10. Relações entre o direito comunitário e os direitos nacionais
O sistema jurídico comunitário contém todos os tratados, regulamentos, diretivas, atos em geral dos institutos da União Européia. A primeira grande mudança na mentalidade jurídica a ser implementada, foi considerar pessoa jurídica de Direito Internacional Público não só Estados, mas, a partir da União, também as Instituições Comunitárias.
A relação do Direito Comunitário com os Direitos nacionais baseia-se na autonomia daquele com relação a este, na aplicabilidade direta do Direito Comunitário nos ordenamentos jurídicos nacionais e no primado deste sobre os Direitos nacionais. Esta relação não é oriunda dos Tratados, mas da jurisprudência do TJCE.
Inspira-se no Princípio da Separação Recíproca entre os Direitos interno e Comunitário, porém, esta separação não é total, devido ao fato de alguns princípios comunitários serem originários dos Direitos internos, para citar os Direitos fundamentais reconhecidos e tutelados pela ordem comunitária. Outro importante princípio comunitário é o da Congruência Jurídica Estrutural, no qual só será válida a norma democraticamente legítima dentro do funcionamento sui generis da estrutura União Européia. Os conflitos entre as legislações nacionais e comunitárias, inevitáveis, são resolvidos pelo Tribunal de Justiça.
Tais relações, afirmadas por toda uma construção jurisprudencial, baseiam-se nos três princípios fundamentais supra citados: a autonomia do Direito Comunitário em relação aos direitos nacionais; a aplicabilidade direta das normas comunitárias sobre todo o seu âmbito de jurisdição territorial; e, o primado da norma comunitária sobre a estatal.
11. O Reenvio necessário na União Européia
O Tratado de Roma determina: "Art. 177 – O Tribunal de Justiça é competente para decidir, a título prejudicial: a) Sobre a interpretação do presente Tratado; b) Sobre a validade e interpretação dos atos adotados pelas Instituições da Comunidade e pelo BCE; c) Sobre a interpretação dos Estatutos dos organismos criados por um ato do Conselho, desde que estes Estatutos o prevejam. Sempre que uma questão desta natureza seja suscitada em processo pendente perante um órgão jurisdicional nacional cujas decisões não sejam suscetíveis de recurso judicial previsto no direito interno, esse órgão é obrigado a submeter a questão ao Tribunal de Justiça."[14]
Sempre que uma questão desta natureza seja suscitada perante qualquer órgão jurisdicional de um dos Estados-membros, esse órgão pode, se considerar que uma decisão sobre essa questão é necessária ao julgamento da causa, pedir ao Tribunal de Justiça que sobre ela se pronuncie. Pressuposto: decisão de órgão jurisdicional nacional suscitando questão ao TJCE. Compete ao juiz do processo decidir (ex officio/pedido das partes). Cabe ao juiz: formular as questões que pretende ver esclarecidas sobre a interpretação de uma norma/validade de um ato comunitário. Regras Processuais: Momento de Reenvio: economia e utilidade processual; o processo é enviado por correio à Secretaria do TJCE; o despacho de reenvio suspende o processo. Intervenção: (2 meses) as partes na causa são os Estados-membros e as Instituições Comunitárias. Julgamento: acórdão. Conteúdo do Acórdão: Acórdão Interpretativo; interpretação apenas do D. Comunitário. Acórdão sobre questão de validade: não declara erga omnes a nulidade do ato comunitário (Recurso de Anulação). Repercussão do Acórdão: a decisão vincula o juiz nacional que recorreu ao Tribunal Comunitário; só é vinculativa no processo em que foi solicitada. Efeito retroativo: as jurisdições nacionais ficam, no futuro, dispensadas de submeter idêntica questão ao TJCE. Reenvio Prejudicial: Tribunais Nacionais - TJCE - interpretação do conteúdo/âmbito dos Tratados e Atos Comunitários - parecer sobre validade dos atos das Instituições Comunitárias. O TJCE em nenhuma hipótese funciona, em relação aos Tribunais Nacionais como um tribunal de recurso ou como tribunal supremo de um sistema federal.[15]
Portanto, no estágio atual, o Tribunal da Comunidade Européia não se assemelha a um tribunal de um Estado Federal pois que, de um lado, a espécie de invalidade da norma estadual que contrarie a norma comunitária não é a nulidade senão a ineficácia ou inaplicabilidade, e, por outro lado, o tribunal não dispõe de competência para julgar da validade das normas comunitárias e nem mesmo quando é chamado a pronunciar-se sobre as questões de envio prejudicial consagradas pelo artigo 177 acima citado.[16]
NOTAS
1.IANNI, Octávio. A sociedade global. Rio de Janeiro: Ed. Civ. Brasileira, 1992. p. 141.
2.PINTO, Roseane Abreu Gonzales. Estado, direito e os limites e virtudes da globalização econômica. Revista PARADIGMA – Ciências Jurídicas. V. 8, nº 8. Ribeirão Preto: EDUNAERP, 1998. p. 106.
3.BASSO, Maristela. MERCOSUL – seus efeitos jurídicos, econômicos e políticos nos Estados-membros. Porto Alegre: Livr. Do Advogado Ed. 1997. p. 114.
4.JAGUARIBE, Hélio. Brasil, homem e mundo: reflexão na virada do século. Rio de Janeiro: Topbooks Ed., 2000. P. 76.
5.VITAGLIANO, José Arnaldo. ROSSI, Fernanda. Os conflitos de lei e a política nacional. Capturado em 19 de outubro de 2000. Online. Disponível na Internet http://www.argumentum.com.br/ARTIGOS/04-10/os_conflitos_de_lei____e_a_polí-no.htm.
6.ALMEIDA, Paulo Roberto de. O Mercosul no contexto regional e internacional. São Paulo: Ed. Aduaneiras, 1993. p. 81.
7.ARNOLDI, Paulo Roberto Colombo. A declaração de falência e seus efeitos jurídicos no âmbito do Mercosul. Revista PARADIGMA – Ciências Jurídicas. V. 8, nº 8. Ribeirão Preto: EDUNAERP, 1998. p. 70.
8.AGUADO, Juventino de Castro. A integração que queremos (e necessitamos) e a integração que temos. Revista PARADIGMA – Ciências Jurídicas. V. 09 nº 09/10. Ribeirão Preto: EDUNAERP, 2000. p. 225. Juventino de Castro Aguado menciona que o Mercosul é viável e que no campo comercial "...o comércio intraregional, passou de 4 bilhões de dólares em 1991 para 20 bilhões de dólares em 1998; neste meio tempo tem havido, é certo, dificuldades e percalços, mas a permanente disposição e boa vontade dos seus integrantes, especialmente do Brasil, tem permitido a manutenção de um rumo com idéias próprias; isto é necessário para fazer frente à "irracionalidade do mercado global" (Robert Kurtz) e às ameaças de possíveis outras irracionalidades e incertezas a nível continental."
9.SILVA, Roberto Luiz. Direito comunitário e da integração. Unisíntese – direito em CD-Rom. Porto Alegre: Síntese, 1999.
10BATISTA JUNIOR, Paulo Nogueira. A economia como ela é. São Paulo: Ed. Bontempo, 2000. p. 80.
11.SILVA, Roberto Luiz. Op. Cit.
12.SÁENZ, Joseba Aitor Echebarría. El derecho comercial en los procesos de integración. Ribeirão Preto: Revista PARADIGMA – Ciências Jurídicas. V. 8, nº 8, ano 1998. p. 15.
13.QUADROS, Fausto. Direito das comunidades européias e direito internacional público. p. 432, Lisboa: Coimbra, 1991.
14.LARANJEIRO, Carlos. Tratado de Roma. p. 202. Coimbra: Almedida, 1993.
15.SILVA, Roberto Luiz. Op. Cit.
16.TEIXEIRA, Antonio Fernando Dias. A natureza das comunidades Europeias: estudo político-jurídico. p. 117. Coimbra: Mamedina, 1993.
BIBLIOGRAFIA
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