, qual seja, os embargos de declaração, a fim de que, sem maiores discussões, seja suprida a exigência formal e consequentemente possa ser reapreciada a matéria pelo magistrado – o qual, mesmo admitindo a teoria da fungibilidade recursal, poderia supostamente, ao analisar o pedido de reconsideração, alegar que o caso seria de interposição de declaratórios com efeitos infringentes (prazo de cinco dias), e não de agravo de instrumento (prazo de dez dias), cogitando-se da intempestividade do pedido apresentado em prazo superior a cinco dias da publicação oficial da decisão interlocutória gravosa.

A partir de tais ponderações, temos como exagerado o posicionamento de que o pedido de reconsideração, independentemente do momento temporal em que apresentado, não deveria ser apreciado pelo juiz, como sustentam, dentre outros, Antônio Vital Ramos de Vasconcelos[26] e João Batista Lopes.[27] Ora, desse modo estar-se-ia privilegiando o (tão combatido) formalismo exacerbado indiferente às finalidades a que se propõe o atípico pedido[28], embora importante ser ressaltado que essa medida não suspende e nem interrompe o prazo para interposição de outros recursos típicos.[29]

Mesmo assim, devemos ressalvar, não é de todo incoerente a posição doutrinária contrária ao nosso pensar, já que são inúmeros os recursos típicos previstos no ordenamento processual e o acolhimento de mais esse instrumento estaria, a princípio, na contramão da contemporânea exigência de um procedimento mais claro, simplificado, célere e eficiente.[30] Por outro lado, em nossa defesa, poder-se-ia muito bem ser alegado que o pedido de reconsideração seria utilizado para viabilizar ao julgador justamente uma resposta mais rápida e definitiva sobre o caso, já que não mais teria a parte o direito de buscar outra via recursal para modificação da matéria incidental resolvida, e por isso seria utilizado por ela nos casos em que entende ser flagrante a viabilidade de o mesmo magistrado retificar seu anterior posicionamento. [31]

Ou seja: se já está abrindo mão o causídico de utilização dos meios recursais típicos para continuar a discussão quanto ao incidente nas superiores instâncias, por qual razão então o magistrado simplesmente deveria se negar a avaliar o pedido de reconsideração, suficientemente fundamentado, e sumariamente desenvolver as razões jurídicas pelas quais ratifica ou retifica a decisão gravosa? Embora tenhamos reconhecido estar em aberto a discussão (com argumentos defensáveis em ambas as direções), realmente ainda não nos convence plenamente, no ponto, uma visão exageradamente formalista, limitadora de uma mais completa/satisfatória tutela jurisdicional, que impeça a utilização comedida do instrumento anômalo – se bem que por segurança deva realmente ser evitado pelos operadores do direito e do processo até que melhor solução legislativa (que o contemple) seja anunciada.

E há, de fato, razões para se acreditar que haja maiores alterações nesse cenário. Recentemente, com a publicação da Lei n° 11.187/2005, alterando o teor do art. 527 do CPC, passou-se a admitir expressamente a figura do “pedido de reconsideração”, ao menos em duas oportunidades: quando, em decisão monocrática do Desembargador Relator, o agravo de instrumento é convertido em agravo retido (inciso II), e quando é a ele negado efeito suspensivo (inciso III) – hipóteses em que não mais se cabe utilizar o agravo interno (art. 527, parágrafo único).[32]

Mas, levando em conta os fundamentos contrários à utilização do pedido de reconsideração, acreditamos que na hipótese de ser manejado totalmente fora do prazo previsto para o recurso típico, e ainda tivesse caráter manifestamente protelatório, poderia sim, como sustenta José Rogério Cruz e Tucci, representar “comportamento dilatório” inapropriado, com a viabilidade de o julgador, mantendo a decisão atacada, vir ainda a condenar a parte irresignada com a penalidade de litigância de má-fé.[33]

Já em se tratando de matérias de ordem pública enfrentadas em decisão judicial, não há qualquer discussão quanto à viabilidade do pedido de reconsideração. É que nesse caso se sabe que para as partes pode ocorrer a preclusão do direito de recorrer (levando a sua irresignação para a instância recursal prevista na legislação de regência), mas não a preclusão de um direito de requerer, mesmo em tempo posterior ao prazo para interposição do recurso típico, a reconsideração da posição do magistrado que proferiu a decisão gravosa e que ainda conserva a função jurisdicional, pois é claro que ato determinável de ofício pode também ser determinado a requerimento da parte.[34]

De qualquer forma, retomando o ponto controvertido, entendemos que não é exato, como defendem Flávia Moreira Guimarães Pessoa,[35] Rogério Donnini,[36] e Maurício Giannico,[37] concluir-se que só se deve falar em pedido de reconsideração diante de hipóteses não preclusivas ao juiz, envolvendo matéria de ordem pública. É que, como trabalhado com esmero, mantemos a convicção de que, mesmo em hipóteses de decisão interlocutória que não trate de matéria de ordem pública, poderia a parte se valer do instrumento atípico, obedecendo-se aos óbices previstos pelo fenômeno preclusivo e assumindo a parte insurgente o risco de se valer de medida atípica.

Por fim, importante o registro de que sendo levado em consideração pelo julgador o pedido de reconsideração (seja em matéria de ordem pública, seja em matéria de natureza ordinária), conveniente, em nome do prestigiado direito ao contraditório, que se ouça a parte contrária a respeito de ato do juiz que possa vir a ser retificado, e que, em consequência, possa trazer prejuízo ou colocar a parte adversa em novel situação desfavorável no processo. [38]

Sobre o autor
Fernando Rubin

Advogado do Escritório de Direito Social, Bacharel em Direito pela UFRGS, com a distinção da Láurea Acadêmica. Mestre em processo civil pela UFRGS. Professor da Graduação e Pós-graduação do Centro Universitário Ritter dos Reis – UNIRITTER, Laureate International Universities. Professor Pesquisador do Centro de Estudos Trabalhistas do Rio Grande do Sul – CETRA/Imed. Professor colaborador da Escola Superior da Advocacia – ESA/RS. Instrutor Lex Magister São Paulo. Professor convidado de cursos de Pós graduação latu sensu. Articulista de revistas especializadas em processo civil, previdenciário e trabalhista. Parecerista.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RUBIN, Fernando. A regra da preclusividade das decisões judiciais frente à situação anômala da revogação de liminares e da utilização do atípico pedido de reconsideração. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3413, 4 nov. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22938. Acesso em: 22 nov. 2024.

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