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A atuação da AGU na defesa das políticas públicas de Estado.

Notas descritivas sobre o PAC e sobre a Usina Hidrelétrica de Belo Monte

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Agenda 08/11/2012 às 13:10

4.  Breves conclusões sobre a AGU e sua atuação postulatória

A abertura democrática promovida pós 1988 aliada à proteção e ao amparo de uma sociedade plural estimularam o lado contestador das instituições públicas e organismos sociais que se encontrava de certa forma em estado de latência em razão de quase vinte anos de regime ditatorial[33].

A judicialização da política ou a politização do direito, a depender do ângulo que se olhe para o fenômeno, é fator dominante nos embates sociedade versus Estado. Não se está aqui mensurando qualitativamente o acerto ou desacerto dessa tendência, mas apenas constatando um movimento “pós redemocratização” que se fortalece a cada dia com base tanto no preceito constitucional da inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXV, CF/88) quanto na busca por um ambiente isento para o travamento das discussões acerca dos caminhos adotados por determinado governo[34].

Nesse cenário, como destaca Costa (2011, p. 466), o STF, reconhecendo a alteração do perfil do Judiciário, e desempenhando seu papel na definição das questões políticas que lhe são submetidas, tem a percepção de que aquela Corte deve julgar com prudência[35], pois a atuação política desse Poder é excepcional, não devendo, portanto, substituir-se às atividades do Executivo e do Legislativo. E essa prudência encontra esteio tanto na utilização dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, quanto na sensibilidade às limitações de ordem orçamentária.

Foi sob a ótica da atuação postulatória (de contencioso judicial) que este artigo se focou. E o caso Belo Monte foi escolhido por ser emblemático na demonstração do amplo debate judicial que é travado pelos atores sociais, participantes ativos da dialética própria à formação das políticas públicas. Duas instituições que integram as Funções Essenciais à Justiça, o Ministério Público, promovendo uma advocatura em defesa da sociedade – e nas palavras de Ferraresi (2011, p. 494) “cobrando dos órgãos governamentais a implantação de direitos garantidos pela Carta Constitucional de 1988” –, e a Advocacia-Geral da União, promovendo uma advocatura em defesa do Estado, protagonizam uma verdadeira batalha no judiciário: um tentando suspender o empreendimento, o outro tentando promover o seu prosseguimento.

Há poucos anos a intensidade desse embate seria algo inimaginável, pois era o Ministério Público Federal que exercia ambas as competências (representação judicial da sociedade e da União). Ademais, vivia-se em um ambiente de baixíssima abertura democrática e de pouquíssimo respeito à pluralidade de ideias que sempre existiu no meio social, no qual não havia lugar apto a um embate ideológico profícuo, mesmo porque a ideologia preponderante era a imposta pela força.

No cenário acima descrito a Advocacia-Geral da União não tinha razão de existir, já que sua conformação é própria de um Estado Democrático de Direito[36], onde o primeiro a respeitar as leis e garantir a higidez de um amplo debate público é o Estado, guiado por um governo legitimamente sufragado pelo povo que integra a sociedade.

Há, portanto, nesse contexto, a necessidade de uma convivência institucional entre o Ministério Público e a Advocacia-Geral da União que reflita uma paridade de armas e uma equivalência de estatura e respeitabilidade constitucional (especialmente no tocante às prerrogativas institucionais das carreiras), de modo a que todos os participantes do debate tenham voz e possam com a mesma eficiência defender seus pontos de vista.

Acaso não existisse a Advocacia-Geral da União a defender a higidez jurídica da escolha política realizada pelo governo, Belo Monte não teria resistido sequer ao primeiro embate judicial, já que em todas as Ações Civis Públicas ajuizadas pelo MPF houve a concessão de medidas liminares no sentido de obstaculizar o andamento do projeto de construção da hidrelétrica. E contra todas as medidas liminares foram opostas as ferramentas processuais aptas a superar as decisões sumárias de primeiro grau, a saber: agravos de instrumento (AI) e pedidos de suspensão de liminares e tutelas antecipadas (SLAT).

A partir de um único empreendimento do PAC, a Usina Hidrelétrica de Belo Monte, surgiram cerca de 70 (setenta) feitos judiciais entre Ações Civis Públicas, ações cautelares, ações populares, ações possessórias, recursos de apelação, recursos de agravo de instrumento, suspensões de liminares e tutelas antecipadas e conflitos negativos de competência. Tudo isso para, em resumo, discutir uma das ações pinçadas pelo governo como necessárias à consecução de uma dada política pública, a que tem como foco o desenvolvimento do potencial de produção energética do país a partir da matriz predominantemente hidrelétrica.

Os números de Belo Monte, que não constituem uma estatística passada e acabada, mas uma estatística presente (prospectiva) e em formação, demonstram que a atuação da AGU tem sido fundamental para o prosseguimento da referida política pública.

Destarte, tem-se que a AGU, inserida no modelo de Estado adotado pela nova ordem Constitucional de 1988, detém papel de relevo no auxílio à viabilização das políticas públicas estatais, pois garante, além da orientação legal prévia necessária à conformação jurídica de todo e qualquer ato administrativo da União, mesmo que desafiada judicialmente a decisão administrativa, esta possa ser defendida em seus contornos legais e constitucionais, preservando-se o mérito da escolha governamental, já que muitas são as opções políticas que se podem extrair de uma dada moldura normativa sem que isso implique em violação ou inobservância das fronteiras legais e constitucionais impostas pelo Ordenamento Jurídico, mas, ao contrário, respeitem o interesse público fixado normativamente.


5. Referências:

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______. 9ª Vara Federal da SJ/PA, Ação Civil Pública n. 0028944-98.2011.4.01.3900.

______. 9ª Vara Federal da SJ/PA, Ação Civil Pública n. 0001618-57.2011.4.01.3903.

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Notas

[1]   A Advocacia-Geral da União – AGU encontra previsão constitucional no artigo 131 da Constituição Federal de 1988, que assim dispõe: “A Advocacia-Geral da União é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo.”

[2]   Embora este seja um tema polêmico, entendo que quatro são as carreiras que integram a Advocacia-Geral da União, a saber: a) Diretamente: as carreiras de Advogado da União e de Procurador da Fazenda Nacional, que representam, dentro de suas competências, a União sob a ótica da Administração Direta; e b) Órgãos vinculados: as carreiras de Procurador Federal e Procurador do Banco Central, que representam, dentro de suas competências, a União sob a ótica da Administração Indireta (autarquias e fundações públicas federais). Todavia, essa distinção (órgão vinculado ou não) não tem mais razão de ser, pois inexiste qualquer diferenciação ontológica entre as competências e atribuições de cada uma das referidas carreiras, sendo, todas, dignas da mesma respeitabilidade institucional.

[3] Nesse sentido, no intuito de conferir especialidade aos seus órgãos de execução, a Procuradoria-Geral Federal editou a Portaria 420/2008 especificando as áreas temáticas que as Procuradorias Regionais, Estaduais e Seccionais Federais deveriam observar na sua organização interna sempre que possível. Assim, dividiu as matérias de competência das autarquias e fundações públicas federais e onze temas, senão vejamos:

“Art. 1º. A representação judicial das autarquias e fundações públicas federais que já tenha sido ou venha a ser atribuída à Adjuntoria de Contencioso, Procuradorias-Regionais Federais, Procuradorias Federais nos Estados, Procuradorias-Seccionais Federais e Escritórios de Representação será exercida nos termos da Portaria PGF n. 530, de 13 de julho de 2007.

Art. 2º. Para o desempenho da atribuição prevista no art. 1º, a Adjuntoria de Contencioso, as Procuradorias Regionais Federais, as Procuradorias Federais nos Estados, as Procuradorias Seccionais Federais e os Escritórios de Representação deverão distribuir as atividades de contencioso em áreas temáticas.

Art. 3º. As áreas temáticas a serem criadas são:I - Cobrança e Recuperação de Créditos;II - Desenvolvimento Agrário e Desapropriações;III - Desenvolvimento Econômico;IV - Educação, Cultura, Ciência e Tecnologia;V - Indígena;VI - Infra-Estrutura;VII - Licitações, Contratos e Patrimônio;VIII - Meio Ambiente;IX - Previdência e Assistência Social;X - Saúde; e,XI - Servidor Público e Pessoal.”

[4] Segundo Patrícia Marques Gazola todas as políticas públicas deveriam não só ser submetidas ao crivo da consultoria jurídica a fim de verificar sua higidez constitucional e legal, mas deveriam ser elaboradas, desde o início, com a participação do Advogado Público, senão vejamos: “Todas as políticas públicas deveriam ser elaboradas com a participação de um Advogado público, tanto para que este conheça melhor as efetivas necessidades a serem atendidas pelas ações administrativas, quando para que este, ciente dos interesses públicos que estão carecendo tutela, possa orientar o agente público sobre os procedimentos adequados ao cumprimento dos requisitos legais, seja recomendando uma formatação jurídica diversa no documento, seja propondo a elaboração de um projeto de lei e regulamentação necessária para que se assegure o respeito aos princípios constitucionais ou ainda suscitando a necessidade de implantação em conjunto com ações de outras Secretarias ou Ministérios.

Sem esta proximidade, muitas vezes projetos são desenvolvidos durante meses e acabam sendo ‘barrados’ nas Procuradorias, que, distantes das discussões, apenas analisam os aspectos formais do processo olvidando-se dos interesses públicos que estão sendo objeto da busca de concretização. Perde-se tempo, dinheiro e adia-se o acesso a direitos fundamentais para muitos cidadãos.

A maior proximidade da Procuradoria no momento da elaboração das políticas públicas poderá viabilizar a otimização das ações, para que estas deixem de ser consideradas como locais burocráticos que somente criam problemas para se converterem em parceiras na busca de viabilização da verdadeira missão da administração pública.

Sendo assim, a atuação do Advogado público é fundamental na implantação de políticas públicas integradas, pois pode viabilizar a aproximação dos diversos interesses afetos às diferentes áreas de atuação estatal.” (GAZOLA; FIGUEIREDO, 2009. 417-418)

[5] No mesmo sentido, Enterría e Ramón Fernández (2000, p. 467-468) lecionam que para o vício na finalidade ser perpetrado “no es necesario que el fin perseguido sea un fin privado, un interés particular del agente o autoridad administrativa, sino que basta que dicho fin, aunque público, sea distinto del previsto y fijado por la norma que atribuya la potestad.”

[6] “É justamente por objetivar garantir a aplicação dos princípios da legalidade e da legitimidade que a consultoria jurídica desempenhada pela Advocacia-Geral da União se caracteriza como uma verdadeira função de controle no processo político (policy control, à luz da classificação funcional de Karl Loewenstein). Garantindo que as políticas públicas formuladas no âmbito do Poder Executivo estejam de acordo com o ordenamento jurídico, tanto no plano constitucional como legal, a consultoria jurídica possibilita a responsabilização do administrador público pelos seus atos, na medida em que ele não se poderá valer de uma suposta eficiência no atendimento das demandas sociais para deixar de obedecer à lei e à Constituição.” (MACEDO, 2009, p. 472-473)

[7] “As políticas públicas podem ser controladas, assim, não apenas em seus aspectos de legalidade formal, mas, também, no tocante à sua adequação ao conteúdo e aos fins da Constituição, que são, entre outros, fundamentalmente os fixados no art. 3º. A redução das desigualdades regionais é um imperativo que deve permear todas as políticas públicas propostas e executadas no Brasil. É inconstitucional qualquer política que atente contra os fins determinados na Constituição de 1988 e que desconsidere ou prejudique o desenvolvimento e a diminuição dos desequilíbrios regionais, a menos que a consideremos como algo que pode ser cumprido aleatoriamente, a bel-prazer dos detentores do poder.” (BERCOVICI, 2005, p. 112-113.)

[8] Constituição Federal de 1988 – “Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária; II – garantir o desenvolvimento nacional; - III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.”

[9]   Em outro artigo, Kirsch (2006, p. 81) assevera que “o governante não pode olvidar que a máquina estatal deve agir com o máximo de eficiência, conforme prevê o art. 37 da Lei Maior, tornando-se, destarte, imperiosa a participação da AGU na elaboração do plano político, para conferir segurança e credibilidade jurídicas, evitar desperdício de tempo e danos aos administrados, assim como prevenir equívocos dos próprios governantes”.

[10]  Nas palavras de Dallari Bucci (2006, p. 255), “O modelo das políticas públicas não exclui o da legalidade, mas convive com ele. Para Charles-Albert Morand, as políticas públicas podem ser incorporadas à lei, se superpor a elas ou se pôr a seu serviço, num quadro em que o direito é cada vez mais desordenado, complexo e movediço. Não obstante, no modelo que estamos propondo, a realização das políticas deve dar-se dentro dos parâmetros da legalidade e da constitucionalidade, o que implica que passem a ser reconhecidos pelo direito – e gerar efeitos jurídicos – os atos e também as omissões que constituem cada política pública. O problema passa a ser, então, o de desenvolver a análise jurídica, ‘de modo a tornar operacional o conceito de política, na tarefa de interpretação do direito vigente e de construção do direito futuro’.”

[11] FREITAS, Marcelo de Siqueira. A Procuradoria-Geral Federal e a Defesa das Políticas e do Interesse Públicos a Cargo da Administração Indireta.  Revista da AGU, Brasília - DF, ano VII, n.17, jul/set., 2008.

[12] Dados extraídos do site da Presidência da República. Disponível em: <http://www.casacivil.gov.br/. arquivos/pasta.2010-07-28.8154672857/pac1_parte1apresenta.pdf>. Acesso em: 12 set. 2010.

[13] Isto em observância ao disposto no art. 3º da Constituição Federal de 1988.

[14] Maiores detalhes podem ser acessados no site < http://www.presidencia.gov.br>.

[15] “O Estado, como toda instituição humana, tem uma função objetiva que nem sempre está de acordo com os fins subjetivos de cada um dos homens que o formam. A determinação do sentido do Estado é de crucial importância para a sua compreensão. Sem uma referência ao sentido do Estado, os conceitos da Teoria do Estado, segundo Heller, seriam vazios de significado, não sendo possível diferenciá-lo de outras organizações sociais. A atribuição de fins ao Estado significa, praticamente, sua justificação, sua legitimação material. De acordo com Jellinek, os fins do Estado não servem para determinar o que acontecerá, mas para determinar o que não deve ser feito. [...]

Na questão dos fins do Estado, o conceito-chave do Estado Social é a distribuição. O papel primordial do Estado Social é o de promover a integração da sociedade nacional, ou seja, ‘el proceso constantemente renovado de conversión de una pluralidad en una unidad sin perjuicio de la capacidad de autodeterminación de las partes.’ [...]

A fixação constitucional dos objetivos da República no art. 3º insere-se neste contexto de legitimação do Estado pela capacidade de realizar fins predeterminados, cuja realização se dá por meio de políticas públicas e programas de ação estatal. O próprio fundamento das políticas públicas, segundo Maria Paula Dallari Bucci, é a existência dos direitos sociais, que se concretizam através de prestações positivas do Estado, e o conceito de desenvolvimento nacional, que é a principal política pública, conformando e harmonizando todas as demais.” (BERCOVICI, 2005. p. 106-107.)

[16] CARDOSO, Fernando Henrique; FALETTO, Enzo. Dependência e Desenvolvimento na América Latina: ensaio de interpretação sociológica. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004.

[17] “O desenvolvimento nacional é, conforme vimos, um dos objetivos da República consagrados no art. 3º da CF. Para definirmos um conceito de desenvolvimento ‘constitucionalmente adequado’ devemos, preliminarmente, diferenciar a ideia de desenvolvimento da de crescimento: o desenvolvimento é uma mudança qualitativa, não apenas quantitativa, englobando, assim, a ideia de crescimento e superando-a. Feita esta distinção essencial, podemos adotar aqui o conceito de desenvolvimento exposto por Fábio Konder Comparato: ‘De qualquer modo, já se estabeleceu um razoável consenso no sentido de que o desenvolvimento é um processo de longo prazo, induzido por políticas públicas ou programas de ação governamental em três campos interligados: econômico, social e político. O elemento econômico consiste no crescimento endógeno sustentado na produção de bens e serviços. [...] O elemento social do processo desenvolvimentista é a aquisição da progressiva igualdade de condições básicas de vida [...]. Enfim, o desenvolvimento integral comporta, necessariamente, um elemento político, que é a chave da abóboda de todo o processo: a realização da vida democrática, isto é, a efetiva assunção, pelo povo, do seu papel de sujeito político, fonte legitimadora de todo poder e destinatário do seu exercício.’ [...]

O art. 3º da CF, ao fixar o desenvolvimento nacional e a redução das desigualdades regionais como fins a serem alcançados, fundamenta a reivindicação do direito à realização de políticas públicas para a concretização do programa constitucional. O que há em comum em todas as políticas públicas é o processo político de escolha de prioridades para o governo, tanto em termos de finalidades, como em termos de procedimentos. O Poder Executivo encarrega-se da formulação e execução das políticas públicas sem qualquer tipo de controle ou fiscalização, desde que não ultrapasse suas competências. Ou seja, em princípio, o controle das políticas públicas limita-se à sua legalidade formal. [...]

Para se implementar efetivamente o desenvolvimento consagrado no programa constitucional, Fábio Konder Comparato defende a criação de mecanismos para o controle judicial de políticas públicas. Esse controle deve se dar não apenas no tocante às suas finalidades [...], mas, também, em relação aos meios empregados para se chegar a esses fins, sempre levando-se em consideração que o juízo de validade de uma política pública não pode ser confundido com o juízo de validade das normas e atos jurídicos que a compõem.” (BERCOVICI, 2005.  p. 108-109).

[18] Criticando os teóricos da implementação, Anne Larason Schneider afirma: “Muitos estudiosos da implementação [...] não estão cientes do trabalho que tem sido feito sobre pesquisa de avaliação, e muitos definem todo o processo pós-adoção como implementação de políticas. Uma consequência disso é que a implementação ‘bem sucedida’ é muitas vezes definida [...] como alcance das metas da política. Trata-se de uma conclusão infeliz, porque se a política não consegue atingir suas metas, é importante determinar se o malogro foi causado por pressupostos deficientes [...], ou se foi porque os órgãos responsáveis por sua implementação não conseguiram traduzir adequadamente a teoria subjacente à política em um plano operacional, ou porque os responsáveis pela implementação não contaram com os recursos necessários.” (SCHNEIDER, 2009.)

[19] Gepac – Grupo de Acompanhamento do PAC: trata-se de grupo especial de atuação coordenada criado no âmbito da AGU. Conta com a participação de Advogados da União, Procuradores Federais e da Fazenda Nacional, integrantes, portanto, das carreiras da AGU. Essa atuação coordenada permitiu, por exemplo, a realização do leilão que garantiu tarifas mais baixas de pedágio em rodovias federais da Bahia e o leilão de energia elétrica da hidrelétrica de Belo Monte, no Pará.

Principais áreas: o eixo de empreendimento que mais tem ações é o de Infraestrutura Logística com 1.578. São rodovias (771), aeroportos (613), ferrovias (188), portos (5) e hidrovias (1). Depois, estão as áreas Energética (351), Social e Urbana (176), e outras (4.843). Disponível em: http:// www.agu.gov.br>.  Acesso: 22 maio 2010.

[20] O 9º Balanço do PAC divulgado anunciou que 44% das obras do PAC estavam com o andamento dentro do cronograma previsto pelo governo, 5% estão em situação de atenção e 1% em estágio preocupante. Até fevereiro de 2010 haviam sido gastos R$ 256,9 bilhões, de um total de R$ 638 bilhões.

Do total investido, R$ 126,3 bilhões são de estatais e R$ 88,8 bilhões do setor privado. Da quantia de R$ 19,1 bilhões de financiamentos previstos para a habitação no período, foram contratados R$ 16,5 bilhões e R$ 2,6 bilhões estão em contratação. No setor de saneamento, dos R$ 39,3 bilhões previstos, R$ 32,2 bilhões foram contratados e R$ 7,1 bilhões estão em contratação. Disponível em: <http//: www.agu.gov.br>.  Acesso: 22 maio 2010.

[21] Disponível em: <http://www.agu.gov.br>. Acesso em: 26 de julho de 2011.

[22] Esclareça-se: não se está fazendo um juízo meritório acerca da “justiça ou injustiça” / “acerto ou desacerto” das políticas públicas eleitas pelo governo. Assim, quando se diz que a atuação da AGU resulta em “dados favoráveis ao país”, se pretende afirmar que sua atuação rende frutos benéficos e favoráveis às ações que o governo, legitimamente posto por meio do sufrágio popular, entende como sendo necessárias e, por conseguinte, pretende implementar no Estado.

[23] Trata-se da conjugação dos artigos 3º, II (garantir o desenvolvimento nacional), 174, § 1º (Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado. § 1º - A lei estabelecerá as diretrizes e bases do planejamento do desenvolvimento nacional equilibrado, o qual incorporará e compatibilizará os planos nacionais e regionais de desenvolvimento) e 225 (Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações).

[24] Constituição Federal de 1988 – “Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: [...] II – garantir o desenvolvimento nacional; III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais [...]”.

[25] Constituição Federal de 1988 – “Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: [...] III – a dignidade da pessoa humana [...]”.

[26] O Ministério Público, como Função Essencial à Justiça e, na conceituação de Moreira Neto, Advocacia Pública da sociedade, exerce um importante papel como ator/interlocutor nessa moderna relação sociedade versus Estado ou sociedade versus governo – fruto de respeito à democracia e à pluralidade Constitucionalmente albergadas –, na qual as políticas públicas são questionadas em um ambiente neutro e imparcial, o Judiciário.

[27] Em razão desse primeiro projeto, cujos estudos remontam ao ano de 1975, houve, em 1989, durante o 1º Encontro dos Povos Indígenas do Xingu, reunião entre representantes da Eletronorte e as comunidades indígenas atingidas pelo empreendimento na qual uma índia Caiapó chamada Tuíra levanta-se da plateia e, depois de diversas investida contra o ar, põe seu facão junto ao rosto e ao pescoço de um dos diretores da Eletronorte, José Antônio Muniz Lopes, que discursava sobre o referido projeto. Tal fato histórico restou marcado como evento emblemático e propiciou uma mudança paulatina na concepção do projeto que evoluiu até tomar o formato que tem hoje. Vários jornais da época noticiaram o fato, como se pode ver, por exemplo, no endereço eletrônico <http://pib.socioambiental.org/anexos/17159_20101109_105057.pdf> . Acesso em: 03 abr. 2012.

[28] Dados técnicos sobre a Usina Hidrelétrica de Belo Monte podem ser encontrados no Contrato de concessão de uso de bem público para geração de energia elétrica n. 01/2010-MME-UHE BELO MONTE. Disponível em: <http://www.aneel.gov.br/aplicacoes/Contrato/Documentos_Aplicacao/Contrato%20Belo%20 Monte.pdf>. Acesso: 03 abr. 2012.

[29] Resolução CONAMA n. 237/1997 – “Art. 8º O Poder Público, no exercício de sua competência de controle, expedirá as seguintes licenças:

I – Licença Prévia (LP) – concedida na fase preliminar do planejamento do empreendimento ou atividade aprovando sua localização e concepção, atestando a viabilidade ambiental e estabelecendo os requisitos básicos e condicionantes a serem atendidos nas próximas fases de sua implementação;

II – Licença de Instalação (LI) – autoriza a instalação do empreendimento ou atividade de acordo com as especificações constantes dos planos, programas e projetos aprovados, incluindo as medidas de controle ambiental e demais condicionantes, da qual constituem motivo determinante;

III – Licença de Operação (LO) – autoriza a operação da atividade ou empreendimento, após a verificação do efetivo cumprimento do que consta das licenças anteriores, com as medidas de controle ambiental e condicionantes determinados para a operação.

Parágrafo único. As licenças ambientais poderão ser expedidas isolada ou sucessivamente, de acordo com a natureza, características e fase do empreendimento ou atividade.”

[30] Dentre as condicionantes, destacam-se:

a) implantação do hidrograma ecológico, visando garantir a manutenção da reprodução da ictiofauna e da navegação;

b)PAN – planos de ação nacional para espécies da fauna e flora ameaçadas;

c)     proteção de áreas por meio da compensação ambiental;

d)a fixação como áreas de proteção permanente (APP) os 500 (quinhenteos) metros médios no entorno dos reservatórios de Belo Monte;

e) implantação de mecanismos de transposição de embarcações, a fim de garantir a navegabilidade no rio;

f) projetos de aquicultura e incentivo à pesca sustentável;

g) apoio à pequena produção e à agricultura familiar;

h) saneamento básico em Vitória do Xingu e Altamira;

i) esgotamente sanitário em 100% da área urbana;

j) melhoria e ampliação do sistema de abastecimento de água;

l) remediação do lixão existente em Altamira;

m)implantação de aterro sanitário;

n) implantação do sistema de drenagem urbana;

o) retirada da população das áreas de risco;

p) indenização aos atingidos com perda imobiliária ou de atividade produtiva; etc..

Todos esses dados podem ser consultados nos autos da Apelação Cível (Ação Civil Pública) n. 0000709-88.2006.4.01.3903, que tramita no TRF1 sob a relatoria da Des. Federal Selene Maria de Almeida.

[31] Com o termo “implementação” quer-se dizer o início das obras de construção da UHE – Belo Monte.

[32]  Noutra senda, é fato que as disputas judiciais contra a implementação desta ou daquela política pública têm nos polos ativos outros atores para além do Ministério Público, e algumas dessas demandas, ademais, têm seu início diretamente junto ao Supremo Tribunal Federal.

[33] Esse fato nos remete ao pensamento de Burdeau (2005, p. 71) sobre a relação existente entre o “Poder” estatal e os poderes de fato, ao apontar que a rivalidade existente entre eles é o motor da vida política, já que o objetivo desta é a conquista do “Poder” estatal “que sancionará a pretensão do Poder vitorioso a fazer-se reconhecer como o único autorizado a imputar suas vontades ao Estado”. Embora não se esteja a afirmar que o Ministério Público queira conquistar o “Poder” estatal, o fato é que, de certo modo, a imagem do embate entre a sociedade (por meio do MP) e o Estado (por meio da AGU) seguramente reflete, sob o ângulo jurisdicional, parcela desse embate político na busca do controle senão da vontade estatal ao menos de suas ações, sendo que essas lutas intestinas são o “móbil” da vida social e consequentemente da vida no Estado, em uma sociedade democrática e plural.

[34]  “O fortalecimento do Judiciário e das demais instituições do sistema de justiça tornou-se mais visível, tanto para os agentes políticos como para a população. Os agentes políticos encontraram no Judiciário um novo interlocutor e uma nova arena, tanto para seus confrontos quanto para contestar políticas governamentais e decisões de maiorias legislativas” (SADEK, 2011, p. 16-17).

[35]  Espera-se que um dia (em breve) essa percepção esteja inserida de forma contundente e perene em todo o Judiciário Nacional.

[36] “Meu ponto de partida é o de que esse projeto do Estado Democrático de Direito seria reduzido a uma mera figura de retórica se não existissem, no plano das instituições, mecanismos e instrumentos que dessem consequência a esse programa. E parece-me que a Advocacia Pública é a função de Estado por excelência encarregada de realizar a vontade majoritária democraticamente estabelecida, adequando-a aos marcos do ordenamento jurídico.

Então, parece que essa relação de imbricação lógica da Advocacia Pública com o Estado Democrático de Direito pode ser explicada teoricamente por uma vinculação das suas funções institucionais aos dois valores fundamentais de qualquer democracia constitucional. O primeiro deles, legitimidade democrática e governabilidade. O segundo deles, controle da legalidade ampla, que eu prefiro chamar de controle de juridicidade.

As nossas funções institucionais básicas – consultoria jurídica e representação judicial – devem sempre ser pensadas e reconduzidas a esses dois valores fundamentais do Estado Democrático de Direito, que são, de um lado, legitimidade democrática e governabilidade, e, de outro, respeito e promoção do controle de juridicidade.” (BINENBOJM, 2010, p. 1-2). Disponível em: <http://www.bidforum.com.br/bid/ PDI0006.aspx?pdiCntd=70773>)

Sobre o autor
Filipo Bruno Silva Amorim

Procurador Federal, atualmente exercendo o cargo de Vice-Diretor da Escola da Advocacia-Geral da União. Bacharel em Direito pela UFRN. Especialista em Direito Constitucional pela UNISUL. Mestre em Direito pelo Centro Universitário de Brasília (UniCEUB).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AMORIM, Filipo Bruno Silva. A atuação da AGU na defesa das políticas públicas de Estado.: Notas descritivas sobre o PAC e sobre a Usina Hidrelétrica de Belo Monte. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3417, 8 nov. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22976. Acesso em: 22 nov. 2024.

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