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Da hipoteca: análise crítica do instituto

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Agenda 02/04/2013 às 09:58

Embora a essência do instituto diga respeito a bens imóveis, é possível que a hipoteca seja constituída sobre bens móveis, desde eles tenham algum tipo de registro formal, sem o qual a propriedade não se transmita.

Resumo: O presente artigo trata da hipoteca, instituto essencialmente civil, muito utilizado na atualidade devido ao seu dinamismo e à prioridade que dá ao credor quanto ao pagamento do crédito. Na seara dos direitos reais, a hipoteca encontra-se ao lado do penhor e da anticrese, embora se sobressaia em demasia em relação a estes, pela sua própria constituição e pelos tipos de bens que podem lhe servir de objeto. Há três tipos de hipoteca, a convencional, a legal e a processual, sendo a convencional o tipo mais utilizado na prática e que possui a maior gama de possibilidades, permitindo sua aplicação corriqueira. Com a hipoteca, o bem dado em garantia fica sequelado, impossibilitando ao devedor manobras com o intuito de fraudar a dívida. Atualmente, a hipoteca pode gravar vários tipos de bens, ampliando as possibilidades e a aplicação do instituto. Assim sendo, é necessário analisar suas principais características e seu desenvolvimento no meio jurídico e social.

Palavras-chave: Hipoteca. Hipoteca convencional. Hipoteca Legal. Hipoteca judicial.


1 INTRODUÇÃO   

A hipoteca é um instituto jurídico cujas origens advêm do direito clássico e, desde então, encontra-se sedimentada no direito contemporâneo devido à sua importância como garantidora das obrigações.

Atualmente, a hipoteca ocupa lugar privilegiado na garantia dos contratos, fazendo com que o credor se satisfaça mesmo com a inadimplência do devedor de forma bastante objetiva, o que permite a facilitação na aquisição de crédito, ferramenta indispensável para a mobilidade do patrimônio. Contudo a inadimplência é o óbice para que essa relação se dê de forma proveitosa para credor e devedor, contribuindo para que a hipoteca seja uma garantia obrigacional importante.

Como direito real, a hipoteca se apresenta como acessório de um contrato pessoal, cuja classificação é dominante na doutrina moderna, revelando-se como um instituto substancialmente civil. Dessa forma, com a possível inadimplência do devedor, a hipoteca se evidencia e faz com que os contratos garantidos por ela sejam cumpridos.

Em virtude da especialização e da publicidade com que a hipoteca grava o bem, o credor tem seu direito garantido de forma real e permite com que terceiros tenham acesso às informações concernentes à dívida, afastando a ignorância dos mesmos em uma eventual inter-relação jurídica. Outro ponto importante se refere à indivisibilidade da hipoteca, que diz respeito à garantia da obrigação por completo, o que é uma vantagem caso não ocorra o pagamento total.  

Com a rotineira busca por crédito, além da constante movimentação financeira do mercado, aquele que se torna credor em um contrato deve procurar formas através das quais as obrigações sejam adimplidas. Diante disso, a hipoteca é uma maneira segura tanto para pessoas físicas ou pessoas jurídicas que pretendam ter garantias de um contrato. Mas há, também, a hipoteca que não deriva da vontade das partes como, por exemplo, a legal, que visa a proteger certas pessoas em determinadas situações e tem origem legislativa, bem como a hipoteca judicial, originária de uma sentença, cuja possibilidade está prevista no Código de Processos Civil.

Ante o exposto, a hipoteca apresenta grande importância no Direito e mister que sejam analisadas suas principais características desde sua constituição até sua extinção, apontando as vantagens, efeitos e consequências no desenvolver dessa garantia real das obrigações.


2 CONCEITO E DEFINIÇÃO

A palavra hipoteca deriva do grego, hypotheke, e significa o “oferecimento de um bem, geralmente imóvel, como garantia de um empréstimo pecuniário” e, ainda, um “direito real que tem o credor de uma dívida sobre imóvel, bem de raiz ou, por exceção, certos móveis (navios, aviões etc.) dados em garantia pelo devedor, e que somente pelo não pagamento da dívida se converte em posse efetiva do credor” (HOUAISS, 2.007, p. 1.540). De sua etimologia extrai-se que os institutos da hipoteca e do penhor têm a mesma origem, distinguindo-se modernamente por um ter como garantia bens imóveis (e os considerados imóveis para o direito) e o outro, bens móveis, além do diferencial possessório.

 A sua anotação jurídica, contudo, remonta ao Direito Romano, onde era comum nas atividades rurais, nas quais o agricultor deixava os bens de seu trabalho afetados pelas dívidas que contraía, o que no Direito contemporâneo, confundir-se-ia com o penhor, dado o tipo de bem garantidor e sua posse. Antes da codificação de Justiniano[1], a hipoteca consistia em o devedor dar em garantia gado, escravos e utensílios, embora continuasse na posse dos mesmos (VENOSA, 2.006, p. 553).

Na hipoteca, o bem continua na posse do devedor, pois se trata de pignus obligatum, ou seja, uma obrigação formada através da convenção de garantia ou, senão, para a melhor garantia de uma dívida, contrapondo o penhor, pignus datum, na qual o bem era entregue ao credor. (VENOSA, 2.006, p. 553).

A hipoteca é conceituada como “direito real de garantia de natureza civil, incidente em coisa imóvel do devedor ou de terceiro, sem transmissão da posse ao credor”. Assim sendo, fica evidente seus caracteres mais importantes como sua natureza, os tipos de bens e a posse dos mesmos (PEREIRA, 2.004, p. 368).  A hipoteca, ainda, possui como característica a acessoriedade e indivisibilidade. Todavia, para que ela tenha seu alcance público e devida instrumentalidade, é necessário o registro no cartório competente, sem o qual produzirá efeitos somente entre as partes, sendo os mesmos meramente obrigacionais (VENOSA, 2.006, p. 556).

De acordo com Pontes de Miranda (1959, p. 62) a hipoteca é um direito real de garantia que grava o imóvel ou bem que a lei aponta como hipotecável sem passar ao titular do direito a posse, não permitindo ao credor, sequer, a pretensão à sua imissão. Caso ocorra a transmissão da posse, tal pacto se desvirtuará como direto real, não sendo inscritível ou averbável.

Pelo Conseguinte, fica claro a partir dos conceitos que a hipoteca distingue-se basicamente do penhor pelos tipos de bens dados em garantia e a forma com que se regula a posse dos mesmos na relação entre credor e devedor, embora tenham as mesmas origens. É um direito real desde que obedecidas às formalidades de registro, vinculando o bem gravado, o que assegura ao credor o adimplemento de uma obrigação, dando-lhe o direito de perseguição do bem, além de possuir natureza jurídica civil. Define-se, portanto, hipoteca como a garantia real e acessória de um contrato que se perfaz através do registro do gravame, cujo bem imóvel ou assim considerado fica na posse do devedor, conferindo ao credor preferencial direito de venda no caso de inadimplemento.

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3 dos princípios que regem a hipoteca

A hipoteca, como se vê, oriunda do Direito Romano, contemplada pelo Código Civil de 1916 e em vigor graças ao novel Código, rege-se por alguns princípios, os quais são o da acessoriedade, indivisibilidade, especialização, publicidade e o subprincípio da prioridade.

Por acessoriedade, entende-se que a hipoteca seja dependente de outro contrato para que exista, não podendo haver a chamada hipoteca abstrata (VENOSA, 2.006, p. 556), oportunidade na qual é necessário volver a atenção para a teoria do excelso Pontes de Miranda, em sua escada dos negócios jurídico[2]. Da mesma forma, a hipoteca servirá de garantia independentemente da natureza e da espécie da obrigação da qual ela nasça (RUGGIERO, 2.005, p. 717).

Sobre a indivisibilidade da hipoteca assevera Lacerda de Almeida (apud DINIZ, 2.009, p. 555) que o ônus real grava o bem em sua integralidade, pois enquanto não se liquidar a obrigação a hipoteca subsistirá por inteira, onerando o bem mesmo com o pagamento parcial do débito. A indivisibilidade, nesse caso, diz respeito ao vínculo real existente entre o cumprimento da obrigação e o bem, e não pode ser confundida no que diz respeito ao bem e a dívida, que podem muito bem ser fracionados. A indivisibilidade, também, distingue-se da possibilidade de remir alguns bens hipotecados a partir do pagamento parcial, o que é convencionalmente possível entre as partes.

A especialização é um princípio que diz respeito à descrição minuciosa e à individualização do bem que servirá como garantia hipotecária, além dos requisitos da dívida, não podendo a hipoteca ser instituída com base em bens gerais e ilimitados, devendo o patrimônio do devedor ser pormenorizadamente gravado, de acordo com o vínculo obrigacional (VENOSA, 2.006, p. 557). Segundo esse princípio, a hipoteca não poderá incidir sobre bens futuros ou ainda não concretizados, pois escapa à realidade jurídica (MONTEIRO, 2.007, p. 409-410)[3].

Já o princípio da publicidade faz alusão ao registro do título da hipoteca no cartório competente, o que garante o conhecimento a terceiros que porventura busquem uma consulta. Por cartório competente, entende que seja o do lugar onde se encontra o imóvel ou de cada um deles, caso o título se estenda por mais de uma circunscrição imobiliária, de acordo do com artigo 1.492 do Código Civil. Desse princípio deriva o subprincípio da prioridade, que consiste em haver mais de um registro, ser obedecida a ordem cronológica deles, oportunidade na qual será preterido o registro mais novo em favor do mais velho. O oficial do registro pode indeferir o pedido de registro de duas hipotecas no mesmo dia se no instrumento não houver horário que distinga sua cronologia. Ocorrendo o caso em tela, haverá a eleição para ser registrado do título mais novo (VENOSA, 2.006, p. 556-557).

Ante o exposto, conclui-se que os princípios que regem a hipoteca estão, principalmente, dispostos no Código Civil de forma implícita e explícita, exercendo papéis fundamentais no desenvolvimento desse instituto. A doutrina atual não é unânime na consideração deles, de tal forma que alguns autores arrolam os princípios da especialização e publicidade essencialmente. Sobre o princípio da publicidade, é notório que dele deriva o corolário da prioridade, podendo o mesmo ser denominado de subprincípio por sua importância.

 


4 DA natureza jurídica

Analisar a natureza jurídica de um instituto é indispensável para sua classificação e ordenamento junto de seus semelhantes, apontando quais seus caracteres e pontos em comum.

A hipoteca encontra-se nos artigos 1.473 a 1.505 do Código Civil, donde trás consigo a classificação de direito real. Vale lembrar, no entanto, que e hipoteca somente se materializará como direito real com o devido registro do título, sem o qual, será ineficaz perante terceiros (DINIZ, 2.009, p. 554). Essa classificação, embora majoritária, não é unânime, pois Francesco Carnelutti acredita que a hipoteca é um instituto do direito processual (apud MONTEIRO, 2.007, p. 408).

Venosa (2.006, p. 556) também a classifica como direito real, contudo traz a lume a discussão doutrinária que existia no Código Civil de 1.916, na qual o comerciante e sua atividade não estavam incluídos na lei civil, dada a sua concentração no superado Código Comercial, o que não ocorre na atual classificação de empresa e suas relações de consumo.

A hipoteca, assim como os outros direitos reais de garantia, trata-se de um acessório. Lafayette (apud RODRIGUES, 2.006, p. 394) assevera a qualidade de direito real da hipoteca, sendo ela criada simplesmente para assegurar a eficiência de outro direito pessoal.

Dessa forma, nada mais correto em classificar ou, senão, manter a classificação atual e majoritária de direito real da hipoteca, visto que ela existe no direito civil independentemente da norma processual. Embora existam classificações diferentes sobre a natureza jurídica da hipoteca, elas são minoritárias e trazem parca fundamentação a seu respeito. Conclui-se, portanto, que a hipoteca existente no direito processual é resultante da contida do direito material.


5 DOS TIPOS DE HIPOTECA

Sobre hipoteca, é necessário ressaltar que existem três tipos, os quais são a convencional, a legal e a judicial.

A hipoteca convencional surge do acordo de vontades entre aquele que pretende oferecer e aquele que pretende receber a hipoteca. Pode ser convencionada por instrumento particular assinado por duas testemunhas, mas dependendo do valor do imóvel, a forma deve ser a prescrita no artigo 108 do Código Civil, ou seja, através de escritura pública (DINIZ, 2.009, p. 566). É a forma mais comum de hipoteca.

A hipoteca legal é exigida em certas situações e de algumas pessoas com finalidade de prevenir ou acautelar possíveis prejuízos, a exemplo do artigo 1.489 do Código Civil (VENOSA, 2.006, p. 565-566). No caso da hipoteca legal, não existe título tampouco vontade das partes, dada sua origem legislativa.

Já a hipoteca judicial consiste em existir uma sentença judicial que a determine, conferindo ao exequente direito de prosseguir na execução, inclusive, contra os adquirentes do bem. Ocorre, no entanto, que tal tipo hipotecário perde a utilidade frente à fraude à execução, além do mais, deixa de ser contemplado no vigente Código Civil (VENOSA, 2.006, p. 562; 569-570), embora mereça atenção e estudo, posto que está disposta no parágrafo único do artigo 466 do Código de Processo Civil. De acordo com Marinoni e Mitidieiro (2.008, p. 442), a constituição de hipoteca judicial independe de requerimento e, mesmo que exista uma condenação genérica, será procedente ainda que não resolvido o arresto de bens do devedor ou quando o credor promover a execução provisória.

Silvio de Salvo Venosa entende que a hipoteca de navios, aeronaves, minas e pedreiras devem ser classificadas como hipotecas especiais, devido às suas peculiaridades (2.006, p. 560). Essa opinião está contida, também, de forma implícita da doutrina de Washington de Barros Monteiro (2.009, p 429; 430), na qual o autor coloca a hipoteca naval, aérea e de vias férreas paralelas às demais. Nada obstante, essa classificação não pode germinar, pois as hipotecas mencionadas derivam da hipoteca do tipo convencional.

Pelo conseguinte, dos tipos hipotecários existentes, a hipoteca convencional possui o maior número ligações com outros institutos jurídicos, além de ser a mais utilizada, inclusive se comparada à hipoteca legal. Quanto à hipoteca judicial, é certo que sua aplicação será mais restrita a cada dia diante dos remédios processuais existentes, dentre os quais se destacam os empregados por meio eletrônico, ainda que visem ao bloqueio de outros tipos de bens.


6 DO DIREITO DE SEQUELA E PREFERÊNCIA

O direito de sequela na hipoteca significa que o credor perseguirá a coisa onde quer que se encontre, mesmo que esteja em poder do adquirente, enquanto à preferência diz respeito ao direito do credor de receber prioritariamente, sem ser necessário se sujeitar a um possível concurso de credores.

  O direito de sequela confere ao credor a garantia mesmo que o bem seja alienado, pois o instituto da hipoteca apenas grava o bem de ônus, sem retirá-lo do comércio contudo, e a hipoteca apenas incidirá sobre esse bem com a sua alienação (VENOSA, 2.006, p. 558). O artigo 1.475 do Código Civil é categórico em dispor contra a cláusula contratual que proíbe o proprietário de alienar o bem outrora hipotecado. Em seu parágrafo único, há a possibilidade, no entanto, de as partes ajustarem que o crédito hipotecário vencerá caso ocorra a alienação, oportunidade na qual o adquirente terá conhecimento de que deverá pagar a dívida.

Nesse mesmo sentido, cabe ressaltar que o devedor não está inibido de alienar o bem hipotecado, pois não perde o jus disponendi, visto que transferirá o ônus que o grava ao adquirente, que não poderá se escusar com a alegação de ignorância. Entretanto, se o devedor alienar o imóvel antes do registro da hipoteca, responderá pelo crime de estelionato, previsto no artigo 171, § 2º, II do Código Penal (PEREIRA, 2.004, p. 386-387)[4].

 Já o direito de preferência faz alusão ao subprincípio da prioridade, tratando-se da condição preferencial em que fica o credor que tem o título da hipoteca registrado perante outros credores que não o tenham ou não registraram seus títulos posteriormente, garantindo ao credor preambular vantagem sobre os precedentes, podendo excutir o bem antes deles. O credor da segunda hipoteca e posteriores não poderão executar o imóvel antes do vencimento da primeira (VENOSA, 2.006, p. 557; 571).

Nesse sentido, o parágrafo único do artigo 1.493 do Código Civil dispõe sobre a prioridade, que por sua vez determina a preferência do credor, recebendo essa prioridade o nome de prelatícia[5] pela doutrina (DINIZ, 2.009, p. 568).

Frente ao exposto, extrai-se que o tanto o direito de sequela quanto o de preferência constituem a essência da hipoteca no que tange à segurança jurídica que ela traz, pois ambos servem para qualificar a garantia que o credor possui no caso de inadimplemento do devedor. O direito de sequela, todavia, encontra óbices práticos por não ser confortável ao credor saber que o devedor pretende alienar o imóvel dado em garantia, podendo gerar algum tipo de embaraço entre ambos a depender de execução hipotecária. Já o direito de preferência se manifesta como um dos fundamentos da hipoteca, por dar predileção ao credor que registrou o título.


7 DOS requisitos objetivos

Visualizar quais os tipos de bens podem ser objeto de hipoteca é de extrema importância, pois serve tanto à sua cognição quanto para distingui-la de institutos semelhantes. O objeto da hipoteca corresponde a bens imóveis, embora haja casos em que ela recairá sobre bens móveis, considerados imóveis para o direito. No artigo 1.473 do Código Civil, há a disposição dos bens que podem ser objeto da hipoteca, os quais serão analisados com mais esmero adiante.

A hipoteca é instituída sobre bens pertencentes ao devedor, não sendo possível hipotecar bens alheios, com exceção do devedor de boa-fé, que oferece em hipoteca um bem que acredita ser seu e o adquiri posteriormente, validando, dessa forma, o domínio real que fora aparente (DINIZ, 2.009, p. 557). Também é necessário que os bens possam ser alienáveis, oportunidade na qual se excluem os bens que estão fora de comércio por algum motivo. Nesse mesmo sentido assevera Washington de Barros Monteiro que não são hipotecáveis os imóveis onerados com cláusula de inalienabilidade ou que se encontrem extra commercium (2.007, p. 412).

Segundo Ruggiero, a hipoteca se estenderá a todos os incrementos e acréscimos, abrangendo todos os melhoramentos, construções e acessões que porventura se juntem ao imóvel a partir da constituição do vínculo hipotecário (2.005, p. 711). Dessa forma, a hipoteca poderá recair sobre bens móveis quando eles forem acessórios de um imóvel, como ocorre no caso de acessão intelectual ou destinação do proprietário, assim como no maquinário utilizado em uma empresa ou os animais mantidos em uso em uma fazenda, pois eles são considerados pertenças e não se constituem como partes integrantes do imóvel por si sós (GONÇALVES, 2.009, p. 563).

Assim, os bens naturalmente imóveis e seus acessórios, nos quais há a abrangência do solo e suas acessões, podem ser objeto de hipoteca como sabido e isso se estende, também, aos apartamentos em edifícios em condomínio, sem que seja necessária a concordância dos demais condôminos, o que não acontece no caso dos bens cuja característica lhes confira indivisibilidade sem que haja a devida autorização dos demais, com a exceção de o devedor hipotecar apenas o quinhão de que dispõe (DINIZ, 2.009, p. 558).

Poderá ser objeto de hipoteca o domínio direto, de forma que o senhorio poderá dar em garantia hipotecária o domínio eminente do qual é titular, o que consiste na substância da coisa, sem as suas utilidades. Caso o senhorio adquira o domínio útil a partir da constituição da hipoteca, a garantia se estenderá a todo o imóvel, completando-se os atributos da propriedade (MONTEIRO, 2.007, p. 414).

O domínio útil, como desmembramento da propriedade, também poderá ser objeto de hipoteca, oportunidade na qual o adquirente deverá pagar o laudêmio no caso da execução da mesma (PEREIRA, 2.004, p. 374).

As estradas de ferro, um tipo de bem imóvel pouco comum de imaginar que possam ser dados em garantia, visto à sua condição e constituição de trilhos, estações, entre outros, além de sua vultuosa importância econômica, social e logística, têm a peculiaridade que consiste em sua manutenção operacional, devendo o credor da hipoteca obedecer a certos preceitos de administração. O artigo 1.504, in fine, do Código Civil também traz uma característica própria desse tipo de garantia, que consiste no direito de oposição do credor caso exista proposta de venda, das linhas, ramais e parte considerável do material de exploração, além da possibilidade de fusão empresarial, caso ocorra a instabilidade da garantia (DINIZ, 2.009, p. 559-560).

Os recursos naturais, anteriormente dispostos no Código Civil de 1.916 no seu artigo 810, VI, como “as minas e as pedreiras, independentemente do solo onde se acham”, podem ser objeto de hipoteca, mas com a ressalva de que deverão ter sua exploração preferencialmente feita pela União, por força da Constituição Federal de 1988. No caso das minas, é necessário que exista uma concessão para que possam ser hipotecadas, requisito dispensado para as pedreiras, por sua natureza (PEREIRA, 2.004, p 375). Já Venosa (2.006, p. 559), traz a possibilidade de que os monumentos arqueológicos sejam objeto de hipoteca, por se encontrarem no solo.

Os navios possuem uma particulariedade, pois são bens móveis que o direito os imobiliza. Diante de seu alto valor econômico, podem ser hipotecados e isso se estende desde o momento de sua construção às suas partes e acessórios. Por estar vinculado a um porto, ter nacionalidade e registro que o individualiza, oferece condições para assegurar o pagamento de uma dívida. Para que a hipoteca de navios seja válida, é necessária a outorga uxória (MONTEIRO, 2.007, p. 461).

As aeronaves, assim como os navios, além de serem submetidas a registro, imobilizadas pelo direito e ter sua hipoteca constituída desde a sua construção, são submetidas ao regime da lei especial. O registro da aeronave será público, único e centralizado, inscrito no Registro Aeronáutico Brasileiro (GONÇALVES, 2.009, p. 565; 572).

A lei 11.481/2.007 introduziu os incisos VII, IX e X no artigo 1.473 do Código Civil, cujos incrementos são o direito de uso especial para fins de moradia, que diz respeito à aceitação da garantia real pelos agentes do Sistema Financeiro da Habitação, desde que constatada a posse para fins de moradia e exista registro dela no cartório competente. Da mesma forma ocorre com o direito real de uso, que ficará limitado à duração de sua concessão. Por fim, pode ser objeto de hipoteca a propriedade superficiária, que corresponde às plantações e construções, sem que haja o domínio do solo, constituindo-se em um direito real de plantar ou construir em terreno alheio (DINIZ, 2.009, p. 564).

Maria Helena Diniz traz o exemplo do gasoduto[6] como objeto de hipoteca. Tal bem se adere ao solo abrangendo a área útil que é desapropriada e o espaço aéreo, incluindo seus bens e pertenças. Não se pode deixar de lado a concepção segundo a qual são bens móveis que são considerados imóveis. No entanto, o gasoduto se trata de um bem imóvel composto, visto que o objeto da hipoteca pode recair sobre ele, propriamente dito, ou sobre seus acessórios. As suas partes integrantes somente serão consideradas hipotecadas se houver uma hipoteca conjunta (2.009, p. 562-563).

Pelo conseguinte, os requisitos objetivos servem ao direito como balizadores da hipoteca, tratando-se de tipos previstos em lei. Entretanto, cabe ressaltar que outros tipos de bens não previstos no texto legal poderão ser objeto de hipoteca desde observada a natureza hipotecária nos mesmos, que se resume à condição ou tratamento de imóveis e o registro formal que possam apresentar. Há, também, que se destacar a hipoteca que recai sobre bens móveis quando eles são acessórios ou melhoramentos dos imóveis, pois representam uma garantia valiosa junto do imóvel em que se encontram, embora sua manutenção e controle não seja tarefa muito fácil, podendo ocorrer o seu perecimento, desvio ou subtração.

Sobre o autor
Diego Alexandre Rodrigues Ferreira

Bacharel em Direito pela Universidade Norte do Paraná, especialista em Direito civil e processo civil pela Universidade Estadual de Londrina, presidente do Sindicato dos Servidores Municipais de Tamarana, ensaísta, advogado na comarca de Londrina, estado do Paraná, e região.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERREIRA, Diego Alexandre Rodrigues. Da hipoteca: análise crítica do instituto. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3562, 2 abr. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24082. Acesso em: 5 nov. 2024.

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